Crónicas que tratam temas da cultura, da literatura, da política, da sociedade portuguesa e das realidades actuais do mundo em que vivemos. Em outros textos mais curtos farei considerações sobre temas de grande actualidade.
Crónicas que tratam temas da cultura, da literatura, da política, da sociedade portuguesa e das realidades actuais do mundo em que vivemos. Em outros textos mais curtos farei considerações sobre temas de grande actualidade.
A 28 de Maio de 1926, faz amanhã oitenta e cinco anos, surgiu o golpe de Estado, que Salazar cunhou de revolução nacional, potenciador da sua ascensão política. A conjuntura de crise social, política e económica da 1ª República tornou possível o emergir das opressivas ditaduras, militar e salazarista.
Como cidadão afirmo que, se não nos acautelamos dada a similitude circunstancial que a pátria portuguesa hoje vive, corremos o risco de nos deixarmos cair num caminho de estreitamento das liberdades se optarmos por um modelo de desenvolvimento centrado na produtividade económica e na capacidade da sociedade civil como nos propõe o PSD de Pedro Passos Coelho. Se o mundo já vive sob uma didatura financeira, como nos diz o lúcido Stéphane Hessel no seu Manifesto[1], corremos o risco de a legitimar completamente se alinhamos no radicalismo ideológico do PSD com o qual o Professor Marcelo Rebelo de Sousa, numa sensibilidade mais social-democrata, não se identifica plenamente por não ser um liberal.
Num registo historiográfico, saliento que António de Oliveira Salazar advogou de acordo com a doutrina inscrita no Acto Colonial que a política ultramarina devia ser orientada por uma matriz nacionalista. No seu pressuposto essencial a unidade política do Estado Português tinha absoluta correspondência com os limites fronteiriços da nação, os quais se estenderiam do Minho a Timor. A sua perspectiva ideológica encarava a acção colonizadora como a autêntica vocação do país. Não obstante, a clarificação e a propaganda intensa, moldada por outros matizes ideológicos, desta ideia só surge com a revisão Constitucional de 1951 que integra o Acto Colonial neste texto jurídico e altera o conjunto lexical usado pelo regime.
Salazar reputava como fundamental para reforçar esta estratégia política de unificação, advinda da realidade espiritual herdada de séculos anteriores, consolidar como meios de acção o incentivo ao intercâmbio económico entre a metrópole e as colónias e a promoção da cristianização dos povos autóctones coloniais[2]. Sustentou, também na fundação do Estado Novo, como ideia-chave a noção de que as diversas parcelas coloniais formariam uma unidade imperial, dando azo ao aparecimento do termo de “império colonial português” e impulsionando a formação de um espaço económico português de dimensão internacional, no sentido de estimular as transacções comerciais dentro do espaço imperial[3].
[2] António de Oliveira Salazar, “A Nação na política colonial”, in Ibidem, vol.I, Antologia Colonial Portuguesa, Lisboa, Agência Geral das Colónias, 1946, pp. 326-334.
[3] Ruy de Sá-Carneiro, A política colonial do Estado Novo, Lisboa, Agência Geral das Colónias, 1949, 26 p.
Este debate político entre o líder do PSD e o líder do PS, mantido na televisão na noite de 20 de Maio de 2011, esteve bastante aceso com trocas de argumentos ideológicos entre o “passivo” do Governo e as ideias do principal líder da oposição. Mostrou ser um debate bastante renhido em que será difícil definir um vencedor, a não ser de forma pouco neutral. Ambos lançaram ataques mútuos que deixaram pairar o mal-estar, a tensão emocional, no adversário. Ficam aqui os principais argumentos ideológicos que foram esgrimidos neste mediático debate político rumo às Eleições Legislativas de 2011. Cabe a todos os cidadãos analisarem as ideias políticas, a capacidade de liderança dos diversos partidos, a actuação do Governo para, em função das suas convicções ideológicas, escolherem entre a diversa panóplia partidária os protagonistas das ideias que querem ver concretizadas politicamente. É um dever de consciência a nossa participação cívica como cidadãos para uma necessária revitalização das democracias do século XXI.
Pedro Passos Coelho
José Sócrates
A actual cifra de 700 mil desempregados apesar do presente Estado Social.
