Crónicas que tratam temas da cultura, da literatura, da política, da sociedade portuguesa e das realidades actuais do mundo em que vivemos. Em outros textos mais curtos farei considerações sobre temas de grande actualidade.
Crónicas que tratam temas da cultura, da literatura, da política, da sociedade portuguesa e das realidades actuais do mundo em que vivemos. Em outros textos mais curtos farei considerações sobre temas de grande actualidade.
A marca “Crónicas do Professor Nuno Sotto Mayor Ferrão” foi criada no final do ano de 2008, em textos avulsos, embora só tenha surgido associada a este nosso blogue cultural e cívico a 23 de julho de 2009, perfizeram-se agora 12 anos (2009-2021).
Este blogue cresceu exponencialmente, desde essa data, em número de visitantes e em países abrangidos, devido ao bom acolhimento dos internautas e aos conselhos muitos úteis de muitos amigos. Inicialmente, designava-se “Crónicas do Professor Ferrão”.
O blogue teve, até ao momento, mais de 280 mil visitas de múltiplos países, destacando-se Portugal e os países lusófonos ou regiões de grandes comunidades de emigrantes portugueses espalhados por vários países, entre estes destacam-se por ordem de decrescente importância em termos de visitantes: Brasil, EUA, Angola, Moçambique, França, Suiça, Espanha, Inglaterra e África do Sul. Conta com mais de 300 “posts” com textos, imagens e vídeos sobre temas de História, de Literatura, de Arte, de Música, de Educação, de Cidadania e de Religião e algumas centenas de comentários de visitantes.
Associado ao blogue foi criado o canal do YouTube com o mesmo nome, em 24 de julho de 2020, interligado, em alguns casos, com o blogue em termos de conteúdos de vídeos produzidos. O último vídeo criado neste nosso canal versou a educação e o Plano 21.23 - Escola +.
Não quisemos deixar de assinalar estas duas datas do blogue (décimo segundo aniversário) e do canal do YouTube (primeiro aniversário) relativo a esta marca de produção e de divulgação de conteúdos culturais. Sem o vosso acolhimento e os vossos incentivos, estes meios de intervenção culturais e cívicos não teriam sido possíveis. Um enorme bem-haja a tod@s, carríssim@s leitores e companheir@s.
A consciência moral, defendida pela Igreja Católica, implica o ajuizamento pessoal na vida quotidiana da prática do bem e do impedimento do mal. Para se evitar juízos erróneos é importante a educação cristã para o bem, a assimilação das mensagens evangélicas e dos ensinamentos da Igreja Católica, vulgarmente conhecida por catequese. Também auxiliam bastante a formação da consciência moral: a oração, o exame interno de consciência, a confiança na intercessão do Espírito Santo, o conselho de pessoas sábias e um coração compadecido com o sofrimento dos outros seres humanos e animais.
No documento pastoral Gaudium et Spes[1] do Concílio Vaticano II, de 7 de dezembro de 1965, valoriza-se uma consciência cristológica, que deve ser amadurecida para que o Homem possa moldar a sua vida e os seus comportamentos por essas “leis interiores” e não por “leis exteriores”[2]. A Igreja Católica deixou, desde os finais dos anos 60, de ser diretiva e passou a conceder autonomia ao Homem para descobrir o mundo e se descobrir como pessoa, no respeito pelos valores cristãos do Evangelho.
De facto, esta nova teologia moral, ajustada ao cidadão urbano, singrou na reunião conciliar, em função da rutura que os padres conseguiram operar na Igreja Católica, perante as grandes transformações do mundo contemporâneo – aggiornamento. Assim, o magistério da Igreja deixou de depender do padrão autoritário e passou a sustentar o magistério da persuasão, deixando espaço para o homem se descobrir como pessoa, no respeito pelos valores cristãos do Evangelho.
Uma investigadora portuguesa salienta-nos este aspeto: “(...) O número quarenta e seis da ‘Gaudiumet Spes’ afirma que a solução dos problemas morais deve ser procurado à luz do Evangelho e da experiência humana.(...) A moral do Vaticano II é a do homem sacramentalmente transformado em Cristo e inserido na Igreja. Isto leva a que se dê um espaço e um papel ativo a todos, à sua responsabilidade e à reciprocidade das consciências (...) Esta perspetiva é reforçada na ‘Gaudium et Spes’; é o Espírito Santo quem permite realizar a leitura da realidade, de modo a ser capaz de fazer emergir os sinais da presença de Deus na história, para se chegar a soluções plenamente humanas. (...)”[3].
Aliás, Aristóteles, no século IV a. C., definiu um caminho ético para a vida dos seus concidadãos na sua obra Ética a Nicómaco[4]. Considerou o filósofo que a felicidade só podia ser alcançada através de uma vida virtuosa e não através da fruição dos prazeres, das riquezas e das honras. A prática da virtude seria atingida através do exercício continuado da prudência dos indivíduos.
Para o Homem contemporâneo enfrentar a crise de valores necessita ancorar-se nas virtudes clássicas, quer tealogais, quer cardeais. Nas virtudes tealogais, destacam-se a Fé nos processos transcendentes de diálogo com Deus; a Esperança num futuro melhor terreno e celeste e a Caridade na propensão para a ajuda aos seres humanos mais próximos.
As virtudes cardeais como a prudência, a justiça, a fortaleza e a temperança são essenciais aos comportamentos cívicos. A prudência manifesta-se na razão para entender a forma cautelosa de atingir o bem; a fortaleza para se permanecer firme nas dificuldades, naquilo que hoje é conhecido por resiliência (particularmente importante nesta fase de enfrentamento da pandemia de COVID-19) e persistência; a justiça como vontade de dar aos outros homens o que lhes é devido; a temperança que modera os prazeres e os instintos para garantir a expressão da vontade moral.
Com efeito, só o cultivo das virtudes tealogais e cardeais permitirá ao Homem enfrentar a crise de valores marcada pelo relativismo, pelo individualismo, pelo egoísmo, pelo hedonismo, pelo materialismo, pelo secularismo, pelo indiferentismo, pela violência gratuita que se afiguram como vícios perniciosos da contemporaneidade, dado que estão, desde o século XIX, a corroer a coesão das sociedades ocidentais. Apenas pela prática destas virtudes tealogais e cardeais será possível vencer esses vícios ominosos, bem como pela abertura ao outro e ao seu bem mediante o amor fraterno, de que o Papa Francisco nos procura interpelar, através da sua última Carta Encíclica “Fratelli Tutti”[5].
Oiçamos as palavras avisadas do Papa Francisco nesta Encíclica: “(...) é buscar aquilo que vale mais, o melhor para os outros: o seu amadurecimento, o seu crescimento numa vida saudável, o cultivo dos valores e não só o bem-estar material. No latim, há um termo semelhante: bene-volentia, isto é, a atitude de querer o bem do outro. É um forte desejo do bem, uma inclinação para tudo o que seja bom e exímio, que impele a encher a vida dos outros com coisas belas, sublimes, edificantes. (…) volto a destacar que «vivemos já muito tempo na degradação moral, baldando-nos à ética, à bondade, à fé, à honestidade; chegou o momento de reconhecer que esta alegre superficialidade de pouco nos serviu. Uma tal destruição de todo o fundamento da vida social acaba por colocar-nos uns contra os outros na defesa dos próprios interesses».[86] Voltemos a promover o bem, para nós mesmos e para toda a humanidade, e assim caminharemos juntos para um crescimento genuíno e integral. Cada sociedade precisa de garantir a transmissão dos valores (...)”[6]
Estas orientações morais são extremamente importantes, para enfrentarmos os desafios deste mundo sem bússola ética[7], retomando o título de um artigo de Adriano Moreira. Na verdade, o mundo tem vivido um abismo ético, entre 1965 e 2020. Entre 1965 e 1991, manifestou-se uma fase da guerra ideológica conhecida por guerra fria, entre o bloco capitalista e o comunista, num enfrentamento que via o adversário como a figuração do mal.
A globalização capitalista, vitoriosa no fim do século XX, conduziu à separação entre a economia e as finanças, potenciando a corrupção com o mercado de capitais a recorrerem frequentemente aos paraísos fiscais, fugindo à tributação legal dos Estados, fazendo aumentar as desigualdades sociais entre países e no seio destes. O terrorismo global espraiou-se pela Civilização Ocidental, desde o atentado de 11 de setembro de 2001. Nos tempos mais recentes emergiu a malévola guerra comercial EUA-China, que o presidente Donald Trump acicatou.
A segunda década do século XXI tem sido caraterizada pela decadência das democracias ocidentais motivada pelos partidos populistas, como o Vox em Espanha ou o Chega em Portugal, e pelas fake news de que os EUA têm sido muito férteis nos últimos tempos. Estes movimentos contra os sistemas vigentes estão a crescer, devido à grande iletracia política e cívica dos cidadãos. Por outro lado, esta conjuntura sem norte ético está marcada pela emergência de novos nacionalismos, com as políticas proteccionistas de Donald Trump e de Boris Jonhson e pelas pretensões independentistas da Catalunha e da Escócia.
O desrespeito humano, mediante um processo de desenvolvimento não sustentável das sociedades urbanas e industrializadas, pela natureza-mãe tem originado um crescimento veloz das alterações climáticas e potenciado os fenómenos extremos de secas, de intempéries, de furacões, que assolam a nossa casa comum, planeta único em que vivemos. Concomitantemente, por falta de uma consciência moral generalizada tem-se verificado uma persistência na violação dos Direitos Humanos, em várias partes do mundo. Perante estas inúmeras dificuldades éticas do nosso mundo, importava reforçar o papel interventivo da Organização das Nações Unidas, mas infelizmente os egoísmos nacionalistas estão a barrar os esforços dos últimos Secretários-Gerais desta organização supranacional.
Em suma, em 2020, o mundo confrontou-se com uma grave pandemia – designada COVID-19 -, em que não se conhecem ainda as verdadeiras razões do seu início e a autêntica responsabilidade humana, mas a destruição de muitos ecossistemas e a extinção de muitas espécies animais e vegetais constituem um mau prenúncio para as próximas décadas, caso não se arrepie caminho para evitar a catastrófe global sem retorno. Daí a necessidade de educar para comportamentos cívicos, mediante a formação de consciências morais, que acautelem a prática de uma cidadania das virtudes para o bem-estar de todos, a harmonia geral, a paz social e para a derrota dos populismos, dos negacionismos e dos egoísmos atrozes.
[2] Maria das Dores de Brito Rodrigues, “A teologia moral no Concílio Vaticano II”, in Justa Autonomia – A modernidade da Constituição pastoral 'Gaudium et Spes”, Dissertação para a obtenção do grau de Mestre, Lisboa, Faculdade de Teologia da Universidade Católica, 2003, pp. 104-112.
Num mundo crescentemente marcado por conflitos e violências, neste momento de vivência e de convívio com a pandemia do COVID-19, muito temos a aprender com a experiência de aculturação e de interculturalidade com os portugueses dos séculos XV a XVII.
Neste mundo de aversão ou de desconfiança perante os estrangeiros que circulam neste mundo globalizado dos nossos dias, com as escolas a acolherem e a incluírem alunos estrangeiros de múltiplas nacionalidades é importante saber dialogar com outras culturas e tradições, pois apenas dessa forma se conseguirá a integração plena nas sociedades europeias de invíduos da Europa de Leste, do Oriente e, sobretudo, da América Latina.
O caso de violento racismo exercido sobre George Floyd nos EUA, no fim do mês de maio de 2020, que originou muitas revoltas e inúmeros tumultos urbanos nas cidades norte americanas, veio evidenciar a falta de diálogo intercultural em muitas das sociedades contemporâneas.
A morte de G. Floyd às mãos preconceituosas de 4 polícias mostra o racismo e a prepotência de algumas autoridades das forças de segurança internas deste país, que tem atravessado a história contemporânea dos EUA, apesar da luta sem tréguas de Martin Luther King. Pelo que, muitos países, terão bastante a aprender com as lições históricas dos portugueses no contacto mutuamente enriquecedor com outros povos durante a expansão dos europeus dos séculos XV a XVII. Dado que os portugueses conseguiram um diálogo muito enriquecedor com outros povos, como veremos, de seguida, em duas peças artísticas do Museu Nacional de Arte Antiga, demonstrativas do contacto dos portugueses com as populações naturais do Japão e do Brasil.
OS BIOMBOS NAMBAN
Através da observação atenta dos Biombos Namban (Figura A), verificamos as trocas interculturais entre os portugueses e os povos do mundo com que contactámos, entre os séculos XVI e XVII. A impressão que esta peça nos causa é um gosto requintado de uma peça de mobiliário, muito rica, com muita tendência para a representação figurativa dos pormenores. Esta peça de mobiliário foi produzida no Japão entre 1593 e 1601 por um autor chamado Kano Domi e representa a forma como os japoneses viam os portugueses que tinham chegado ao Japão para estabelecer relações comerciais e evangelizar a população através dos missionários jesuítas.
O suporte, que sustenta a pintura, é constituído por uma leve estrutura de madeira recoberta de várias camadas de papel de amoreira, sendo revestidas a folhas de ouro e pintadas com a técnica da têmpera. Os biombos formam um par. Cada deles tem 1 metro e quase 73 centímetros de altura, 2 centímetros de espessura e quase 3 metros e 31 centímetros de comprimento.
Na excelente apresentação descritiva do programa televisivo da “Visita Guiada”, que teremos oportunidade de visualizar no vídeo em baixo, em relação aos Biombos, referidos, vemos representados alguns elementos: o arcabuz transmitido pelos portugueses aos japoneses; os elefantes desconhecidos pelos japoneses; os óculos dos portugueses que causaram intensa estranheza aos nipónicos; as cadeiras chinesas utilizadas pelos portugueses em terras nipónicas; as igrejas cristãs de estilo japonês, fruto da evangelização dos missionários jesuítas; a admiração dos japoneses pela habilidade “trapezista” dos marinheiros lusos; os animais “exóticos” como os cães perdigueiros que os nipónicos desconheciam, etc.
