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Crónicas do Professor Nuno Sotto Mayor Ferrão

Crónicas que tratam temas da cultura, da literatura, da política, da sociedade portuguesa e das realidades actuais do mundo em que vivemos. Em outros textos mais curtos farei considerações sobre temas de grande actualidade.

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GREVE GERAL – REFLEXÕES EM TORNO DAS MOTIVAÇÕES DAS GREVES DO PASSADO E DO PRESENTE – A JORNADA DE LUTA DE 24 DE NOVEMBRO DE 2010

 

A Greve é um acto de suspensão do trabalho com o objectivo dos trabalhadores reivindicarem exigências profissionais de melhoria das suas condições remuneratórias ou de prestação dos seus trabalhos em contexto de maior dignidade ou, eventualmente, um protesto perante a perda de benefícios. A Greve está ligada à liberdade sindical e é um Direito fundamental dos trabalhadores consagrado na Constituição Portuguesa de 1976, que repôs os Direitos de Organização Sindical, e importa trazer à memória colectiva que a Ditadura Militar e o Estado Novo proibiram as Greves, com Legislação específica, nos anos de 1927, 1934 e 1958.

 

Historicamente, o Direito à Greve aparece em Portugal na segunda metade do século XIX, com as Leis de 1864 e de 1891 que permitiram uma maior agitação social no fim do século XIX e no início do século XX. Os socialistas José Fontana, Antero de Quental e Azedo Gneco foram grandes propulsores dos Direitos dos Trabalhadores e desta peculiar forma de luta.

 

Com efeito, teve particular importância a Greve Académica de 1907 que permitiu ao rei D. Carlos transformar o governo Constitucional de João Franco em governo Ditatorial, o que potenciou o crescente descontentamento da população portuguesa com o regime Monárquico que o levou a resvalar no abismo auto sacrificial. Com a instauração do regime Republicano, a Greve foi consagrada como um Direito, logo em 1910, e no período da I República o país assistiu incrédulo a um turbilhão grevista com mais de meio milhar de Greves em cerca de 16 anos (1910-1926).

 

A Greve assume-se como a forma mais expressiva da luta sindical. Contudo, as Greves devem partir da consciência crítica e reflexiva dos trabalhadores que devem usar desse expediente de protesto com parcimónia, porque estas devem configurar nas suas motivações reivindicações de ordem profissional e não, unicamente, constituir arremedos de propaganda político-partidária, mas, nos dias de hoje, importa também ter uma linha de pensamento que corresponda a uma cidadania Global que tenha por referência os quadros conjunturais e estruturais em que nos movemos.

 

Esta Greve Geral é uma acção de âmbito nacional, abrangendo múltiplos sectores de actividade, subscrita pelas duas Centrais Sindicais Portuguesas, a CGPT-IN e a UGT, que apresentaram um pré-aviso de Greve com a devida antecedência.

 

A França tem estado historicamente na vanguarda dos movimentos da cidadania contemporânea ao afirmar-se, ao longo do tempo, como uma nação decisiva para as mudanças da mentalidade e das estruturas sociais. Basta recordar os protestos populares da Revolução Francesa, iniciada em 1789, as contestações em Paris no mês de Maio de 1968 e a dinâmica das Manifestações, neste mesmo país, em 2010, contra o aumento da idade da Reforma e as medidas de austeridade, promovidas no contexto da crise económica, decorrentes do ambiente de declínio demográfico Europeu, da anunciada falência do Estado-Providência e dos Programas de Estabilidade e Crescimento apresentados pelas instâncias comunitárias da UE como soluções para acudir a estes problemas do Velho Continente.

 

Esta estratégia delineada, pelos líderes Europeus, de encurtamento da abrangência das Políticas Sociais tornará a vida, das classes médias e das camadas populares, mais difícil com o congelamento das carreiras do sector público, a redução de salários, o aumento dos impostos e a precarização dos trabalhos e o crescimento exponencial do contingente de desempregados resultantes da formação de oligopólios.

 

Estes problemas portugueses e europeus estão, suficientemente, diagnosticados[1], contudo cumpre conceber um novo paradigma Civilizacional[2], de base Humanista, que permita superar os inúmeros paradoxos que tolhem as sociedades europeias no contexto da Globalização desregrada e dum sistema financeiro, motivado pelos mecanismos especulativos, separado das actividades produtivas da economia real. Como nos diz o pensamento, bem clarividente, de Vitorino Magalhães Godinho temos de ultrapassar a economia de consumo de produtos, cada vez mais evanescentes, para que as famílias e os Estados não se endividem mais e para que haja capacidade de poupança individual e colectiva. No entanto, convém mudar de paradigma, no sentido de libertar a economia, os Estados e os cidadãos do controlo dos oligopólios e deste sistema financeiro pouco atreito aos juízos Éticos.

 

Em suma, todos os funcionários públicos terão uma redução do salário real no próximo ano, mais ou menos significativa, na pátria de Guerra Junqueiro. Com base neste pressuposto, esta Greve Geral de 24 de Novembro de 2010 representa um gesto inequívoco de indignação democrática contra esta estratégia que não resolve os problemas de fundo, de Portugal e da Europa, que Vitorino Magalhães Godinho tão bem nos escalpeliza nesse lúcido ensaio já citado.