Discurso mistificador/fantasista de José Sócrates da realidade que mostra a vacuidade do programa do PS.
O Governo de José Sócrates deixou o país numa situação de pré-bancarrota.
Afirma que o Engenheiro José Sócrates não quer discutir a sua acção Governativa e que prefere escudar-se da influência da crise financeira internacional.
Sublinha que a crise financeira é mais grave em Portugal do que na maioria dos outros países Europeus.
Frisa que o PEC – IV significou o falhanço dos outros PEC’s por perda de confiança dos mercados na Governação Portuguesa.
Denunciou o facto de José Sócrates ter afirmado que não governaria com o FMI.
Afirma que o PSD propõe uma flexibilização do trabalho temporário e não uma liberalização laboral.
Propõe a redução da Taxa Social Única como mecanismo para lubrificar a indispensável competitividade da economia portuguesa.
Põe a tónica que o Governo Socialista não está a cumprir o acordo do défice público.
Nega que ele, próprio, seja imaturo e que coloca um rótulo prejudicial ao país, mas antes que tem uma visão realista.
Declara querer transparência das contas públicas.
Frisou que o Governo do PS foi incompetente.
Disse que o país precisa de um Governo competente e que o país que esteve socialmente aflito sabe que o Governo Socialista foi responsável pela pré-bancarrota e que, por isso, é necessário mudar de liderança, mas que para tal é urgente fazer crescer a economia.
Critica da derrapagem na execução Orçamento de Estado pela insuficiente redução da despesa pública.
Afirma que o seu Governo mudou de estratégia política para fazer face à crise financeira internacional.
Apresentou a tese dos co-pagamentos do Sistema Nacional de Saúde como propostas anticonstitucionais do PSD de que apresentou provas.
Sublinha que o PSD de Pedro Passos Coelho conduziu o país à ajuda externa, num acto de irresponsabilidade, que impulsionou os juros da República Portuguesa a subirem abruptamente nos “ratings” das agências respectivas.
Define como estratégia face à actual crise o combate ao desemprego.
Argumenta que como Primeiro-Ministro tentou evitar a ajuda externa, mas que a ânsia eleitoral da oposição e do PSD fez com que se deitasse fora a solução (o PEC – IV).
Denuncia que o PSD propõe no seu Programa Eleitoral uma liberalização do trabalho precário.
Denuncia que o Programa do PSD quer acabar com o despedimento por justa causa.
Prometeu estudar e reduzir moderadamente a Taxa Social Única.
Vinca que a notícia vinda a público, no dia de ontem, da redução do défice era positiva, mas que o líder do PSD aposta na maledicência e no pessimismo prejudiciais para a mentalidade dos portugueses.
Frisou que a nova metodologia contabilística europeia alterou a percentagem do défice e que o fenómeno da nacionalização dos bancos privados alterou o panorama financeiro nacional devido à crise internacional mais grave dos últimos 80 anos.
Lamentou as cartas públicas do PSD terem levantado suspeitas no momento das negociações do Governo com a “troika”.
Enfatizou ter criado um clima de diálogo para o entendimento no momento da crise política.
Afirma-se como um resistente e ter tomado medidas difíceis, numa liderança forte, dando uma marca distintiva à Governação do PS e que o país não precisa de aventuras políticas e de um Programa de radicalismo ideológico que coloque em causa o Estado Social.
A tese pan-africanista defendida em Moçambique pretendia a integração deste território na União Sul-Africana, o que constituía uma ambição do general Jan C. Smuts desde a Conferência de Paz de 1919. Inicialmente o projecto imperialista de Smuts, inspirado no sonho megalómano de Cecil Rhodes[1], consistia em incorporar esta colónia no Estado Sul-Africano, mas esta ideia transformou-se nos anos 40 no projecto de uma União Pan-Africana que ligasse economicamente os Estado livres do Sul do continente. Em Moçambique, perfilharam esta tese os estrangeiros de origem britânica que aí residiam e os colonos burgueses com negócios na União Sul-Africana.