Por outras palavras, fruto da globalização, encetada pela expansão marítima portuguesa, assistimos ao diálogo de culturas com: o capitão-mor português a transportar à cintura duas espadas de samurai, o transporte no cortejo de mercadorias pelos portugueses de objetos com influências formais de múltiplas regiões do mundo ou, ainda, o esforço de adaptação dos jesuítas portugueses aos costumes japoneses, conseguindo a conversão de muitos habitantes locais, como surge representado numa figura de um nipónico vestido de jesuíta.
A PINTURA “O INFERNO”
Esta pintura portuguesa do início do século XVI representa o tema do inferno. Deve ter sido pintada entre 1505 e 1530. É uma pintura a óleo, típica da arte Renascentista, que tem um suporte retangular de madeira de carvalho, com 1 metro e 19 centímetros de altura e 2 metros e quase 18 centímetros de largura.
Representa um lugar subterrâneo com uma abertura no canto superior direito, de onde caem as almas das pessoas condenadas ao inferno. Muito original é a representação do chefe dos demónios, que aparece sentado numa cadeira como um índio brasileiro, com penas na cabeça e uma trompa na mão, quando o território brasileiro tinha sido “achado” uns anos antes pela armada de Pedro Álvares Cabral. Alguns dos condenados surgem como indivíduos sofredores dentro de um caldeirão com água a ferver. Os condenados estão associados a diversos pecados. Os historiadores não têm a certeza da sua autoria, por falta de documentos históricos conclusivos.
A pintura terá sido exposta num antigo convento, onde lembraria aos seus moradores o risco de terem comportamentos moralmente condenáveis. Trata-se de uma imagem satírica da crença católica no inferno, que alguns autores comparam ao poder expressivo da obra literária de Gil Vicente intitulada Auto da Barca do Inferno.
Paradoxalmente, o mestre de cerimónias, vestido de índio, é o único completamente vestido, em claro contraste com os restantes demónios e os indivíduos condenados que se encontram nus ou seminus. O aspeto risível da pintura sobressai das figuras estranhamente cómicas dos demónios, que se encarregam dos condenados. Confrontemos este imaginário do pintor com a descrição de Pero Vaz de Caminha quando avista índios no Brasil: “(...) Avistámos homens que andavam pela praia (...) nus, sem coisa alguma que lhes cobrisse suas vergonhas. Traziam arcos nas mãos, e suas setas. (...)”.(in Arquivo Nacional da Torre do Tombo)
Questionário de análise das obras de arte:
Identifica o tipo de arte (pintura, escultura, mobiliário, etc) de cada uma das figuras - A e B.
Regista dois aspetos de cada uma das peças artísticas observadas (figuras A e B).
Expressa as emoções que sentes na observação de cada uma das obras de arte (figuras A e B).
Menciona o tema representado nas obras de arte das figuras - A e B.
Refere a data e o local de produção das obras de arte das figuras - A e B.
Indica as dimensões (altura, largura e comprimento) das obras de arte das figuras - A e B.
Enuncia os suportes em que foram produzidas as obras de arte das figuras - A e B.
Descreve os elementos representados nas obras de arte das figuras - A e B.
Enuncia o(s) período(s) histórico(s) em que se produziram as obras de arte das figuras - A e B.
Indica as caraterísticas mais importantes das obras de arte apresentadas nas figuras - A e B.
Comenta a seguinte frase: “A aversão aos estrangeiros que se verifica nos nossos dias é contrária à defesa dos Direitos Humanos e ao diálogo intercultural”.
Num mundo crescentemente marcado por conflitos e violências, neste momento de vivência e de convívio com a pandemia do COVID-19, muito temos a aprender com a experiência de aculturação e de interculturalidade com os portugueses dos séculos XV a XVIII. Não será por acaso que a ONU, nesta presente conjuntura do início do século XXI, está a ser liderada por António Guterres, um profundo conhecedor da estratégia do diálogo intercultural.
Na aprendizagem intercultural do pintor Nuno Gonçalves, nos Painéis de São Vicente, são manifestos os seus conhecimentos empíricos das novidades e das técnicas das pinturas flamengas e italianas Quinhentistas. Apesar do grande desconhecimento sobre esta obra emblemática do MNAA, recentemente a iniciar o seu o restauro, devido a ausência de documentação histórica que nos forneça provas para muitas das questões e das teorias que rodeiam esta obra-prima da pintura portuguesa do Renascimento, muito temos a aprender.
Através da observação atenta desta pintura emblemática, verificamos a vivacidade das cores, a utilização da técnica a óleo e o rigor no realismo empregue na representação das vestes e da construção de figuras em vários planos, dando-nos a noção de um espaço tridimensional e de um forte realismo nos drapejamentos. Constatamos, assim, a aprendizagem do pintor com os autores flamengos e italianos. Terá estado na Flandres? Terá conhecido Van Eyck em Portugal?
O objetivo do pintor Nuno Gonçalves foi o de representar a nação portuguesa nos seus vários estratos sociais em volta de um Santo. É, ainda hoje, um símbolo da identidade nacional portuguesa do tempo da gesta dos Descobrimentos Marítimos. Será que a expressividade tensa das fisionomias das figuras desta obra significará a unidade nacional perante o desafio das descobertas marítimas em curso em meados do século XV ?
Verificamos as trocas interculturais entre os portugueses e os povos do mundo com que contactámos, entre os séculos XVI e XVIII, através dos Biombos Namban e mediante a apresentação de diversas outras peças artísticas do Museu Nacional de Arte Antiga.
Na apresentação descritiva da Visita Guiada em relação aos Biombos, que apresentamos no "link" em cima, vemos representados: o arcabuz transmitido pelos portugueses aos japoneses; os elefantes desconhecidos pelos japoneses; os óculos dos portugueses que causaram intensa estranheza aos nipónicos; as cadeiras chinesas utilizadas pelos portugueses em terras nipónicas; as igrejas cristãs de estilo japonês, fruto da evangelização dos missionários jesuítas; a admiração dos japoneses pela habilidade “trapezista” dos marinheiros lusos; os animais “exóticos” como os cães perdigueiros que os nipónicos desconheciam, etc.
Por outras palavras, fruto da globalização, encetada pela expansão marítima portuguesa, assistimos ao diálogo de culturas com o capitão-mor português a transportar à cintura duas espadas de samurai, o transporte no cortejo de mercadorias pelos portugueses de objetos com influências formais de múltiplas regiões do mundo ou, ainda, o esforço de adaptação dos jesuítas portugueses aos costumes japoneses, conseguindo a conversão de muitos habitantes locais, como surge representado numa figura de um nipónico vestido de jesuíta.
Igualmente no Museu Nacional de Arte Antiga encontramos múltiplos exemplos artísticos de interculturalidade formal, como deu a conhecer a historiadora Maria de Lourdes Riobom. Desde o Saleiro do Benim em que surgem os portugueses vistos pelos africanos, o contador mogol onde surgem representados portugueses e asiáticos; o cofre oriental, inspirado nos baús portugueses de viagem e reproduzindo uma estampa de A. Dürer que representa figuras da Sagrada Família, compaginando anjos vestidos de acordo com os costumes nativos e pastores trajados à portuguesa ou a pintura do Inferno, de autor português Quinhentista, anónimo que apresenta o Diabo como um Índio.
Em suma, verificamos que a aculturação, a interculturalidade e a aprendizagem com o “outro”, entre os portugueses e os povos contactados, nos permitiram no início do contexto da globalização oferecer “novos mundos ao mundo”, desde o século XVI, através do diálogo intercultural que permeia múltiplas peças do rico espólio artístico do Museu Nacional de Arte Antiga.
Esta doença infecciosa, conhecida por COVID-19, detectada primeiramente na China, continua a expandir-se para outros países, como em Itália onde apareceu no dia 31 de janeiro de 2020 ou nos Estados Unidos da América, que confirmaram o primeiro caso no dia 24 de fevereiro deste ano ou em muitos outros os países em que foi sendo diagnosticado, tornando-se uma pandemia reconhecida pela Organização Mundial de Saúde.
Em Portugal, o primeiro caso foi diagnosticado no dia 2 de março de 2020, encontrando-se ainda em crescimento a sua difusão, bem como no mundo com o surto pandémico a acelerar o seu ritmo de expansão estatística, de acordo com os dados da Organização Mundial de Saúde.
A resistência que houve em França e em outros países, durante a segunda guerra mundial, foi um dos fatores fundamentais para a vitória das forças aliadas sobre os nazis. A resiliência psicólogica e física irá ser fundamental para os portugueses, os europeus, os brasileiros e muitos outros povos do mundo nesta batalha contra esta pandenia do Coronavírus 2019 (COVID-19) e que, neste momento, tem o seu epicentro na Europa.
Chama-se a este fenómeno de resistência coletiva estabelecido em Portugal pelo Estado de Emergência isolamento social profilático, mas é preciso resiliência para não se cair no desânio ou na depressão perante notícias mais alarmantes. É um conjunto de três elementos que é fundamental para garantir a resistência/resiliência perante a evolução ciclópica desta pandemia em Portugal, na Europa e no mundo. Iremos, então, referir estes 3 elementos cruciais para a sanidade psíquica, física e sanitária dos milhões de cidadãos, que em Portugal, na Europa e no mundo se encontram em isolamento social nas suas habitações (#ficaemcasa).
Em primeiro lugar, apenas a unidade espiritual e as solidariedades coletivas em termos familiares, fraternais entre comunidades de amigos, patrióticas, lusófonas e europeias nos poderão garantir o ânimo para enfrentar este isolamento social imposto em muitos países do mundo e, em particular, na Europa.
A Inglaterra que resistia a tomar medidas tão drásticas, acabou de decretar este mesmo isolamento social profilático. Nesta era digital, apesar da sobrecarga das plataformas de comunicação, a internet e os “smartphones” tornaram estas atitudes mais fáceis de realizar. As solidariedades patenteiam-se nas compras que os vizinhos mais novos fazem aos vizinhos mais velhos e as palavras de conforto que trazemos uns aos outros através destes meios digitais.
Em segundo lugar, apenas com uma fé transcendental ou com uma forte convição espiritual, num retorno necessário às humanidades e às revistas culturais, aos livros e à “cultura online”, se conseguirá vencer este inimigo invisível, que anda por aí devido à globalização social que facilitou a inesperada circulação de pessoas numa escala planetária, com viajantes de todas as nações e de vários grupos sociais.
As humanidades, num indispensável retorno do mundo à metafísica, permitirão perceber que esta crise imeniente irá fazer tomar consciência às pessoas, aos governantes e às empresas sedentas do lucro fácil, especulativo, de que o abismo climático estará à nossa porta dentro de algumas décadas, neste século XXI.
O maravilhoso mundo novo, numa alusão a uma obra-prima de denúncia simbólica do escritor Aldous Huxley, que nos prometiam os positivistas e os neopositivistas do progresso constante, como foi o ingénuo caso de Francis Fukuyama, não passou de uma ilusão de ideólogos tecnocráticos.
Assim, unicamente com a complementaridade das visões tecnocráticas e das visões humanistas será possível construir um mundo melhor para as próximas gerações, pois, caso contrário, a Humanidade irá de colapso em colapso até ao seu próprio extermínio. É imperioso cuidar da “nossa casa comum”, como nos diz o Papa Francisco, com um espírito mais franciscano e mais afastado da teoria dos interesses.
Em terceiro lugar, emerge o papel da ciência médica e da indústria farmacêutica na busca de novos métodos de tratamento, de cura e de uma vacina para prevenir os novos surtos de COVID-19, que poderão aparecer ainda em final de 2020 ou início de 2021. É absolutamente vital a investigação laboratorial humanitária, da China, dos Estados Unidos e da Alemanha, em prol de tod@s os cidadãos do mundo, uma vez que poderá ser primordial para reduzir vítimas letais deste surto pandémico e minimizar grandes efeitos colaterais na economia.
Estão a revelar-se autênticos heróis os trabalhadores do Sistema Nacional de Saúde dos países europeus e do mundo, eventualmente, onde haja estruturas sanitárias semelhantes, pois o mundo foi apanhado desprevenido com este surto pandémico e apenas o esforço humanitário e o sacrifício suplementar da comunidade médica, de enfermeiros, de auxiliares de ação médica, de farmacêuticos e de fornecedores de bens essenciais tem conseguido responder com dificuldade ao crescimento exponencial de casos por todo o mundo, cifrando-se em mais de 350 mil de pessoas infectadas a nível global, embora a batalha esteja a ser muito dura, particularmente em Itália e em Espanha, nesta fase no fim do primeiro trimestre de 2020.
O problema continua a ser que a economia está baseada em pantanosos alicerces financeiros, que apenas desvirtua a economia real e a torna muito mais vulnerável aos golpes fraudulentos dos detentores de grandes fortunas e à fuga de capitais para maléficos paraíses fiscais, que garantirá mais desigualdades sociais no mundo, como o anunciam os relatórios PNUD da ONU.
Neste âmbito financeiro, foi positiva a decisão da Comissão Europeia, anunciada por Ursula Von Der Leyen, de que os países europeus da União Europeia passavam a usufruir de uma flexibilidade orçamental com a exclusão da regra de um máximo de défice orçamental de cada país de 3%, no decorrer desta conjuntura pandémica.