 

Nuno Sotto Mayor Ferrão



[1] A nova Primavera do político, org. Michel Wieviorka, Lisboa, Editora Guerra e Paz/Fundação Calouste Gulbenkian, 2007 e Bento XVI, Caridade na Verdade – carta encíclica, Lisboa, Edições Paulinas, 2009.

[2] Mário Soares, Elogio da política, Lisboa, Sextante Editora, 2009 e Vitorino Magalhães Godinho, Os problemas de Portugal – Os problemas da Europa, Lisboa, Edições Colibri, 2010.

CIMEIRA DA NATO (OTAN), 2010, EM LISBOA – BREVES CONSIDERAÇÕES HISTÓRICAS E GEOPOLÍTICAS

 

O envolvimento de Portugal nas operações da Nato no Afeganistão e a necessidade de prestigiar o nosso país neste momento em que os voláteis mercados internacionais desconfiam da nossa capacidade de solver os juros dívida pública externa podem ter determinado os órgãos de soberania da pátria lusitana a fazer esta proposta, de realização da Cimeira de Lisboa em 2010 a 19 e 20 de Novembro, aos dirigentes da Nato.

 

A Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN/NATO) foi criada em 1949 no contexto inicial da guerra fria entre as duas superpotências (EUA-URSS), tendo Portugal ingressado no período do Estado Novo, de forma imediata nesta Aliança de defesa militar, pela sua política geoestratégica de protecção das suas colónias no conturbado ambiente anticolonialista do pós-guerra. Constituiu-se, assim, como uma aliança militar anti-soviética em pleno período de corrida ao armamento e de tensão entre os dois blocos rivais, capitalista e comunista. Aderiram à Nato os países da América do Norte e da Europa Ocidental, integrantes do modelo capitalista.

 

Após a queda do muro de Berlim (1989) e a desintegração da URSS (1991) o mundo deixou de ser bipolar, passando a ser unipolar por uns anos, mas com as incapacidades político-militares reveladas pelos EUA tornou-se evidente que o mundo passou a ser, na Era da Globalização, multipolar e, como prova disso, sucedeu o alargamento do G7 para G8 e, posteriormente, para G20. Com o trágico acontecimento de 11 de Setembro de 2001, o mundo aprendeu a viver nas incertezas, de um planeta demasiado intercomunicante, que o transformou numa pequena aldeia de grandes vulnerabilidades.

 

Assim, neste contexto do início do século XXI, emergem novas ameaças a que a Nato, superiormente representada pelo Conselho do Atlântico Norte, procura dar uma resposta eficaz. Das ameaças à segurança dos países membros sobressaem: o perigo terrorista, a eventualidade de uma guerra clássica, a proliferação de armas de destruição maciça (designadamente das bombas atómicas nas mãos de vários países), o risco de uma guerra química ou biológica e o vazio institucional de alguns países que se tornaram “antros” de malfeitores. Por outro lado, a incapacidade militar da Organização das Nações Unidas (ONU) de fazerem prevalecer as normas jurídicas internacionais procedentes do Conselho de Segurança tornou a Nato um instrumento fundamental da segurança colectiva da Civilização Ocidental.

 

Perante estas novas ameaças está a ser revisto, e discutido, o novo conceito estratégico de defesa dos países-membros do Conselho do Atlântico Norte. Quais são, então, os novos inimigos dos países ocidentalizados? No plano da segurança colectiva, os actores hostis parecem ser os guerrilheiros do terror, que atacam as populações civis indefesas, dos países economicamente mais prósperos ou mais interventivos no plano da segurança colectiva Global. Os países sem Estado, como a Somália e o Afeganistão em reconstrução, entre outros, constituem motivo de profunda preocupação, porquanto grupos e indivíduos, aí entrincheirados, fornecem cobertura a actividades criminosas para a segurança internacional, respectivamente com a pirataria no oceano Índico e com o terrorismo de escala planetária.

 

A necessidade de gerir de forma racional os recursos militares da Nato, face à presente crise económica mundial e aos imparáveis gastos militares, exige, nas palavras do Secretário-Geral da Nato, Anders Fogh Rasmussen, a reestruturação das cadeias de comando dos quartéis-generais da organização, implicando uma redução dos comandos estratégicos por uma questão de economia de custos. Neste contexto economicista, o quartel-general da Nato em Oeiras vislumbra-se dispensável no novo figurino institucional da organização. Ou seja, a lógica desta reestruturação passa por reconfigurar as estruturas institucionais, no sentido de as tornar mais leves, reduzindo gastos financeiros, sem perda de capacidade operativa das suas forças responderem com eficácia às novas ameaças emergentes nesta conjuntura da Globalização.

 

Portugal possuiu, actualmente, contingentes militares integrados nas operações da Nato no Kosovo e no Afeganistão. Aliás, em Novembro de 2005 morreu o militar português João Paulo Roma Pereira, do Alandroal, nas operações de segurança no Afeganistão num serviço de grande dignidade prestado à Pátria e à Humanidade. A crise económica internacional constitui uma pressão complementar para uma eventual retirada, faseada, das forças da Nato deste país. Eventualmente, haverá outro ponto informal da agenda desta Cimeira, a introduzir por vontade do seu Secretário-Geral, que será o debate sobre o sistema antimíssil a criar nos países-membros.

