Crónicas que tratam temas da cultura, da literatura, da política, da sociedade portuguesa e das realidades actuais do mundo em que vivemos. Em outros textos mais curtos farei considerações sobre temas de grande actualidade.
Crónicas que tratam temas da cultura, da literatura, da política, da sociedade portuguesa e das realidades actuais do mundo em que vivemos. Em outros textos mais curtos farei considerações sobre temas de grande actualidade.
A 29 de Abril de 2011, por volta das quinze horas e trinta minutos, caiu em Lisboa Norte uma inusitada tempestade composta por trovoadas violentas, chuva forte e queda de pedaços de granizo, de dimensões inesperadas, que deixaram os lisboetas estupefactos ou aflitos se estavam em situação de mobilidade. Este temporal afectou, sobretudo, as zonas da Amadora, de Benfica, da Pontinha, de Queluz e de Oeiras, onde as corporações de Bombeiros de diversas partes de Lisboa foram chamadas a intervir, com centenas de alertas, devido a inundações e a bloqueios das vias públicas por causa da queda de granizo.
Após o sobressalto, que este temporal provocou nos lisboetas, houve reportagens em catadupa que inundaram os meios de comunicação social com fotografias e filmes, particulares, de uma situação insólita apesar do provérbio popular: “Abril águas mil”. O Estádio da Luz, onde ontem se jogou a primeira mão de uma das meias-finais de futebol da Liga Europa, encontrou-se esta tarde vestido de branco do granizo caído, apesar de ontem ter estado vestido de vermelho para apoiar o Sport Lisboa e Benfica, num jogo memorável, contra o Sporting Clube de Braga.
Com as alterações climáticas, o mundo nos últimos anos tem assistido a fenómenos naturais repentinos que subvertem as tipologias tradicionais de classificação de climas. Com efeito, as circunstâncias atmosféricas, padronizadas em relação a uma determinada região, estão a mudar em função da Globalização dos imprevistos ambientais que tem assolado o planeta e o nosso país. Estas tempestades, súbitas, estão a ser uma constante atmosférica que tem provocado o caos no momento, inúmeros prejuízos e, mesmo, vítimas que levou as Autoridades da Protecção Civil a criar um sistema de alertas da população.
Lembremo-nos do que aconteceu na zona oeste de Portugal (sobretudo em Torres Vedras e na Lourinhã) em 23 de Dezembro de 2009, onde muitas famílias no Natal ficaram sem electricidade. Os cientistas dizem-nos, também, que o aquecimento do planeta tem originado a existência de mais vapor de água na atmosfera que induz a uma crescente instabilidade do clima. Assim, tem-se registado um número crescente de mini-tornados, em Portugal e no mundo, devido a estas alterações climáticas.
A Conferência das Nações Unidas sobre as alterações climáticas realizada em Copenhaga, em Dezembro de 2009, foi muito inconclusiva, facto, aliás, que despertou uma crítica veemente de Luís Inácio Lula da Silva, na altura Presidente do Brasil.
Neste trigésimo sétimo aniversário da Revolução do 25 de Abril de 1974, que todos os cidadãos europeus devem conhecer, verifica-se uma redução substancial das celebrações oficiais deste facto genésico da Democracia Portuguesa devido à suspensão dos trabalhos parlamentares e à austeridade a que o país ficou obrigado.No entanto, o carácter simbólico e cívico deste acontecimento histórico levou alguns cidadãos, nascidos após 1974, a subscreverem um Manifesto, intitulado “O inevitável é inviável”, que apela para a necessidade de reconhecer que as liberdades estão a ser postas em causa com o afunilamento de opções democráticas de escolha. Na verdade, as pressões financeiras e tecnocráticas impostas pela “cúpula” da Globalização estão a constranger as hipóteses de um autêntico pluralismo democrático.
Por esta razão, é importante saber que a Associação 25 de Abril tem um importante sítio da Internet que nos abre uma panóplia documental muito interessante sobre este acontecimento. Convém, no entanto, tomar em linha de conta alguma bibliografia essencial sobre esta revolução, lembrarei um estudo clássico feito pelo Historiador José Medeiros Ferreira, um estudo actual elaborado pela Historiadora Maria Inácia Rezola e um testemunho memorialista de um dos líderes da revolução, Otelo Saraiva de Carvalho. Ficam, aqui, as referências a estas obras incontornáveis para se conhecer e compreender melhor este acontecimento histórico:
José Medeiros Ferreira, Ensaio Histórico sobre a Revolução do 25 de Abril: O período pré-constitucional, Lisboa, Publicações Alfa, 1990.
