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Crónicas do Professor Nuno Sotto Mayor Ferrão

Crónicas que tratam temas da cultura, da literatura, da política, da sociedade portuguesa e das realidades actuais do mundo em que vivemos. Em outros textos mais curtos farei considerações sobre temas de grande actualidade.

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QUADRAGÉSIMO ANIVERSÁRIO DA REVOLUÇÃO DE 25 DE ABRIL DE 1974 – EVOCAÇÃO HISTÓRICA

 

No quadragésimo aniversário deste acontecimento capital da História de Portugal e do mundo, do século XX, importa fazer um primeiro balanço reflexivo.

 

Foi o que fiz no estudo histórico “Balanço diacrónico (1974-2014) da revolução de 25 de Abril” na revista Nova Águia[1], em que investiguei o impacto público que o acontecimento teve na sociedade portuguesa ao longo destes quarenta anos. Fui impulsionado por uma perspectiva inédita, a que associei uma interpretação da simbologia revolucionária que paira na mentalidade portuguesa.

 

Para além do que afirmei, nesse estudo, vou agora sintetizar algumas linhas gerais do golpe militar que fundou o regime democrático em que vivemos. É certo que, ainda, existe muita emotividade, na forma de ver este acontecimento, na dialéctica quase de amor-ódio, mas o historiador tem de transpor estas barreiras de vivência e propor reflexões serenas e fundamentadas.

 

A importância deste acontecimento tem tal magnitude, nacional e internacional, que o atual Governo neoliberal que gere o país não teve coragem de terminar com este feriado e criou, mesmo, um site para assinalar esta efeméride. Pois se o fizesse “cairia o Carmo e a Trindade”… Para quem tiver curiosidade, aqui fica a sugestão desse e de outros balanços feitos nessa significativa revista cultural (Nova Águia).

 

O derrube do Estado Novo foi concretizado pelo Movimento das Forças Armadas, constituído maioritariamente por capitães, sob a direção do Posto de Comando do Regimento de Engenharia nº 1, localizado na Pontinha. O início das operações foi sinalizado por duas canções que se tornaram emblemáticas “E depois do Adeus” e “Grândola Vila Morena”.

 

A coluna militar de Salgueiro Maia, saída da Escola Prática de Cavalaria de Santarém, chegou a Lisboa na madrugada de 25 de Abril de 1974 e ocupou o Terreiro do Paço e cercou vários ministérios, aí instalados, e mais tarde cercou o Quartel do Carmo onde se tinha refugiado Marcello Caetano e alguns outros membros do Governo da ditadura do Estado Novo.

 

No Terreiro do Paço viveram-se alguns momentos de grande tensão emocional com episódios de grande crispação entre as forças fiéis ao regime e as forças revoltosas, designadamente na Rua Ribeira das Naus e na Rua do Arsenal. Na primeira rua viveu-se um momento de êxtase heróico de Salgueiro Maia, tão bem reconstituído historicamente pelo filme “A hora da Liberdade”, realizado por Joana Fontes, resultado de um aprofundado trabalho de pesquisa dos factos históricos.

 

A coluna militar de Salgueiro Maia foi entusiasticamente saudada pela população que acompanhou as movimentações militares. Foi junto da sede da PIDE/DGS que se registaram os maiores desaires quando por duas vezes os funcionários da antiga polícia política dispararam sobre a multidão provocando cinco mortos e dezenas de feridos.

 

Aliás, este trágico acontecimento dentro do aguardado golpe de estado, neste caso de feição militar, esteve assinalado durante anos numa placa evocativa destas vítimas, mas infelizmente alguém atentou contra a memória colectiva retirando essa placa evocativa colocada na Rua António Maria Cardoso.

 

Da parte da tarde, do dia 25 de Abril de 1974, o capitão Salgueiro Maia mandou atirar com a artilharia sobre a frontaria do Quartel do Carmo, o que fez compreender a Marcello Caetano que já não tinha apoios suficientes e aceitou, então, entregar-se ao general António de Spínola.

 

Este golpe militar assumiu uma repercussão internacional pela forma não violenta como foram conduzidas as operações militares e pela influência internacional que teve no “dominó político” que pôs fim a alguns autoritarismos no mundo, a saber na Grécia, em Espanha, na Rodésia e na África do Sul.

 


[1] Nuno Sotto Mayor Ferrão, “Balanço diacrónico (1974-2014) da revolução de 25 de Abril”, in Nova Águia, nº 13, 1º semestre de 2014, Sintra, Editora Zéfiro, pp. 57-63.

