O NOSSO MUNDO – A LÍBIA, OS PAÍSES ÁRABES E A UNIÃO EUROPEIA – E AS LIBERDADES AMEAÇADAS – CONQUISTAS E CONSTRANGIMENTOS EM 2010 E 2011
“(…) A liberdade está ameaçada, e a educação para a liberdade é urgentemente necessária. (…)”
in Aldous Huxley, Regresso ao Admirável Mundo Novo, Lisboa, Livros do Brasil, s.d., p. 227
O nosso mundo parecendo progredir, nos últimos anos à custa de uma prometida Globalização, tem caído numa teia de crises que geram nas mentalidades das pessoas um sentimento de profunda incerteza. Na verdade, as revoluções da “Primavera Árabe”, agora no fim da sangrenta guerra civil na Líbia, tem-se traduzido numa luta contra regimes políticos opressivos no Norte de África e no Médio Oriente. No entanto, das revoluções desconstrutivistas aos sonhados regimes democráticos plenos vai uma distância abissal de um longo caminho que urge trilhar.
Assim, os povos do mundo parecem clamar por Estados de Direito, que salvaguardem a justiça social e o civismo, parecendo, na aparência, dar razão à consabida tese de Francis Fukuyama[1] de fim da História. No entanto, esta perspectiva é uma pura ilusão dos ingénuos, pois as conquistas democráticas da “Primavera Árabe” ainda são muito prematuras e o sistema internacional tem esvaziado, sob pressão de uma Globalização Financeira, os regimes democráticos. É certo que um vento de Esperança surgiu nos EUA com a eleição do Presidente Barack Obama em 2009.
Na União Europeia, devido à falta de vontade política, os regimes democráticos têm entrado, como sustenta Boaventura Sousa Santos[2], num ritmo de baixa intensidade, reduzindo as formas de participação dos cidadãos através de liberdades sitiadas e de direitos sociais a minguar. Estes constrangimentos Europeus decorrem da ditadura dos mercados financeiros, aceites pela mulher mais poderosa do planeta[3] (chanceler alemã Ângela Merkel) e pelo presidente francês Nicolas Sarkozy, que se recusam a gizar uma estratégia comunitária ousada que sirva de alternativa. De facto, este é um tempo em que domina no Velho Continente o pensamento único[4], neoliberal, que adormece e torna apática a consciência cívica dos povos Europeus.
Neste tom de resignação ideológica Ângelo Correia, figura bem conhecida da vida política portuguesa, disse, no Jornal da Noite da RTP-N de 28 de Julho de 2011, que o mundo tem de aceitar e consciencializar-se da inevitabilidade do pensamento único. Aliás, Henrique Medina Carreira[5] e Manuela Ferreira Leite[6] já advogaram implicitamente, ou mesmo explicitamente, que o controlo das contas públicas, em anos anteriores, só se seria possível com um regime autoritário.
Em conclusão, no nosso mundo as liberdades estão longe de progredir, embora as promessas de um Admirável Mundo Novo[7] façam sorrir povos oprimidos, como a Líbia a libertar-se do regime do coronel Kadafi, porque o sistema da Globalização Financeira quer impor ao mundo uma única filosofia de vida, consumista, que aproxima a Humanidade do abismo ecológico e social. Com efeito, só esta consciência das liberdades ameaçadas poderá despertar a opinião pública mundial para a iminente tragédia decorrente da apatia cívica e da falta de sentido crítico face à Globalização Financeira em que as elites têm querido adormecer as populações.
Nuno Sotto Mayor Ferrão
[1] Francis Fukuyama, “A Revolução Liberal Mundial”, in O Fim da História e o Último Homem, Lisboa, Editora Gradiva, 1992, pp. 59-70.
[2] Boaventura Sousa Santos, Portugal – Ensaio contra a autoflagelação, Coimbra, Almedina Editora, 2011, pp. 131-132.
[3] De acordo com informação divulgada em Agosto de 2011 pela revista “Forbes”.
[4] Há autores inspirados que já falam nesta presente conjuntura como a manifestação de um Despotismo Esclarecido dos dissimulados defensores da ideologia neoliberal.
[5] Henrique de Medina Carreira, “O fim da ilusão”, in O fim da ilusão, Alfragide, Editora Objectiva, 2011, pp. 93-97.
[6] Ficou conhecida nos anais da História Política Portuguesa a frase de Manuela Ferreira Leite de que para endireitar as Finanças Públicas Portuguesas era necessário um interregno da democracia por uns meses.
[7] Aldous Huxley foi um escritor inglês de renome internacional que publicou um romance satírico com o título de Admirável Mundo Novo que anunciava as ameaças que o futuro parecia trazer à liberdade. É muito interessante o ensaio que passados quase trinta anos este autor escreveu sobre o mundo contemporâneo ( Aldous Huxley, Regresso ao Admirável Mundo Novo, Lisboa, Livros do Brasil, s. d.).