Em suma, nesta conjuntura de guerra contra esta pandemia, impõe-se uma resistência coletiva com um isolamento das famílias e das pessoas infetadas para se estancarem as correntes infecciosas, que circulam nas nossas sociedades neste mundo global. Unicamente mediante esta resistência coletiva, a que apelou Winston Churchil com o seu famoso discurso, do início da segunda guerra mundial, de “sangue, suor e lágrimas” face ao inimigo nazi, em 1940, será possível vencer este terrível inimigo invisível que é o Coronavírus 2019 (COVID-19).
No contexto histórico da crise de valores, que tem perpassado as nossas sociedades, desde o início do século XX, tal como explanei em artigo da revista Brotéria[1], e face aos desafios da globalização e da rápida transformação que tem gerado novas desigualdades sociais no mundo e no país, compreendemos plenamente a urgência da implementação da Estratégia Nacional da Educação para a Cidadania, mas, paradoxalmente, temos de perceber que as mudanças das práticas pedagógicas, sendo fundamentais, terão de ser paulatinas para serem consistentes.
Nas sociedades contemporâneas dois vetores têm gerado crescentes faltas de civismo bem visíveis nos cidadãos e nos nossos jovens, naquilo a que o Professor José Filipe Teles de Matos chama “déficit cívico”: a importância desmesurada dada aos direitos em detrimento dos deveres, quando partindo do conceito implícito de cidadania de Turner (1993) estes terão de andar a par e a crescente reivindicação de que todos os indivíduos são iguais na sociedade.
Também hoje, no seio das concorrenciais sociedades globalizadas manietadas por nefastas políticas neoliberais, os valores universais da Solidariedade, da Tolerância, da Participação, da Gratuitidade e do Diálogo permanente estão a ser postos de lado por uma maioria dos cidadãos e, sem isso, a segurança global climática e a paz no mundo encontram-se num risco maior do que nunca. O vício instalado de correr atrás do vil dinheiro em detrimento dos valores está a tornar as sociedades contemporâneas profundamente desumanizadas.
O “déficit cívico” advém da falta de tempo dos pais para educarem os filhos nas nossas sociedades e do facto de muitos pais não se cultivarem nas virtudes (Aristóteles), não se tornando assim modelos de referência. Só derrubando estes muros de egoísmo e dando gratuitamente tempo aos outros é possível cumprir “uma cidadania ativa e altruísta” como nos pede Sua Eminência o Cardeal-Patriarca D. Manuel Clemente.
Num momento em que na democracia portuguesa se revelam elevados níveis de indiferença cívica, com indicadores de mais de 50% de abstencionistas nas eleições legislativas de 2019, cada vez em maior número desde o fim do século XX, a cidadania encontra-se em crise.
No atual quadro local, nacional e global, a cidadania ativa implica uma consciência da complexidade do mundo contemporâneo e a aquisição de competências para o seu entendimento e para a sua participação efetiva. As recomendações da UNESCO de 2015 suscitaram a reintrodução da Educação para a Cidadania nos Currículos nos finais da segunda década do século XXI no nosso país.
Em conformidade com o Desp. N.º 6173/2018, de 10 de Maio, define-se a necessidade das crianças e jovens necessitarem de formação formal para o exercício de condutas cívicas em sociedades ocidentais em que crescem exponencialmente os fenómenos de indiferença perante o próximo, porque urge que os futuros cidadãos saibam com sentido de responsabilidade assumir os seus deveres e reivindicar os seus direitos. Numa sociedade que proclama constitucionalmente o direito de todos a terem uma habitação condigna causa profunda indignação a situação confrangedora dos sem-abrigos, que habitam as cidades de Portugal e muitas cidades das sociedades ocidentais.
Não obstante, a Assembleia Geral da ONU, nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável em 1966, tenha pretendido acabar com a pobreza, proteger o ambiente e promover a prosperidade e o bem-estar de todas as pessoas, a verdade é que a sua concretização está muito longe de serem alcançados com a oculta ditadura dos mercados financeiros.
As grandes questões de atualidade do nosso mundo global decorrem da emergência climática, assinalada pela nova Comissão Europeia liderada por Ursula von der Leyen, e pelas crescentes desigualdes sociais dentro dos países e entre países, assim como temos assistido às migrações de populações que atravessam o Mar Mediterrâneo em condições de grande precariedade. Só revalorizando as virtudes cardeais (a prudência, a justiça, a fortaleza e a temperança), não numa perspetiva excessivamente aristotélica, se conseguirá mobilizar os cidadãos para uma participação responsável e gratuita no sentido de formar nos jovens condutas cívicas para responderem a estas problemáticas emergentes.
De quatro concepções de cidadania possíveis (comunitarista, cívico-republicana, neoliberal e socióliberal)[2] perante as problemáticas vigentes nos nossos dias, as duas últimas estão na moda, mas revelam-se ineficazes para enfrentar os ingentes desafios globais que temos pela frente. Talvez, só um compromisso das duas primeiras concepções possa tornar possível romper as redes de indiferentismo social, como nos alerta Sua Santidade o Papa Francisco, e ajudar na promoção dos laços de solidariedade e de responsabilidade coletiva rumo a um mundo mais justo e socialmente mais sustentável.
O mundo que nos rodeia está cada vez mais repleto de multimilionários sem escrúpulos e de pessoas sem abrigo que os Estados demonstram dificuldade em combater, porque as redes de offshores e de planeamentos fiscais das grandes empresas escondem verbas essenciais à missão dos Estados Sociais no ocidente.
Num mundo dominado pela sensação da insegurança coletiva (emergência climática, proliferação das armas nucleares - veja-se o primeiro vídeo deste "post"-, vulnerabilidade dos mercados financeios) só uma participação responsável de tod@s com a luta pela defesa dos nossos direitos e o cumprimento das nossas obrigações e deveres garantirá um ambiente de paz e de tranquilidade na sociedade.
Esta insegurança tem feito crescer as espiritualidades e as terapias orientais (o ioga, o reiki, o budismo, a meditação, o tai chi chuan, o chi kung, as artes marciais, a acupunctura, o shiatsu, a medicina tradicional chinesa, etc)[3] no seio do mundo ocidental, demasiado apegado aos valores do materialismo e do consumismo. Só a segurança dos valores interiores e morais nos podem dar a força para confrontar o turbilhão ciclópico de mudanças e de incertezas que pairam nesta sociedade global do fim da segunda década do século XXI.
Hoje somos confrontados com riscos alargados ligados às crescentes catástrofes naturais, às inúmeras vulnerabilidades económicas e sociais, aos inúmeros conflitos escolares, às manifestações de terrorismo, de forma que unicamente consciências cívicas individuais e coletivas nos podem salvar deste abismo de que já nos falava nos anos 80 do século XX E. F. Shumacher no seu livro Small is beatifull. Dizia-nos ele, num texto de grande atualidade: “(...) De longe bem maior é o capital fornecido pela natureza – e nós nem sequer o reconhecemos como tal. (...) é um erro absurdo e suicida. (...)”[4]
Os Direitos Humanos constituem a base da cidadania, porque só a defesa dos Direitos Humanos internacionalmente consagrados desde o pós-guerra, nas suas diferentes gerações (1ª, 2ª, 3ª e 4ª) pelos Estados de Direito através das Constituições permite a promoção da paz e do bem-estar coletivo, mas perante os desafios e a complexidade da conjuntura internacional global como a guerra comercial EUA-China e o avanço dos populismos no mundo colocam-se obstáculos à universalidade dos Direitos Humanos cada vez mais difíceis de superar.
Daí o papel que as pessoas têm e terão, designadamente os jovens em particular num mundo à beira do abismo. Só as sinergias das Constituições ocidentais, da ação dos cidadãos e dos jovens, que começam a tomar a liderança das questões ambientais globais, das instituições supranacionais da UE à ONU poderão garantir um mundo mais justo. Deste modo, unicamente através da formação dos jovens e dos adultos em questões cívicas será possível tentar romper com as constantes violações com as quais nos confrontamos diariamente no país e no mundo.
O nosso papel de professores, de pais e de cidadãos passa por exemplificar com boas maneiras cívicas e suscitar a informação, a vontade de pesquisa e o espírito crítico, para que os nossos jovens possam ter a consciência e a vontade de agir na sociedade com condutas construtivas afastadas das atitudes violentas que proliferam em meio escolar e em alguns meios sociais.
Como afirmava António Sérgio, em 1915, o papel do professor não se pode resumir a ensinar a resolver problemas de Matemática ou de outra disciplina, mas também a enfrentar os problemas sociais e cívicos para que possam cumprir as suas obrigações de cidadãos[5], quando chegarem à idade adulta, ou como nós diremos no fim da escolaridade obrigatória. Todavia, convém lembrar que as mentalidades mudam muito paulatinamente, como sublinhava com assertividade António Sérgio[6], no início do século XX.
“Esta é a madrugada que eu esperava O dia inicial inteiro e limpo Onde emergimos da noite e do silêncio E livres habitamos a substância do tempo” “25 de abril”, in Sophia de Mello Breyner Andresen, O Nome das Coisas
“Quando a pátria que temos não a temos
Perdida por silêncio e por renúncia
Até a voz do mar se torna exílio
E a luz que nos rodeia é como grades”
“Exílio”, in Sophia de Mello Breyner Andresen, Livro Sexto'
Sophia de Mello Breyner Andersen foi uma grande poetisa portuguesa do século XX, que recebeu o Prémio Camões em 1999 e que, postumamente, recebeu uma homenagem em 2014 com a transladação do seu corpo para o Panteão Nacional.
Nasceu, no Porto, a 6 de novembro de 1919, às 11 horas da manhã, no seio de uma família burguesa, sendo os seus pais Maria Amélia de Mello Breyner e de João Henrique Andersen. Viveu com os seus pais, na Quinta do Campo Alegre, no que é hoje o Jardim Botânico do Porto. Pelo que, neste ano de 2019, Portugal e o mundo lusófono, celebram o Centenário do seu nascimento.
Iniciou os estudos no Colégio Sagrado Coração de Jesus, tendo recebido uma educação moral cristã, no seu ambiente aristocrático familiar, pelo que, alguns anos mais tarde, se tornou dirigente de movimentos universitários católicos durante a frequência do curso, em 1939-1940, de Filologia Clássica na Universidade de Lisboa, que acabou por não terminar. Contactou com poetas influentes, como Ruy Cinatti e Jorge de Sena, ao colaborar na revista Cadernos de Poesia.
Veio a ter um posicionamento político relevante como católica progessista ao denunciar os defeitos do regime Salazarista e os seus apaniguados, tendo escrito uma Cantata da Paz como canção de intervenção oposicionista ao regime.
Deste modo, Sophia teve uma intervenção cívica assinalável, como oposicionista, no regime do Estado Novo ao denunciar o regime autoritário, conforme consta do apoio, em 1958, à candidatura presidencial do general Humberto Delgado e ao integrar movimentos católicos contra o Salazarismo, tendo assinado a Carta dos 101 Católicos contra a guerra colonial e o apoio da Igreja Católica à política Salazarista. No mesmo espírito de independência, de liberdade e de democracia apoiou a independência de Timor-Leste, já durante o regime democrático português, que se concretizou no ano de 2002.
Em 1946 casou-se com Francisco Sousa Tavares, jornalista, político e advogado, tendo o casal 5 filhos, entre eles salienta-se Miguel Sousa Tavares, conhecido jornalista e escritor. Os filhos inspiraram-na a escrever contos infantis.
Em 1964 recebeu o Grande Prémio de Poesia atribuído pela Sociedade Portuguesa de Escritores. No período democrático, a seguir à revolução de 25 de abril de 1974 foi deputada constituinte, em 1975, eleita pelo Partido Socialista no círculo do Porto.
Celebrizou-se com o livro de contos intitulado Contos Exemplares e com livros infantis como A Menina do Mar, O Cavaleiro da Dinamarca, A Fada Oriana, entre outros. Traduziu, para português, obras de autores clássicos como Eurípedes, Claudel, Dante Alighieri e Shakespeare. Em vida, foi homenageada com um Doutoramento Honoris Causa em 1998, na universidade de Aveiro, e com o Prémio Rainha Sofia em 2003.
Viria a falecer com 84 anos, em Lisboa, a 2 de julho de 2004. Seria homenageada, postumamente, com a integração dos seus restos mortais no Panteão Nacional, em 2014, e com a inscrição dos seus poemas marítimos, em 2005, no Oceanário de Lisboa.
A sua obra poética recorre à sua memória afectiva como fonte inspiradora, descrevendo as suas casas e os seus objectos familiares, partindo assim da vivência para a criação literária, pelo que a sua obra está recheada de uma grande carga autobiográfica.
A poesia é para Sophia o valor transformador da vida. Habituou-se, sobretudo, a escrever de noite quando a concentração no seu objeto literário era plena. Evidenciou cedo, aos 3 anos de idade a sua propensão poética, ao recitar num serão natalício em família o poema “Nau Catrineta”.
Na criação literária realçam-se como temas fundamentais da sua poesia a vivência juvenil e estudantil, a natureza e os seus elementos simbólicos (as árvores, os pássaros, o luar, a praia, as ondas, etc) como motivos bucólicos de inspiração mas, como tema contrastante de aversão permanente, surge a cidade como espaço de interação fria e desumanizada. O tempo é, também, tema de reflexão poética da autora.
Há, na obra de Sophia, um culto da literatura clássica e, em particular, da arte e da cultura gregas, visíveis em obras como O Rei de Itaca, Os Gregos, Soneto de Eurydice, Crepúsculo dos Deuses, entre outras.
Fernando Pessoa foi um poeta referencial para a autora, convergindo com ele na influência de Platão, nas memórias afectivas, na importância concedida ao sebastianismo e ao messianismo.