 

Nuno Sotto Mayor Ferrão

JOSÉ MANUEL TENGARRINHA – HISTORIADOR E CIDADÃO – SÉRIE HISTORIADORES PORTUGUESES

 

                                                                                   “(…) Esta é a madrugada que eu esperava

                                                                                   O dia inicial inteiro e limpo

                                                                                   Onde emergimos da noite e do silêncio

                                                                                   E livres habitamos a substância do tempo (…)”

                                                                                   Sophia de Mello Breyner Andersen (poema 25 de Abril)

 

José Manuel Tengarrinha, nascido em Portimão em abril de 1932, recentemente homenageado nos seus 80 anos, é um jornalista, um historiador e um político que se bateu sempre pela liberdade ao longo da vida. Como historiador tornou-se clássica e pioneira a sua obra História da Imprensa Periódica Portuguesa (Lisboa, Portugália, 1965), mas as suas investigações históricas abordaram também a temática política.

 

Há a salientar como obras incontornáveis A Revolução de 1820 – Manuel Fernandes Tomás, (Lisboa, Caminho, 1982), em que prefaciou e anotou o papel relevante deste revolucionário do liberalismo oitocentista e Movimentos Populares Agrários em Portugal, (Mem Martins, Publicações Europa-América) que lhe serviu de Tese de Doutoramento orientada pelo Professor Jorge Borges de Macedo em que abordou as contestações camponesas no período do Antigo Regime. Como obra de antologia de algumas das suas pesquisas históricas apareceu, nos anos 80, o livro Estudos de História Contemporânea de Portugal (Lisboa, Caminho, 1983).

 

Nas suas preocupações com os processos de legitimação democrática destacou-se na defesa da criação de círculos uninominais na eleição de Deputados, nos anos 90, e na elaboração da obra E o povo onde está ?: Política Popular, Contra-Revolução e Reforma em Portugal (Lisboa, Esfera do Caos, 2008). Dirigiu a obra História do Governo Civil de Lisboa (Lisboa, Governo Civil de Lisboa, 2002) e na sua qualidade de experiente jornalista escreveu o livro Imprensa e Opinião Pública em Portugal. Como derradeiro trabalho de fôlego historiográfico escreveu a volumosa biografia de José Estêvão: o Homem e a Obra (Lisboa, Assembleia da República ,2011), tendo terminado a sua carreira universitária como Professor Catedrático jubilado da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.

 

O seu apego à liberdade fê-lo participar no tempo do Governo de Marcello Caetano na Comissão Democrática Eleitoral, que liderou, constituída para participar nas eleições de 1969. Foi também no mesmo espírito de luta pela democratização do país que se entusiasmou com o III Congresso da Oposição Democrática de 1973 em Aveiro. Manifestou sempre a preocupação de que a política fosse uma manifestação das vontades populares, tendo propugnado por um regime que se construísse das bases sociais para as cúpulas dirigentes.

 

Foi, neste contexto, do combate político ao regime do Estado Novo que acabou por ser preso pela PIDE na prisão do Aljube. Após a revolução do 25 de abril de 1974 foi libertado por decisão da Junta de Salvação Nacional e pôde participar na fundação e na liderança do MDP/CDE – Movimento Democrático Unitário/Comissão Democrática Eleitoral. Deste modo, foi Deputado à Assembleia Constituinte em 1975-1976 e eleito para a Assembleia da República nas quatro primeiras legislaturas até 1987.

 

No dia 14 de abril de 2012 realizou-se um almoço de homenagem por ocasião do seu octogésimo aniversário, organizado por um grupo de amigos na FIL de Lisboa, que  contou com uma Comissão Promotora onde estiveram nomes muito prestigiados da sociedade portuguesa, tais como: Ramalho Eanes, Mário Soares, Jorge Sampaio, Adelino Gomes, José Carlos Vasconcelos, André Freire, António Arnauld, António Almeida Santos, etc.

 

Oiçamos a entrevista a José Manuel Tengarrinha conduzida por José Manuel Rosenda difundida na Antena 1 da RDP.

