GUERRA JUNQUEIRO (1850-1923), ARAUTO DO IDEAL REPUBLICANO NO CONTEXTO DA CRISE PATRIÓTICA DO FIM DA MONARQUIA
Abílio Manuel de Guerra Junqueiro (1850-1923)[1] nasceu em Freixo de Espada-à-Cinta, em meados do século XIX, do casamento entre José António Junqueiro Júnior e Ana Guerra[2], abastados proprietários rurais da região. O jovem Abílio, após uma formação incompleta no Curso de Teologia, acaba por tirar o diploma do Curso de Direito em Coimbra. Ingressou, de seguida, no funcionalismo público e tornou-se mais tarde, episodicamente, político, mas veio a ganhar fama como escritor.
Alcançou grande notoriedade pública como poeta que instigou o ódio antimonárquico e anticlerical, tendo potenciado o ambiente revolucionário que desembocou na implantação da República em 5 de Outubro de 1910. Em Coimbra, no eclético ambiente das tertúlias académicas alargou a sua mundividência, integrando o grupo de intelectuais da Geração de 70[3] que ficou conhecido como “Vencidos da Vida”[4]. Neste viçoso ambiente, da intelectualidade Coimbrã, cedo começou afirmar-se como um promissor poeta e como um encarniçado Republicano.
Em 1873 escreveu um poema de elogio à República Espanhola denominado “À Espanha livre”. Na sequência do Ultimato inglês, de 11 de Janeiro de 1890, encolerizado com a cedência da Monarquia portuguesa aos interesses ingleses que abortaram o sonhado projecto colonial do mapa cor-de-rosa de unir os territórios da costa ocidental de Angola à contra-costa Moçambicana, publicou o opúsculo “Finis Patriae” (1890) que pela popularidade que alcançou exacerbou a descrença popular nas instituições da Monarquia Constitucional. Em reconhecimento dos seus serviços, em prol do ideal Republicano, foi nomeado em 1910 Ministro Plenipotenciário da República Portuguesa na Confederação Suíça, função que ocupou até 1914.
Alcançou um extraordinário êxito literário com o poema “A morte de D. João” (1874) que foi alvo de apreciação crítica por parte de grandes escritores como Joaquim Pedro de Oliveira Martins ou Camilo Castelo Branco. Tornou-se tradutor dos contos infantis de Hans Christian Anderson, que certamente terá influenciado a sua escrita fortemente sentimental. Com a obra, satírica e lírica, intitulada “A velhice do Padre Eterno” (1885) abriu uma acesa polémica anticlerical que enraiveceu as hostes monárquicas e eclesiásticas para gáudio dos Republicanos que o ergueram em arauto da sua Causa.
Em 1892 publicou o livro “Os Simples” em que exaltou os mais desfavorecidos da sociedade, as pessoas humildes e os camponeses, numa cadência lírica em homenagem aos corações mais genuínos dos seus conterrâneos Freixenistas que viviam da lavoura. O seu prestígio literário rompeu fronteiras, pois algumas das suas obras encontram-se traduzidas em diversas línguas. No momento em que celebramos o Centenário da implantação da República não quis deixar de evocar um dos grandes vultos da Cultura Portuguesa que mais contribuiu para a galvanização popular a favor do regime Republicano na transição do século XIX para o XX.
Nuno Sotto Mayor Ferrão
[1] Ana Maria Martins, “Abílio Manuel de Guerra Junqueiro”, in Dicionário Enciclopédico da História de Portugal, vol. I, Lisboa, Selecções do Reader’s Digest, 1990, pp. 302-303.
[2] A sobrinha do poeta, Margarida Augusta Guerra Junqueiro casou-se em 1935 com o Almirante Manuel Maria Sarmento Rodrigues. Vide Nuno Sotto Mayor Quaresma Mendes Ferrão, Aspectos da vida e obra do Almirante Sarmento Rodrigues (1899-1979), Mirandela, Edição Câmara Municipal de Freixo de Espada-à-Cinta, 1999, p. 28.
[3] João Medina, Eça de Queiroz e a geração de 70, Lisboa, Moraes Editores, 1980.
[4] Este grupo de promissores intelectuais reunia José Duarte Ramalho Ortigão, Joaquim Pedro de Oliveira Martins, Abílio Guerra Junqueiro, Luís de Soveral, Francisco Manuel de Melo Breyner, Carlos Lobo de Ávila, Eça de Queirós, entre outros.