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Crónicas do Professor Nuno Sotto Mayor Ferrão

Crónicas que tratam temas da cultura, da literatura, da política, da sociedade portuguesa e das realidades actuais do mundo em que vivemos. Em outros textos mais curtos farei considerações sobre temas de grande actualidade.

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EGAS MONIZ (1874-1955), DA POLÍTICA AO PRESTIGIADO GALARDÃO DE PRÉMIO NOBEL DA MEDICINA EM 1949

 

 

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“(...) Psicologicamente notável é a deslocação da ‘paixão’ política para a pesquisa médico-científica – uma decisão consciente de descobrir novas rotas no mar ignoto dos meios de diagnóstico e de tratamento. (...)”.
Barahona Fernandes, Egas Moniz, pioneiro de descobrimentos médicos, Amadora, Instituto de Cultura e Língua Portuguesa, 1983, p. 133.

 

António Caetano de Abreu Freire Egas Moniz foi uma personalidade polifacetada como académico, médico, escritor e político, tendo vivido no contexto do fim da monarquia constitucional a meados do regime salazarista. Com as suas descobertas neurológicas tornou-se o nome mais importante das ciências médicas portuguesas do século XX.

 

No final do século XIX, formou-se no Colégio Jesuíta de S. Fiel mas acabou por se afastar da prática da religião católica, sem se deixar contaminar pelo vírus anticlerical das hostes republicanas, que veio a enfileirar. Socialmente descendeu de uma família da nobreza provinciana da Beira Litoral. Apesar desses pergaminhos nobiliárquicos, foi educado no culto do trabalho, como era tradicional na época, o que se vincou na sua vivência com a emigração dos familiares mais próximos.

 

Formou-se em Medicina na Universidade de Coimbra, em 1898, com média final de 16 valores. Entretanto, em 1901, prestou provas de doutoramento na mesma instituição com uma dissertação que versou as vivências sexuais, num contexto sócio-histórico de repressão dos impulsos libidinosos, onde foi aprovado com 17 valores, tornando-se lente nesta Universidade e, dez anos mais tarde, transferindo-se para a Universidade de Lisboa. Nesta altura, foi promovido a professor catedrático de Neurologia, após uma intensa formação com o seu Mestre Augusto Rocha e de um estágio em Paris. 

 

Na conjuntura finissecular, foi-se impregnando de espírito liberal no contacto com a juventude da época. Descontente com os rumos políticos do país, que colocaram Portugal à beira da bancarrota e do desespero patriótico, aproximou-se dos críticos do rotativismo parlamentar, dado que os partidos do statu quo colocavam os homens à frente das ideias políticas.

 

Neste sentido, iniciou a sua atividade política como deputado, em 1903, na Monarquia Constitucional, como seguidor da disssidência Progressista de José Alpoim. Nesta conjuntura, foi várias vezes deputado e assumiu-se contra o radicalismo da ditadura de João Franco, tendo-se transformado num indefectível do regime republicano, com o aprofundar da crise do regime monárquico. 

 

Com a instauração da República, tornou-se deputado na Assembleia Constituinte em 1911, destacando-se pelas suas qualidades oratórias. Foi, ainda, várias vezes deputado na 1ª República. Em 1916, foi preso no conturbado contexto político-social, salientando-se pelo seu antagonismo a Afonso Costa.  Ideologicamente, foi um liberal moderado, que sustentou o reatamento das relações diplomáticas com a Santa Sé, uma vez que tinha ficado bastante incomodado com o anticlericalismo primário de Afonso Costa.

 

Em 1917, tornou-se o principal dirigente do Partido Centrista, logo integrado no Partido Nacional Republicano como suporte da afirmação política de Sidónio Pais. Nesta época, foi líder parlamentar do grupo sidonista no Governo, embora se tenha afastado das prepotências cesaristas de Sidónio Pais, fazendo-nos lembrar da atitude do atual dirigente turco Recep Erdogan com as suas ambições presidencialistas. Mas, no âmbito do consulado sidonista, foi ainda Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e veio a desempenhar o cargo de Presidente da Delegação Portuguesa à Conferência de Paz de Paris em 1918-1919.