 

Nuno Sotto Mayor Ferrão

 

O ESTADO DO ENSINO PÚBLICO, BÁSICO E SECUNDÁRIO, EM PORTUGAL: CONTRADIÇÕES; HESITAÇÕES E AMBIGUIDADES (1970-2009)

Ericeira, 17 de Agosto de 2009
“O estado do Ensino Público, Básico e Secundário, em Portugal: contradições, hesitações e ambiguidades (1970 - 2009)”

 
          É meu intuito traçar uma panorâmica sintética do estado do ensino público, básico e secundário, em Portugal, dos anos 70 aos nossos dias, com base numa reflexão, simultaneamente, empírica e teórica, sem cair numa rudimentar visão sincrética. Esta temática tem sido amplamente debatida, sem que haja, todavia, uma compreensão global do estado da problemática, porquanto a pluralidade de opiniões e os erráticos palpites de numerosos leigos, não tem favorecido a clarificação das questões basilares, entre os especialistas e junto da opinião pública, e também a elucidação das opções em aberto no actual sistema de ensino português.  
 
          O primeiro grande impulso histórico transformador foi dado por José Veiga Simão, Ministro da Educação Nacional durante parte do Governo de Marcelo Caetano (1970-1974), que estabelecendo a necessidade de democratizar o ensino no país abriu a porta à massificação do ensino obrigatório, num tempo de significativo analfabetismo popular. Por outro lado, o ideal educativo do desenvolvimento integral dos indivíduos, que Sua Santidade, o Sumo Pontífice, Bento XVI nos vem recordar, numa época excessivamente centrada nas competências competitivas, na sua mais recente e notável encíclica “Caridade na Verdade”[1], a par da metodologia pedagógica activa introduzida pela “Escola Nova”[2], que recentrou o ensino português e europeu nas aprendizagens dos alunos, inverteram o paradigma pedagógico tradicional até então dominante[3]. 
 
          Este novo paradigma pedagógico, implementado no contexto revolucionário da esperança libertadora do PREC, pecou pelo excesso da viragem institucional nas escolas do país, ao ponto da anarquia pedagógica contaminar o sistema de ensino nos meados dos anos 70, pois, em boa verdade, o eixo estruturante da dinâmica educativa deve assentar, como bem percepciona a sensata e actual linguagem docente, no binómio ensino/aprendizagem. 
 
          Neste complexo quadro histórico, de transmutação do sistema de ensino, estas variáveis alargaram o espaço de competências dos professores[4], que, dessa forma, assistiram à mudança de paradigma pedagógico, em função da transição de regime político, sem que tivessem tempo para se adaptarem. Daí que, como atentos observadores, não estranhemos a confusão revolucionária que contaminou o sistema de ensino, nos meados dos anos 70, colocando em causa hierarquias escolares e metodologias pedagógicas tradicionais.
 
          Assim, os professores do novo regime democrático passaram a ter que ensinar a aprender, que motivar para as diversas aprendizagens, que fomentar a formação de competências sociais e cívicas, para além de ensinarem as matérias programáticas, que já anteriormente lhes eram incumbidas. Em suma, os docentes passaram a ter que desenvolver mais tarefas e de maior complexidade, num “estalar de dedos”, fazendo desembocar o sistema, imprudentemente, num caótico estado qualitativo… 
 
          Em concomitância, emergiu a necessidade de massificar o ensino público, o que obrigou o sistema a alargar o número de professores ao serviço do Ministério da Educação, tornando, assim, as exigências doutrinárias, proclamadas pelas Ciências Psico-Pedagógicas e pelas autoridades políticas, inviáveis de serem cumpridas no curto e médio prazos. Houve, com efeito, uma falta de razoabilidade nos organismos governativos que tutelaram o ensino público[5].
 
          Neste quadro geral de pressupostos educativos, a finalidade do desenvolvimento integral dos alunos implicou a consecução da acção pedagógica ao nível do Saber, do Saber-Fazer e do Saber-Estar, o que tornou as tarefas docentes mais complexas e mais difíceis de serem aferidas em termos da qualidade dos desempenhos profissionais. Aliás, este requisito de complexidade da acção educativa entra, ironicamente, em profunda contradição com os “rankings das escolas secundárias”, impostos pela tutela, que pretendem classificar, de forma perfeitamente adulterada, as escolas pelos resultados cognitivos dos seus alunos. 
 
          Deste modo, este mecanismo classificativo de escolas secundárias é uma autêntica aberração à luz da natureza humana e do actual conceito psicológico da inteligência emocional, de Daniel Goleman[6] e de António Damásio, ou, por outras palavras, em lúcida linguagem popular diríamos que “não joga a bota com a perdigota”, porque se assume que o sistema de ensino público deve pugnar por uma educação global e, na prática, a tutela administrativa estabelece uma lista ordenada decrescente das melhores escolas secundárias do país com base em resultados cognitivos…
 
          É certo que este mecanismo classificativo do sistema de ensino trata o lado mais fácil da avaliação educativa, mas a educação por excelência só é possível de ser qualificada, e não apenas de ser quantificada e, por isso, os “rankings das escolas” são simplesmente uma aberração pedagógica de transviadas orientações administrativas.
 
