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Crónicas do Professor Nuno Sotto Mayor Ferrão

Crónicas que tratam temas da cultura, da literatura, da política, da sociedade portuguesa e das realidades actuais do mundo em que vivemos. Em outros textos mais curtos farei considerações sobre temas de grande actualidade.

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O POLÉMICO ACORDO ORTOGRÁFICO DA LÍNGUA PORTUGUESA (1990-2015) – RAZÕES DO DEBATE

 

O Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990 (designado em diante AO) é um tratado internacional estabelecido com o objetivo de unificar a ortografia da Língua Portuguesa no espaço da lusofonia. Este objetivo apenas foi alcançado neste documento em 98% das palavras. Existem exemplos favoráveis e desfavoráveis, no mundo à aplicação deste AO, sendo o primeiro caso a língua castelhana e, o segundo caso, a língua inglesa.

 

Deste modo, face à polémica que divide a sociedade portuguesa, um grupo de cidadãos no respeito pelos preceitos constitucionais propõe-se recolher as assinaturas necessárias para a realização de um referendo que irá incidir na seguinte questão, em conformidade com um projeto de lei já escrito: “Concorda que o Estado Português continue vinculado a aplicar o «Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa» de 1990, bem como o 1.º e o 2.º Protocolos Modificativos ao mesmo Tratado, na ordem jurídica interna?”. Este AO nas duas ortografias a unificar, nas matrizes portuguesa e brasileira, obriga a uma adaptação maior em termos do número de palavras na primeira matriz do que na segunda.

 

O AO assinado em 1990 não criou um consenso nos meios culturais dos países de expressão oficial portuguesa e, em especial, em Portugal. De facto, gerou-se uma polémica que se tem arrastado ao longo dos últimos anos devido a erros etimológicos ou à introdução de facultatividades, ou seja, ao permitir mais do que uma grafia da mesma palavra. A contestação ao AO sustenta-se em argumentos filológicos, políticos, económicos e, mesmo, jurídicos.

 

O AO tem passado por uma longa história de pequenos avanços e recuos, sem que haja unanimidade nacional e internacional. Com efeito, em 1998 e, depois, em 2004 os países de expressão de língua portuguesa assinaram dois Protocolos Modificativos do AO, tendo o segundo facilitado o processo de ratificação para a sua entrada em vigor. Após a ratificação por 4 países (Brasil, Cabo Verde, São Tomé e Princípe e Portugal) do segundo Protocolo Modificativo do AO, a nação portuguesa em 2008 agilizou os processos para a sua implementação interna.

 

Os dirigentes políticos dos países da CPLP, reunidos no verão de 2008, manifestaram o interesse em promover os mecanismos para a sua aplicabilidade, que para algumas figuras iria tornar possível que a língua portuguesa se tornasse, futuramente, um instrumento de trabalho na ONU. Atualmente, nos diversos países da CPLP falta a ratificação de Angola, que se manifesta mais refratária à sua rápida aceitação.

 

Os antecedentes deste AO de 1990 estão no fracassado Acordo Ortográfico de 1945 e na tentativa de Acordo de 1986, que se revelaram inconsequentes por terem pretendido uma unificação ortográfica absoluta, o que desagradou primeiro aos brasileiros e depois aos portugueses, por isso surgiu este novo AO que estabeleceu compromissos para uma maior uniformidade, sem garantir uma coerência ortográfica, pois foi preferido o critério de uma ortografia sónica em vez de uma ortografia mista conciliadora dos critérios etimológico e fonético.

 

O aprofundamento da distância linguística entre a ortografia do português europeu e do português brasileiro iniciou-se com a Reforma Ortográfica Portuguesa de 1911, a que os linguistas brasileiros responderam com a ênfase colocada na oralidade.