Houve também muitas pressões oriundas do Estado vizinho, de propaganda e de apoio financeiro, para que esta tese alastrasse socialmente na colónia. E, na verdade, alguns Estadistas portugueses sentiram medo desta ameaça que se infiltrava no próprio tecido social Moçambicano, ao ponto do ministro das colónias de Salazar, José Vieira Machado, temer no contexto do início da 2ª guerra mundial, em 1939, que a União sob pretexto da defesa do Sul de Moçambique fosse em seu socorro e se apoderasse das suas funções de soberania.
Em 1925 a veemente crítica do sociólogo Edward Ross às insuficiências da administração colonial portuguesa, bem como o aparente fracasso administrativo de Brito Camacho foram factores contextuais propícios à difusão da tese da integração de Moçambique na União. Protestando contra a emergência deste movimento, num periódico defensor do patriotismo luso, no seu editorial contesta-se a posição de alguns colonos considerada subversiva ao pretenderem a integração de Moçambique na União Sul-Africana[2]. Afirma também que estavam envolvidos neste movimento jornalistas e altos-funcionários públicos locais que possuíam interesses nos países vizinhos e que, possivelmente, eram por estes estimulados financeiramente para fazerem a propaganda da causa do pan-africanismo.
Por outras palavras, nota-se o tom heterodoxo desta corrente doutrinária no facto do editorial censurar esta posição pan-africanista como um atentado moral ao dever patriótico e aos direitos de soberania do Estado português sobre Moçambique. Assegura que o objectivo da propaganda deste grupo visava descredibilizar o Estado português e dividir a sociedade moçambicana em posições antagónicas. Nas seguintes citações corroboram-se as análises que acabámos de fazer:
“(...) Conjuremos o perigo! Atente o Governo: Em Moçambique conspira-se contra a soberania portuguesa, servindo-se os traidores de todos pretextos ainda os mais fúteis. (...) Há tempos o Sunday Times, aludiu a entendimentos macabros entre indivíduos de duas nacionalidades, uma delas a portuguesa, para a entrada de Moçambique no domínio político da União. Aproximamos portanto os factos e tiremos as conclusões precisas. Há ouro estrangeiro em Moçambique a fomentar a discórdia nos espíritos, e a difamar os nossos processos de administração ? (...)”[3] .
No decurso da segunda guerra mundial, em 13 de Agosto de 1941, surge a notícia na imprensa espanhola[4], desmentida categoricamente pelo embaixador português em Espanha, de que sete membros do Governo de Moçambique teriam proposto ao ministro sul-africano, marechal Smuts, a constituição de um governo livre em Moçambique[5] que poderia aderir ao projecto de uma União económica Pan-Africana dos Estados independentes do sul do continente. É compreensível que o teor desta notícia tenha despertado a hostil reacção diplomática portuguesa e tenha sido alvo da atenção dos serviços de Censura do Estado Novo, no sentido de que não pudesse ser posta em causa a doutrina da indissolubilidade patriótica entre a metrópole portuguesa e as suas colónias. Na realidade, esta informação prova que germinavam teses emancipalistas em Moçambique, neste caso de pendor pan-africano, que eram, inclusivamente, partilhadas por indivíduos com elevadas responsabilidades políticas e sociais[6].
Nos anos 30 em plena vigência do regime Salazarista aparecem informações oficiais enviadas ao Presidente do Conselho de Ministros, António de Oliveira Salazar, de que alguns maçons do norte de Moçambique defendiam a incorporação desta região num dos ricos Estados vizinhos. Não sendo esta uma manifestação da clássica tese pan-africanista era uma posição que se baseava em pressupostos semelhantes. De facto, pairou nesta altura o perigo da Alemanha ou da Grã-Bretanha anexarem o norte de Moçambique com o apoio de alguns habitantes locais.
Num interessante relatório escrito por algum habitante de Moçambique e enviado às autoridades portuguesas, que chegaria a Salazar, intitulado Relatório – Aviso aos bons portugueses[7] dá-se conta do risco de Portugal perder o norte de Moçambique em função das conspirações que se teciam. O autor alertou o Estado Português para a circunstância da perversa influência da Maçonaria na região e para o facto da frágil implantação das instituições Salazaristas poderem colocar em perigo a soberania portuguesa na colónia, dado que a seu ver os maçons eram aliados das cobiças estrangeiras[8].