          Há, pois, vários problemas estruturais, do ensino, básico e secundário, em Portugal, que estão, sobejamente, diagnosticados pelos sociólogos da educação, advindos da estruturação formulada no pós-25 de Abril em função dos ideais libertários. Com efeito, conjugaram-se, desde essa altura, vários factores históricos que contribuem para a fraca eficácia do actual sistema educativo português: 1. os pais, muitas vezes, demitem-se dos seus papéis educativos; 2. as reformas de política educativa têm sido, quase, sempre de alcance conjuntural; 3. as modernas Pedagogias têm enfatizado em excesso os aspectos folclóricos da educação[7]; 4. a pressão das estatísticas nacionais e internacionais têm dado azo ao facilitismo pedagógico e, finalmente; 5. as práticas docentes têm sido, muitas vezes, resistentes às mudanças. 
 
          Em resumo, este caldo de inércia e de desnorte social, político, pedagógico e profissional não tem favorecido a melhoria dos padrões de ensino em Portugal, porque como tenho, sempre, sustentado existe um conjunto de variáveis sistémicas que são co-responsáveis pelo estado do ensino em Portugal.
 
          Por conseguinte, só uma reforma estrutural da educação que seja mobilizadora de todos os agentes envolvidos no sistema de ensino público português poderá conseguir gerar as harmoniosas sinergias para uma educação globalizante e, efectivamente, de qualidade. Por esta razão, só com a co-responsabilização e a convicção profunda de pais, de agentes políticos, de cientistas sociais, de meios de comunicação social, de professores e de educadores, munidos de boa vontade e de bom senso, se poderá implementar uma verdadeira reforma do ensino público português, de nível básico e secundário. 
 
          Na realidade, um dos principais problemas que contribui para a instabilidade do sistema em Portugal é a falta de autoridade dos professores que se alicerça, em parte, na regulamentação legal[8], hiper-protectora dos direitos dos alunos que visa o programático objectivo de lutar contra o absentismo escolar dos estudantes do ensino básico obrigatório.
 
          Nesta perspectiva, não há uma proporcionalidade de meios e de fins, porquanto embora esta finalidade de política educativa seja louvável, os mecanismos empregues através dos diversos Estatutos do Aluno do Ensino Básico e Secundário, promulgados por vários Governos, têm conduzido à permissividade disciplinar das escolas, desembocando, pois, esta situação na progressiva perda de autoridade dos professores. Daniel Sampaio, perito nesta problemática, assume outras variáveis que condicionam este indesejável fenómeno, mas, do meu ponto de vista, estas circunstâncias de âmbito político-legislativo não são menosprezáveis.
 
          Outro problema, do sistema de ensino português, de significativo peso é a avaliação docente, alterada durante o Governo de José Sócrates, que tem um grau elevado de subjectividade epistemológica como, aliás, nos demonstra o facto dos modelos avaliativos docentes variarem de um país para outro. Não obstante, importa reconhecer que a avaliação docente influencia a qualidade do sistema de ensino, no entanto uma avaliação de desempenho docente basicamente quantitativa e burocrática, como no presente modelo promulgado pela tutela, não é compaginável com uma educação global. É nesta incomensurável contradição que assenta o drama sistémico com que os actuais políticos tecnocráticos da “5 de Outubro” (Maria de Lurdes Rodrigues, Valter Lemos e Jorge Pedreira), se debatem.
 
          Na verdade, para a consecução de uma educação global, integral dos alunos, são necessárias a motivação e a mobilização de professores com sensibilidade humanista, e não de professores-burocratas com mera sensibilidade técnica, para que os docentes possam ser avaliados de forma qualitativa e formativa em função de uma pluralidade de perfis pedagógicos. Caso contrário, em face do presente rumo da tutela, estaremos a criar perversamente escolas com modelos empresariais de objectivos produtivos, com funcionamentos pouco democráticos e muito afastadas do modelo pedagógico globalizante que comporta, inevitavelmente, a dimensão criativa dos educadores e dos educandos[9].
 