Maria Inácia Rezola, 25 de Abril – Mitos de uma Revolução, Lisboa, Esfera dos Livros, 2011.
Otelo Saraiva de Carvalho, O Dia Inicial – 25 de Abril – Hora a Hora, Lisboa, Editora Objectiva, 2011.
Por outro lado, também é verdade como diz o provérbio de sabedoria popular “em casa onde não há pão, toda a gente ralha e ninguém tem razão” e, nessa medida, percebo o apelo do Sociólogo António Barreto que subscreveu um Manifesto, com várias dezenas de outras insignes personalidades da vida pública do país, para realçar a necessidade de um mínimo de convergência nacional, nesta fase crítica da vida colectiva, para que Portugal consiga resolver a questão financeira, manter o equilíbrio social e gerar oportunidades de investimento. Afigura-se-nos que estes grandiosos desafios que o país enfrenta (necessidade de regularizar as suas contas e de tornar a Democracia mais plural) constituem uma espécie de quadratura do círculo que dificilmente é resolúvel com recurso unicamente “à régua e ao compasso”. Só, porventura, a criatividade do pensamento divergente, no longo prazo, poderá solucionar este estrangulamento da vida dos cidadãos, nacionais e mundiais, mudando as mentalidades, a nível interno, e o sistema internacional do capitalismo desregulado.
Entretanto, convém ponderar com tranquilidade e sensatez na crise financeira e económica que se está a instalar no país e relembrar com orgulho o Património simbólico da Revolução do 25 de Abril de 1974.
Italo Calvino sempre foi um dos meus escritores predilectos pelo seu potencial criativo. Há muito em comum entre José Gomes Ferreira e Italo Calvino: uma escrita criativa e um clima surrealista que os tolhe, o papel “antifascista” dos dois contra, respectivamente, Benito Mussolini e António de Oliveira Salazar, um mesmo ideário comunista, a que Italo Calvino renuncia em 1957, e um ano comum de cerramento das pálpebras (1985).
Quando comecei a ler “As Aventuras de João Sem Medo” de José Gomes Ferreira, escritas em 1933 e terminadas em 1963, logo me apercebi do paralelismo estético existente entre estes dois magistrais escritores latinos. Ambas as obras literárias, de prosa, são um hino à imaginação, tal como a nona Sinfonia de Ludwig van Beethoven é um hino à alegria e à generosidade da Humanidade. Neste ambiente de crise Ética e Económica, em que vivemos, as visões generosas destes dois escritores são exultantes. Sem esquecer, todavia, o legado intervencionista que os seus exemplos de vida nos legaram.
É, certo, que existem diferenças nas suas carreiras, pois o escritor português seguiu mais a veia poética e o escritor italiano mais a via ensaística, embora ambas paralelas às narrativas de contos e de romances. Quero-vos apresentar dois magníficos documentários feitos sobre as obras destes dois escritores.
Italo Calvino escreveu uma trilogia literária fantástica intitulada respectivamente “O Barão Trepador”(1957), “O visconde cortado ao meio”(1952) e “O Cavaleiro Inexistente”(1959). A imaginação e o sentido alegórico que subjaz às suas obras e, em particular, no livro do visconde que está preso por duas consciências antagónicas dão-nos um universo que entra no carácter simbólico do onírico. Esta é, com efeito, a ponte que liga as duas margens do universo temático surrealista da literatura portuguesa e italiana. Igualmente, o esteio criativo deste género de literatura é a defesa da escrita intuitiva que torne emergente o inconsciente dos escritores numa proposta estética que se alavanca no ideário da Psicanálise.
Contudo, afigura-se-me que José Gomes Ferreira quis refundar um universo mitológico que partindo das histórias populares, para crianças, as superasse pelo tom poético imprimido às coisas banais, enquanto Italo Calvino pretendendo respeitar o património imaterial dos contos de fadas quis criar histórias imaginativas com forte sentido alegórico. Neste sentido, a escrita de José Gomes Ferreira emerge de forma mais clara como uma sátira política, às ditaduras (militar, salazarista ou caetanista), ou social, à mentalidade pessimista dos portugueses.
Em suma, nos arremedos narrativos surrealistas destes dois escritores espreita a alegria das cores fantasistas e das mensagens simbólicas que devem unir os criadores literários aos seus leitores. Vale, pois, bem a pena uma incursão por este património imaterial da Cultura Latina.