 

Desgostoso com o rumo político português, resolve apostar na investigação científica. Nesta sua caminhada, obteve um inegável sucesso com as suas pesquisas médicas pioneiras nos campos da neurologia e da psiquiatria com as técnicas da angiografia cerebral (arteriografia), em 1927, e a leucotomia pré-frontal, em 1935, que permitiram respetivamente diagnosticar tumores cerebrais e aplicar a neurocirurgia à cura de certas psicoses. Depois destes retumbantes êxitos técnico-científicos, foi distinguido com o Prémio Nobel da Fisiologia e Medicina em 1949.

 

Escreveu vasta obra ligada à ciência médica e muitos ensaios ligados à arte, patenteando o seu pendor humanista tão típico nestas gerações de médicos.

 

As suas técnicas cirúrgicas inovadoras foram ensaiadas no Hospital Júlio de Matos e no Hospital de Santa Maria. A técnica da leucotomia foi alvo de grande polémica pública, mas facultou a compreensão aprofundada das bases cerebrais da vida psíquica normal e patológica.

 

Contudo, o seu prestígio começou em 1927 como inventor da técnica da arteriografia cerebral, já com 53 anos, que permitiu diagnosticar com precisão doenças e tumores cerebrais. Foi - segundo o reputado psiquiatra Barahona Fernandes -  um dos primeiros neuropsiquiatras a divulgar, em Portugal, a doutrina psicanalítica de Sigmund Freud e as suas virtudes terapêuticas. Egas Moniz, com as suas descobertas técnico-científicas, concedeu um notável impulso à neurocirurgia.

 

Este médico, professor, investigador morou em Lisboa num palacete estilo D. João V, na Avenida Luís Bivar, repleto de uma rica biblioteca e recheado de requintadas obras de arte. Foi uma personalidade multifacetada que tanto resolvia os problemas triviais do quotidiano como se extasiava com os aspetos sublimes da arte e da natureza, sabendo manter um espírito estóico ante as dificuldades vivenciais e uma energia singular no seu percurso de investigador científico.

 

Possuidor de uma vasta cultura humanista, tão distante das visões tecnocráticas preponderantes nos dias de hoje, debruçou-se nos seus ensaios sobre figuras históricas carismáticas como Camilo Castelo Branco, o Papa João XXI, José Malhoa ou Maurício de Almeida. De facto, escreveu muito, além dos temas médicos, tendo abordado escritores e artistas, alguns por especial interesse no tema da loucura humana, mas muitos outros por mera motivação estética, evidenciando a sua mentalidade de investigador em trabalhos como Júlio Dinis e a sua obra.

 

Aos 74 anos escreveu as suas memórias de investigador no incontornável livro (essencial para compreender as suas invenções técnico-científicas) intitulado Confidências de um investigador científico. Trabalhou até à derradeira hora, então com 81 anos, na clínica particular e no hospital, além de ter presidido durante vários anos à Academia das Ciências de Lisboa.

 

Em conclusão, Egas Moniz desconstruiu o complexo de inferoridade dos portugueses em termos científicos com as suas descobertas médicas. Afirmou-se como um médico humanista preocupado com o bem-estar psíquico dos seus semelhantes, que eram muitas vezes remetidos para manicómios. No tempo da Ditadura Salazarista, opôs-se a este regime autocrático pelo facto deste oprimir as liberdades individuais, embora sem grande ativismo político nestas décadas finais da sua vida.

___________________

Barahona Fernandes, Egas Moniz, pioneiro de descobrimentos médicos, Amadora, Instituto de Cultura e Língua Portuguesa, 1983, 169 p..

Sérgio Campos Matos, “António Caetano de Abreu Freire Egas Moniz”, in Dicionário Enciclopédico da História de Portugal, s.l., Publicações Alfa, 1990, pp. 201-202.  