Com efeito, corroboramos que em Moçambique neste período houve muitos sectores sociais “desnacionalizados” defensores da junção do teritório a um dos Estados vizinhos, por esta razão se compreende que o ministro das colónias João Belo, ainda no tempo da Ditadura Militar, tenha proclamado que a sua política de 1926 a 1928 visou nacionalizar Moçambique.
Nuno Sotto Mayor Ferrão
[1] “A África durante o imperialismo industrial europeu”, in História Universal, vol. II, Adpatação e Revisão Prof. Jorge Borges de Macedo, Selecções do Reader’s Digest, 1995, pp. 337-338.
[2] “Conjuremos o perigo”, in Portugal, 23 de Dezembro de 1925, nº 33, p. 1.
[3] ( Continuação da citação do texto :) “(...) Mas quem é que ignora isso, se a sucessão de factos, e a qualidade dos elementos neles envolvidos não são de molde a alimentar dúvida ? Dissemos no último número que nesta colónia se fazia descaradamente a propaganda do domínio estrangeiro. Citávamos até, para o caso, a presença no movimento de dois altos funcionários do Estado. (...)” Ibidem, p. 1.
[4] Encontrámos esta informação num documento subscrito pelo Director dos Serviços de Censura, Álvaro Salvação Barreto, que eventualmente terá considerado esta notícia potencialmente perigosa se viesse a circular na metrópole.
[5] Arquivo Oliveira Salazar, Correspondência Oficial, Ultramar, nº 9, Pasta 20, f. 588 ( Arquivo Nacional Torre do Tombo ).
[6] Do seguinte excerto deste documento se podem comprovar estas análises: “(...) O embaixador português foi hoje ao Ministério dos Negócios Estrangeiros desmentir energicamente a notícia publicada na imprensa espanhola, segundo a qual sete membros do Governo de Moçambique tinham oferecido ao general Smuts consituir um ‘Governo livre’ na colónia, logo que Smuts assim o desejasse. O embaixador declarou que esta notícia era absolutamente fantástica e salientou que, nunca como agora, foram tão apertados os laços entre Portugal e as suas colónias. (...)” Ibidem, f. 588.
[7] Arquivo Oliveira Salazar, Correspondência Oficial, Ultramar, nº 62, Pasta 34, ff. 765-766 ( Arquivo Nacional da Torre do Tombo ).
[8] As passagens desse relatório confirmam-nos as inferências feitas no texto: “(...) Há um grande perigo de perdermos a parte norte da nossa colónia de Moçambique. (...) I) A Revolução abençoada de 28 de Maio ainda não chegou a África. (...) Os funcionários continuam a pertencer à Maçonaria como dantes e até assinam os pontinhos da praxe. (...) A espionagem estrangeira tem como braço direito a Maçonaria. Como há duas lojas, uma delas dissidente, uma auxilia a Alemanha, a outra a Inglaterra. (...) O que tem valido a Portugal tem sido serem muitos querer a mesma coisa. Porem desta vez estão todos de acordo. A Inglaterra visa as regiões fronteiriças do Niassaland e a Zambézia ( agricultura e as regiões mineiras ). A Alemanha visa as regiões do algodão e do sizal por causa das célebres matérias-primas. Se não dão provedidências urgentes e se isto não leva uma limpeza radical, ficaremos sem a parte norte da colónia de moçambique, província de Niassa (...) Peço maior segredo e que isto só seja lido e comunicado a quem seja português e possa agir por Portugal. Isto é quase um grito de S.O.S. Os portugueses e católicos verdadeiros, que estão de alma e coração com o Estado Novo e a obra abençoada de Salazar, e que se arriscam a tudo, fazendo espionagem por sua conta própria, inimigos irreconciliáveis da Maçonaria e Portugueses acima de tudo, ver-se-ão seriamente ameaçados, perdidos mesmo, se não são tomadas medidas enérgicas contra este estado de coisas. (...)” Ibidem, ff. 765-766.