“Que a música moderna tende a desumanizar-se, isto é, a libertar-se,
a purificar-se do delirante subjectivismo romântico, é um facto”
in Fernando Lopes-Graça, “Apresentação de Stravinsky”,
in Música e Músicos Modernos – Aspectos, obras, personalidades,
Lisboa, Editorial Caminho, 1986, p. 204.
O festival de música erudita que o Centro Cultural de Belém, em Lisboa, tem acolhido, nos últimos anos, intitulado, inicialmente, “Festa da Música” e agora “Dias da Música” subordinou-se, este ano durante os dias 15, 16 e 17 de Abril, ao tema “Da Europa ao Novo Mundo 1883-1945”. Foi um caminho heterodoxo iniciado pelos seus programadores que quiseram abrir novos horizontes estéticos, geográficos e estilísticos aos sons escutados pelo público que se deslocou a Belém: foi um verdadeiro êxito que levou os espectadores ao rubro em alguns concertos. Houve, ainda, a feliz oportunidade para a divulgação dos jovens talentos musicais na programação “Escolas em palco”.
As rupturas estéticas, iniciadas nesta conjuntura histórica, procuraram novas formas de expressão que extravasassem as linhas melódicas e empáticas, tão próprias do movimento Romântico. Assim, nos finais do século XIX, a par das formas clássicas, apareceram outras estruturas expressivas que, por um lado, deram mais liberdade aos artistas e, por outro, tornaram a música mais abstracta e mais difícil de ouvir por parte do público leigo.
É, neste sentido, que o grande compositor português Fernando Lopes-Graça afirmava, em 1931, que a música se tinha desumanizado no início do século XX, porque esta seria nas suas palavras “pura matéria sonora”[1] que não teria de transportar, como acontecia no Romantismo, nenhum estado de espírito. Esta tese constituiu, certamente, uma crítica ao sistema atonalista (de Schoenberg, de Berg, de Webern, etc.) que pecava pela ruptura com as sequências harmoniosas que caracterizavam a música baseada nas tonalidades clássicas.
A ânsia da inovação estética e da criatividade artística desencadeou o fenómeno das multiplicidades estilísticas (impressionismo, neoclassicismo, atonalismo, blues, jazz, ecletismo, etc.), tal como se verificou, também, na pintura, que marcam a música desta época. Estas rupturas estéticas fizeram-se à custa de algumas polémicas que causaram indignação em muitos artistas, críticos e públicos que estranharam os novos caminhos trilhados pelos compositores inovadores.
Os Estados Unidos da América emergindo, a seguir à 1ª Guerra Mundial, como a nova potência internacional acabaram por se tornar o novo território criador de onde brotaram novos géneros musicais inspirados no cosmopolitismo social afro-americano como o “Blues” ou o “Jazz”.
Maurice Ravel (1875-1937), Igor Stravinsky (1882-1971) e George Gershwin (1898-1937) foram três grandes criadores musicais deste período que ampliaram a paleta de sonoridades do mundo ocidental. Destes autores geniais que estiveram em destaque, em vários concertos nos Dias da Música, deixo aqui alguns excertos de obras emblemáticas.
Nuno Sotto Mayor Ferrão
[1] “(…) para a nova corrente estética, para a música desumanizada, a música não é senão pura matéria sonora (…)” in Fernando Lopes-Graça, “Apresentação de Stravinsky”, in Música e Músicos Modernos – Aspectos, obras, personalidades, Lisboa, Editorial Caminho, 1986, p. 203.
A crise financeira portuguesa da dívida soberana está nas bocas do mundo, ao ponto de ter atingido o debate eleitoral finlandês. Estas notas de reflexão, não descurando a gravidade da falta de liquidez do Estado e da sociedade portuguesa, pretendem elencar as suas principais causas internas e externas situando-as na presente conjuntura geoestratégica mundial. A União Europeia tem imposto aos países comunitários critérios mais rigorosos de endividamento dos Estados para diminuir os défices orçamentais através dos Planos de Estabilidade e Crescimento (PECs).
Convém perceber, sem escamotear a realidade, as causas estruturais que potenciaram a crise financeira da dívida soberana portuguesa. A Contemporaneidade está infestada do imediatismo mediático que faz perder aos cidadãos a necessidade de uma consciência que extravase os tempos curtos do presente. Daí que seja importante uma leitura que se alavanque na Memória Colectiva para tentar compreender as raízes profundas desta situação de crise nacional e internacional.
