Crónicas que tratam temas da cultura, da literatura, da política, da sociedade portuguesa e das realidades actuais do mundo em que vivemos. Em outros textos mais curtos farei considerações sobre temas de grande actualidade.
Crónicas que tratam temas da cultura, da literatura, da política, da sociedade portuguesa e das realidades actuais do mundo em que vivemos. Em outros textos mais curtos farei considerações sobre temas de grande actualidade.
Num mundo crescentemente marcado por conflitos e violências, neste momento de vivência e de convívio com a pandemia do COVID-19, muito temos a aprender com a experiência de aculturação e de interculturalidade com os portugueses dos séculos XV a XVIII. Não será por acaso que a ONU, nesta presente conjuntura do início do século XXI, está a ser liderada por António Guterres, um profundo conhecedor da estratégia do diálogo intercultural.
Na aprendizagem intercultural do pintor Nuno Gonçalves, nos Painéis de São Vicente, são manifestos os seus conhecimentos empíricos das novidades e das técnicas das pinturas flamengas e italianas Quinhentistas. Apesar do grande desconhecimento sobre esta obra emblemática do MNAA, recentemente a iniciar o seu o restauro, devido a ausência de documentação histórica que nos forneça provas para muitas das questões e das teorias que rodeiam esta obra-prima da pintura portuguesa do Renascimento, muito temos a aprender.
Através da observação atenta desta pintura emblemática, verificamos a vivacidade das cores, a utilização da técnica a óleo e o rigor no realismo empregue na representação das vestes e da construção de figuras em vários planos, dando-nos a noção de um espaço tridimensional e de um forte realismo nos drapejamentos. Constatamos, assim, a aprendizagem do pintor com os autores flamengos e italianos. Terá estado na Flandres? Terá conhecido Van Eyck em Portugal?
O objetivo do pintor Nuno Gonçalves foi o de representar a nação portuguesa nos seus vários estratos sociais em volta de um Santo. É, ainda hoje, um símbolo da identidade nacional portuguesa do tempo da gesta dos Descobrimentos Marítimos. Será que a expressividade tensa das fisionomias das figuras desta obra significará a unidade nacional perante o desafio das descobertas marítimas em curso em meados do século XV ?
Verificamos as trocas interculturais entre os portugueses e os povos do mundo com que contactámos, entre os séculos XVI e XVIII, através dos Biombos Namban e mediante a apresentação de diversas outras peças artísticas do Museu Nacional de Arte Antiga.
Na apresentação descritiva da Visita Guiada em relação aos Biombos, que apresentamos no "link" em cima, vemos representados: o arcabuz transmitido pelos portugueses aos japoneses; os elefantes desconhecidos pelos japoneses; os óculos dos portugueses que causaram intensa estranheza aos nipónicos; as cadeiras chinesas utilizadas pelos portugueses em terras nipónicas; as igrejas cristãs de estilo japonês, fruto da evangelização dos missionários jesuítas; a admiração dos japoneses pela habilidade “trapezista” dos marinheiros lusos; os animais “exóticos” como os cães perdigueiros que os nipónicos desconheciam, etc.
Por outras palavras, fruto da globalização, encetada pela expansão marítima portuguesa, assistimos ao diálogo de culturas com o capitão-mor português a transportar à cintura duas espadas de samurai, o transporte no cortejo de mercadorias pelos portugueses de objetos com influências formais de múltiplas regiões do mundo ou, ainda, o esforço de adaptação dos jesuítas portugueses aos costumes japoneses, conseguindo a conversão de muitos habitantes locais, como surge representado numa figura de um nipónico vestido de jesuíta.
Igualmente no Museu Nacional de Arte Antiga encontramos múltiplos exemplos artísticos de interculturalidade formal, como deu a conhecer a historiadora Maria de Lourdes Riobom. Desde o Saleiro do Benim em que surgem os portugueses vistos pelos africanos, o contador mogol onde surgem representados portugueses e asiáticos; o cofre oriental, inspirado nos baús portugueses de viagem e reproduzindo uma estampa de A. Dürer que representa figuras da Sagrada Família, compaginando anjos vestidos de acordo com os costumes nativos e pastores trajados à portuguesa ou a pintura do Inferno, de autor português Quinhentista, anónimo que apresenta o Diabo como um Índio.
Em suma, verificamos que a aculturação, a interculturalidade e a aprendizagem com o “outro”, entre os portugueses e os povos contactados, nos permitiram no início do contexto da globalização oferecer “novos mundos ao mundo”, desde o século XVI, através do diálogo intercultural que permeia múltiplas peças do rico espólio artístico do Museu Nacional de Arte Antiga.