 

A Nato e a Rússia estão em processo de reaproximação, depois da queda do figurino político da Europa de leste, resultante da guerra fria, e da integração destes países na União Europeia, daí a sessão de trabalhos prevista entre os responsáveis políticos do Conselho do Atlântico Norte e os responsáveis Russos. A Federação Russa sente necessidade de aproximação ao Ocidente devido à insegurança interna que sente pelo terrorismo checheno e pelas organizações clandestinas que subsistem no país devido ao mercado negro.

 

Perante esta Cimeira internacional, e o impacto mediático que irá ter, os meios de segurança interna foram reforçados na vigilância e na monitorização da circulação aérea, naval e terrestre no território nacional. Nesta medida, foi suspenso por alguns dias o acordo de Schengen, de liberdade de circulação de pessoas da União Europeia, e foi montado por todo o país um sistema de controlo fronteiriço de indivíduos. Este sistema de prevenção foi montado, porque se conhecem os distúrbios que algumas Manifestações, mais aguerridas, habitualmente causam e se acautelam eventuais actos indesejáveis sempre possíveis nestas ocasiões mediáticas.

 

Nuno Sotto Mayor Ferrão

 

Para informações complementares consultar: Cimeira da Nato em Lisboa 2010 e Organização do Tratado do Atlântico Norte

 

 

 

 

 

 

 

 

A CARICATURA NOS CARTOONS DESIGNADOS ZITS DE JERRY SCOTT E JIM BORGMAN

 

Os Zits de Jerry Scott e Jim Borgman já foram publicados em mais de 1500 jornais internacionais e estão agora disponíveis em livros traduzidos em várias línguas. O humor subtil e, tantas vezes, corrosivo dos autores retrata bem o conflito de gerações entre pais, que viveram numa outra conjuntura histórica, e filhos que vivem na conjuntura da Globalização das novas tecnologias e do consumo desenfreado. A forma sarcástica como o protagonista, Jeremy, é representado faz-nos, muitas vezes, compreender com boa disposição as angústias e as indecisões de muitos adolescentes e os constantes conflitos com os seus pais. A falta de comunicação é-nos apresentada como um dos problemas que subjaz a estas situações de corrente conflitualidade parental.

 

A caricatura, em Portugal, teve um tão elevado representante em Rafael Bordalo Pinheiro, na transição do século XIX para o XX, que nos deu as bases de inteligibilização destas leituras sardónicas. É caso para dizer que uma boa imagem vale mais que mil palavras… O desenho de qualidade pode, com poucas imagens, fazer-nos perceber melhor uma comunicação gestual do que muitas vezes uma descrição verbal, pormenorizada, que pode fazer-nos perder o núcleo das questões essenciais.

 

Além disso, as imagens metafóricas passam-nos uma mensagem de forma rápida, fazendo-nos sorrir ou rir com situações já nossas conhecidas. Nas várias pranchas cómicas dos Zits tratam-se temas, do quotidiano, dignos de reflexão: por um lado, os adolescentes são vistos como muito dependentes das novas tecnologias e amigos da descontracção e da preguiça (atente-se na forma como Jeremy se senta no sofá ou no modo frenético como se levanta depois de ter estado na preguiça mais tempo), por outro lado, os pais são perspectivados, também, pelo lado dos adolescentes como antiquados, formais e demasiado rotineiros, sendo esta a base para a compreensão de muitas faltas de entendimento entre as gerações de pais e filhos. Vale, pois, bem a pena ler estes livros!

 

Nuno Sotto Mayor Ferrão

 

ATRIBUIÇÃO DO “PRÉMIO DARDOS” A 10 BLOGUES

 

Durante esta semana tive o gosto de ser agraciado por Carlos Barbosa de Oliveira no seu blogue “Crónicas do Rochedo”, no ‘post – Dardos x 5’ como um dos vários contemplados com este Prémio. Uma vez que o espírito deste Prémio se destina a promover a qualidade cultural da blogosfera, não só regozijo-me como tenho o imenso prazer de participar na atribuição deste Prémio a blogues que costumo frequentar e que considero valorosos pelos conteúdos de qualidade com que habitualmente nos brindam. Faço uma divisão entre blogues de referência, que já se tornaram Clássicos no panorama da blogosfera, e blogues que se têm vindo a afirmar como uma Revelação e resultam de descobertas mais recentes, mas que merecem todo o apoio pelo contributo que têm estado a dar para a difusão destes valores Humanistas enunciados na finalidade do Prémio Dardos.

 

«O Prémio Dardos é o reconhecimento dos ideiais que cada blogueiro emprega ao transmitir valores culturais, éticos, literários, pessoais, etc.... que, em suma, demonstrem a sua criatividade através do pensamento vivo que está e permanece intacto entre as suas letras e as suas palavras. Estes selos foram criados com a intenção de promover a confraternização entre blogueiros, uma forma de demonstrar o carinho e reconhecimento por um trabalho que agregue valor à Web.»