 

Em função destas contradições filológicas, abriu-se um aceso debate que tem divido Portugal e os países da CPLP, havendo eminentes personalidades favoráveis ao AO e outras contra, o que tem criado uma clivagem que perpassa a sociedade portuguesa. Verifiquemos os principais argumentos a favor e contra a aplicação deste AO.

 

Consideram os seus defensores que uma ortografia comum aos países de expressão oficial portuguesa favorece internacionalmente a projeção da língua portuguesa e a sua adoção como língua de trabalho das Nações Unidas, que o custo económico da duplicação de edições de livros deve ser tomado em linha de conta, que num momento em que o mundo se globaliza é importante uma língua comum uniformizada nos processos de escrita, que a aplicação do AO será favorável ao aumento da circulação do livro no espaço lusófono, que a não aceitação do AO provocará uma diminuição da importância da ortografia portuguesa em benefício da ortografia brasileira pelo expansionismo cultural desta potência geo-política, que dada a morosidade do processo negocial será tarde para recuar face ao estabelecido pelos dirigentes lusófonos, que o AO será favorável à projeção das obras bibliográficas escritas em português.

 

Entre as personalidades favoráveis ao AO contam-se Vital Moreira, Edite Estrela, Celso Cunha, José Eduardo Agualusa, Rui Tavares, Clara Ferreira Alves, Lauro Moreira, Juca Ferreira, Adriano Moreira, etc..

 

Por seu turno, consideram os oponentes como argumentos fundamentais de contestação ao AO de 1990 que este tratado não é suficiente para atingir a uniformidade ortográfica entre a norma portuguesa e a brasileira, que a unificação ortográfica não permitirá uma maior projeção internacional da língua portuguesa, que o poder “neocolonial” do Brasil como potência geo-política não se deve vergar à vontade da pátria portuguesa (o que só se conseguirá saber através da realização de um referendo), que é possível vender livros escritos no português europeu no Brasil, que as facultatividades permitem grafias duplas e múltiplas rompendo um critério ortográfico equilibrado (dado que deixa de existir uma maneira correta de escrever em função de uma norma clara), que a língua faz-se pela dinâmica das populações e não por decreto dos governos.

 

Entre as personalidades contrárias ao AO contam-se João Ubaldo Ribeiro, Cláudio Moreno, Miguel Sousa Tavares, Vasco Graça Moura (entretanto já desaparecido), Isabel Pires de Lima, Carlos Heitor Cony, António Lobo Xavier, Eduardo Lourenço, José Pacheco Pereira, Teolinda Gersão, etc..

 

Portugal foi o primeiro país a ratificar o AO logo em 1991, mas demorou mais tempo a ratificação do Segundo Protocolo Modificativo de 2004, tendo este sido ratificado em 2009 e agilizado o processo para a sua implementação em fase de transição entre 2009 e 2015. O Ministério da Educação determinou que a aplicação nas escolas, em fase de transição, se fizesse no ano letivo de 2010/2011 e que a sua efetiva aplicação se fizesse no ano letivo seguinte e para todo o Estado português desde o início de 2012.

 

Num inquérito feito, em 2005 sobre o AO, a organismos universitários e a editoras, a maioria das entidades mostrou-se contra a sua aplicação devido às fragilidades da base ortográfica estabelecida e numa sondagem do Correio da Manhã no início de 2009, a maioria dos inquiridos mostrou-se, também, contrária à sua entrada em vigor. A partir desta altura, começaram a circular petições, contra e a favor do AO, tendo alcançado notoriedade a petição "Manifesto em Defesa da Língua Portuguesa Contra o Acordo Ortográfico", que também criticou os programas do ensino básico e secundário da disciplina de Português pelo reduzido peso dado à Literatura Portuguesa.

 

Este facto patenteia a polémica que tem rodeado o AO, pois esta petição entregue na Assembleia da República recolheu mais de 110 mil assinaturas, o que torna inequívoca a divisão da sociedade portuguesa em relação à sua implementação. Em 2010 surgiu, nas redes sociais, uma iniciativa legislativa de cidadãos destinada a suspender e a revogar a aplicação do AO em Portugal.