Contam-se como valores fulcrais, que sobresssaem na sua poesia, a busca da justiça e do equilíbrio, o pendor moral na ação quotidiana, a consciência da contemporaneidade, o amor como dinâmica da ação, os ensinamentos clássicos e da Civilização Helénica, o idealismo platónico, o individualismo psicológico, o humanismo cristão e a crença messiânica.
A sua obra literária encontra-se traduzida em várias línguas, tendo uma linguagem poética simples, intimista, baseada no paradigma da cultura helénica, em que evoca nos seus poemas objetos, seres vivos e míticos, os tempos e os dias na sua singeleza. A autora escreveu, ainda, contos, artigos, ensaios e peças de teatro. Entre as dezenas de livros que publicou contam-se como os mais conhecidos de poesia: Dual (1972 e 1986), O Nome das Coisas (1977); Mar (2001) - antologia organizada por Maria Andresen de Sousa Tavares; Orpheu e Eurydice (2001).
Os poetas do seu tempo e os críticos literários portugueses como Eduardo Prado Coelho, Álvaro Manuel Machado, David Mourão-Ferreira e Jorge de Sena foram unânimes em considerar que a poesia de Sophia está repleta de uma sabedoria que se expressa com enorme simplicidade e originalidade, na senda do paradigma cultural clássico, mas profundamente inspirada pelo seu espírito platónico, guiado por uma intensa cultura humanista e por uma defesa intransigente da liberdade.
Em suma, Sophia fez da poesia a trave-mestra da sua vida e converteu a sua ação pública em fulgores poéticos de intervenção cívica.
Existe uma forte necessidade de um pacto de regime na educação em Portugal, desde o início do regime democrático pós-25 de abril, pois as constantes mudanças no sistema de ensino não permitem a estabilidade pedagógica, docente e curricular, num sistema crucial para o desenvolvimento do povo português. Costumo dizer que as políticas educativas estão em constante mutação, seja de tendência de direita ou de esquerda, mas as práticas pedagógicas permanecem.
Neste inovador projeto do Ministério de Tiago Brandão Rodrigues, criam-se novas metodologias de aulas temáticas para promover a interdisciplinariedade, mas poderá ser um pouco mais difícil a sua operacionalização. Na matriz curricular elaborada, criam-se duas novas disciplinas: a disciplina de Cidadania e Desenvolvimento e a de Tecnologias da Comunicação e Informação e redistribuem-se os tempos das diversas disciplinas. Deste modo, a direita esvazia o valor da Cidadania e a esquerda reintegra-o, no pressuposto da inclusão social.
Como o executivo socialista, sob pressão do primeiro-ministro António Costa, não optou por uma reforma curricular profunda, propondo antes que as disciplinas se regulassem por “matérias essenciais”, o que constitue uma reforma curricular “encapotada”, mas torna os programas disciplinares mais incoerentes nas estruturas curriculares vigentes. Este projeto, em ano de concurso nacional interno de docentes, coloca dificuldades adicionais à sua implementação.
Este projeto de flexibilidade e autonomia curricular inspira-se no modelo finlandês de organização das aulas em volta de temas multidisciplinares, que resultou de uma maturação reflexiva prévia e não de um impulso reformista momentâneo. Contudo, em Portugal, o Ministério da Educação, como não quer impor um modelo fechado e abre a porta a um projeto-piloto em algumas escolas, delega nestas a responsabilidade das suas concretizações. Esta modalidade descentralizada, de implementação de aulas temáticas, vai ao arrepio da tendência centralista do sistema de ensino português.
Os princípios educativos da transversalidade das competências e da utilização de um conhecimento muldisciplinar são universalmente válidos, mas a questão está na sua operacionalização, a partir de um dado sistema educativo concreto, neste caso do português. Não obstante, existem inconsistências no discurso de fundamentação da filosofia educativa, porque o executivo assegura que se pretende uma flexibilização pedagógica e que a carga horária não é revista. Porém, dado que as manchas horárias serão reajustadas pelas escolas até 25%, tal poderá não acontecer em várias situações. No nosso país, as aulas temáticas irão constituir uma responsabilidade dos professores.
A implementação será desenvolvida dentro de um projeto-piloto, aplicado em mais de 150 agrupamentos de escolas, com vista à experimentação das novas metodologias pedagógicas e dos esquemas de organização curricular das diferentes escolas.
De facto, os estabelecimentos de ensino públicos e privados aderentes ao projeto-piloto passam a ter manchas curriculares heterógeneas, em função do princípio da autonomia, o que poderá criar situações de desigualdade social, mas também potenciar novos processos de aprendizagem. Pretende-se, assim, que os alunos saibam relacionar os conhecimentos das diversas disciplinas com o recurso a aulas temáticas.
A versatilidade curricular traduz-se no facto dos alunos do ensino secundário terem oportunidade de frequentarem outras disciplinas, além das pertencentes ao seu curso. Todavia, esta reforma educativa é parcelar, pois à flexibilização pedagógica não corresponde uma revisão integral curricular e programática.
Para contornar este problema, esta flexibilização pedagógica indica a necessidade da definição de “matérias essenciais”, o que configura uma revisão informal programática pela impossibilidade legal de realizá-la nos prazos estipulados pelos normativos, mas esta escolha tem, concomitantemente, a vantagem de evitar novas alterações dos manuais escolares.
O sucesso deste projeto-piloto irá depender, mormente, da capacidade dos professores trabalharem em articulação colaborativa num método transversal nas aulas temáticas. Não existem diretrizes rígidas para a sua concretização, sendo os professores deixados, pela tutela, praticamente em autogestão.
O princípio de investir nas competências transversais, através da iniciativa autonómica das escolas, é teoricamente positivo. Assim, o reajustamento do sistema de ensino português passou por evitar uma reforma curricular formal, dando esse encargo às escolas que aderiram ao projeto-piloto e apenas se definiram “matérias essenciais” para evitar tocar a fundo nos programas das disciplinas, o que permite ultrapassar os constrangimentos temporais indicados pelos programas oficiais.
Em suma, o sucesso deste projeto de autonomia e flexibilidade curricular irá depender da operacionalização dos professores, apesar dos princípios da multidisciplinariedade e das aulas temáticas sejam teoricamente muito interessantes pela abordagem de assuntos de atualidade de uma forma transversal permitindo aos alunos uma visão global. A Finlândia no seu modelo, que irá inspirar esta tentativa de inovação do sistema de ensino português, procurou ainda valorizar e dignificar mais a carreira docente, pelo que esperamos que também isto suceda em Portugal.
Anselmo Braamcamp Freire notabilizou-se na História de Portugal como historiador, genealogista e político, na transição do século XIX para o XX. Nasceu, em 1849, no seio de uma família aristocrática de matriz liberal, tendo revelado uma mentalidade versátil, embora sempre cioso de uma, invulgar, seriedade cívica. Esta forte consciência cívica terá sido, certamente, fortalecida pela sua grande formação humanística. Sendo este aspecto um exemplo que os nossos autarcas devem tomar em linha de conta.
Foi um mecenas de investigações históricas, com a imensa fortuna que herdou, tendo fundado a revista Arquivo Histórico Português e publicado uma vasta obra historiográfica, de que sobressaem os títulos Brasões da Sala de Sintra, Crítica e História e Armaria Portuguesa.
Neste papel de investigador e de divulgador da História da Pátria emergiu, também, como figura central em diversas efemérides comemorativas (I Aniversário da República, V Centenário da Conquista de Ceuta e IV Centenário da morte de Afonso de Albuquerque), como membro destacado da Academia das Ciências de Lisboa atribuíram-lhe a incumbência de publicar a importante obra documental Portugaliae Monumenta Histórica.
O seu prestígio foi ainda, socialmente, acrescido na qualidade de fundador da Sociedade Portuguesa de Estudos Históricos e de sócio correspondente da Royal Historical Society of England.
No final do século XIX, iniciou uma carreira política no Partido Progressista convicto do ideal liberal, no regime monárquico, herdado do seu inspirador tio – Anselmo José Braancamp. Assim, foi designado por carta régia Par do Reino em 1887. Nos últimos anos do século, já filiado no Partido Progressista, foi eleito Presidente da Câmara Municipal de Loures. No entanto, revelou, desde cedo, uma independência de espírito que se compaginava mal com o sectarismo partidário, tendo lutado contra os enredos de compadrio no decurso das suas gestões autárquicas.
Na viragem de século lamentou a ignorância larvar da população portuguesa, assacando, nos seus escritos, como sintoma claro da decadência nacional o desinteresse geral a que os seus contemporâneos votavam os estudos históricos, daí que nas décadas seguintes tenha sido um propulsor da curiosidade histórica colectiva.
No início do século XX, Anselmo Braamcamp Freire fará uma mudança política substancial, pois os seus estudos históricos e a sua experiência política levaram-no a uma visão céptica em relação às virtualidades do regime monárquico, aderindo ao ideário Republicano, no contexto do autoritarismo de João Franco em 1907.
Deste modo, ganhou as eleições à Câmara Municipal de Lisboa, em 1908, à frente das hostes Republicanas, tornando-se Presidente da edilidade e evidenciando-se como um administrador eficaz e um tenaz combatente das teias da corrupção e do compadrio, garantindo, concomitantemente, a resolução de muitos problemas camarários (o abastecimento alimentar, os transportes, a iluminação, o saneamento, etc.) sem endividamentos crónicos como era incomum na altura.
Esta ponderada gestão autárquica da coisa pública de profícuo zelo pelo bem comum deveria tornar-se um modelo para os nossos atuais governantes e autarcas. Dentro deste ideário Republicano defendeu, em 1908, a tese federalista e descentralizadora num Congresso Municipalista que acolheu como Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, ancorando-se nos conhecimentos históricos que bebeu de Alexandre Herculano.
Sob o novo regime Republicano foi deputado na Assembleia Constituinte em 1911 e Presidente do Congresso Republicano. Mais tarde, pelo seu prestígio, foi, também, Presidente do Senado e com um espírito ponderado tentou apaziguar as inimizades entre as diversas facções Republicanas, embora sem sucesso. Aliás, sentindo-se profundamente desiludido com o regime Republicano adere à Cruzada Nacional D. Nuno Álvares Pereira em 1918, ao perceber o caos a que a conflitualidade partidária Republicana estava a conduzir a pátria.
Por último, digamos que Anselmo Braamcamp Freire legou uma valiosa Biblioteca, de cerca de 10.000 volumes, e uma excelsa Pinacoteca, constituída por quadros de pintores afamados, à Câmara Municipal de Santarém.
O benemérito exemplo de dedicação e de serviço à causa pública alicerçado numa forte consciência cívica e numa sólida formação humanista devem servir de modelo para os autarcas e os políticos que querem ser reconhecidos pelos seus concidadãos. Entendeu que, sem uma forte consciência, de uma memória coletiva preservada e divulgada não havia possibilidade de romper com os sinais de decadência nacional que pululavam, daí que, no fim da sua vida, tenha integrado a Cruzada Nacional D. Nuno Álvares Pereira.
Com efeito, sem uma forte consciência da nossa memória histórica a identidade coletiva definhará e a salvação que se pretende pela mera gestão pragmática das contas públicas será um autêntico suicídio coletivo. Não se pode encontrar outra resposta, tal como Braamcamp Freire nos ensinou, que não seja compaginar orçamentos equilibrados com a promoção constante da memória coletiva para se forje em todos nós, concidadãos, uma exigente consciência Ética.
A greve traduz, por determinação sindical, uma suspensão do trabalho por decisão dos trabalhadores com vista à satisfação de reivindicações profissionais. Este meio reivindicativo resulta dos direitos fundamentais dos cidadãos que os regimes democráticos consagram, como está, aliás, expresso na atual Constituição da República Portuguesa, datada de 1976.
Houve grandes movimentos grevistas no fim da Monarquia Constitucional (1872, 1897 e 1904) e no período da 1ª República (1911-1912), onde a carestia de vida tornou exponenciais as ondas grevistas. Contudo, as greves do fim do século XIX e início século XX eram, sobretudo, de âmbito operário, mas com a erupção das classes médias em Portugal no último quartel do século XX surgem greves de outros grupos profissionais.
Na realidade, foi o reconhecimento legal do direito de associação que permitiu a consagração da greve como um direito, na segunda metade do século XIX, em Portugal (1864 e 1891). O tema do desencadear excessivo de greves gerou desde sempre reacções públicas. Contudo, verifica-se que os movimentos grevistas estão mais acesos em momentos de instabilidade política ou económica como foram os casos das múltiplas greves da 1ª República e das greves portuguesas da atualidade, designadamente neste ano de 2013.
Dos movimentos grevistas dos operários sobressai que deve ser utilizado como meio de reivindicação profissional e não como meio de luta político-partidária em contexto de pluralismo ideológico. No entanto, durante a Ditadura Militar e o Estado Novo as greves foram proibidas em diplomas legais de 1927, de 1934 e de 1958, precisamente quando os regimes políticos autoritários pressentiam que estavam a ser alvo de uma contestação social mais aguda.
O direito à greve implica que não há incumprimento dos trabalhadores pelo que não podem ser qualificados de “faltosos”. As greves desencadeadas por motivos profissionais feitas com ponderação e intermediadas por negociações dignificam a ação dos sindicatos. Consta terem sido Antero de Quental e José Fontana[1] os grandes impulsionadores da consciência dos operários para o direito à greve no fim do século XIX.
No período Marcelista, já no fim do Estado Novo, na segunda metade do século XX, desencadeou-se um forte movimento grevista de índole operária que coincidiu com a subida da inflação e a perda de poder de compra dos trabalhadores, a que reagiu o regime com recurso violento à intervenção da polícia de choque. Em junho de 1969, Marcelo Caetano permitiu alguma abertura sindical ao pôr termo à necessidade das direções sindicais serem homologadas pelo Governo.
