EVOCAÇÃO DO CENTENÁRIO DA I GUERRA MUNDIAL (1914-1918 / 2014-2018)
A 8 de abril de 2014 foi assinado um protocolo de colaboração entre o Ministério da Defesa Nacional e o Ministério da Educação e Ciência para potenciar uma programação alargada de evocações do Centenário da 1ª Guerra Mundial no quadriénio de 2014-2018, no sentido de mobilizar parcerias entre as entidades militares e as escolas portuguesas.
Ao Centenário evocativo deste magno acontecimento da História Universal terei o prazer de me juntar com a participação numa tertúlia, subordinada a este tema, que se realizará a 21 de junho de 2014, sábado às 15 horas, na Biblioteca Municipal de Sesimbra. Procurarei levantar algumas pistas compreensivas sobre o impacto na mentalidade que este acontecimento teve em Portugal na época, mas sem querer desvendar muito mais lanço-vos, desde já, o desafio para participarem neste encontro de reflexão histórica.
A I Guerra Mundial teve como motivos principais as políticas expansionistas das grandes potências geopolíticas, a constituição de duas alianças político-militares antagonistas (a Tripla Aliança e a Tríplice Entente), a rivalidade naval e imperial entre a Inglaterra e a Alemanha e, finalmente, como fator imediato o assassinato do herdeiro do Império Austro-húngaro, Francisco Fernando, perpetrado em Sarajevo por um nacionalista sérvio, preparado pela Sociedade Secreta Mão Negra, a 28 de junho de 1914.
Este conflito bélico (1914-1918) viu as Potências Centrais baquearem perante as forças Aliadas, porque a Itália e a Roménia desertaram, respectivamente em 1915 e em 1916, sendo que os EUA entraram na Guerra, ao lado das potências Aliadas, em 1917. Num breve balanço, militar, verifica-se que as Potências Centrais se revelaram numericamente inferiores em tropas, mas superiores em programas de armamento. Contudo, as forças geoestratégicas penderam para as potências Aliadas pelos motivos elencados[1].
A intervenção de Portugal na Grande Guerra foi alvo de uma acesa polémica política, pois já em julho de 1914 começaram os primeiros conflitos militares entre as tropas portuguesas e alemãs a norte de Moçambique.
Espelho das divergências relativas à intervenção portuguesa no conflito mundial foi o fosso que se abriu entre os apoiantes, da posição favorável à entrada na guerra, que se encontravam sobretudo no Partido Democrático e que contava com o apoio político de figuras proeminentes como Afonso Costa, João Chagas, José Norton de Matos e Bernardim Machado e do outro lado estavam outras forças partidárias e figuras prestigiadas favoráveis à posição de neutralidade como o general e ministro Alfredo Freire de Andrade e Sidónio Pais. Na verdade, após alguma polémica, meses mais tarde, a 23 de novembro deste ano, o Congresso da República autoriza Portugal a intervir ao lado dos Aliados.
Todavia, só no início de 1916 Portugal entra na guerra devido à continuação dos combates com as forças alemãs em Angola e em Moçambique, ao receio da partilha das colónias portuguesas entre as potências imperialistas em caso de neutralidade, à necessidade de credibilizar o novo regime político no plano internacional, à aliança luso-britânica que levou a Inglaterra a solicitar a apreensão de navios alemães fundeados no rio Tejo para serem postos ao serviço dos Aliados.
A satisfação deste pedido desencadeou a declaração de guerra da Alemanha a Portugal a 9 de março, o que conduziu à formação de um Governo chamado de União Sagrada destinado a preparar os contingentes militares portugueses para a entrada na Grande Guerra.
Entretanto, o Ministro da Guerra José Norton de Matos e o general Tamagnini de Abreu procederam à organização de uma força de combate de trinta mil homens que ficou conhecida como Corpo Expedicionário Português, não obstante a sociedade portuguesa tenha permanecido dividida entre os intervencionistas e os refractários ao recrutamento militar.
Jaime Cortesão, deputado do Partido Democrático, alistou-se com entusiasmo e denodado sentido patriótico, sendo que na Tertúlia da Biblioteca Municipal de Sesimbra ouviremos o escritor Pedro Martins a falar-nos da experiência militar desta carismática figura do século XX português[2].
A guerra teve como momentos mais dramáticos os combates nas trincheiras, vivenciados em condições médico-sanitárias deploráveis, designadamente na Batalha de Verdun, em 1916, em que perderam a vida mais de meio milhão de soldados franceses e alemães. Também os contingentes militares portugueses sofreram pesadas baixas com milhares de mortos e feridos na batalha de La Lys a 9 de março de 1918.
Este ciclópico e catastrófico conflito militar teve como desfecho a derrota da Alemanha com a assinatura do Armistício a 11 de novembro de 1918. Assim, este facto gerou o desmembramento territorial das Potências Centrais e as duras imposições do Tratado de Versalhes à Alemanha de desarmamento, de separação de comunidades alemãs da sua antiga pátria e de pesadas sanções pecuniárias e territoriais, que estiveram na origem da revolta nacionalista alemã impeditiva de uma paz duradoura ansiada por Woodrow Wilson e meditada por Immanuel Kant.
Em suma, esperamos que estas evocações históricas e pedagógicas do Centenário da Grande Guerra que vão decorrer, em Portugal e um pouco por toda a Europa nestes próximos tempos, sensibilizem as populações e os seus líderes dos riscos dos antagonismos nacionalistas que ainda estão enraizados em algumas potências regionais neste momento de ponderosa crise europeia, na segunda década do século XXI.
[1] “Guerras mundiais e ideologias – A Europa e os EUA entre 1914 e 1945”, in História Universal, vol. 2, Revisão técnica Jorge Borges de Macedo, Lisboa, Círculo de Leitores, 1994, pp. 368-372.
[2] Fernando Pereira Marques, “Intervenção portuguesa na grande guerra”, in Dicionário Enciclopédico da História de Portugal, Lisboa, Publicações Alfa, 1990, pp. 346-347.
Nuno Sotto Mayor Ferrão