 

Blogues Clássicos:

  • Duas ou três coisas – espaço de memórias diplomáticas, de notas de cultura e de actualidade da autoria de Francisco Seixas da Costa
  • Crónicas de Francisco José Viegas – crónicas de cultura, de actualidade e de futebol deste autor
  • Córtex Frontal – espaço de comentário político, de actualidade e de futebol da autoria de José Medeiros Ferreira e de Joana Amaral Dias
  • A Nossa Candeia – espaço de intervenção cívica e cultural de Ana Paula Fitas
  • Revista Nova Águia – espaço de divulgação cultural associada à revista do mesmo nome

 

Blogues Revelação:

  • Carta a Garcia – espaço de comentário político e de divulgação de obras de Arte de Osvaldo Castro e Tiago Castro
  • História Viva – espaço dedicado à História da autoria de Eduardo Marcolino
  • João olhos no Mar – espaço dedicado à arte e à poesia de Miguel Gomes Coelho
  • Milhafre – espaço cívico de divulgação de intervenções do Movimento Internacional Lusófono e de difusão de uma Cultura Lusófona
  • Donatien Alphonse François – espaço de crítica mordaz às situações quotidianas das nossas sociedades

 

Nuno Sotto Mayor Ferrão

MIGUEL REALE (1910-2006), CENTENÁRIO DO NASCIMENTO DESTE HUMANISTA DE DIMENSÃO INTERNACIONAL

 

Miguel Reale marcou a Cultura Luso-Brasileira pela sua fibra intelectual como Jurista, Filósofo, Ensaísta, Historiador das Ideias e Escritor. Realiza-se, em Lisboa, de 8 a 11 de Novembro de 2010, no âmbito do Centenário do seu nascimento, o Colóquio intitulado “Miguel Real e o Pensamento Luso-Brasileiro”, com comunicações de numerosos e prestigiados especialistas, numa parceria entre o Instituto Luso-Brasileiro de Cultura e o Centro de História da Cultura da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa.

 

Durante este Colóquio será lançada a revista “Nova Águia”, nº 6, às dezassete horas do dia 10 por Renato Epifânio, pois nela se destaca um artigo do Professor Doutor António Braz Teixeira[1], um dos esteios do Instituto Luso-Brasileiro de Cultura, em que nos revela a faceta, menos conhecida, de Miguel Reale como Historiador das Ideias Filosóficas Brasileiras.

 

Este pensador afirmou-se internacionalmente com a sua Teoria Tridimensional do Direito, que o catapultou para um reconhecimento Académico, além fronteiras, como Filósofo Jurídico. Na realidade, a pluralidade dos seus saberes e das suas curiosidades intelectuais imprimiram-lhe o perfil de Humanista que escreveu obras em diversas áreas: Filosofia do Direito, Filosofia Brasileira, História da Cultura, Ciência Política, Literatura, deste modo teve vários livros traduzidos em diversas línguas. No Brasil, o seu prestígio público emanou da sua grande autoridade intelectual que o levou a ingressar na Academia Brasileira de Letras, a partir dos anos 70, e a colaborar na Comissão que reviu, em 1967, a Constituição Brasileira. Já nos últimos de vida concedeu o seu contributo de especialista no trabalho de supervisão do actual Código Civil Brasileiro.

 

É, pois, absolutamente justa esta Homenagem, inerente a este Colóquio e ao artigo que o novo número da “Nova Águia” nos apresenta, para que, as sociedades lusófonas, conheçam melhor o pensamento deste insigne Homem de Letras Brasileiro.

 

Nuno Sotto Mayor Ferrão



[1] António Braz Teixeira, “Miguel Reale, Historiador das Ideias”, in Nova Águia, nº 6, 2º semestre de 2010, Sintra, Editora Zéfiro, pp. 140-142.

AS IDEIAS EMANCIPALISTAS EM MOÇAMBIQUE NA DÉCADA DE 1920 – CONTRIBUTOS PARA A HISTÓRIA ULTRAMARINA PORTUGUESA DA 1ª REPÚBLICA[1]

Entre 1922 e 1926 circulou em Moçambique entre grupos de colonos a ideia de que seria vantajoso para efeitos de uma mais eficaz exploração da mão-de-obra nativa que a colónia se tornasse independente, tendo havido inclusivamente um projecto de Constituição para o futuro  território emancipado. Por outro lado, esta colónia era muito mais dependente economicamente da União Sul Africana, com a qual mantinha intensas relações comerciais e sociais, do que da metrópole. Deste modo, se a administração colonial portuguesa era pouco expedita, se havia insatisfação com as medidas tomadas pelos delegados do poder metropolitano, como foi o caso do Alto-Comissário Manuel de Brito Camacho, e se os colonos percebiam que se assumissem as rédeas governativas lhes seria mais fácil a exploração do trabalho indígena torna-se fácil compreender que nesta fase politicamente mais liberal se tenham difundido nesta colónia as teses emancipalistas.


Manuel de Brito Camacho[2] após ter exercido o cargo de Alto Comissário em Moçambique, numa conferência proferida em 1924[3], argumentou que a descentralização administrativa era o caminho inevitável para a emancipação das colónias, que aliás se constituía como o fim desejável de qualquer sistema colonial, o que era uma tese inaceitável à luz da posição oficial do Estado português que pressupunha a inalienabilidade dos territórios coloniais[4].


Este intelectual politizado considerava impossível manter a soberania da metrópole nas colónias, por tempo indeterminado por ser uma inegável injustiça, defendendo como alternativa que se investisse na unidade económica entre a metrópole e as colónias e na descentralização administrativa no sentido de se possibilitar o desenvolvimento colonial, com o intuito de pôr fim à exploração desonesta das colónias e ao menosprezo pela civilização dos “indígenas”. Camacho considerava ser necessário independentizar cada vez mais os orgãos locais da administração colonial em relação ao poder metropolitano devido à instabilidade política que então se vivia na metrópole e à finalidade emancipalista do processo colonial.