A Primeira República em Portugal (1910-1926) foi marcada por um contexto marcadamente anticlerical que teve como máximo expoente a Lei de Separação do Estado da Igreja, de 1911, da autoria do Ministro da Justiça, Afonso Costa. Este ambiente persecutório, que adivinha já das ideias do movimento Republicano no tempo da Monarquia, constrangeu a capacidade de acção da Igreja Católica no país.
Numa época em que o país e o mundo estavam a passar por um turbilhão de crises, na segunda década do século XX, as aparições de Nossa Senhora de Fátima aos 3 pastorinhos (Lúcia, Francisco e Jacinta) em 13 de Maio de 1917, e com repetição nos cinco meses seguintes, culminando a 13 de Outubro do mesmo ano com um público de milhares de pessoas manifestou um fenómeno de estranha luminosidade no Sol na Cova da Iria, em Fátima, que surgiram a muitas pessoas como sinais de esperança num mundo melhor moldado por uma Ética de caridade e uma Fé que transcendesse a Racionalidade pura.
A conjuntura deprimente que tornou possível este fenómeno religioso de Fé colectiva, apesar da descrença de António Sérgio que a ele assistiu incrédulo, nesta data, caracterizou-se pelo materialismo exacerbado e pela ganância nacionalista que desembocaram na violência da Primeira Guerra Mundial com as tropas expedicionárias portuguesas a combaterem em França, pela instabilidade política e social da Primeira República sobressaltada com as constantes mudanças governativas e a agitação grevista e pela expansão das ideias bolcheviques (comunistas) na Rússia que inquietaram muitos espíritos europeus.
Será o curto “consulado” de Sidónio Pais que, de Dezembro de 1917 a Dezembro de 1918, permitirá o sopro de esperança espiritual que fará florescer a devoção a Nossa Senhora de Fátima, restabelecendo as relações diplomáticas entre a República Portuguesa e a Santa Sé e permitindo a criação do Centro Católico Português. É, assim, que a 28 de Abril de 1919 se dará início à construção da Capelinha das Aparições, centro nevrálgico de todo o Santuário de Nossa Senhora de Fátima.
Não obstante, todas as dúvidas lançadas pelos filósofos François Voltaire e Friedrich Nietzsche, e muitos outros, que conduziram a uma imanente mentalidade ateísta que moldou o espírito de muitas sociedades contemporâneas da Civilização Ocidental, os fenómenos religiosos mostraram-se imperturbáveis. Deste modo, é indesmentível que a Fé num espírito cósmico, sobrenatural, é um traço estrutural da História Universal desde o Homem do Paleolítico.
As peregrinações que, por estes dias se deslocam a Fátima em devoção de Nossa Senhora, culminam com as celebrações litúrgicas de 13 de Maio evocativas da primeira aparição aos pastorinhos. Este ano a cerimónia eucarística, principal, é presidida pelo Cardeal Sean O’ Malley, arcebispo de Boston, como acção de graças pela beatificação de João Paulo II, que tinha uma especial devoção por Nossa Senhora de Fátima, tendo estado três vezes no santuário, onde teve oportunidade de agradecer a recuperação do atentado a que foi sujeito em 1981 e de beatificar os pastorinhos, Francisco e Jacinta, a 13 de Maio de 2000. Em 2011, como em 1917, nestas conjunturas internacionais e nacionais de crise a mensagem de Fé, de Esperança e de Caridade de Nossa Senhora de Fátima aparece a muitas pessoas como a chave para a Paz e a Concórdia rumo a um mundo melhor.
No Auditório José Gomes Mota, da Fundação Mário Soares, foi apresentado o livro “Indignai-vos!” (Carnaxide, Editora Objectiva, 2011), já na 3ª edição portuguesa, de Stéphane Hessel, no dia 4 de Maio de 2011, com a presença do autor, do Dr. Mário Soares, do representante da Editora Objectiva e do Embaixador Francês em Portugal. O Dr. Mário Soares fez o prefácio desta edição e apresentou, nesta sessão, o autor ao público presente.
Este livro, agora traduzido para português, é um “best-seller” em França e no mundo pelas tiragens impressionantes e pela expansão internacional da sua tradução em mais de vinte línguas. O prefaciador, deste livro, diz-nos que partilha muitas convicções com o autor, designadamente o diagnóstico de que a crise Europeia torna premente a necessidade de mudar de paradigma político de desenvolvimento (neo-liberal) – de um modelo monetário num modelo global de intervenção internacional, da União Europeia, nos vários níveis de acção que co-responsabilize todos os seus Estados-Membros.
