PORTUGAL, PÁTRIA DE POETAS? A MATRIZ IDENTITÁRIA LATINA EM REFLEXÃO
Luís Vaz de Camões Teixeira de Pascoaes
Fernando Pessoa Miguel Torga
Sophia de Mello Breyner Andersen
MAR PORTUGUÊS
"Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!
Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.
Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu"
FERNANDO PESSOA
Portugal é um país de grandes poetas devido à sua matriz identitária latina, pejada de uma sensibilidade lírica, de fino recorte criativo. Possivelmente, por esta razão, os países do Norte da Europa tenham muito a aprender connosco, na medida em que o Homem é um ser multidimensional que se deve desenvolver nas suas múltiplas facetas (materiais e espirituais). A inspiração e a capacidade criativa dos portugueses, transposta para a poesia por muitos escritores, foram sublimadas pelo poder imaginativo de Fernando Pessoa, que soube dar “novos mundos ao mundo” poético, tendo-se tornado uma figura de valor universal indiscutível.
A matriz de arrebatamento emocional dos latinos tem possibilitado uma invulgar veia artística e estética aos povos latinos. Aliás, num estudo recente este temperamento mais arrebatado dos povos latinos foi valorizado, pois dizia-se que as pessoas que exteriorizavam mais as emoções, sendo os povos latinos pouco fleumáticos, ao contrário das pessoas do Norte da Europa, tinham uma predisposição para terem uma vida mais longa.
Em Portugal germinaram grandes poetas como Luís Vaz de Camões, Almeida Garrett, Teixeira de Pascoaes, Afonso Lopes Vieira, Fernando Pessoa, Florbela Espanca, António Gedeão, Miguel Torga, Sophia de Mello Breyner Andersen, Eugénio de Andrade, David Mourão-Ferreira, entre muitos outros que expressaram a alma pátria através desta arte literária. O temperamento latino está timbrado por esta colossal riqueza emotiva, que na paleta semântica da poesia soube ser imensamente prolífera. A localização geográfica desta pátria no sudoeste Europeu, com um clima ameno, e uma paisagem de grande variedade e beleza incitaram a inspiração criativa. Aliás, foi esta tocante natureza de tons paradisíacos que inspirou o grande poeta britânico Lord Byron a qualificar Sintra como a “mais bela vila do mundo”, num êxtase de inspiração que o ambiente pitoresco do local potenciou.
Não é, também, de menosprezar a intensa vivência lusófona, ao longo da História de Portugal, que constituiu uma fonte de vivências abertas que entusiasmaram o poder de criação poética de alguns escritores portugueses, onde avulta o nome de Luís Vaz de Camões.
Em face destas fosforescentes estruturais mentais, do povo português, não admira as capacidades extraordinárias que tem revelado para cantar o Amor na versão poética. Esta alma poética dos portugueses fez surgir um grande realizador de cinema de projeção internacional, Manuel de Oliveira, que nos seus filmes nos manifesta esta alma lusíada.
De facto, esta valorização do património poético que é um traço de identidade dos portugueses pode servir de lição para que o mundo e a Civilização Ocidental, em particular (numa permuta culturalmente enriquecedora entre o Sul e o Norte da Europa), encontrem novos pontos de equilíbrio para compaginarem o desenvolvimento material e o desenvolvimento espiritual do Homem. Mais do que nunca, nesta presente fase histórica, perante a crise multipolar que a Humanidade vive, este dom espiritual dos portugueses, de serem poetas nos momentos de adversidade, pode despertar a Esperança, para que se procurem as alternativas necessárias, de forma que o desânimo não catapulte a nossa Civilização para uma depressão coletiva.
A intervenção cívica da poesia em Portugal teve em Miguel Torga e em Sophia de Mello Breyner Andersen bons expoentes. A inteligência emocional, de que nos falam os modernos cientistas, não se coaduna com a mentalidade materialista e tecnocrática que reina impunemente nas nossas sociedades e abafa as virtualidades do espírito Humanista.
Em suma, a saúde das democracias, a saúde mental dos cidadãos, a saúde das sociedades desta Globalização desregulada exigem a revitalização do património poético para o bem-estar comum da Humanidade. Neste pressuposto, a riqueza cultural de Portugal e de toda a Comunidade Lusófona podem ser uma mais-valia importante para superar este impasse gerado por uma ideologia totalitária que tem inquinado as relações internacionais neste início do século XXI.
Nuno Sotto Mayor Ferrão