 

Como doutrinador, Brito Camacho considerava que a evolução histórica conduziria as colónias à emancipação, opondo-se desta forma ao pensamento da maioria dos colonialistas e à posição oficial do Estado português que pressupunham a inalienabilidade do império português independentemente das circunstâncias conjunturais. Declara que as relações entre a metrópole e as colónias deviam prever e preparar a emancipação destes territórios, defendendo implicitamente que o benéfico princípio descentralizador era contrário à indesejável exploração colonial, embora julgasse que esta finalidade emancipalista estaria mais longe em povos “selvagens” ( expressão do próprio Brito Camacho ), como eram os de Moçambique ou de Angola, do que em povos com maior nível de desenvolvimento como os da União Sul-Africana.


Na sua visão estratégica heterodoxa, a política colonial devia ser exercida em proveito da metrópole e das colónias, de modo a constituir-se uma unidade económica equilibrada[5], que se atenuaria com a emancipação das colónias mas sem se perderem completamente. É por esta razão que justificava o estímulo à cultura do algodão e do açúcar em Moçambique, tal como o sustentava também Freire de Andrade, porque estas culturas beneficiavam tanto a metrópole como a colónia.


De facto, aconselhou que a política colonial seguisse uma doutrina administrativa coerente, proporcionando simultaneamente uma articulação entre o poder central e os orgãos das colónias e uma continuidade administrativa que independentizasse a máquina da administração colonial da instabilidade política que a República Parlamentar então vivia. Do seu ponto vista, só assim se poderia favorecer o desenvolvimento das colónias e das suas populações nativas. Elucida a originalidade desta visão administrativa o seguinte excerto desta conferência:

 

“(...) O termo natural da evolução duma Colónia, mais rápida ou demoradamente, conforme as suas circunstâncias é a sua emancipação. (...)”[6].

 

Por outro lado, Brito Camacho foi um crítico contundente da excessiva burocracia da administração colonial[7], porque frisou a ineficácia do funcionamento do Estado Colonial que consumia desnecessariamente o erário público em requisitos burocráticos em vez de estimular o progresso da economia colonial. A seu ver, os vícios de que enfermava a administração colonial eram a falta de formação dos dirigentes dos serviços públicos e a excessiva papelada usada na resolução de problemas, sem que, na realidade, isto resultasse numa solução expedicta dinamizadora da vida e da economia coloniais. Queixava-se, também, de que a influência do Estado sobre a sociedade civil era insuficiente, requerendo para o efeito verbas mais avultadas de fomento económico-social, porque senão os orçamentos apenas serviam para sustentar as funções burocráticas dos Serviços Públicos.


Ao mesmo tempo, Brito Camacho lamentava que a Administração colonial em Moçambique não possuísse conhecimentos científicos sobre a realidade económica tutelada ( o contexto agrícola, silvícola e mineralógico ), porque não existiam investigações, nem documentos de informação fidedignos sobre o assunto. Por esta razão, os serviços administrativos eram ineficazes, uma vez que eram excassas as informações científicas sobre a realidade colonial[8]. No fundo, opinava sobre a necessidade de tornar mais rigorosa a administração colonial alicerçando-a em múltiplos conhecimentos científicos relativos à realidade da colónia[9], referindo ser importante que os temas coloniais do território fossem introduzidos no ensino secundário com a finalidade de transmitir instrução útil aos futuros funcionários administrativos.


Sem dúvida que a experiência de Brito Camacho como Alto Comissário de Moçambique e as pressões anexionistas da África do Sul o terão levado a pensar que era inevitável a independência colonial de Moçambique, embora reputasse que, como o povo nativo era “selvagem”, o seu período de luta pela libertação seria mais alongado. Evidentemente que a influência da África do Sul e o exemplo da independência egípcia de 1922[10] poderão ter impressionado o seu espírito de molde a considerar que a emancipação dos povos coloniais era uma fatalidade. Deste modo, provavelmente as influências que o inspiraram o sentimento de inevitabilidade da independência colonial foram os exemplos externos destes dois países e o grau de discriminação racial existente em Moçambique, que geraram uma vontade explícita de revolta das populações locais contra a dominação colonial.


As influências empíricas que sofreu neste cargo por parte das ambições anexionistas da África do Sul e da intenção retrógrada do tratamento opressivo dos indígenas da parte dos colonos fizeram-no pensar que a independência colonial seria uma inevitabilidade, fosse por processo de anexação desse vizinho poderoso ou por necessidade de definir uma nova plataforma de relacionamento entre os indígenas e os povoadores brancos.


Em resumo, foi a acção política de Brito Camacho como Alto Comissário que o levou a pensar que seria inevitável mais tarde ou mais cedo a independência de Moçambique, porque as ideias governativas moralizadoras que aí intentou implementar não singraram, visto que os interesses políticos dos colonos impediram-no através dos seus ódios que as suas políticas sociais beneméritas em relação ao grosso da população colonial prosperassem[11]. Acreditava então que futuramente as populações nativas se revoltariam contra o processo subjugador dos colonos, impondo através da independência novas formas de relacionamento social entre indígenas e populações brancas.