No entanto, os sindicatos, descontentes com o regime político, alimentaram um ciclo imparável de greves nos anos de 1969 e de 1970 que apenas eram sustidas pela polícia de intervenção. Exemplo emblemático desta fase histórica foi a greve dos operários da Lisnave em novembro de 1969. A intensidade do ciclo grevista voltou a reacender-se em finais de 1973 até ao eclodir da Revolução do 25 de abril de 1974[2].
Em suma, o recurso à greve como recurso de legitimação de negociações na defesa dos direitos dos trabalhadores e dos cidadãos (de manutenção de postos de trabalho, de segurança salarial e de dignas condições de trabalho, etc) é absolutamente aceitável no plano da consciência Ética.
As atuais greves afirmam-se como legítimas no contexto internacional da “economia de casino”. Porquanto os Estados de Direito são prejudicados nesta conjuntura, com a falta de transparência do sistema financeiro global e a fuga ao fisco por parte dos grandes negócios através de paraísos fiscais, torna imoral grande parte dos défices dos Estados (adquiridos por vias especulativas), respeitadores dos Direitos Humanos, e legitimam, também, no plano da cidadania global as greves de muitos trabalhadores portugueses. Na verdade, as democracias do Ocidente estão em crise, porque não respeitam o pluralismo ideológico e propõem aos cidadãos uma cartilha de ideologia única imposta pela ditadura dos mercados financeiros (teocracia dos mercados).
[1] Maria Manuela Cruzeiro, “Greves” in Dicionário Enciclopédico da História de Portugal, Lisboa Publicações Alfa, 1990, p. 299-301.
[2] João Brito Freire, “Greves Operárias”, in Dicionário de História do Estado Novo, vol. I, coord. Fernando Rosas e J.M. Brandão de Brito, Venda Nova, Bertrand Editora, 1996, pp. 401-404.
É com grato prazer e noção da responsabilidade cívica, que recai sobre este projeto, que pretendo celebrar convosco a ultrapassagem, em fevereiro de 2013, dos 73 000 visitantes[1]. Afigura-se-me que a linha editorial deste blogue, que se configura como um espaço de cultura, de reflexão e de liberdade tem sido acolhida com agrado geral junto de um público frequentador das redes sociais. Não pretendo com este “post” proceder a uma análise quantitativa exaustiva, mas chamar a atenção para alguns dados estatísticos avulsos, não esquecendo, no entanto, que a apreciação qualitativa independente será feita por cada um de vós, caríssimos leitores.
É, contudo, com bastante satisfação que verifico um crescimento superior a 30% de visitantes no blogue, ao longo do último ano em comparação com o anterior. Assim, a média ponderada de visitas diárias, nos últimos 12 meses, aproxima-se das 100 e a mensal das 3000, o que significa um crescimento significativo que só é possível devido aos ecos, que tenho recebido de leitores, de amigos e de familiares, bem estimulantes para lhe dar continuidade. Este blogue tem coberto várias temáticas culturais e cívicas (literatura, história, religião, música, arte, cidadania global, ética pública, etc) desde 23 de julho de 2009, contando, neste momento, com cerca de 180 “posts” de tamanhos e de profundidades diversas num período de tempo que ultrapassa os 1250 dias.
A interatividade dos comentários tem permitido uma avaliação externa informal que tem possibilitado afinar pormenores e incitar novas reflexões, tal como as pertinentes e preciosas observações de amigos e de companheiros se revelam extremamente úteis e encorajadoras.
A estrutura deste blogue é composta por uma matriz estética clássica na organização formal, embora procurando aliá-la a um arrojo inventivo na formulação dos conteúdos ou na fundamentação interpretativa das posições sustentadas. Porventura, esta conciliação de valores que se complementam pela pluralidade de fazer “pontes” entre opções doutrinárias, mais dificilmente conciliáveis, justifique alguma difusão internacional e lusófona deste blogue. Ora, então, note-se a proveniência dos visitantes: 45% são originários de Portugal, 17% são originários dos EUA, 8% são originários do Brasil, 2% são originários de França, 1% são originários de Espanha e 1% são originários da Venezuela, sendo 26% dos visitantes de origem desconhecida.
Apetece-me citar o pensador Sócrates: “Não sou nem ateniense, nem grego, mas sim cidadão do mundo”, porque a nossa tarefa de reflexão consciente tem de partir de uma observação atenta das realidades culturais e sociais do mundo, globalizado, em que vivemos, para que o possamos transmutar de acordo com os nossos generosos princípios e convicções em direção a um mundo mais justo, mais pacífico e mais desenvolvido. Esta é, de facto, uma preocupação cívica essencial que preside à elaboração dos “posts” deste blogue. Contudo, reconheço que tem sido um prazer alimentá-lo, mas que tal não seria possível sem o estímulo de muitos amigos e leitores, que quero homenagear, pois compreendem e compartilham esta maneira de estar no mundo que exige uma informação criteriosa aliada uma forte consciência crítica, em conformidade com os pressupostos Humanistas em acreditamos.
João Domingos Bomtempo foi um pianista, compositor e pedagogo português que nasceu em Lisboa em 1775. Desde tenra idade recebeu as primeiras lições de música de seu pai, um músico italiano da Corte Portuguesa (Francesco Buontempo) e ingressou na Orquestra de Santa Cecília. A sua vida repartiu-se entre uma aprendizagem musical, junto das fontes clássicas, que o alçou a um inegável prestígio internacional e a uma clara manifestação cívica de intervenção política através das suas obras elogiosas do Liberalismo e do Patriotismo Português.
No início do século XIX junta-se em Paris, sob o impulso protetor do Barão do Sobral, a um grupo de exilados liberais, que se reuniram em volta do poeta Filinto Elísio, influenciando-o decisivamente. Possivelmente, terá sido numa das suas estadias no estrangeiro que aderiu à Maçonaria. Nesta cidade, depois de uma estreita convivência com pianistas famosos, como Muzio Clementi e John Field, publicou as suas primeiras obras para piano e escreveu sobre a nova técnica do teclado no livro “Elementos de Música e Methodo de Tocar Piano-Forte…” que, como estrangeirado, veio a influenciar o ensino da música portuguesa.
Ciente das excessivas “colonizações estrangeiras em Portugal”[1], decorrentes das invasões francesas e da ingerência inglesa ulterior, compôs na altura várias peças de tom patriótico, cansado destas intromissões estrangeiras na soberania nacional, de exaltação do brio patriótico em obras como Hino Lusitano; Requiem consagrado à Memória de Camões e com um novo Requiem (em coautoria) dedicado à Memória do General e Maçon Gomes Freire de Andrade, que conspirou contra a presença inglesa no país.
Após a Revolução Liberal Portuguesa de 1820 compôs obras entusiásticas do novo regime político, mas com o interregno governativo Miguelista foi perseguido e refugiou-se na Embaixada da Rússia durante vários anos. Na conjuntura da implantação do Liberalismo vintista empreendeu a benemérita fundação da “Sociedade Filarmónica”, em Lisboa, que promoveu a divulgação das suas obras e de compositores, de renome, como Haydn, Mozart, Hummel, Clementi e Beethoven. Com efeito, só com a vitória Liberal na Guerra Civil, D. Pedro IV o reabilitou, concedendo-lhe a Comenda da Ordem de Cristo e nomeando-o Diretor-Geral do Conservatório de Música.
Em conclusão, a sua vida é uma autêntica lição para os nossos dias, pois o progressismo político que patenteou nas suas composições musicais, podem ser inspiradoras, embora no quadro estético de um classicismo formal que as submerge. Na verdade, os artistas e os intelectuais continuam a ter esta nobre missão de fazer passar mensagens denunciadoras do pensamento único de um pragmatismo “alla Romana” como matriz ideológica desta Civilização Globalizada.
[1] Como salientava na época, lucidamente, Alexandre Herculano, na qualidade de consciência crítica da nação.
Os intelectuais afirmam-se como pessoas que valorizam as coisas do espírito e as faculdades de entendimento e numa época em que se sobrevaloriza a tecnicidade, “ipso facto” os intelectuais e os cientistas das áreas humanísticas e sociais são menorizados. Esta secundarização do papel dos intelectuais no processo da Globalização tecnocrática é nociva para o tratamento humanista das questões das sociedades contemporâneas, uma vez que temos que nos lembrar que os homens são seres multidimensionais que vivem tanto melhor quanto mais afinada for a sua qualidade de vida, que só é possível valorizando a inteligência emocional.
Deste modo, urge revalorizar o espírito, porque o homem como o reconheceram os velhos filósofos da “Hélade” são corpo e espírito e o contexto materialista só tem amesquinhado a natureza humana, daí as inúmeras sátiras que escritores e cineastas têm feito a este aspecto ao longo da História Contemporânea.
O caso Alfred Dreyfus, em França no fim do século XIX, recorda o papel dos intelectuais na defesa da justiça e da verdade. Em breves traços, direi que o capitão do exército francês foi injustamente acusado de ser um espião ao serviço do Império Alemão. Em 1894-1895 foi condenado e degredado para uma colónia francesa até que Émile Zola e depois Anatole France denunciaram perante a opinião pública tratar-se de uma acusação falsa por se basear em documentos forjados e facilitados, na aceitação da acusação, pelo facto do oficial ser judeu e existir um ambiente anti-semita muito forte em França. Foi acusado, erroneamente, duas vezes pela Justiça Militar (1894 e 1899) e só mais tarde foi amnistiado, mas ainda foi alvo de um atentado no funeral de Émile Zola. Deste acontecimento histórico sobressai o papel que os intelectuais podem e devem ter na defesa de valores éticos e de causas justas.
Afirmava o intelectual francês Raymond Aron que os intelectuais se deviam comprometer com causas políticas e mundividências ideológicas, porque ao contrário do que nos querem fazer crer os tecnocratas não há mentalidades assépticas.
É esta convicção que subjaz a todos os intelectuais, estou a lembrar-me de Jaime Cortesão sobre quem proferi uma comunicação no II Ciclo de Estudos de Homenagem a António Telmo a 30 de junho de 2012, que incomoda os tecnocratas e os pensadores da tecnocracia. Torna-se uma evidência que se tratarmos os cidadãos como números (estatísticas) e os alinharmos num pensamento ortodoxo é mais fácil a gestão colectiva em função dos interesses dos criadores do sistema tecnocrático. É este o grande paradoxo, da atualidade, da Globalização dos mercados financeiros que se querem impor como prepotentes ditadores à revelia do poder dos cidadãos.
Com efeito, o pensamento único da Globalização uniformizadora do sistema neoliberal tem procurado impor a conceção da inevitabilidade de que a sua verdade deve ser aceite sem discussão por todos os cidadãos com base no argumento de que as realidades do nosso mundo são complexas, dessa forma se justifica o poder concedido aos tecnocratas. Jaime Cortesão que sempre se postulou do lado da barricada da liberdade consideraria, certamente, se fosse vivo que este sistema era castrador e profundamente antidemocrático.
É esta a razão que tem feito arregimentar os jornalistas que têm perdido liberdade de expressão, porque passam a servir os grandes grupos económicos. Percebe-se, neste contexto, a crescente desvalorização a que têm sido votadas as Ciências Humanas e Sociais, nos currículos do Ensino Superior, Secundário e Básico, que passam na atualidade por uma crise resultante da sacralização das estatísticas dando primazia aos dados quantitativos em detrimento das reflexões qualitativas. Nesta medida, os defensores da tecnocracia têm amesquinhado a dignidade das democracias, porque têm reduzido o papel dos cidadãos e dos intelectuais.
Por conseguinte, só revalorizando o papel dos pensadores (Adriano Moreira, António Barreto, Agostinho da Silva, Eduardo Lourenço, Mário Soares, Marcelo Rebelo de Sousa, Edgar Morin, Noam Chomsky etc) será possível voltar a dignificar as democracias, porquanto garantirão melhor que ninguém a defesa das liberdades que é uma condição “sine qua non” da democracia. Em suma, os intelectuais constituem, no fundo, o último baluarte de defesa das liberdades de cidadania.
A Europa encontra-se num momento de uma clara depressão colectiva resultante da Crise da Zona Euro. No entanto, os resultados das eleições em França e na Grécia neste mês de maio reabriram o debate político na Europa. O dia da Europa, que tanto foi celebrado, em anos anteriores, foi um pouco esquecido – o 9 de maio.
Na realidade, as manifestações que têm decorrido pela Europa de descontentamento com as políticas excessivas de austeridade, a par dos resultados socioeconómicos desastrosos com o crescimento das taxas de desemprego e o aprofundamento da recessão económica desencadearam a vontade de mudança política das populações de França e da Grécia, embora neste país estas eleições possam apresentar sinais preocupantes. A receita draconiana da austeridade, sem promoção do crescimento económico, tem deixado a Europa de rastos.
Convém lembrar, neste conjuntura de abertura do debate político Europeu, a frase sensata de Sékou Touré, líder nacionalista africano, que disse certo dia: “preferimos a liberdade em pobreza, à riqueza em escravidão”. Eis aqui o busílis da questão. E como escreveu com muita lucidez Paul Ricouer é necessário um equilíbrio entre a ideologia e a utopia e, neste momento, a primazia do neoliberalismo está a retirar espaço de manobra para o sonho utópico que é um constituinte fundamental da natureza humana.
Importa mais do que nunca abrir janelas de oportunidade nesta conjuntura de crise colectiva do Velho Continente. Vamos, então, puxar pelos cordelinhos da Esperança que nos deve fazer transcender o dia-a-dia da mediocridade dos falsos Deuses dos dias que passam. A posição coerente de Mário Soares, na entrevista ao jornal i, estremeceu a pobreza do debate político português que se tem confinado à aceitação do neoliberalismo do descaracterizado PSD. Deste modo, Mário Soares chamou a atenção para a necessidade de salvar a ideologia socialista democrática, a social-democracia e o pensamento democrata-cristão ao invés de se insistir inutilmente num neoliberalismo que não conduz a Europa para os caminhos da Justiça e da Paz.
