A DEMOCRACIA EM DEBATE EM TEMPOS DE GLOBALIZAÇÃO DA CRISE DE VALORES
Manuel Villaverde Cabral, um conceituado professor universitário, e Miguel Serras Pereira, ilustre jornalista vão dinamizar o debate, promovido pelo Movimento Internacional Lusófono e pela Plataforma Outra Democracia, intitulado “Ainda vivemos em democracia?”, no dia 24 de março na sede do MIL às 18 horas, que é uma questão cada vez mais cadente. Muitos cidadãos defendem que vivemos numa espécie de democracia iluminada por mentes tecnocráticas que dirigem, de forma autista, os destinos das nações.
O sociólogo Boaventura Sousa Santos num interessante ensaio, recentemente publicado, escreve que vivemos numa democracia minguada e cada vez menos participativa, porque esta se torna incómoda para os centros de decisão que são entidades opacas e que estão muito longe dos cidadãos. Em boa hora, a Direção do “MIL” decidiu promover em articulação com a “PODe” este pertinente debate que deve ter uma dimensão transnacional, dado que a Globalização impõe critérios que podem desvirtuar o conceito de democracia.
Cumpre definir o próprio conceito de democracia para se poder debater, de forma esclarecida, esta interessante e preocupante problemática. Na democracia os cidadãos escolhem os seus governantes nos atos eleitorais, ora acontece que no presente as esferas de decisão transcendem os próprios governantes dos pequenos países e das grandes comunidades políticas (como a União Europeia), porque os verdadeiros decisores são os investidores naquilo a que, comummente, se chama o poder oculto dos mercados.
Por exemplo, neste momento a capacidade decisória dos governantes portugueses face à intervenção financeira da Troika é muito reduzida. Só que acontece que o pluralismo, como característica imanente das democracias que se prezam, está reduzido a um caminho muito estreito que as esferas ocultas dos poderes financeiros impõem. Muitos cidadãos desconhecendo os rumos históricos que nos fizeram chegar a este abismo de “democracias musculadas” recusam-se a aceitar que vivemos em regimes democráticos degenerados. No entanto, os cidadãos encontram-se em grande parte manietados pelas estruturas financeiras que se impõem como verdadeiras ditaduras lembrando as sábias palavras do ancião Stéphane Hessel.
Um dos problemas, que estas democracias da Era da Globalização nos colocam, é o facto da ideologia totalitária do mercado como valor absoluto ter conduzido ao declínio das ideologias moderadas da social-democracia, do socialismo democrático e da democracia-cristã, o que significa que a característica fundamental das sociedades democráticas definida pelo clarividente cientista e filósofo Karl Popper como “sociedades abertas” está posta em causa. Há uma série de questões a que importa, de sobremaneira, responder para garantir que as liberdades são respeitadas nestas aparentes ou fragilizadas democracias:
- é compaginável uma democracia que respeite a liberdade dos cidadãos com a uma ideologia monolítica neoliberal que favorece o critério materialista?
- é possível uma verdadeira democracia sem cidadãos conscientes e interventivos?
- queremos uma democracia que tome como paradigma as ideias de Alexis de Tocquevillle ou as ideias de Jean-Jacques Rousseau?
- é possível uma democracia de valores numa conjuntura em que prevalecem os interesses instalados num sistema de “Capitalismo de Casino”? Onde cabem nestas democracias as convicções que devem moldar as mentes dos políticos?
- o maior sintoma de que já não vivemos numa democracia, autêntica, não é o facto dos cidadãos se sentirem cada vez mais desfasados da classe política?
- se a grande depressão económica de 1929 fez entrar os regimes demoliberais em crise não estará a acontecer, sub-repticiamente, o mesmo com as nossas democracias da Era da Globalização?
São questões importantes que gostaria de ver debatidas face a esta preocupante problemática que deve fazer despertar os cidadãos de bom consciência.
Nuno Sotto Mayor Ferrão