 

Nuno Sotto Mayor Ferrão

 

 

 

 

 

 

 

 

 

REVOLUÇÃO REPUBLICANA DE 5 DE OUTUBRO DE 1910: OS ANTECEDENTES IMEDIATOS, O ACONTECIMENTO E ALGUMAS CONSEQUÊNCIAS

 

Rua da Ericeira[1]

 

           Neste ano do Centenário da implantação da República Portuguesa (1910-2010) não podia deixar de evocar este magno e genésico acontecimento da História Contemporânea Nacional. Irei descrever um pouco sinteticamente, com base num relato minucioso de um jornalista da época[2], os antecedentes imediatos[3], o acontecimento revolucionário e algumas das consequências mais importantes ao nível das rupturas do novo regime político.

 

           A ditadura de João Franco (1906-1908), propulsora de medidas repressivas, levou a alastrar na sociedade portuguesa, a par do movimento de propaganda Republicana, uma dinâmica de insubmissão popular. A opressão exercida pelo Governo de João Franco suscitou de tal forma a animosidade dos revolucionários que marcaram a revolta Republicana para o dia 28 de Janeiro de 1908, que acabaria por afastá-lo da Presidência do Conselho de Ministros. De facto, a prepotência ditatorial de João Franco levou-o a reprimir a liberdade de imprensa e a aprisionar dirigentes e populares Republicanos, suspeitos de organizarem uma revolta política. Foi, com efeito, a ausência de plena liberdade durante este Governo que permitiu a associação de monárquicos dissidentes e de republicanos que encaravam a necessidade de uma Revolução, mesmo se perfilhassem ideais contrários, como solução de libertação dos opressivos grilhões da Ditadura de João Franco.

 

           Assim, o descontentamento dos monárquicos dissidentes foi um factor que não se pode menosprezar como elemento potenciador da revolta face ao regime político desacreditado, isto é, a monarquia constitucional. Compreende-se, assim, que o movimento de conspiração e revolta contra a monarquia se tenha feito através da associação de elementos monárquicos dissidentes e de republicanos e da junção de armamento para o acto revolucionário.

 

           Esta conjugação de factores deu azo à primeira grande tentativa de revolta Republicana, em Portugal no século XX, a 28 de Janeiro de 1908. O Almirante Cândido dos Reis e o Escritor João Chagas foram alguns dos dirigentes revolucionários que tiveram um papel decisivo neste acontecimento e na revolução do 4-5 de Outubro de 1910. Na realidade, o insucesso daquela revolta ficou a dever-se à incapacidade de prender o Ditador João Franco e à prevenção das forças militares fiéis ao regime monárquico.

 

           Foi o fracasso da revolta do 28 de Janeiro que induziu o aumento da repressão policial Franquista suscitando, por sua vez, o recrudescimento do ódio à Monarquia. Esta crescente animosidade desembocou no regicídio do rei D. Carlos e do príncipe herdeiro D. Luís Filipe a 1 de Fevereiro desse ano. Este homicídio do rei e do seu filho primogénito adveio do ambiente de hostilidade decorrente do Decreto Ministerial que autorizava a condenação à morte dos cidadãos politicamente insubordinados[4].  

 

           Nesta dinâmica de destruição do regime monárquico, a Carbonária, como organização secreta revolucionária, nascida no país no fim do século XIX, a par do papel da Maçonaria na formação da elite dirigente, contribuíram de forma fundamental para armar as classes populares que apoiaram com êxito o movimento insurreccional de 4-5 de Outubro de 1910. Artur Luz de Almeida, António Maria Machado Santos[5] e António Maria da Silva organizaram a acção revolucionária desta instituição secreta. Com efeito, a Carbonária proporcionou a expansão da doutrina Republicana, através da propaganda, e a minuciosa organização da sublevação popular e militar. Por último, cumpre referir que a acção desta organização estimulou os mecanismos repressivos policiais da Ditadura de João Franco.

 

           Deste modo, a Carbonária preparou a acção revolucionária com o fabrico de bombas e o seu detonamento em diversas ocasiões na cidade de Lisboa. Neste contexto de agitação social, importa investigar uma questão que parece não ter sido formulada pela historiografia portuguesa, de forma clara: em que medida o ambiente de violência desta Associação Secreta, antes da Revolução de 1910, e o facto de muitos populares estarem armados, não favoreceu a instabilidade civil da 1ª República? 