 

Na imprensa portuguesa a maioria dos periódicos adotou já a norma do AO, não obstante alguns meios de comunicação social escrita de grande projeção como os jornais Público e Sol e a revista Sábado serem renitentes à sua aplicação até à atualidade. A Sociedade Portuguesa de Autores, em 2013, decidiu continuar a aplicar a norma ortográfica antiga, visto que o Brasil adiou a sua eventual ratificação para 2016 e Angola ter tomado uma posição contrária à sua implementação.

 

Este AO tem por base uma filosofia pragmática favorável a uma convergência lusófona com base no critério sónico de aproximar a palavra escrita da sua utilização oral, no entanto a falta de consenso interno e internacional, no espaço lusófono, a par do desrespeito pelo critério etimológico tem levado muitas personalidades a serem refractrárias à sua aplicação, pois muitas delas consideram que as facultatividades darão origem a uma heterografia.

 

Por outro lado, não houve uma séria discussão pública do tema, pois os governantes tomaram a decisão de avançar com o processo sem ouvir a opinião dos governados e descurando a opinião negativa da maioria de especialistas consultados e, mesmo, uma petição que foi apresentada na Assembleia da República. Convém frisar que não foi apresentada nenhuma justificação linguística ou cultural a favor do AO.

 

Este AO, com os seus acrescentos, não garante a unificação da língua portuguesa, pois além da questão ortográfica teriam de se rever os outros aspetos da gramática. De acordo com o documento, contra o AO que enuncia as razões do referendo, manifesta-se nos documentos de apoio ao cidadão (dicionários, corretores e conversores) um verdadeiro caos ortográfico. Culturalmente, a aplicação do AO afasta a ortografia do Português da ortografia das línguas de matriz greco-latina. Considera, este documento, que o AO prejudica o Património Cultural Imaterial da Língua Portuguesa pela anarquia ortográfica.

 

Em suma, apesar de contestar o AO escrevo de acordo com este, pois como docente o sistema de ensino a isso nos impele. Na verdade, não devemos ser excessivamente pragmáticos nesta problemática, pois a Língua Portuguesa na sua matriz europeia é definidora de uma identidade coletiva do povo português, mesmo nas suas interconexões no espaço da lusofonia que transcende o espaço geográfico da CPLP, como é o caso evidente da Galiza, desta forma esta diversidade no espaço cultural lusófono é enriquecedora e não empobrecedora da nossa língua comum.

 

Nuno Sotto Mayor Ferrão

 

SANTO ANTÓNIO (1191-1231) DE LISBOA OU DE PÁDUA ?

 

A questão com que iniciámos esta crónica é irrelevante, embora paire em boa parte da mentalidade dos portugueses e dos italianos, pois foi um pregador de uma amplitude universalista, como se constata da argumentação que vos apresentamos.

 

É, com efeito, o santo português, de nascimento, com maior relevo, que pertenceu à ordem franciscana, embora tenha estudado em Lisboa e em Coimbra, sendo a sua festa comemorada no período do solistício de verão a 13 de junho em Portugal com festas populares que a cidade de Lisboa celebra com grande júbilo. Nascido em Lisboa em 1191 com o nome de Fernando Martins de Bulhão, só recebe o nome de António quando ingressa na ordem religiosa franciscana.

                                                        

Convém recordar, por isso, que viveu em pleno contexto da reconquista cristã de Portugal. Deste modo, o ambiente de crescimento económico e urbano, que se fazia sentir na Europa, a par das grandes desigualdades sócio-políticas e da atmosfera marcial das Cruzadas fê-lo, certamente, aproximar-se dos ideais de humildade, de pobreza e de evangelização da ordem mendicante franciscana. 

 

A forte formação intelectual, iniciada com os cónegos regrantes de Santo Agostinho, permitiu-lhe profundos conhecimentos de teologia, que o veio a transformar no ano de 1946 em Doutor da Igreja.