Não nos podemos olvidar das dívidas de gratidão da Alemanha para com a Europa e os EUA, pois se não fosse a 2ª Guerra Mundial os alemães não teriam podido desonerar o peso de uma máquina de guerra como nos lembra o Professor Adriano Moreira e, por outro lado, o êxito da reunificação alemã não teria sido tão fácil sem o apoio da Comunidade Europeia. Por conseguinte, o grande drama atual da crise da Zona Euro reside no facto das decisões unilaterais da Chanceler, Ângela Merkel, não terem resolvido os problemas angustiantes das populações Europeias, como acabou mesmo por agravá-los nos últimos tempos. Passámos do unilateralismo do Presidente Bush a uma vontade unilateralista do Diretório Franco-Alemão.
Com a eleição de F. Hollande abre-se uma janela de oportunidade para superar este maléfico unilateralismo. Tal como nos diz, de forma lúcida, José Correia Pinto no blogue “Politeia” é fulcral saber como pagar a dívida, mas ao mesmo tempo importa assegurar que os mecanismos perversos do mercado não a fazem crescer de forma injusta.
Em suma, só com a resolução do impasse desta encruzilhada Civilizacional da Europa será possível devolver a Esperança aos cidadãos e combater sem tréguas a Resignação e a apatia política que perpassam as sociedades contemporâneas do Velho Continente. É necessário que haja líderes Europeus capazes de mobilizar os cidadãos para que esta Depressão Colectiva não se transforme em autêntica resignação cívica.
Sophia de Mello Breyner Andersen (poema 25 de Abril)
José Manuel Tengarrinha, nascido em Portimão em abril de 1932, recentemente homenageado nos seus 80 anos, é um jornalista, um historiador e um político que se bateu sempre pela liberdade ao longo da vida. Como historiador tornou-se clássica e pioneira a sua obra História da Imprensa Periódica Portuguesa (Lisboa, Portugália, 1965), mas as suas investigações históricas abordaram também a temática política.
Há a salientar como obras incontornáveis A Revolução de 1820 – Manuel Fernandes Tomás, (Lisboa, Caminho, 1982), em que prefaciou e anotou o papel relevante deste revolucionário do liberalismo oitocentista e Movimentos Populares Agrários em Portugal, (Mem Martins, Publicações Europa-América) que lhe serviu de Tese de Doutoramento orientada pelo Professor Jorge Borges de Macedo em que abordou as contestações camponesas no período do Antigo Regime. Como obra de antologia de algumas das suas pesquisas históricas apareceu, nos anos 80, o livro Estudos de História Contemporânea de Portugal (Lisboa, Caminho, 1983).
Nas suas preocupações com os processos de legitimação democrática destacou-se na defesa da criação de círculos uninominais na eleição de Deputados, nos anos 90, e na elaboração da obra E o povo onde está ?: Política Popular, Contra-Revolução e Reforma em Portugal (Lisboa, Esfera do Caos, 2008). Dirigiu a obra História do Governo Civil de Lisboa (Lisboa, Governo Civil de Lisboa, 2002) e na sua qualidade de experiente jornalista escreveu o livro Imprensa e Opinião Pública em Portugal. Como derradeiro trabalho de fôlego historiográfico escreveu a volumosa biografia de José Estêvão: o Homem e a Obra (Lisboa, Assembleia da República ,2011), tendo terminado a sua carreira universitária como Professor Catedrático jubilado da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.
O seu apego à liberdade fê-lo participar no tempo do Governo de Marcello Caetano na Comissão Democrática Eleitoral, que liderou, constituída para participar nas eleições de 1969. Foi também no mesmo espírito de luta pela democratização do país que se entusiasmou com o III Congresso da Oposição Democrática de 1973 em Aveiro. Manifestou sempre a preocupação de que a política fosse uma manifestação das vontades populares, tendo propugnado por um regime que se construísse das bases sociais para as cúpulas dirigentes.
Foi, neste contexto, do combate político ao regime do Estado Novo que acabou por ser preso pela PIDE na prisão do Aljube. Após a revolução do 25 de abril de 1974 foi libertado por decisão da Junta de Salvação Nacional e pôde participar na fundação e na liderança do MDP/CDE – Movimento Democrático Unitário/Comissão Democrática Eleitoral. Deste modo, foi Deputado à Assembleia Constituinte em 1975-1976 e eleito para a Assembleia da República nas quatro primeiras legislaturas até 1987.
No dia 14 de abril de 2012 realizou-se um almoço de homenagem por ocasião do seu octogésimo aniversário, organizado por um grupo de amigos na FIL de Lisboa, que contou com uma Comissão Promotora onde estiveram nomes muito prestigiados da sociedade portuguesa, tais como: Ramalho Eanes, Mário Soares, Jorge Sampaio, Adelino Gomes, José Carlos Vasconcelos, André Freire, António Arnauld, António Almeida Santos, etc.
Oiçamos a entrevista a José Manuel Tengarrinha conduzida por José Manuel Rosenda difundida na Antena 1 da RDP.
Chegados com o vosso interesse, paciência e curiosidade às 40. 000 visitas importa fazer um breve balanço quantitativo deste nosso blogue, pois o balanço qualitativo deixo para outra ocasião ou, mesmo, para os vossos comentários. Por razões de comodidade farei arrendamentos, por aproximação, às unidades referidas. Já fiz cerca de 150 “posts” (textos) desde 23 de julho de 2009, data em que este blogue foi criado sob o estímulo de muitos amigos que já aqui tenho recordado. O blogue tem cerca de 265 comentários feitos por variadíssimos leitores, o que torna este um espaço aberto à reflexão e à discussão num ambiente de cordata amabilidade entre os diversos intervenientes.
Atualmente, o blogue conta com uma média de mais de 70 visitas diárias que variam muito no tempo de duração e com uma média mensal que ultrapassa as 2.000 visitas. Houve um salto quantitativo de 2010 para 2012, pois o blogue cresceu em média 50%, ao ano, passando de uma média mensal de cerca de 1000 visitas para as cerca de 2000 que se têm verificado no presente.
O blogue conta já com quase 1000 dias de existência e com cerca de 766 dias em que tem instalado um contador (sitemeter), que começou a funcionar a 12 de fevereiro de 2010. Este espaço de cultura, de reflexão e de liberdade, que é de todos, não seria possível sem o vosso inestimável e gratificante apoio, porque saber que estou a escrever para leitores amigos e interessados que compartilham muitas afinidades é um prazer redobrado.
49% das visitas são provenientes de Portugal, 31% têm origem desconhecida, 14% são oriundas dos Estados Unidos da América e 6% são originárias do Brasil. É interessante saber que 79% dos leitores lêem estes textos em português e 21% os lêem em inglês. Há visitantes, sobretudo, de três continentes: Europa, África e América, sendo mais raras as visitas da Ásia ou da Oceânia, mas já estão registadas algumas entradas esporádicas.
O interesse que este blogue tem recebido, com um exponencial crescimento do número de visitantes, tem tornado possível e tem acicatado muitas das minhas reflexões e investigações no âmbito de problemáticas ligadas à cultura, à cidadania e à atualidade do mundo em que vivemos. Foi, aliás, esta atividade, a par da atenção de vários leitores amigos, que tornou possível a minha colaboração em outros blogues (Milhafre – blogue do Movimento Internacional Lusófono e Mensagens do Agrupamento Damião de Góis – blogue da Biblioteca do Agrupamento Damião de Góis) e em duas revistas (Nova Águia – revista de Cultura e Brotéria – revista de Cultura Cristã), bem como o amável e estimulante desafio que recebi para proferir uma conferência inserida no II Ciclo de Estudos de Homenagem ao Professor António Telmo.
Este blogue, além de ser um espaço de opinião, procura ter uma dimensão de formação cultural nos temas que aborda pelas pesquisas que procuro ir desenvolvendo. Espero continuar a ter o prazer das vossas leituras interessadas, das vossas sugestões e dos vossos comentários. Bem-haja caríssimos/as amigos/as leitores/as!
O Jogging é um desporto barato, que se pode realizar praticamente em qualquer lugar, que se assume como libertador do espírito e das tensões musculares acumuladas no corpo humano, pois permite a diminuição da ansiedade e do stress diário que caracteriza as sociedades mais desenvolvidas do início do século XXI. Parece-me uma modalidade desportiva adequada, como resposta barata, à crise económica que se faz sentir em Portugal, na Europa e no mundo. Este desporto respeita o ritmo e a cadência interna de cada cidadão e a existir competição pode ser praticada no sentido da auto superação de distâncias e de tempos contabilizados, de forma que os indivíduos podem competir serenamente consigo mesmos, sem estarem preocupados com os ritmos alheios. Aliás, é este o objectivo mais nobre de uma educação digna, em particular neste caso de uma educação desportiva saudável.
Assim, a prática desta modalidade desportiva se exercida com sensatez e sentido de equilíbrio garante o cumprimento do belo ideal Helénico: “corpo são, em mente sã”, porque um dos dramas da saúde pública atual é a obesidade dos jovens e dos adultos resultante dos processos de sedentarização das cidades contemporâneas. O ritmo alucinante e a anomia ética das sociedades atuais em processo de Globalização desregulada, devido à ditadura da tecnocracia financeira, têm feito perder qualidade de vida aos cidadãos que precisam de serenidade para travarem os processos de alienação colectiva em função de uma ideologia única que se quer impor.
José Sócrates é um exemplo de uma personalidades pública que praticava jogging e que procurava incutir uma mentalidade otimista aos portugueses. Hoje em dia, as notícias nefastas limitam-se a “dar murros no estômago” de Pedro Passos Coelho, de que é exemplo a notícia, saída ontem, de que a agência Standard and Poor’s baixou o rating da dívida pública portuguesa para o nível de “lixo”. Os políticos estão, hoje em dia, manietados ao poder da ditadura dos mercados devido a uma Globalização desregulada, em que primam os mecanismos especulativos em detrimento do Bem Público. E é necessário, recordando o grande filósofo francês Paul Ricoeur, fazer a Humanidade recuperar uma dialéctica equilibrada entre a ideologia e a utopia, mas com a conjuntura presente da crise financeira de 2008 a alastrar à Europa e a estrutura de um “Capitalismo de Casino” a minar as formas de desenvolvimento sustentável dos cidadãos que vão perdendo progressivamente níveis de qualidade de vida esta finalidade está mais distante. O prato da balança do pretenso progresso pende, na atualidade, para a ideologia neoliberal que muitos querem impor como uma inevitabilidade e falta, com efeito, um pouco de utopia.
Se nos anos 60 o prato da balança pendia para as tendências utópicas com as revoluções juvenis, hoje passa-se o contrário. Temos de ser realistas, mas convém manter os níveis de esperança numa Humanidade talentosa capaz de superar esta violenta crise que está a abalar as economias do Ocidente e do mundo. Ora, este realismo otimista só é possível com menos ideologia neoliberal e mais sentido crítico, através de ideais utópicos, que nos façam superar a desmoralização que está corroer o próprio “Homem Ocidental”. A bitola do sucesso não pode passar por associar um Capitalismo tóxico com uma democracia minguada que reduza o poder de participação dos cidadãos, como muito bem explicitou Boaventura Sousa Santos num dos seus mais recentes ensaios.
O jogging é, a meu ver, um desporto que faz fluir a imaginação criativa que é tão necessária à motivação humana para a resolução dos ingentes desafios com que a Humanidade está confrontada. A filmografia americana trata bem o tema do jogging como uma atividade crucial para as pessoas para reflectirem sobre as suas rotinas e ganharem força para enfrentarem os dilemas que têm pela frente. Ao mesmo tempo, o jogging exerce um trabalho de tonificação muscular e de descompressão das cargas de stress emocional que são benéficas a uma vida mais saudável. O jogging pode proporcionar em certas personalidades, mais atreitas a dons espirituais, a inspiração simbólica para fazer renascer os ideais utópicos tão necessários nos dias que correm.
Urge o aparecimento de figuras carismáticas, na aceção de Max Weber, que sejam capazes de mobilizar os cidadãos sem a desconfiança constante que a opinião pública tem criado em relação aos políticos. Fica, aqui, uma dessas figuras históricas carismáticas que viveu na Era que designo de Utópica (Ernesto Che Guevara), pois temos de voltar a encontrar as dinâmicas sociais ajustadas ao equilíbrio político da Humanidade para que passa compaginar de forma dialéctica a ideologia (o statu quo) com a utopia (o ideal a reificar).
O ano de 2011 foi um tempo cheio de acontecimentos inesperados que se seguiram uns atrás dos outros, em catadupa. Um dos acontecimentos mais dramáticos e preocupantes foi a crise da Zona Euro com as dívidas soberanas dos países Europeus a preocuparem a Civilização Ocidental e o mundo que entrou em fase de recessão económica. Em Portugal e em outros países europeus os governos mudaram devido a esta crise conjuntural (resultante da crise financeira dos EUA de 2008) e estrutural (resultante do capitalismo financeiro que deu azo ao totalitarismo dos mercados a nível da Globalização – “economia de casino” ou “teologia de mercado”). Em toda a Europa, tomaram-se medidas de austeridade e alguns países foram intervencionados pelas instâncias de supervisão financeira ou por entidades supranacionais.
A cidadania global esteve na ordem do dia com as manifestações cívicas contra a austeridade, com greves a percorrerem toda a Europa, com três mulheres socialmente mobilizadas a receberem o Prémio Nobel da Paz, com o “Manifestante” a ser eleito pela revista Time como a figura do ano, com o movimento anti-sistema designado “Occupy”, com as manifestações dos indignados da “geração à rasca” e as revoltas contra regimes tiranos na designada Primavera Árabe.