Desde os anos 90 do século XX, tal como em décadas anteriores em outros países desenvolvidos, as classes médias habituaram-se a consumir, de forma fácil, com recurso ao crédito bancário que arrastou muitos cidadãos a endividarem-se por várias décadas para adquirirem bens essenciais ou supérfluos. Ao mesmo tempo, o Estado tem-se tornado crescentemente mais complexo, com mais responsabilidades sociais que o fez adoptar o critério de privatizações de propriedades e de empresas públicas para se conseguir financiar para além das receitas fiscais.
O problema inerente a esta nefasta tendência tem sido a diminuição da Poupança Pública e das famílias num tempo de crescentes gastos. Por esta razão, tem todo o sentido a filosofia de austeridade que deve presidir às Políticas Públicas, aliás o execrável Ditador das Finanças, no final dos anos 20 e início dos anos 30, adoptou com sucesso este critério que lhe permitiu ascender politicamente. Longe de fazer qualquer panegírico a António Oliveira Salazar, devemos, no entanto, reconhecer-lhe este mérito de ter sabido pôr em ordem as finanças públicas. Os indivíduos, das classes médias, seduzidos pelos apelos do mercado acabaram por perder o hábito de amealhar poupanças, porque os produtos importados que inundaram o país e rechearam o Centros Comerciais e os Mega Centros Comerciais criaram necessidades de consumo irracionais.
Na actualidade o modelo materialista, de base monetário, inspirado na excessivamente pragmática Civilização Romana tem feito depreciar o valor dos Bens Imateriais e das Ciências Humanas em favor dos Bens Materiais e da pretensa cientificidade, quase positivista, dada à Econometria. Aliás, o fervor materialista/imperialista dos Romanos conduziu-os à decadência Ética, que é um traço de grande semelhança com as sociedades Globalizadas do nosso tempo
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O actual endividamento do Estado Português decorre do sistema financeiro internacional sem peias, em que a especulação e as fraudes bancárias por via do Capitalismo pouco regulado devido aos paraísos fiscais é uma constante (veja-se, a este propósito, a interessante caricatura publicada por Joana Amaral Dias no Cortex Frontal), que tem potenciado as crescentes desigualdades entre Estados, sociedades e grupos económicos e sociais.
Sem dúvida que a fraca competitividade da economia portuguesa ( veja-se o interessante artigo de Ricardo Pais Mamede, "Preocupados com o crescimento português ?" em Ladrões de Bicicletas ) que não se tem conseguido adaptar aos critérios da desbragada agressividade social da Globalização imposta pelos grandes potentados económicos foi um factor que potenciou o endividamento do Estado e da sociedade portuguesa.
Como causas mais imediatas da crise da dívida soberana portuguesa está a crise financeira de 2008 que se iniciou nos EUA e que contagiou os seus principais parceiros comerciais, designadamente a Europa. Esta crise financeira fez perceber aos países ocidentais que estavam a viver acima das suas possibilidades, porque muito do dinheiro emprestado resultava de complexos esquemas contabilísticos que não tinham uma sustentação real. Como dizia com acerto Ernâni Lopes as finanças ficaram desfasadas da economia real.
Em 2010 estalou a crise financeira Grega devido aos endividamentos excessivos do Estado e da sociedade deste país, devido ao critério mais rigoroso de controlo dos défices públicos na União Europeia resultantes da meta dos 3% de endividamento estabelecido na Filosofia dos Programas Europeus de Estabilidade e Crescimento e à depreciação do Euro devido à forte competitividade das novas potências internacionais emergentes.
As crises históricas nacionais das finanças públicas têm-se repetido desde o fim do século XIX e início do século XX ( É interessante consultar a visão ampla, histórica e internacional, de Francisco Seixas da Costa que se destaca no artigo "Embaixador diminuído ?" no blogue duas ou três coisas). No último quartel do século XIX, Portugal pediu empréstimos para se equipar em termos de construção de infra-estruturas viárias e ferroviárias que garantissem ao país a constituição de um espaço económico nacional. Efectivamente, de 1891 a 1902 instalou-se uma grave crise financeira no país devido à dificuldade de pagar aos credores externos, numa situação em que Portugal se encontrava em plena bancarrota.
Em meados dos anos 20 a crise financeira Angolana devido aos gastos excessivos na construção de infra-estruturas de comunicação e transporte nas grandes colónias africanas portuguesas colocaram o país à beira do colapso financeiro nos anos finais da 1ª República (1924-1926). Não nos esqueçamos que anteriormente o envolvimento de Portugal (1916-1918) na 1ª Guerra Mundial tinha deixado as finanças públicas na penúria.