Nos anos 20 um jornalista, Mário Domingues, do periódico A Batalha de linha anarquista, ventilou a ideia de que os povos coloniais tinham direito a tornarem-se independentes, o que significa que nas margens extremistas das correntes políticas existia na sociedade da metrópole uma corrente anticolonialista.  Ele denunciava que a missão civilizadora era impossível, porque os meios de coercção exercidos sobre os indígenas não permitiam que fossem devidamente civilizados. Esta posição heterodoxa assumida por esta corrente política desligada do poder efectivo foi a única que até ao momento foi estudada pelos investigadores [12]. Estas duas posições ideológicas demonstram que não havia unanimidade em relação ao futuro desejável das colónias, designadamente em relação à ideia de que o império era parte integrante e inalienável da pátria portuguesa.

Em Junho de 1923 num período de forte descontentamento social com a actuação administrativa de Brito Camacho um grupo de colonos interessados na exploração de mão-de-obra negra pretendeu tornar Moçambique independente[13], porque se eles fossem dominantes do ponto de vista político numa eventual independência poderiam controlar economicamente as populações locais. Realizou-se, inclusivamente, nesta época um comício favorável a esta causa emancipalista sustentada sobretudo por colonos com o objectivo de explorar a mão-de-obra de trabalho negro, no sentido de que a emigração sazonal para a região do Rand fosse aplicada localmente em proveito da ganância dos colonos brancos de Moçambique. Das seguintes passagens duma notícia, em tom de denúncia, se inferem estas informações:

 

“(...) Temos a certeza que há ainda homens de senso em Portugal que hão-de salvar o eterno explorado. Longe das ambições dos africanistas, declarados filhos de Moçambique, (...) saberão, estamos certos, arrancarem destes abutres a liberdade de extorquirem o preto a seu talante, com lei na mão, adrede feita. Não está a província em condições de ter uma autonomia administrativa, mas a embriaguez da política local vai longe: Vai até ao ponto de admitir a possibilidade de uma emancipação! Por este critério pode-se calcular da seriedade política dos agitadores, dos tais filhos de Moçambique, zelosos pela sua emancipação. (...)”[14].

 

Embora sob os regimes autoritários as teses coloniais heterodoxas tenham sido mais reprimidas, não obstante verificaram-se algumas excepções. Por exemplo, em Janeiro de 1929 em plena Ditadura Militar num editorial de um jornal Moçambicano[15] censurando-se a política centralista colonial defende-se, ao invés, uma administração colonial autónoma exercida pelas élites locais, que na avaliação do autor conduziria num futuro próximo à desejável emancipação do povo Moçambicano. Neste artigo rotulam-se de tirânicas as leis centralizadoras coloniais do ministro João Belo, asseverando-se que o modelo administrativo colonial nesta província tinha de ser autonómico no sentido de se caminhar para o desenvolvimento e emancipação do povo moçambicano. Esta doutrina insere-se na corrente heterodoxa que circulava em Moçambique entre alguns colonos brancos com maior apego à terra. Neste texto considera-se que esta colónia já possuía élites intelectuais capazes de governarem eficazmente “in loco” sem dependência de burocratas enviados de Lisboa[16].

Hotel Polana – Lourenço Marques

O jornal O Brado Africano, porta-voz das populações nativas Moçambicanas, criticou em 1923 as teses emancipalistas defendidas por colonos burgueses[17], porque a seu ver pretendiam dominar os autóctones quando o território se tornasse independente. Mas, na verdade talvez para conquistarem mais militantes, os defensores do emancipalismo argumentavam que as posições segregacionistas sobre os indígenas eram tomadas pela tutela metropolitana[18]. No entanto, a realidade histórica evidencia que o descontentamento burguês com a governação de Brito Camacho se devia à protecção que procurou dispensar à mão-de-obra indígena. Com efeito, o editorial deste periódico insurge-se contra a tese emancipalista e racista que começava a ser pevalecente entre os meios burgueses de Lourenço Marques[19], reconhecendo que seria preferível a tutela de Lisboa sob os aborígenes moçambicanos do que estas ambições de um grupo de colonos, porque estes eram desfavoráveis à dignidade civilizacional dos indígenas.


Em 1924 a conjugação de factores politicamente negativos, como sejam a crise económico-financeira de Angola e de Moçambique e o ódio intenso a Norton de Matos e a Brito Camacho por parte dos empresários coloniais, potenciou o recrudescimento dos movimentos independentistas nestas sociedades. Foi, neste contexto, que José Osório de Oliveira[20], funcionário colonial em Moçambique, considerou que a descentralização administrativa colonial dos Altos Comissários era responsável pela “desnacionalização” das colónias, pelo crescimento do espírito de autonomia e pelas veleidades de independência de certos sectores destas sociedades coloniais, que do seu ponto de vista poderiam fazer perigar a soberania portuguesa no ultramar.