Stéphane Hessel neste seu apelo à indignação cívica, dos cidadãos do mundo, explicita os seus fundamentos Éticos e vivenciais, que assentam no Programa da Resistência Francesa à qual pertenceu ao lado do General De Gaulle, que se moldam à actual crise política internacional. O autor critica o facto dos grandes poderes económicos actuais tentarem por várias vias domesticar o espírito crítico dos cidadãos, deturpando a base das democracias.
Como socialista, o autor frisa que a actual falta de recursos dos Estados decorre da desigual distribuição de rendimentos em que os oligopólios se recusam à prática da generosidade social. Deste modo, este entusiasmado cidadão, de 93 anos, apela para que nos indignemos, como o fizeram os heróis da Resistência Francesa contra o Nazismo, também contra a actual ditadura dos mercados financeiros. A sua postura, de idealista pragmático, faz com que apele ao Direito à indignação como um imperativo Ético em contextos sociais pouco respeitadores dos Direitos Humanos.
A sua visão Hegeliana da História imprime um sentido teleológico ao caminho da Humanidade em direcção à liberdade humana. Considera, por isso, que, não obstante a nossa sensação de pequenez face à complexidade do mundo actual, Globalizado, o pior inimigo do Homem “de bom coração” é a indiferença cívica que aniquila o Direito democrático à indignação e à militância transformadora das realidades que nos rodeiam.
Como dizia, no tempo de G.W. Bush, um editorialista crítico da administração norte-americana, num periódico de Nova Yorque, só a emergência de uma nova potência mundial – a cidadania activa global - poderá pôr cobro às crescentes injustiças da Globalização. Na verdade, Stéphane Hessel crê no poder das Organizações Não Governamentais e na eficácia destas em concertação com a acção em rede dos cidadãos e dos meios de comunicação social para poder gerar transformações empíricas.
O autor tributário de várias correntes filosóficas contemporâneas, do Existencialismo de Jean-Paul Sartre, da Fenomenologia de Maurice Merleau-Ponty e do Idealismo Hegeliano, é empurrado para a entrada na História Universal com a sua oposição activa contra o Nazismo, numa atitude declarada de Idealista Pragmático. Esta sua experiência da guerra leva-o a pugnar por um exercício de uma cidadania activa, não-violenta, que suscite soluções de esperança para os conflitos duradoiros das nações e das relações internacionais. É, nessa medida, que nos deixa o seu exemplo concreto da actual indignação que nutre contra o belicismo Israelita exercido sobre os Palestinianos, uma vez que os sionistas se esqueceram dos valores subjacentes aos Direitos Humanos que lhes deram a possibilidade de surgirem como Estado-Nação em 1948.
Na sua lúcida visão e corajosa intervenção cívica, que consubstancia uma indesmentível autoridade moral, a utopia é a força motriz transformadora do mundo, pois sem esta não há esperança e a indiferença instala-se inexoravelmente. Stéphane Hessel diz-nos, neste livro indispensável, que se não transcendermos o Materialismo desta Globalização não chegaremos ao primado das questões Éticas que se impõem como fulcrais para a beleza da própria Humanidade, no sentido de realizar as suas últimas finalidades, nesta sua pertinente leitura de Filosofia da História. Em suma, o espírito de resistência é, na sua perspectiva de aprofundada compreensão da natureza humana, potencialmente criador de uma esperança revivificante que mobilize e galvanize os indivíduos e as sociedades. É, por esta razão, se tantas outras não houvessem, que recomendo a leitura deste fascinante Manifesto cívico.
O testemunho da sua vida, rica em posições humanitárias, tendo sido preso pelos Nazis, pertencido à Comissão que redigiu a Declaração Universal dos Direitos Humanos em 1948, tendo sustentado no pós-guerra o direito da Argélia à autodeterminação, elucida este Manifesto que apela à ultrapassagem de uma apatia cívica, face à anomia da conjuntura internacional, sem se incorrer em posições extremadas.