Isto significa que houve poucos líderes internacionais com prestígio, a não ser a Chanceler Ângela Merkel por impor à Zona Euro e à União Europeia uma solução de mero remedeio (com rígidas políticas orçamentais) sem uma política estratégica, sendo rotulada pela revista Forbes como a mulher mais poderosa do mundo, tendo inclusivamente o antigo líder da Alemanha reunificada, Helmut Kohl, criticado as intervenções titubeantes da líder alemã. Por uma boa razão, esteve o Dr. Mário Soares que lançou vários livros este ano e deu o alerta nacional para a falta de uma estratégia europeia que fosse respeitadora dos grandes objectivos dos pais fundadores da Comunidade Europeia.
Em Portugal, não obstante a crise da dívida soberana e a necessidade da ajuda internacional da “Troika” para garantir a solvabilidade do Estado Português, também houve acontecimentos maravilhosos sobretudo nos planos desportivo e cultural como tenham sido a vitória do F.C.Porto na Liga Europa sob o comando táctico de André Villas-Boas e o apuramento da Selecção Portuguesa de Futebol para o Campeonato da Europa de 2012. Na cultura destacou-se a distinção do Fado pela Unesco como Património Cultural Imaterial da Humanidade, o Prémio Pritzker de Arquitectura de Eduardo Souto de Moura e a comemoração dos 15 anos da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa com vários contributos, designadamente do Movimento Internacional Lusófono.
O mundo, a lusofonia e Portugal ficaram mais pobres com desaparecimento de algumas figuras tutelares como ícones da “inteligenzia” da política, da cultura, das artes e das técnicas como sejam Václav Havel, Vítor Alves, Malangatana, Cesária Évora, Steve Jobs, Elisabeth Taylor e Vitorino Magalhães Godinho. Nos antípodas éticos, morreram alguns líderes da “inteligenzia” do Mal como Osama Bin Laden, Muammar Khadafi e Kim Jong-Il, embora os dois primeiros de formas humanitariamente muito controversas.
Como virámos mais uma página da História da Humanidade, do ponto de vista do calendário ocidental convencional com a entrada no novo ano de 2012, mas não ainda ao nível das mudanças necessárias no nosso mundo, aqui vos deixo esta canção “we are the world, we are the children” do “Live Aid” e uma “marcha clássica” de Johann Strauss dirigida por um maestro ancião, enérgico e divertido. Porque estamos no início de 2012 ficam aqui os votos de um ano novo, para todos nós concidadãos do mundo, que seja moldado pela Esperança para que possamos vencer a resignação e o pessimismo face às crises que se instalaram no nosso planeta, pois só estes apelos cívicos aos sentimentos mais fundos de confiança, de generosidade e de bondade podem colmatar o pessimismo que se tem propagado nas sociedades do século XXI – é, aliás, um dos maiores “vírus sociais” dos nossos dias. Haverá, seguramente, momentos tristes durante o ano, mas como diz o sábio provérbio popular português “tristezas não pagam dívidas” estaremos a salvo…
Nesta Era da Globalização, que vivemos, existe uma crescente uniformização de hábitos e tradições culturais em todo o mundo. Os cidadãos sentem a obrigação de salvaguardarem as suas culturas, locais, regionais e nacionais, face à importação de novos hábitos. Estou a lembrar-me da celebração do dia das bruxas, “halloween”, no dia 31 de Outubro, que era uma tradição basicamente anglo-saxónica, que no entanto tem entrado em Portugal e no Brasil com muito sucesso. Se formos compulsar um periódico do Estado Novo, dos anos 50, não encontramos qualquer referência a esta festa “pagã”.
Por outro lado, manifesta-se uma rarefacção da cultura patriótica, que tem sido uma constante dos nossos dias, por exemplo o dia de todos os santos, 1 de Novembro, tem estado muito esquecido junto das novas gerações. Felizmente, que no mundo de língua portuguesa tem sido encontrado um padrão lusófono que cada vez mais aproxima os países de língua portuguesa.
Neste tempo novo em que predomina uma cultura tecnocrática tem-se relegado a cultura Humanista e o grupo dos intelectuais para um segundo plano e talvez, por isso, a crise de valores e de lideranças tem sido tão devastadora na Europa Ocidental como o reconheceu, por estes dias, Jean Claude-Trichet, presidente do Banco Central Europeu.
A Globalização tem criado inúmeras situações contraditórias. Se esta rede de ligações mundiais permitiu a democratização da cultura, também possibilitou a sua degenerescência qualitativa. Hoje em dia, os cidadãos mais instruídos têm, também, menos cultura geral, apesar de estarem rodeados de inúmeras fontes de informação. Na verdade, o excesso de informação que circula a rodos, em resultado dos múltiplos recursos disponíveis, tem diminuído o espírito crítico dos cidadãos e dos dirigentes, não obstante haja os novos canais da blogosfera que parecem querer colmatar esta carência.
Esta realidade conjuntural tem-se traduzido numa diminuição da cultura geral dos indivíduos das classes médias que ficam mais expostos às prepotências das elites “esclarecidas” da tecnocracia, fazendo lembrar os modelos dos “despotismos esclarecidos” do século XVIII. Com efeito, a cultura materialista de consumo, desenfreado, tem afastado os cidadãos da cultura dos Valores Humanistas e da efectiva Defesa dos Direitos Humanos, não obstante estes temas estejam na ordem do dia dos debates públicos. Deste modo, só esta “cultura do ter” pode explicar a omnipresente evocação, todos os dias, nos meios de comunicação social da crise financeira dos países ricos quando no “corno” de África morrem milhões de pessoas à fome.
As novas tecnologias têm feito diminuir os tempos de leitura das gerações mais jovens. Por esta razão, em Portugal em boa hora foi criado o Plano Nacional de Leitura para suprir esta dificuldade. Contudo, a Globalização tem, concomitantemente, possibilitado a transformação dos consumidores passivos em ativos produtores de conteúdos, tornando os cidadãos mais interventivos através das redes sociais e da blogosfera.
Em suma, faz falta a esta Globalização a superação do paradigma da cultura hiper-especializada por outro modelo que volte a confiar no paradigma da cultura Humanista: a única capaz de incrementar uma Cultura Global que forneça aos cidadãos os instrumentos indispensáveis para uma atuação cívica compaginável com os ingentes desafios desta nossa “aldeia global”.
A nobre e bela vila da Ericeira, que acolhe de forma hospitaleira os turistas nacionais e estrangeiros (estes atraídos, em grande parte, pelo marketing do “surf”), realizou este ano, nos dias 19, 20, 21, 22 de Agosto, as Festas em homenagem de Nossa Senhora da Boa Viagem, padroeira dos pescadores que se recolhe na capela altaneira à praia de onde partem as embarcações. Estas Festas populares têm como máximo expoente a procissão marítima, singular, em honra da sua padroeira que promete proteger os seus afoitos navegadores contra as vagas atlânticas que, saindo do porto da Ericeira, atravessam.
Numa crónica anterior, intitulada “Ericeira, uma vila pitoresca de sublime beleza”, já enfatizei alguns aspectos que singularizam e tipificam esta bonita vila da região Oeste de Portugal. Convém lembrar que esta localidade piscatória se tornou uma importante estância balnear desde a 1ª República, que viu instalarem-se aqui para veraneio várias famílias das elites da sociedade portuguesa.
José Ministro dos Santos, Presidente da Câmara Municipal de Mafra, tem investido numa política turística que projectou a Ericeira como um dos pólos mundiais de “surf”. Esta estratégia turística tem passado por especiais cuidados urbanísticos que tornam muito cómoda a estadia dos visitantes. Assim, as entidades locais, desde longa data[1], têm criado e impulsionado recintos pitorescos (miradouros, bancos públicos, recintos recreativos, etc.) que dão aos turistas uma sensação de paradisíaco acolhimento. Na Ericeira as preocupações ecológicas têm estado na ordem do dia, por esta razão existem inúmeros “ecopontos” e recipientes de lixo com múltiplas versatilidades em termos de reciclagem de diversíssimos materiais (pastilhas, cigarros, roupas, etc).
É, também, de destacar o empenho autárquico no saneamento da costa marítima perto da Ericeira, que a fez ganhar espaço entre as praias com bandeira azul, em particular a praia do Sul que pela sua importância histórica tem recebido nos últimos anos vários melhoramentos. Aliás, ainda me recordo de ver o caminho pedonal, de acesso à praia do Sul, parcialmente destruído pela força das vagas marítimas durante os Invernos mais rigorosos do fim do século XX. Foi, igualmente, uma excelente iniciativa a restrição da circulação automóvel no centro da Ericeira (Praça da República e suas imediações), uma vez que permitiu alargar as zonas pedonais para que os turistas e os peões pudessem desfrutar da beleza das casas típicas portuguesas e os recantos emblemáticos que lá se podem encontrar.
Na verdade, a vila merece ser conhecida nos seus mil e um lugares paradisíacos, através de passeios a pé, com pequenas histórias para contar e ricos elementos do património edificado para contemplar[2]. A envolvente regional, paisagística e arquitectónica[3], também não é de menosprezar.
Para apreciar o recorte costeiro, observando a disposição anímica do mar, as névoas oníricas lembrando a lenda de D. Sebastião ou um encantador pôr-do-sol, digno dum ensaio pictórico ou fotográfico, vale a pena percorrer a pé os lindos passeios turísticos que partem da Ericeira, como se esta tivesse os braços abertos ao mar, em sinal do seu destino, em direcção ao Sul rumo à praia da Foz do Lisandro ou em direcção ao Norte rumo à praia dos “surfistas”, denominada Ribeira de Ilhas. Além desta extraordinária beleza poética, que a Ericeira pode desvendar aos visitantes, há outra dimensão que pode atrair os turistas.
Com efeito, a intensa vida social, marcada por um espaço circunscrito e por gerações que veraneiam nesta terra de “pergaminhos históricos”, pode ser outro pólo de atracção. Em Agosto, como salientámos, as Festas Populares em honra de Nossa Senhora da Boa Viagem fazem confluir gentes da região e do país em romaria ou em passeio lúdico. No entanto, em boa parte do ano, nos fins-de-semana ou nos períodos de férias, nos inúmeros cafés do seu centro histórico, em particular perto do “Jogo da Bola” (Praça da República) reúnem-se famílias e amigos de longa data em amenas cavaqueiras, num espaço privilegiado de convivência e de comércio. A par dos cafés, como locais paradigmáticos de convívio, importa realçar a qualidade dos espaços de restauração que se dedicam ao pescado e ao marisco de grande abundância nesta vila de tradições pesqueiras.
Em síntese, a Ericeira pela sua privilegiada localização geográfica é um memorável “bilhete-postal” para o turista percepcionar a missão de Portugal no mundo: a abertura ao mar como espaço de vastos recursos naturais, de união entre povos, de destino histórico da pátria e de evasão poética que pode insuflar de inspiração lírica a alma dos turistas em fuga da pequenez materialista desta Globalização claustrofóbica! Vale bem a pena respirar os ares salubres da Ericeira num passeio turístico que tem condições para ser memorável. Fica a sugestão.
Nuno Sotto Mayor Ferrão
[1] Por exemplo, a Comissão de Iniciativa de Turismo da Ericeira nos anos 20 do século passado procurou embelezar com vários recantos pitorescos a vila.
[2] Tem-se desenvolvido uma interessante bibliografia sobre a Ericeira promovida pela Editora Mar de Letras, em grande parte com o apoio documental existente no Arquivo da Santa Casa da Misericórdia da Ericeira.
[3]A serra de Sintra, o Cabo da Roca, a Tapada de Mafra e o seu respectivo Palácio Nacional contam-se entre os sítios notáveis que se situam na vizinhança desta insigne vila da Ericeira.
Este debate político entre o líder do PSD e o líder do PS, mantido na televisão na noite de 20 de Maio de 2011, esteve bastante aceso com trocas de argumentos ideológicos entre o “passivo” do Governo e as ideias do principal líder da oposição. Mostrou ser um debate bastante renhido em que será difícil definir um vencedor, a não ser de forma pouco neutral. Ambos lançaram ataques mútuos que deixaram pairar o mal-estar, a tensão emocional, no adversário. Ficam aqui os principais argumentos ideológicos que foram esgrimidos neste mediático debate político rumo às Eleições Legislativas de 2011. Cabe a todos os cidadãos analisarem as ideias políticas, a capacidade de liderança dos diversos partidos, a actuação do Governo para, em função das suas convicções ideológicas, escolherem entre a diversa panóplia partidária os protagonistas das ideias que querem ver concretizadas politicamente. É um dever de consciência a nossa participação cívica como cidadãos para uma necessária revitalização das democracias do século XXI.
Pedro Passos Coelho
José Sócrates
A actual cifra de 700 mil desempregados apesar do presente Estado Social.
Discurso mistificador/fantasista de José Sócrates da realidade que mostra a vacuidade do programa do PS.
O Governo de José Sócrates deixou o país numa situação de pré-bancarrota.
Afirma que o Engenheiro José Sócrates não quer discutir a sua acção Governativa e que prefere escudar-se da influência da crise financeira internacional.
Sublinha que a crise financeira é mais grave em Portugal do que na maioria dos outros países Europeus.
Frisa que o PEC – IV significou o falhanço dos outros PEC’s por perda de confiança dos mercados na Governação Portuguesa.
Denunciou o facto de José Sócrates ter afirmado que não governaria com o FMI.
Afirma que o PSD propõe uma flexibilização do trabalho temporário e não uma liberalização laboral.