 

           Houve, posteriormente, um particular cuidado em garantir o êxito de uma nova tentativa revolucionária, após várias tentativas goradas desde o fim do século XIX e início do século XX. Neste sentido, a Carbonária interligou-se com os grandes dirigentes do Partido Republicano e João Chagas, Afonso Costa e António José de Almeida ficaram a liderar a organização revolucionária das operações de insurreição do 4-5 de Outubro. Devido a este factor, e a outro que iremos referir de seguida, surgiu uma dinâmica nova nos preparativos revolucionários. Durante o Governo liderado por António Teixeira de Sousa, de 26 de Junho a 4 de Outubro de 1910, menos opressivo nos processos de controlo aos Republicanos, a propaganda revolucionária teve oportunidade de se intensificar.

 

           Vários momentos foram estabelecidos para o desencadear das operações revolucionárias, designadamente a 28 de Janeiro de 1908, como já referimos, e a 15 de Julho de 1910 que acabou por ser adiada. Foi, então, a 4-5 de Outubro de 1910 que se despoletou a Revolução que implantou em Portugal o regime político Republicano. Um leque de factores conjugou-se para que esta singrasse. Em particular, devemos referir o papel conjunto da Maçonaria, da Carbonária e do Directório Republicano e de muitos militares que tomaram parte na minuciosa preparação da sublevação contra o regime monárquico. No entanto, não podemos esquecer que o peso da adesão popular ao “movimento de libertação” do jugo à Casa Real foi decisivo no resultado do processo revolucionário.

 

           Esta Revolução foi aprazada dois dias antes do seu início. Assim, numa reunião de militares Republicanos a 2 de Outubro no consultório do Dr. Eusébio Leão estabeleceu-se o começo da insurreição, bem como o respectivo plano de sublevação, para o dia 4. Entretanto, o médico e dirigente Republicano, Miguel Bombarda foi assassinado por um doente, do ramo militar, a 3 de Outubro, a quem tinha dado “alta psiquiátrica” após um internamento. Esta vítima, do clima de tensão, ainda teve oportunidade de eliminar, antes de falecer, alguns documentos da Revolução aprazada para que não existissem pistas para as autoridades do movimento insurreccional que se preparava. Contudo, este homicídio suscitou a fúria revolucionária dos populares convencidos da eventual motivação política deste sangrento acontecimento.     

 

           A 4 de Outubro sucedeu alguma desorientação nas operações revolucionárias que geraram o desânimo nas hostes Republicanas. Por conseguinte, os primeiros momentos da Revolução foram de algum desalento e de alguma insegurança nos contingentes revoltosos devido ao facto do plano traçado não se ter cumprido na íntegra. Nessa madrugada, já as operações decorriam, apoderou-se dos dirigentes Republicanos uma enorme descrença por causa da falta de comunicação entre os grupos estratégicos das diferentes ofensivas revolucionárias, no entanto as camadas populares revoltosas entusiasmaram-se em Lisboa com o espírito revolucionário.  

 

           Dentro deste espírito de vitória acantonaram-se na Rotunda, em Lisboa - epicentro do fenómeno revolucionário, as forças insurrectas, tendo-se reunido militares e civis sob o comando do comissário naval Machado Santos. No momento em que muitos dirigentes da revolução recearam o insucesso do movimento insurreccional, este líder manteve um ânimo inabalável, a que se juntou a força moral dos elementos civis que garantiram o local como reduto de defesa do ideal Republicano. Este factor de resistência anímica foi decisivo, porque após a decepção de muitos dirigentes, perante o incumprimento do plano revolucionário traçado, alguns militares de mais altas patentes abandonaram a Rotunda, mas os militares subalternos pediram nessa ocasião a sua liderança das hostes revolucionárias aí estacionadas. 

 

           Na capital, os Republicanos tomaram pontos militares estratégicos e iniciaram escaramuças sangrentas entre os seus contingentes e as tropas fiéis à Monarquia, designadamente a Guarda Municipal. Desta maneira, a Revolução durou desde a madrugada de 4 de Outubro, altura em que começaram as movimentações dos contingentes de insurreição, até ao início da manhã de 5 de Outubro em que foi proclamada a implantação da República.

