AS CLÁSSICAS TESES HISTORIOGRÁFICAS DA IDEOLOGIA COLONIAL PORTUGUESA ENTRE 1919 E 1961
Historiografia atual
Historiografia do Estado Novo
As teses académicas clássicas são, muito bem, aceites na comunidade científica. Referirei, de seguida, cinco das principais teses clássicas da historiografia sobre a ideologia colonial portuguesa no período entre guerras (entre o fim da 1ª grande guerra e o início da guerra colonial).
A primeira tese subscrita por Fernando Rosas, Yves Léonard, João Medina, Gervase Clarence-Smith, Cláudia Castelo e Luís Farinha[1] sustenta que a propaganda imperial do Estado Novo constituíu um factor decisivo para a legitimação social do regime ditatorial, uma vez que a ideologia colonial era amplamente consensual na sociedade portuguesa.
A segunda tese assinada por historiadores como António Duarte Silva, António José Telo, Douglas Wheller, Rui Ferreira da Silva e Valentim Alexandre[2] afirma que a doutrina colonial da Ditadura Militar e do Salazarismo de pendor centralista, nacionalista e economicista correspondeu a uma reacção clara à crise colonial dos anos 20, verificada em Angola e em Moçambique.
A terceira tese, antagónica à segunda, subscrita por José Luís Garcia e José Freire Antunes[3] assevera que a política colonial das ditaduras – Ditadura Militar e Salazarismo - não representou, na realidade, uma rutura ideológica com o legado Republicano, mas sim um corte pragmático perante o contexto histórico de crise colonial, daí se entendendo melhor que o general José Maria Norton de Matos apenas tenha exercido uma moderada oposição ideológica ao colonialismo salazarista.
A quarta tese proposta por Fernando Rosas[4], que se inspira no modelo económico de interpretação imperialista corrente na historiografia internacional, vinca que as colónias portuguesas funcionaram como um mercado de consumo de produtos manufacturados e abastecedor de matérias-primas (regime de pacto colonial), não obstante Portugal não estivesse suficientemente industrializado dos anos trinta aos cinquenta.
Por último, na quinta tese, subscrita por Nuno Severiano Teixeira e José Medeiros Ferreira[5], refere-se que a diplomacia portuguesa defendeu na Conferência de Paz de Paris em 1919 (realizada na sequência da primeira guerra mundial) os interesses coloniais lusos perante as ameaças externas, porque havia a preocupação de assumir que o projecto colonial era a missão nacional por excelência e, simultaneamente, existia a necessidade de preservar a integridade do império português.
Em conclusão, as diferentes teses clássicas da historiografia da ideologia colonial portuguesa, nos três regimes políticos (1ª República, Ditadura Militar e Estado Novo), entre 1919 e 1961, foram bem acolhidas pela comunidade científica.
Nuno Sotto Mayor Ferrão
[1] A tese clássica acima referenciada aparece subscrita nas seguintes obras: Fernando Rosas, “Estado Novo, Império e ideologia colonial”, in Revista de História das Ideias, vol. 17, 1995, Coimbra, Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, pp. 19-32; Yves Léonard, “O Império Colonial Salazarista”, in História da Expansão Portuguesa, dir. Francisco Bethencourt e Kirti Chaudhuri, vol. 5, Navarra, Círculo de Leitores, 1999, pp. 10-30; João Medina, “O terceiro império português. O império africano. O sonho dum ‘novo Brasil em África’”, in História de Portugal, dir. João Medina, vol. 5, Alfragide, Edição Ediclube, 1993, pp. 207-256; Gervase Clarence Smith, O III Império português (1825-1974), Lisboa, Editorial Teorema, pp. 120-170; Cláudia Castelo, “Evolução da política colonial do Estado Novo”, in O modo português de estar no mundo – O lusotropicalismo e a ideologia colonial portuguesa (1933-1961), Porto, Edições Afrontamento, 1999, pp. 45-67; e Luís Farinha, “Do império português à descolonização – Henrique Galvão e o império”, in História, nº 21, Janeiro de 2000, dir. Fernando Rosas, pp. 18-28.
[2] António Duarte Silva, “Acto Colonial”, in Dicionário de História do Estado Novo, dir. Fernando Rosas, vol. I, Lisboa, Bertrand Editora, 1996, pp. 20-22; António José Telo, “Modelos e fases do terceiro Império Português (1890-1961)”, in Economia e Império no Portugal Contemporâneo, Lisboa, Edições Cosmos, 1994, pp. 199-275; Douglhas Wheller, “Aqui é Portugal: The Politics of Colonial Idea During the Estado Novo, 1926-1974”, in Portugal na transição do milénio, Lisboa, Fim de Século Edições,1998, pp. 375-405; Rui Ferreira da Silva, “Sob o signo do império”, in Nova História de Portugal – Portugal e o Estado Novo (1930-1960), coord. Fernando Rosas, Lisboa, Editorial Presença, 1992, pp. 355-381; e Valentim Alexandre, “Ideologia colonial”, in Dicionário de História do Estado Novo, dir. Fernando Rosas, vol. I, Lisboa, Bertrand Editora, 1996, pp. 432-434.
[3] José Luís Lima Garcia, “A ideia de império na propaganda do Estado Novo”, in Revista de História das Ideias, vol. 14, Coimbra, Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, 1992, pp. 411-424; José Freire Antunes, O Factor Africano (1890-1990), Vendas Novas, Bertrand Editora, 1990, pp. 31-51.
[4] Fernando Rosas, op. cit., pp. 13-32.
[5] Nuno Severiano Teixeira,” Colónias e colonização portuguesa na cena internacional (1885-1930)”, in História da Expansão Portuguesa, dir. Francisco Bethencourt e Kirti Chaudhuri, vol. 4, Navarra, Círculo de Leitores, 1998, pp. 494-520; José Medeiros Ferreira, Portugal na Conferência de Paz- Paris, 1919, Lisboa, Quetzal Editora, 1992, pp.1-30.