 

Assim, a sua Santidade foi-lhe publicamente reconhecida, pois soube compaginar um imenso prestígio popular com base nos seus milagres com uma aprofundada base teológica. Em Roma existe a Igreja de Santo António dos Portugueses, de estilo Barroco (como se observa na terceira fotografia), com dependência eclesiástica do cardeal-patriarca de Lisboa, D. Manuel Clemente.

 

Deixou-se inspirar pelos santos mártires de Marrocos e ingressa na ordem franciscana, motivado pelos seus exemplos, numa viagem a este território é apanhado por uma doença súbita que o conduz de novo à Europa, em particular à Itália, tendo-se posteriormente tornado um grande pregador e teólogo.

 

Nesta altura, fazendo um grande périplo de pregação pela Itália e França torna-se um evangelizador de espírito universalista que transcende as fronteiras nacionais. Conta-se que, em Rimini, impedido, de momentaneamente, de pregar se virou para os peixes e é, este episódio, que é recriado pelo Padre António Vieira. Durante a vida teve oportunidade, pelo prestígio alcançado, de publicar os seus sermões, no fim da década de 20 do século XIII, e de continuar a pregar na Europa do Sul contra os hereges, ao mesmo tempo em que ensinava nas escolas conventuais franciscanas de algumas cidades.

 

Dos seus sermões irradia um pensamento eclético, compaginando as bases clássicas gregas com as cristãs com um recurso formal às alegorias que enfatizam os valores éticos da observação da Natureza.  

 

Em 1232, um ano após a sua morte, pelo número de milagres que lhe foram reconhecidos, foi logo canonizado. A cidade de Pádua, onde falece, organiza-lhe imediatamente um solene funeral, erguendo-lhe rapidamente uma basílica para onde vão as suas relíquias.

 

Verificamos que, não obstante, o seu nascimento e crescimento intelectual em Portugal, acaba por falecer em Pádua onde é homenageado, mas a sua ação espiritual-religiosa transcende as fronteiras destas pátrias e a questão com que iniciámos este texto não tem pois qualquer sentido.

 

Nuno Sotto Mayor Ferrão

 

 

LINHAS DA EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA HUMANIDADE – A DIALÉCTICA ENTRE A TÉCNICA E O PENSAMENTO – ENSAIO DE FILOSOFIA DA HISTÓRIA

 
 

Se compararmos o estado humano da Pré-História com o dos nossos dias verificamos que, no longo percurso civilizacional de milhares de anos, evoluímos de um tempo em que havia uma primazia da técnica a uma nova era, a nossa, em que a supremacia da técnica tem levado as sociedades pseudo-desenvolvidas a desprezar o pensamento.

 

 

Na verdade, na Pré-História prevaleciam as técnicas de sobrevivência (o fabrico de instrumentos, o domínio do fogo e os ritos mágicos), que todas concorriam para a sobrevivência do Homem no meio da temível natureza.

 

O florir do pensamento (filosófico, matemático, político, dramatúrgico, artístico e poético) emerge na Civilização Grega que, por isso, se tornará clássica. O teatro, como palco para as reflexões do quotidiano, e o amor da sabedoria, pela interrogação, abriram a porta ao pensamento elaborado, que colocou o Homem perante as grandes questões vivenciais. Os romanos mais dados à aventura e à cobiça imperial basearam-se no legado grego do pensamento e filiaram-se num pensamento pragmático, dando azo às grandes obras de engenharia, de planeamento urbanístico e de organização jurídica da sociedade, com a invenção do Direito.