 

           No momento em que a descrença atinge a alma dos Revolucionários, o Almirante Cândido dos Reis suicida-se e as forças de defesa da Rotunda resistem dando continuidade ao combate pelo ideal de um novo regime. Acontece que este marinheiro ficou convencido que a Revolução tinha fracassado, porque as etapas do plano de insurreição agendadas falharam e acabou por sobrevalorizar informações avulsas que o fizeram temer o insucesso das operações militares.  

 

           Na realidade, do Plano Revolucionário delineado fazia parte o controlo da Rotunda, o posicionamento ofensivo de navios militares no rio Tejo e o assalto ao Palácio das Necessidades onde se encontrava o rei D. Manuel II. Convém sublinhar que foi a falta de comunicação dos dirigentes da sublevação e o incumprimento deste Plano, por acção imprevista das hostes defensoras da monarquia, que suscitaram a descrença dos elementos revolucionários.

 

          Entretanto, os navios tomados pelos revolucionários no rio Tejo bombardearam o Palácio Real das Necessidades, obrigando o monarca D. Manuel II a fugir para o Palácio Real de Mafra. De seguida, a restante família real refugiou-se, também, em Mafra, mas tendo recebido notícias do êxito revolucionário, na manhã de 5 de Outubro, embarcou no porto piscatório da Ericeira para fugir do país.

 

           Ao nível das operações militares, o indefectível monárquico Henrique Paiva Couceiro dirigiu o ataque à guarnição revolucionária da Rotunda, sem sucesso, e posteriormente por instrução superior recebida colocou-se com os seus soldados na Baixa Pombalina para garantir a defesa de um eventual desembarque de marinheiros revoltados que quisessem apoderar-se dos edifícios-sede do poder político. Todavia, o desenlace militar da Revolução pendeu a favor dos contingentes insubmissos, porque as tropas monárquicas estacionadas no Rossio acabam por ser comprimidas entre as forças Republicanas da Rotunda e as forças navais do rio Tejo. É, contudo, de referir que os elementos civis postados ao lado dos revoltosos contribuíram decisivamente para a vitória Republicana. No decorrer dos confrontos armados que duraram várias horas foram concedidas tréguas, a pedido do Embaixador Alemão, para a saída de alguns estrangeiros assustados com o ambiente de instabilidade civil que se vivia.

 

           Por fim, na manhã de 5 de Outubro as forças Revolucionárias tomaram diversos pontos militares estratégicos da capital do país e José Relvas proclama da varanda da Câmara Municipal de Lisboa a instauração do regime Republicano e a formação imediata de um Governo Provisório liderado por Joaquim Teófilo Braga[6].

 

          Esta Revolução teve importantes consequências institucionais decorrentes da estruturação do regime Republicano e sociais procedentes das conflitualidades latentes que se arrastaram durante a 1ª República (1910-1926). Com efeito, com o novo regime Republicano surgiram novos símbolos (o Hino “A Portuguesa”, a moeda denominada “Escudo” e a actual bandeira nacional) que pretenderam corporizar o ideal de uma vida nova da Pátria Portuguesa através da reestruturação dos poderes soberanos do Estado.

 

            Nos primeiros meses do novo regime esta transformação foi sendo tecida pela nova classe política, constitucionalmente, alcandorando-se a máximo representante do Estado o Presidente da República, mas fazendo-o depender do Parlamento bicamarário. Por sua vez, o Estado tornou-se Laico, em 1911 com a Lei da Separação do Estado e da Igreja, que levou a um recrudescimento do ódio anticlerical que podemos imaginar como semelhante àquele que o prodigioso escritor Graham Greene retratou com brilhantismo, no romance histórico “O Poder e a Glória”[7], a propósito da perseguição dum padre Católico por parte da República no México nos anos 20 do século passado. 