 

Alertou, assim, para o perigo, à data da conjuntura de descalabro colonial, do fenómeno das “desnacionalizações” das colónias portuguesas perante as ameaças externas de cobiças de outras potências imperiais ou as ameaças internas de colonos que sonhavam com a independência dos seus territórios. Exemplifica que a força e as aspirações políticas emancipalistas das sociedades coloniais eram reais, fazendo perigar a ideia de transformarem Angola e Moçambique em “novos-brasis”, dado que ele já tinha tido nas suas mãos uma Constituição para Moçambique como território independente. Das seguintes passagens se podem corroborar estas interpretações:

 

“(...) O que um portuguez nascido em Portugal entende por moçambicano nunca o percebi. Sempre me pareceu que moçambicanos eram, apenas, os landins, os makuas e os makondes. Vejo porém que me enganei. Africanos não são só os pretos nem, se quiserem, os brancos que tenham nascido em África. Há brancos nascidos em Portugal que se intitulam moçambicanos ou angolenses pelo facto de viverem em Moçambique ou em Angola e pedem a autonomia e sonham com a independência em detrimento e prejuízo da sua Pátria. (...) Mas o que é facto é que em Lourenço Marques tive eu em meu poder o “Projecto de Constituição do Estado Autonómico da Província de Moçambique” e eu bem sei que ele não representa uma fantasia, mas uma corrente de opinião e uma força. (...)”[21]

 

O general Alfredo Freire de Andrade, representante português na renegociação do Convénio entre a União Sul-Africana e Moçambique em 1922, demonstrou em entrevista a um periódico moçambicano o risco que advinha da tese emancipalista[22].  Deste modo, considerou que a existência de um grupo de colonos no sul de Moçambique favoráveis a um regime autonómico ou mesmo a uma emancipação poderia encaminhar o território para ser absorvido pela tendência expansionista da União Sul-Africana. Em comentário, à entrevista do general, o jornalista afirma que a reinvindicação emancipalista proposta por grupos de colonos do sul de Moçambique e a ideia de Freire de Andrade de resolver o problema monetário local através da adopção de um regime de moeda de padrão ouro eram passos decisivos em direcção à absorção de Moçambique por parte do país vizinho[23].

Por conseguinte, proliferaram teses heterodoxas em certos meios moçambicanos nos anos 20 favoráveis à criação de um regime autonómico administrativo ou mesmo de uma emancipação política. Este facto parece significar que o regime dos Altos Comissários era encarado pelos sectores empresariais da sociedade moçambicana como um mecanismo institucional ainda centralizador, eurocêntrico, porque embora se tivessem reforçado poderes administrativos exercidos “in loco”, a verdade é que eram vistos como delegados do poder metropolitano.

 

Nuno Sotto Mayor Ferrão



[1] Pesquisa histórica, que desenvolvi, inserida num projecto de investigação de História Ultramarina orientado pelo Professor Doutor José Medeiros Ferreira com base em consulta de acervos documentais no Arquivo Histórico-Ultramarino, no Arquivo Histórico-Parlamentar, no Arquivo Histórico da Universidade de Évora, na Biblioteca Municipal de Évora, na Biblioteca Nacional de Portugal, etc.

[2] “Manuel de Brito Camacho”, in Parlamentares e Ministros da 1ª República, (Coord. A.H. Oliveira Marques), Lisboa, Edição Assembleia da República, 2000, pp. 138-139.

[3] Brito Camacho proferiu esta conferência em Lisboa na Associação Comercial  na data referida, tendo sido apresentado ao público com lisonjeiras palavras do general Freire de Andrade. Afirmou o publicista que era necessário propagandear as colónias para persuadir os portugueses das suas vantagens como possíveis mercados de consumo de produtos manufacturados e óptimos mercados de abastecimento de matérias-primas, para além de poderem assumir-se como terreno propício a absorver a avultada corrente emigratória portuguesa.

[4] “(...) Definir as relações entre a metrópole e as colónias é definir um sistema de direitos e obrigações, tendo por base um interesse comum. A principal obrigação da metrópole em relação às suas colónias é preparar a sua emancipação. Uma colónia que não tende para a sua emancipação é uma terra escrava e seria absurdo que tendo-se abolido a escravidão dos indivíduos se mantivesse a escravidão dos povos. (...)” Brito Camacho, Política colonial, Lisboa, Editorial Cosmos, 1936, p. 11.

[5] Em conformidade com esta lógica argumentativa, Brito Camacho seria um contestatário do regime comercial do “pacto colonial” que se veio a instaurar com o Estado Novo, pois este regime económico dava clara preponderância à metrópole no sistema de relações comerciais com as colónias. Não espanta portanto que tenha sido um acérrimo contestatário da política colonial do Salazarismo.

[6] Brito Camacho, op. cit., p. 11.

[7] João Fernandes, Brito Camacho – Algumas reflexões acerca da sua obra colonial, Lisboa, Edição Seara Nova, 1944, pp. 18-19.

[8] Estas críticas lançadas por Brito Camacho à realidade administrativa colonial estão bem explícitas nas seguintes citações dos seus escritos políticos: “(...) Foi só em 1908 que se organizou a repartição de agricultura, um serviço meramente burocrático, como já disse, nada mais fazendo do que ofícios e notas, ignorando a Província como ignora Índia, como ignora Macau. (...) Já o leitor sabe que ainda se não fizeram as pesquisas indispensáveis, para se avaliar, sem fantasias perigosas, do valor mineralógico da Província. E deviam estar feitas, desde há muito, estas pesquisas... (...)” ( Brito Camacho citado in João Fernandes, Brito Camacho – algumas reflexões acerca da sua obra colonial, Lisboa, Edição Seara Nova, 1944, pp. 20-21).