 

No ruir do império romano a Europa enfrenta um período de grande instabilidade de que a Igreja Católica se torna o refúgio e o alfobre do pensamento com grandes Doutores da Igreja como Pedro Abelardo, São Tomás de Aquino ou Santo António de Lisboa, com o método escolástico a fazer a ponte entre o pensamento racional e a fé cristã e os monges copistas a salvaguardarem o património bibliográfico da Antiguidade Clássica. Depois deste tempo denominado erradamente, por estudiosos laicos, de Idade das Trevas emergem dois movimentos na Idade Moderna que fazem florescer de novo o pensamento.

 

Em primeiro lugar, o Renascimento, nos séculos XV e XVI, como tendência cultural para a redescoberta pública dos valores clássicos do Humanismo Greco-Romano, que permitiu fazer florescer o espírito crítico de autores que denunciaram os erros dos antigos e dos contemporâneos, com a concomitante experiência marítima das Descobertas portuguesas, fazendo também emergir uma renovada Igreja Cristã através das reflexões críticas, sobretudo, de Erasmo de Roterdão e de Martinho Lutero, não obstante a nova cisão criada no seio do Cristianismo.

 

Em segundo lugar, o Iluminismo, no século XVIII, como um movimento de ideias que tentou libertar a Europa de alguns preconceitos sociais e políticos, acabando por permitir a eclosão das Revoluções Liberais que transformaram as sociedades do mundo contemporâneo. Este tempo deu forma à consubstanciação do espírito de dignificação do ser humano na sua liberdade e nos seus direitos, inspirando a posteriori a Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU de 1948.

 

Contudo, apesar da constante consolidação das dinâmicas do pensamento, a Revolução Industrial, iniciada em Inglaterra no século XVIII, a par dos avanços técnico-científicos conduziram a uma mentalidade excessivamente crente nos progressos ilimitados da ciência que relegaram as crenças religiosas e os conhecimentos filosóficos para segundo plano, deixando nas “ruas da amargura” crenças religiosas e as reflexões humanistas, o que deu azo a uma profunda crise de valores éticos e espirituais e a uma importância desmedida colocada nos mecanismos técnicos.

 

Aliás, as duas guerras mundiais (1914-1918 e 1939-1945) foram o fruto podre de uma dinâmica histórica comandada pelo desenvolvimento técnico e pela cobiça humana. Este colossal erro da caminhada da Humanidade irá reflectir-se na perniciosa invenção das bombas atómicas que resultam de uma degenerescência da consciência humanista, pois estas novas armas de destruição maciça têm colocado a paz internacional do mundo desde o segundo pós-guerra em constantes sobressaltos.

 

É, assim, compreensível que este descaminho da Humanidade tenha resultado num sistema tecnocrático, que se tornou num despótico sistema de vida, no início do século XXI que foi o ponto culminante resultante da preponderância da ideologia neoliberal, desde os anos 80 do século XX, tendo este sistema uniformizador relegado o plural pensamento humanista e as ciências sociais para um papel secundário nas sociedades pseudo-desenvolvidas.

 

Na verdade, a erupção das crises, já latentes no caldo estrutural da evolução histórica,  (ética, com a corrupção a minar as sociedades desenvolvidas; económico-financeira, com a repetição do erro crasso do Capitalismo Financeiro de 1929 em 2007/2008; política, com o afastamento dos cidadãos em relação à política num tempo em que os estadistas surgem manietados ao poder económico) foram fruto de uma globalização pouco meditada e da ingénua crença no poder da técnica, que apela na atualidade ao desafio do pensamento humanista e à necessidade de o represtigiar.

 

Em suma, esta evolução histórica da Humanidade que do primado da técnica na Pré-História nos levou ao primado da técnica no início do terceiro milénio resulta de um inequívoco retrocesso civilizacional, uma vez que o pensamento humanista que poderá dar dignidade ao ser humano foi menorizado, colocando em risco a necessidade de um pensamento global que saiba meditar nos processos e nos efeitos de uma globalização erguida por técnicos que carece urgentemente de pensadores, que sejam respeitados e valorizados socialmente.

 

Nuno Sotto Mayor Ferrão

 

 

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