 

           Em termos de balanço sucinto da 1ª República (1910-1926), pois uma análise mais aprofundada deste período exigirá a indispensável consulta da Historiografia[8] que está a receber novas actualizações[9] a propósito da Comemoração deste magno acontecimento pátrio, diremos que esta realidade histórica se afigura complexa pelos progressos gerados que se conjugaram com alguns constrangimentos sociais. Cumpre, no entanto, destacar algumas linhas de força que moldaram o semblante reformista deste período.

 

           Em primeiro lugar, teve uma crucial importância a profundidade da política educativa que instituiu o Ensino Primário obrigatório para combater o analfabetismo que grassava na sociedade portuguesa, ao mesmo tempo que se expandiu a estrutura do Ensino Superior no país. Em segundo lugar, como é sabido, a instauração do regime Parlamentarista desencadeou uma instabilidade política que foi dominante neste período. Em terceiro lugar, foram também decisivas as medidas sociais tomadas a favor dos Trabalhadores, designadamente do Direito à Greve que deu origem a um uso excessivo por falta de consciência cívica da população[10], mas o espírito Civilizacional que lhe esteve subjacente moldou este regime e devia ser factor de inspiração do actual que está a ser despojado da sua identidade autenticamente democrática. Esperemos que este momento comemorativo da implantação da República sirva para que o passado, recordado e celebrado, nos ilumine este presente incerto modelado por uma Globalização desregrada rumo a um futuro melhor e mais justo.   

  

 

Revolucionários Republicanos

 

 

José Relvas proclama da varanda da

Câmara Municipal de Lisboa

a instauração do regime Republicano



[1] Em muitas localidades de Portugal a toponímia de ruas e de praças é marcada pelas figuras Republicanas, pela Revolução de 5 de Outubro de 1910 e pela referência a este regime político. Na Ericeira há exemplos deste fenómeno como este que apresentamos, mas na cidade de Beja a densidade de ruas com nomes de figuras ligadas à República é uma realidade particularmente interessante.

[2] Jorge Abreu, 0 5 de Outubro – A Revolução Portuguesa, Lisboa, Edição Alfarrábio, 2010. Esta obra foi escrita por este jornalista Republicano do Primeiro de Janeiro que publicou esta análise, jornalística depurada, em 1912.

[3] Este “post” não pretende fazer uma descrição exaustiva de todas as causas da Revolução Republicana, mas apenas dos motivos mais directos, deste acontecimento da História de Portugal, do segundo quinquénio do século XX.

[4] Idem, Ibidem, p. 60.

[5] João Medina, “Machado Santos”, in História de Portugal, dir. João Medina, vol. X, Lisboa, Edição Ediclube, 1993, pp.  54-63.

[6] “Joaquim Teófilo Fernandes Braga”, in Parlamentares e Ministros da 1ª República (1910-1926), coordenação de A. H. Oliveira Marques, Edições Assembleia da República – Ed. Afrontamento, 2000, pp. 124-125; Mário Soares, As ideias políticas e sociais de Teófilo de Braga, Lisboa, Centro Bibliográfico, 1950 (prefácio de Vitorino Magalhães Godinho).

[7] Graham Greene, O Poder e a Glória, Alfragide, Oficina do Livro, - Casa Editorial, 2010. Este aliciante livro tem um prefácio, bem interessante, da autoria do escritor John Updike. 

[8] João Medina, “A I República – o que foi ?”, in História de Portugal, dirigida por João Medina, vol. XI, Alfragide, Edições Ediclube, 1993, pp, 245-252.

[9] Cito algumas dessas actualizações Historiográficas sem querer ser exaustivo: Joaquim Romero Magalhães, Vem aí a República! 1906-1910, Coimbra, Almedina Editores, 2010; Filipe Ribeiro Meneses, Afonso Costa, Lisboa, Texto Editora, 2010; AAVV, Viva a República 1906-1910, Lisboa, Inprensa Nacional-Casa da Moeda, 2010.

[10] António Sérgio, Educação Cívica, Lisboa, Editora Livraria Sá da Costa, 1984. A 1ª edição data de 1915 e esta última teve um elucidativo prefácio de Vitorino Magalhães Godinho.

 

 

Nuno Sotto Mayor Ferrão

 

 

 

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