          Finalmente, outro “handicap” que se manifesta no sistema de ensino em Portugal é o fenómeno da iliteracia. Em boa parte, a iliteracia estudantil deriva das folclóricas pedagogias modernas e da diminuição do grau de exigência dos docentes para efeitos estatísticos. Este fenómeno traduz-se no facto dos estudantes saberem ler de forma literal, mas, na prática, serem incapazes de interpretar e compreender questões, textos, gráficos, etc. Ou seja, os alunos do ensino básico e secundário sofrem de uma escolarização pouco alfabetizada, como bem destacou o escritor Vasco Graça Moura no que concerne ao ensino da língua portuguesa e ao conhecimento da literatura nacional em função da fasquia definida nos programas do ensino secundário desta disciplina.
 
          Em conclusão, para se superar estas contradições, hesitações e ambiguidades do sistema de ensino em Portugal, que se eternizam no regime democrático, afigura-se-nos fundamental que haja um amplo debate de especialistas da educação, de cientistas e de pedagogos, e que todos os agentes envolvidos no processo educativo se co-responsabilizem pelo cumprimento dos seus deveres, no respeito pela diferença de funções e pela pluralidade de perfis pedagógicos, no sentido de formular um sistema minimamente coerente de ensino, não coercivo, em que todos os intervenientes se auxiliem e se esmerem. Porquanto, de contrário, “sobe à tona”, inúmeras vezes, a tendência de “passar a batata quente” para o vizinho da cadeia educativa[10]!


          Em suma, diremos que só um consenso espontâneo de especialistas conjugado com a boa vontade, o bom senso e a sensibilidade humanista, como nos recomenda Sua Santidade Bento XVI na sua mais recente encíclica[11], de pais, de professores, de cientistas, de políticos e de cidadãos permitirá operacionalizar uma, efectiva, melhoria do sistema de ensino nacional, de forma a afinar os tons melódicos destes diversos agentes educativos, pois sem este requisito primordial a harmonia sistémica do ensino nacional não será viável.
 
Nuno Sotto Mayor Ferrão
 

 


[1] “(…) A fidelidade à pessoa humana exige a fidelidade à verdade, a única que é garantia de liberdade ( Cf. Jo 8,32 ) e da possibilidade de um desenvolvimento humano integral. (…)” in Bento XVI, Caridade na Verdade, Prior Velho, Edições Paulinas, 2009, p. 14.
[2] A Escola Nova, ou Escola Activa, que se desenvolveu na Europa e na América na primeira metade do século XX, só teve efectiva aplicação em Portugal no regime democrático pós-25 de Abril dado que a visão tradicionalista da Educação do Estado Salazarista não permitiu grandes inovações no ensino público.
[3] O paradigma pedagógico dominante desde a época Napoleónica estava centrado no saber do professor e desprezavam-se as aprendizagens afectivas e comportamentais dos alunos.
[4] Os professores neste tempo de mudança deixaram de ter por missão exclusiva instruir e passaram a ter que instruir e educar os alunos e, deste modo, deixaram de se preocupar apenas com o ensino e foram arremessados para a dupla função de ensinar e de fazer aprender. 
[5] Daniel Goleman, Inteligência Emocional, Lisboa, Editora Temas e Debates, 2002.
[6] Gabriel Mithá Ribeiro, A pedagogia da avestruz: testemunho de um professor, Lisboa, Gradiva, 2004.
[7] Estatuto do Aluno do Ensino Básico e Secundário definido pela Lei nº 3/2008, de 18 de Janeiro.
[8] Vide a excelente análise de um dos mais conceituados pensadores internacionais que nos fala da necessidade da criatividade no trabalho e no ensino: “(…) É inevitável, assim, que a avaliação, (…) tenda a transformar todas as relações humanas em relações funcionais de poder. O preço a pagar por esta tecnologia biopolítica é, evidentemente, (…) a diminuição brutal dos possíveis, a restrição do aleatório (…) Como estes serão transformados em funções – a famosa ‘criatividade’ no trabalho, nas empresas, nos serviços, na publicidade, nos média -, os próprios factores aparentemente incodificáveis serão avaliados, quantificados, normalizados. (…) in José Gil, Em busca da identidade- o desnorte, Lisboa, Relógio d’ Água, 2009, pp. 52-53.
[9] Por exemplo, a “passagem da batata quente” fez-se, no sistema, da seguinte forma: o pai responsabiliza o professor do insucesso do seu filho, o professor responsabiliza o pai pelo seu pouco envolvimento na escola, o político responsabiliza o professor pela sua inércia pedagógica, etc. E, deste modo, nada se resolve.
[10] Bento XVI, Ibidem, p. 14.

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