Os jornais diários, como é seu timbre, fizeram um acompanhamento constante desta magna guerra conhecida como Grande Guerra e depois baptizada pelos historiadores como I Guerra Mundial. Na ausência de outros meios de comunicação social, que cobrissem estes acontecimentos cruciais, a imprensa revelava, então, um papel fundamental na influência da opinião pública.
A intervenção de Portugal na Grande Guerra foi alvo de uma acesa polémica política, pois já em julho de 1914 começaram os primeiros conflitos militares entre as tropas portuguesas e alemãs a norte de Moçambique, o que se reflectiu naturalmente na imprensa do país.
Espelho das divergências relativas à intervenção portuguesa no conflito mundial foi o fosso que se abriu entre os apoiantes, da posição favorável à entrada na guerra, que se encontravam sobretudo no Partido Democrático e no Partido Evolucionista e que contava com o apoio político de figuras proeminentes como Afonso Costa, João Chagas, José Norton de Matos e Bernardim Machado e do outro lado estavam outras forças partidárias e figuras prestigiadas favoráveis à posição de neutralidade como o general e ministro Alfredo Freire de Andrade, Sidónio Pais e Manuel de Brito Camacho. Na verdade, após alguma polémica, a 23 de novembro de 1914, o Congresso da República autoriza Portugal a intervir ao lado dos Aliados.
Algumas correntes, políticas, antagonistas das decisões republicanas ou do Partido Democrático como o Partido Unionista, os socialistas, os monárquicos e os católicos sustentaram uma posição de neutralidade.
No momento da entrada de Portugal na Guerra constituiu-se um movimento de apoio à beligerância portuguesa que ficou conhecido como União Sagrada que reunia o Partido Democrático, o Evolucionista, o Unionista e o Socialista. No entanto, com os desaires militares no decorrer de 1917 e até ao verão de 1918 os Unionistas e os Monárquicos sustiveram uma posição de abandono de Portugal da Guerra como o fez a Rússia.
As posições da imprensa portuguesa foram maioritariamente favoráveis à participação de Portugal na “conflagração internacional”, como na altura os periódicos lhe chamavam. A imprensa republicana, de forte implantação urbana, defendeu na sua maioria a tese intervencionista, enquanto a imprensa monárquica com redutos sobretudo nas províncias susteve a tese de neutralidade. No entanto, não nos esqueçamos que a censura de guerra impediu uma completa liberdade de imprensa, sobretudo nos momentos difíceis da participação portuguesa nos palcos de guerra, entre 1917 e 1918.
A linha editorial da revista Ilustração Portuguesa era claramente a favor da entrada de Portugal na Guerra ao lado dos Aliados, tanto mais que a Alemanha já tinha invadido partes fronteiriças das colónias portuguesas de Angola e de Moçambique.
A 6 de agosto de 1914 O Século dando conta da entrada da Inglaterra na guerra afirmou que Portugal, dada a sua aliança diplomática multissecular, não se poderia manter neutral e deveria auxiliar esta potência, uma vez que a Inglaterra tinha um potencial geoestratégico muito importante para a salvaguarda dos interesses coloniais portugueses. A tese intervencionista é, também, sustentada na defesa do ideal da liberdade dos povos protagonizada pelos Aliados, numa posição assumida pelo Congresso da República.
Em 1917 foi publicada em Paris, durante vários meses, uma revista intitulada Portugal na Guerra, que foi dirigida por Augusto Pina. Esta publicação, quinzenal ilustrada, é uma fonte inesgotável para compreender algumas dificuldades atravessadas pelas tropas portuguesas na Flandres, pois mostra os momentos mais importantes do conflito, bem como o envolvimento dos contingentes portugueses nas operações militares dos Aliados.
O jornal republicano A Capital afirmou, no início da Guerra, o dever de Portugal intervir ao lado dos Aliados e, em particular, da Inglaterra devido aos compromissos diplomáticos e à necessidade de pugnar pela causa da liberdade. Faz-se, concomitantemente, uma crítica aberta das posições favoráveis à neutralidade que são sustentadas por alguns setores da sociedade portuguesa.
Os monárquicos sustentaram a neutralidade na Guerra, talvez por essa ser uma decisão essencialmente republicana que geraria muitos sofrimentos e inegáveis dispêndios financeiros. O jornal “A Monarchia” é boa testemunha deste posicionamento. O jornal “A Lucta” dirigido por Manuel Brito Camacho, órgão do partido Unionista, defendeu também a posição de neutralidade.
De seguida, apresento algumas gravações, designadamente de uma tertúlia em que tive o prazer de participar intitulada Portugal na Grande Guerra realizada na Biblioteca Municipal de Sesimbra no dia 21 de junho de 2014.