Em 1977 e em 1983 Portugal pediu auxílio ao Fundo Monetário Internacional devido, nesse primeiro momento, às ondas alterosas do choque petrolífero e à instabilidade política pós-revolucionária e, nesse segundo momento, devido à inflação galopante que levou à necessidade da formação de um Bloco Central (PS-PSD) liderado por um político Humanista.
A conjuntura geoestratégica mundial actual caracteriza-se por um endeusamento do mercado (a que vários autores chamam com propriedade teologia de mercado – Adriano Moreira) que conduziu à construção de um capitalismo financeiro desregulado por acção dos grandes interesses das Empresas Multinacionais que empurraram os governos bajuladores a adoptarem políticas neoliberais desde os meados dos anos 80 inspirados nos modelos políticos de Ronald Reagan e de MargaretThatcher.
Na actual conjuntura internacional, a Revolução tecnológica tem permitido uma vantajosa Globalização da informação, mas também desencadeou concomitantemente a produção de bens tecnológicos evanescentes que incitaram a um consumismo desregrado que está na origem do endividamento das famílias, tal como nos salienta com muita acuidade o Mestre Vitorino Magalhães Godinho.
Como já há vários anos nos vem lembrando, o Dr. Mário Soares, os Estados encontram-se dependentes das pressões das Grandes Multinacionais e, por isso, o poder político está enfraquecido de poder agir de acordo com ideais de justiça social, uma vez que o pragmatismo da “real politik” se tornou dominante. A verdade é que, sem esta independência do poder político, as causas justas mobilizadoras dos cidadãos não se agregam em torno dos partidos políticos e os cidadãos sentem-se cada vez menos identificados com os políticos por toda a Europa, daí as grandes manifestações de descontentamento popular (vale a pena ler e ouvir o post de Ana Paula Fitas "Da "Menina estás à janela" ao FMI - A Resistência da Esperança" e ainda o pertinente texto "Contra a Especulação, Assinar a Petição" no blogue A Nossa Candeia).
As novas potências emergentes (China, Índia, Brasil, etc.) têm alargado o grupo dos países mais ricos do mundo (G7, que passou a G8, que passou a G20) e a Europa tem perdido peso económico nesta transformação geopolítica. O projecto Europeu e a constituição da União Europeia, com uma moeda única, foram tentativas de resposta a estas ameaças externas, no entanto o drama demográfico dos países europeus e as condições, muitas vezes inumanas, de trabalho nas novas potências emergentes, em particular na China e na Índia, impedem uma competitividade salutar, porque se colocam em causa Direitos Humanos Fundamentais e conquistas Civilizacionais que dignificam o Homem como Pessoa. Sem este entendimento do Homem como Pessoa, e não como número de um quadro estatístico ou econométrico, a Humanidade entrará numa regressão sem precedentes na História Universal.
Em suma, a Europa tem que saber partilhar com o mundo o seu paradigma Humanista, que extravasa os limites das democracias tecnocráticas, para que se possa crer na bondade dos valores do Espírito Humanista e dos Direitos Humanos no sentido de se rumar a um mundo melhor que se preocupe com os níveis de qualidade de vida dos seus cidadãos. Daí que a mentalidade Humanista precise de ser valorizada e adoptada como critério de gestão na escolha de líderes políticos e empresariais na Europa para que se garanta a possibilidade de se concretizar uma autêntica justiça social.
Johann Sebastian Bach nasceu no meio de uma família recheada de “pergaminhos” musicais, na Alemanha no fim do século XVII, tendo-se revelado como um plurifacetado intérprete de vários instrumentos (órgão, cravo, violino, etc.) e como maestro, professor e compositor. Aprendeu muito com os seus familiares, com o seu espírito autodidacta e como construtor e reparador de órgãos. Na sua longa carreira assumiu-se como um reconhecido cantor da Igreja de São Tomás e como Director Musical da cidade de Leipzig.
J. S. Bach foi um cultor de vários géneros musicais destinados a espaços profanos (Cortes) e sagrados (Igrejas). A sua profunda Espiritualidade sobressaiu na execução, ou na criação, de sublimes peças religiosas que deverão ter dado especial vitalidade às comunidades eclesiais em que se inseriu. Nos excertos musicais que vos apresento, a seguir, poderão aferir este cariz que marcou as suas obras mais emblemáticas.