Propõe a redução da Taxa Social Única como mecanismo para lubrificar a indispensável competitividade da economia portuguesa.
Põe a tónica que o Governo Socialista não está a cumprir o acordo do défice público.
Nega que ele, próprio, seja imaturo e que coloca um rótulo prejudicial ao país, mas antes que tem uma visão realista.
Declara querer transparência das contas públicas.
Frisou que o Governo do PS foi incompetente.
Disse que o país precisa de um Governo competente e que o país que esteve socialmente aflito sabe que o Governo Socialista foi responsável pela pré-bancarrota e que, por isso, é necessário mudar de liderança, mas que para tal é urgente fazer crescer a economia.
Critica da derrapagem na execução Orçamento de Estado pela insuficiente redução da despesa pública.
Afirma que o seu Governo mudou de estratégia política para fazer face à crise financeira internacional.
Apresentou a tese dos co-pagamentos do Sistema Nacional de Saúde como propostas anticonstitucionais do PSD de que apresentou provas.
Sublinha que o PSD de Pedro Passos Coelho conduziu o país à ajuda externa, num acto de irresponsabilidade, que impulsionou os juros da República Portuguesa a subirem abruptamente nos “ratings” das agências respectivas.
Define como estratégia face à actual crise o combate ao desemprego.
Argumenta que como Primeiro-Ministro tentou evitar a ajuda externa, mas que a ânsia eleitoral da oposição e do PSD fez com que se deitasse fora a solução (o PEC – IV).
Denuncia que o PSD propõe no seu Programa Eleitoral uma liberalização do trabalho precário.
Denuncia que o Programa do PSD quer acabar com o despedimento por justa causa.
Prometeu estudar e reduzir moderadamente a Taxa Social Única.
Vinca que a notícia vinda a público, no dia de ontem, da redução do défice era positiva, mas que o líder do PSD aposta na maledicência e no pessimismo prejudiciais para a mentalidade dos portugueses.
Frisou que a nova metodologia contabilística europeia alterou a percentagem do défice e que o fenómeno da nacionalização dos bancos privados alterou o panorama financeiro nacional devido à crise internacional mais grave dos últimos 80 anos.
Lamentou as cartas públicas do PSD terem levantado suspeitas no momento das negociações do Governo com a “troika”.
Enfatizou ter criado um clima de diálogo para o entendimento no momento da crise política.
Afirma-se como um resistente e ter tomado medidas difíceis, numa liderança forte, dando uma marca distintiva à Governação do PS e que o país não precisa de aventuras políticas e de um Programa de radicalismo ideológico que coloque em causa o Estado Social.
No Auditório José Gomes Mota, da Fundação Mário Soares, foi apresentado o livro “Indignai-vos!” (Carnaxide, Editora Objectiva, 2011), já na 3ª edição portuguesa, de Stéphane Hessel, no dia 4 de Maio de 2011, com a presença do autor, do Dr. Mário Soares, do representante da Editora Objectiva e do Embaixador Francês em Portugal. O Dr. Mário Soares fez o prefácio desta edição e apresentou, nesta sessão, o autor ao público presente.
Este livro, agora traduzido para português, é um “best-seller” em França e no mundo pelas tiragens impressionantes e pela expansão internacional da sua tradução em mais de vinte línguas. O prefaciador, deste livro, diz-nos que partilha muitas convicções com o autor, designadamente o diagnóstico de que a crise Europeia torna premente a necessidade de mudar de paradigma político de desenvolvimento (neo-liberal) – de um modelo monetário num modelo global de intervenção internacional, da União Europeia, nos vários níveis de acção que co-responsabilize todos os seus Estados-Membros.
Stéphane Hessel neste seu apelo à indignação cívica, dos cidadãos do mundo, explicita os seus fundamentos Éticos e vivenciais, que assentam no Programa da Resistência Francesa à qual pertenceu ao lado do General De Gaulle, que se moldam à actual crise política internacional. O autor critica o facto dos grandes poderes económicos actuais tentarem por várias vias domesticar o espírito crítico dos cidadãos, deturpando a base das democracias.
Como socialista, o autor frisa que a actual falta de recursos dos Estados decorre da desigual distribuição de rendimentos em que os oligopólios se recusam à prática da generosidade social. Deste modo, este entusiasmado cidadão, de 93 anos, apela para que nos indignemos, como o fizeram os heróis da Resistência Francesa contra o Nazismo, também contra a actual ditadura dos mercados financeiros. A sua postura, de idealista pragmático, faz com que apele ao Direito à indignação como um imperativo Ético em contextos sociais pouco respeitadores dos Direitos Humanos.
A sua visão Hegeliana da História imprime um sentido teleológico ao caminho da Humanidade em direcção à liberdade humana. Considera, por isso, que, não obstante a nossa sensação de pequenez face à complexidade do mundo actual, Globalizado, o pior inimigo do Homem “de bom coração” é a indiferença cívica que aniquila o Direito democrático à indignação e à militância transformadora das realidades que nos rodeiam.
Como dizia, no tempo de G.W. Bush, um editorialista crítico da administração norte-americana, num periódico de Nova Yorque, só a emergência de uma nova potência mundial – a cidadania activa global - poderá pôr cobro às crescentes injustiças da Globalização. Na verdade, Stéphane Hessel crê no poder das Organizações Não Governamentais e na eficácia destas em concertação com a acção em rede dos cidadãos e dos meios de comunicação social para poder gerar transformações empíricas.
O autor tributário de várias correntes filosóficas contemporâneas, do Existencialismo de Jean-Paul Sartre, da Fenomenologia de Maurice Merleau-Ponty e do Idealismo Hegeliano, é empurrado para a entrada na História Universal com a sua oposição activa contra o Nazismo, numa atitude declarada de Idealista Pragmático. Esta sua experiência da guerra leva-o a pugnar por um exercício de uma cidadania activa, não-violenta, que suscite soluções de esperança para os conflitos duradoiros das nações e das relações internacionais. É, nessa medida, que nos deixa o seu exemplo concreto da actual indignação que nutre contra o belicismo Israelita exercido sobre os Palestinianos, uma vez que os sionistas se esqueceram dos valores subjacentes aos Direitos Humanos que lhes deram a possibilidade de surgirem como Estado-Nação em 1948.
Na sua lúcida visão e corajosa intervenção cívica, que consubstancia uma indesmentível autoridade moral, a utopia é a força motriz transformadora do mundo, pois sem esta não há esperança e a indiferença instala-se inexoravelmente. Stéphane Hessel diz-nos, neste livro indispensável, que se não transcendermos o Materialismo desta Globalização não chegaremos ao primado das questões Éticas que se impõem como fulcrais para a beleza da própria Humanidade, no sentido de realizar as suas últimas finalidades, nesta sua pertinente leitura de Filosofia da História. Em suma, o espírito de resistência é, na sua perspectiva de aprofundada compreensão da natureza humana, potencialmente criador de uma esperança revivificante que mobilize e galvanize os indivíduos e as sociedades. É, por esta razão, se tantas outras não houvessem, que recomendo a leitura deste fascinante Manifesto cívico.
O testemunho da sua vida, rica em posições humanitárias, tendo sido preso pelos Nazis, pertencido à Comissão que redigiu a Declaração Universal dos Direitos Humanos em 1948, tendo sustentado no pós-guerra o direito da Argélia à autodeterminação, elucida este Manifesto que apela à ultrapassagem de uma apatia cívica, face à anomia da conjuntura internacional, sem se incorrer em posições extremadas.
Neste trigésimo sétimo aniversário da Revolução do 25 de Abril de 1974, que todos os cidadãos europeus devem conhecer, verifica-se uma redução substancial das celebrações oficiais deste facto genésico da Democracia Portuguesa devido à suspensão dos trabalhos parlamentares e à austeridade a que o país ficou obrigado.No entanto, o carácter simbólico e cívico deste acontecimento histórico levou alguns cidadãos, nascidos após 1974, a subscreverem um Manifesto, intitulado “O inevitável é inviável”, que apela para a necessidade de reconhecer que as liberdades estão a ser postas em causa com o afunilamento de opções democráticas de escolha. Na verdade, as pressões financeiras e tecnocráticas impostas pela “cúpula” da Globalização estão a constranger as hipóteses de um autêntico pluralismo democrático.
Por esta razão, é importante saber que a Associação 25 de Abril tem um importante sítio da Internet que nos abre uma panóplia documental muito interessante sobre este acontecimento. Convém, no entanto, tomar em linha de conta alguma bibliografia essencial sobre esta revolução, lembrarei um estudo clássico feito pelo Historiador José Medeiros Ferreira, um estudo actual elaborado pela Historiadora Maria Inácia Rezola e um testemunho memorialista de um dos líderes da revolução, Otelo Saraiva de Carvalho. Ficam, aqui, as referências a estas obras incontornáveis para se conhecer e compreender melhor este acontecimento histórico:
José Medeiros Ferreira, Ensaio Histórico sobre a Revolução do 25 de Abril: O período pré-constitucional, Lisboa, Publicações Alfa, 1990.
Maria Inácia Rezola, 25 de Abril – Mitos de uma Revolução, Lisboa, Esfera dos Livros, 2011.
Otelo Saraiva de Carvalho, O Dia Inicial – 25 de Abril – Hora a Hora, Lisboa, Editora Objectiva, 2011.
Por outro lado, também é verdade como diz o provérbio de sabedoria popular “em casa onde não há pão, toda a gente ralha e ninguém tem razão” e, nessa medida, percebo o apelo do Sociólogo António Barreto que subscreveu um Manifesto, com várias dezenas de outras insignes personalidades da vida pública do país, para realçar a necessidade de um mínimo de convergência nacional, nesta fase crítica da vida colectiva, para que Portugal consiga resolver a questão financeira, manter o equilíbrio social e gerar oportunidades de investimento. Afigura-se-nos que estes grandiosos desafios que o país enfrenta (necessidade de regularizar as suas contas e de tornar a Democracia mais plural) constituem uma espécie de quadratura do círculo que dificilmente é resolúvel com recurso unicamente “à régua e ao compasso”. Só, porventura, a criatividade do pensamento divergente, no longo prazo, poderá solucionar este estrangulamento da vida dos cidadãos, nacionais e mundiais, mudando as mentalidades, a nível interno, e o sistema internacional do capitalismo desregulado.
Entretanto, convém ponderar com tranquilidade e sensatez na crise financeira e económica que se está a instalar no país e relembrar com orgulho o Património simbólico da Revolução do 25 de Abril de 1974.
O peso das Manifestações da "Geração à Rasca", que extravasou todas as expectativas em Lisboa, Porto e em outras cidades do país, promovida por 4 jovens nas redes sociais simboliza a violenta crise que a sociedade portuguesa está a viver, sob o efeito das crises sucessivas que temos passado nestes últimos anos por causa do contexto internacional da Globalização desregrada.
E significa, também, a falta de estratégia e de um novo modelo de desenvolvimento, verdadeiramente sustentável e humanista, para o presente e o futuro do país e do velho continente que se adapte a esta Era da Globalização tecnocrática em que as oligarquias da especulação financeira reinam a coberto da incapacidade das organizações internacionais (ONU, UE, BCE, etc) e das políticas neoliberais que se vergam às "engenharias contabilísticas" despojadas de causas mobilizadoras dos cidadãos.
A sociedade portuguesa e europeia está partida entre os que pertencem às elites oligárquicas, financeiras, e os cidadãos que estão cada vez mais metidos num beco sem saída da "escravidão" com a precariedade laboral a eternizar-se como sistema, para citar os “Deolinda”, que serviram de elo dinamizador desta corrente de descontentamento e de indignação colectiva.
Sem conceber um novo modelo de desenvolvimento para a Europa e para o mundo não será possível, jamais, existirem cidadãos com plena qualidade de vida e, por isso, esta Manifestação democrática de alegria e espontaneidade, como a Ana Paula Fitas nos refere em A Nossa Candeia, é tributária do espírito de Abril, porque com este desfasamento entre os decisores e os cidadãos não teremos como rumo um mundo melhor que tenha em conta os anseios e as vontades livres dos cidadãos.
É certo que mundo será mais fácil de gerir se formos encarados como números, mas isso significará a desumanização das sociedades europeias e a perda dos valores democráticos herdados das manifestações populares vindas da Revolução Francesa do "Terceiro Estado". Apetece-me afirmar como o fez o Presidente Jorge Sampaio em tempos idos: "Há mais vida para além do défice!" e entoar hoje e sempre esse nosso lema vivo "O povo unido jamais será vencido".
Este livro intitulado “O Longo Curso – Estudos em Homenagem a José Medeiros Ferreira” é uma obra fundamental para todos os leitores interessados na História política e diplomática portuguesa do século XX que congrega a colaboração de consagrados Historiadores, nacionais e estrangeiros, e de jovens Investigadores que se cruzaram de uma maneira, ou de outra, com este grande Historiador e Professor.
Esta obra é muito rica e variada nas abordagens metodológicas e da pequena leitura que já fiz, de alguns textos, recomendo-a vivamente. Em particular, irei dar especial atenção aos textos das temáticas, colonial e biográfica, e aos capítulos para os quais a curiosidade intuitiva me despertar. Aliás, alguns textos que já publiquei neste blogue, versando o tema da História Ultramarina, são devedores em gratidão do estímulo e das pertinentes pistas de investigação histórica que este saudoso Professor me foi facultando. Também a existência deste blogue, de âmbito cultural, lhe fica a dever o impulso e a confiança que o Professor José Medeiros Ferreira depositou no meu labor.
Associo-me, portanto, ao espírito deste livro que o homenageia como cientista e como pessoa de fortes convicções que soube, sempre, dar-nos vivos exemplos de grande independência crítica e de cidadania em vários momentos da sua carreira e da vida do país.