[9] Brito Camacho achava que havia concretamente carências de informação rigorosa sobre o valor económico-antropológico dos indígenas, a realidade metereológica e a situação mineralógica de Moçambique.

[10] “África e Ásia - 1914-1945 Início da descolonização”, in História Universal, Adapação Prof. Jorge Borges de Macedo, Lisboa, Selecções do Reader’s Digest, 1994, pp.424-435.

[11] João Fernandes, op. cit., p. 16.

[12] José Castro e José Luís Garcia, “A Batalha e a questão colonial”, in Ler História, nº 27-28, pp. 125-146.

[13] “Triunfa a palavra”, in O Brado Africano, 5 de Junho de 1923, nº 219, p. 1.

[14] Ibidem, p. 1.

[15] “Descentralização”, in O Colonial, 26 de Janeiro de 1929, p. 1.

[16] As observações feitas podem ser evidenciadas nas seguintes passagens desse editorial: “(...) Somos apologistas da descentralização máxima para não dizer da autonomia quase absoluta. (...) sustentamos sem desfalecimentos a teoria de que aos povos assiste o direito de se governarem por si mesmos. (...) mas, o certo é que as nossas colónias possuem de facto, uma élite intelectual apta a constituir “self-government” eficazes tanto no campo político como no económico (...) A não ser que um povo caia na suprema desgraça em que tombaram os nossos compatriotas da metrópole não se concebe que se afronte assim um país nascente, cheio de vida, que quer caminhar, que sabe caminhar firme e conscientemente para a libertação, para a emancipação e para a prosperidade. (...)” ( Ibidem, p. 1).

[17] “Dissecando um ícaro. A grandes males, remédios enérgicos”, in O Brado Africano, 21 de Julho de 1923, p. 1.

[18] Também um jornalista do Beira News, ao encontro dos interesses sul-africanos, sustentou que Portugal pretendia oprimir os indígenas moçambicanos e portanto justificava-se a emancipação da colónia liderada pelos colonos brancos.

[19] “(...) De há muito que nesta província vem sendo introduzidos uns costumes novos, que tem trazido a vantagem de um separatismo que, dia para dia, nos está convencendo que cedo virá o dia em que raro será o nativo desta província que diga, com orgulho: sou português! De mãos dadas com o preto, a campanha indesejável, é contra o Kafir da Europa, com os apodos vários que fazem corar até o preto mais retinto. (...) No espírito daqueles dos indígenas que despertam está-se arreigando a convicção de que não podem contar com o auxílio da soberania portuguesa para melhorarem as suas condições sociais e de que o único papel, a única obra de colonização portuguesa, é a conservação do estado selvagem das raças que dominam em nome da civilização.(...) Ibidem, p.1.

[20] “A desnacionalização das nossas colónias”, in Acção Realista, 1 de Julho de 1924, nº 3, pp. 46-48.

[21] (Continuação da citação do texto: “(...) Eu só quero aqui frisar um aspecto, o mais grave da questão, e esse é o da desnacionalização das nossas colónias. (...) Pior do que isso. Deram como resultado desenvolver-se o espírito de autonomia e as veleidades de independência de Angola e de Moçambique. (...) Nem quero falar também dos elementos desnacionalizados e desnacionalizadores que lá há, uns doentes alcoolizados de anglomania. (...) Em Moçambique servem-se do pretexto da má administração metropolitana que não lhe dá, principalmente, garantias de defesa contra a União. (...)” Ibidem, pp. 46 e 47.

[22] “A entrevista com o Sr. Freire de Andrade”, in Correio de Moçambique, 27 de Abril de 1922, p. 2.

[23] Estas análises do texto fundamentam-se nas seguintes citações deste artigo: “(...) Convem porém não ocultar que no sul da província há mais de uma pessoa que entende, ou julga, que a província beneficiaria com a sua autonomia. Ora essa opinião não deve deixar-se que alastre até constituir um prurido, sendo bom que saibam todos que essa autonomia nos arrastaria, pela força das circunstânscias e mau grado dos seus partidários, a essa inevitável adesão... Poucos ignoram que há quem por mais de uma vez tenha dito ( um outro desenraizado ) que pegaria em armas de boa vontade, não para fazer revoluções, mas para conquistar essa autonomia e embora se digam coisas destas sem a consciência do que se afirma, é por estas e outras idênticas que nos aparecem por cá uns manganões com pés de lã a perguntar se não seria para nós um bom negócio arrendarmos à União o porto e os caminhos de ferro e oferecendo a necessária massa para a respectiva propaganda. Essa corrente de autonomia não tem o carácter nativista que afecta a revelação idêntica que se manifesta na outra costa. (...) É um reflexo da vida na vizinha nação que se pretende macaquear aqui. Razão de mais para aquela adesão ser uma consequência imediata da autonomia, se algum dia vier a obter-se esta antes de Moçambique chegar a ser uma nação; adesão que reserva muitas surpresas para os partidários da autonomia, visto que a União não consentiria aqui um minuto esses que não se importam de pegar em armas para conquistá-la e mais todos quantos vivem de expedientes parasitários que são indesejáveis nos países onde se trabalha e se não faz política. Parece-nos pois de sã orientação tudo quanto nos aparte dessa autonomia e nesta ordem de ideias não podemos aceitar o que na entrevista se contem com relação ao regime monetário. (...)” Ibidem, p2.

 

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