O seu talento de intérprete, a tocar órgão ou cravo, foi reconhecido na sua época por toda a Europa, no entanto como compositor só a posteridade o reconheceu na sua genialidade Espiritual, em particular os compositores da primeira metade do século XIX. Aliás, o seu imenso poder criativo levou o estilo musical Barroco ao seu máximo expoente. Em suma, legou-nos um inestimável Património Imaterial que é bem sugestivo, neste contexto Pascal, pois deixou-nos obras hoje muito famosas, junto dos melómanos, como sejam: os Concertos de Brandeburgo, a Tocata e Fuga em Ré Menor, várias Cantatas, as “Goldberg Variations” e a Paixão segundo São Mateus.
Verificamos com base na nossa investigação histórica[1] que o debate em torno da estruturação da administração colonial, nos anos de 1920 e 1930, não se cingiu à escolha dualitária entre centralizar ou descentralizar, porque abrangeu também os diferentes graus de operacionalização de cada uma destas tendências e os efectivos mecanismos de os concretizar.
Poder-se-à afirmar que a Historiografia actual tem andado equivocada ao considerar que este debate se limitou à escolha dicotómica entre as duas tendências, visto que na realidade a discussão política se centrou na amplitude a conferir à descentralização ou à centralização. Na verdade, a prova que o debate político não se restringia a esta dualidade é o facto dos tratadistas de Direito Colonial classificarem, na altura, os sistemas coloniais de acordo com a seguinte trilogia: sujeição, assimilação ou autonomia[2].
Por exemplo, o professor da Escola Superior Colonial José Gonçalo Santa-Rita, prestigiado teorizador da administração colonial[3], categorizou os sistemas administrativos da seguinte forma: de sujeição, eminentemente centralizador da estrutura administrativa; de assimilação, eminentemente uniformizador da estrutura administrativa de todo o território nacional ( metrópole e colónias ); e de autonomia, eminentemente descentralizador da máquina administrativa quase a meio caminho da completa emancipação política. Apreciava o sistema assimilador como mais equilibrado, porque não sendo autoritário concedia algumas liberdades às colónias, sem no entanto lhes facilitar uma futura desvinculação da soberania metropolitana.
Este teórico concordava em 1931 com a oportunidade do Acto Colonial, pelo seu carácter nacionalista, embora não o identificasse como consignando um sistema de sujeição para não lhe atribuir explicitamente um cariz centralizador. Afirmava, inclusivamente, que este diploma consagrava o regime de descentralização administrativo, não obstante reconhecesse, contraditoriamente, que concedia mais poderes à metrópole. Esta clara manipulação ideológica da opinião pública sucedeu, porque depois de intensa campanha de múltiplos e distintos publicistas nas primeiras três décadas do século XX a favor da descentralização administrativa colonial ( António Enes, Eduardo Costa, Júlio de Vilhena, José Ferreira Marnoco e Sousa, Rui Ulrich, Tomás de Almeida Garrett, etc ) era difícil sustentar uma posição doutrinária inequívoca propícia à centralização do sistema colonial.
Por conseguinte, o debate dos doutrinadores políticos girou quase sempre em torno do grau de concretização de uma orientação ou de outra ( centralização versus descentralização ). Deste modo, a amplitude assumida pelo debate da questão, em relação à forma como estruturar a administração colonial, está longe da visão simplificada da maioria dos Historiadores.
Contudo, esta polémica dividiu a sociedade portuguesa, embora tivessse havido uma defesa mais generalizada do princípio descentralizador, ao passo os defensores da tese centralizadora procuravam encobrir a sua posição asseverando que também lutavam por uma descentralização, porquanto o contexto histórico da doutrina internacional do Tratado de Versalhes de 1919 e dos antecedentes doutrinários portugueses do fim do século XIX e princípio do século XX eram claramente a favor da descentralização administrativa. Com efeito, historicamente podemos afirmar que desde 1895 com o Comissário Régio de Moçambique António Enes e depois com a realização do I Congresso Colonial Nacional[3] na Sociedade de Geografia de Lisboa em 1901 se tornou dominante na opinião pública a importância do princípio descentralizador da administração colonial.
Nuno Sotto Mayor Ferrão
[1] Investigação histórica orientada pelas diligências incansáveis do Professor Doutor José Medeiros Ferreira.
[2] Cf. Júlio Monteiro Roque da Silveira, Lições da cadeira de Administração Colonial, Famalicão, Tipografia Minerva, 1931, p. 194.
[3]Congresso Colonial Nacional. Actas das sessões, Lisboa, Edição da Sociedade de Geografia de Lisboa, 1902.