O BOM SENSO NA COMUNIDADE INTERNACIONAL E OS PROCESSOS DE PAZ E DE JUSTIÇA NO MUNDO
O bom senso é um conceito ligado à percepção intuitiva de razoabilidade, que faz as pessoas prever as consequências das suas ações, instigando-as a bons julgamentos e a boas escolhas.
Segundo o filósofo grego Aristóteles, o bom senso era a condição indispensável para uma conduta ética e esta passaria por achar o meio termo entre hipóteses eventualmente antagónicas. Deste modo, o bom senso é a capacidade humana espontânea de fazer o que é mais correto, mas dentro de certos procedimentos considerados normais pela maioria das pessoas. Será que Donald Trump, Kim Jong-un, Pedro Pablo Kuczynski, Mariano Rajoy e Jimmy Morales estão a revelar atitudes sensatas, patenteando bom senso?
O Presidente Donald Trump decidiu, sem qualquer bom senso, transferir a embaixada dos EUA para Jerusálem e reconhecer, unilateralmente e à revelia da comunidade internacional e das Nações Unidas, esta cidade como capital de Israel para grande júbilo de Benjamin Netanyahu. Para Israel, Jerusalém tem sido a capital do Estado judaico, mas sem que tenha havido um reconhecimento internacional desta situação. Os EUA e a Guatemala transformaram-se, até ao momento, nos únicos países do mundo a fazer este reconhecimento.
O conflito israelo-palestiniano parece entroncar na fundação de Israel, em 1948, arrastando-se in illo tempore, pelo que lançar mais achas para a fogueira não parece ser de bom senso... Isto porque Israel considera Jerusalém, cidade santa, a sua capital, mas também os palestinianos, que aspiram à criação do seu próprio Estado, sustentam que Jerusalém-leste deverá ser a capital deste eventual futuro Estado Palestiniano. A falta de razoabilidade desta decisão de Donald Trump está no facto do estatuto de Jerusalém dever ser definido em negociações entre os israelitas e os palestinianos, como o consagram diferentes resoluções da ONU.
No absurdo discurso do início de dezembro de 2017, Donald Trump defendeu o direito de Israel e da Palestina de coexistirem, futuramente, como dois Estados soberanos e que tudo fará para ajudar a implementar uma solução pacífica. No entanto, as consequências previsíveis dum agravamento da tensão entre israelitas e palestinianos fizeram-se sentir, de forma bem visível, na comunicação social, logo após o insensato anúncio do Presidente dos EUA.
Porém, após a sua declaração formal é que apelou à calma e enviou o seu vice-presidente em viagem ao Médio Oriente. Este parece ser um exemplo significativo do que é a falta de bom senso nas relações internacionais.
Historicamente, a comunidade internacional nunca reconheceu Jerusalém como capital de Israel, porque Jerusalém oriental foi ocupada militarmente em 1967 pelo Estado Judaico, mas continua a ser reclamada pela Autoridade Nacional Palestiniana e mantém-se, por isso, como motivo de controvérsia o seu estatuto e constitui um dos principais impedimentos ao processo de paz no Médio Oriente.
Em 2017, também o mundo acordou assustado com a capacidade de hostilidade nuclear da Coreia do Norte, que criou uma poderosa bomba de hidrogénio, cuja experiência provocou abalos sísmicos nas zonas limítrofes. Kim Jong-un vem ameaçando que esta bomba nuclear pode ser colocada num míssil balístico intercontinental, podendo atingir grandes distâncias. Com as recentes experiências, no verão deste ano, a Coreia do Norte tem assustado os seus vizinhos e a comunidade internacional.
A tensão entre os EUA e a Coreia do Norte tem sido protagonizada pelos seus exuberantes e erráticos líderes, com atitudes provocatórias muito perigosas, as quais revelam a falta de sensatez destes dois protagonistas políticos da História da Humanidade.
Na Catalunha, o referendo de 1 de outubro de 2017, relativo a uma eventual independência do território, mostrou uma vontade inequívoca dos cidadãos catalães, que se deslocaram às urnas, de se emanciparem de Espanha. Mariano Rajoy reagiu com mecanismos opressivos, decidindo ilegalizar o referendo e depois destituir o Governo da Catalunha, no sentido de impedir a fragmentação do Estado Espanhol, uma vez que sabemos que a Espanha é formada por um conglomerado de nações.
No entanto, a tensão entre a Catalunha e Madrid revelou uma clara falta de lucidez, de bom senso se quiserem, uma vez que em democracia as questões políticas devem ser resolvidas pela via do diálogo e da auscultação das populações. Com as eleições de 21 de dezembro de 2017, este problema, amplificado pela insensatez de Mariano Rajoy, encontra-se longe de estar resolvido.
O Presidente do Peru, Pedro Kuczynski, evidenciou, também, grande falta de bom senso na sua atuação recente, porque indultou o antigo presidente Alberto Fujimori, sob o pretexto de uma saúde debilitada, quando pelo meio se suspeita que tenha havido negociações políticas para a manutenção do atual Presidente. Fujimori foi condenado a 25 anos de prisão por violação dos Direitos Humanos e por corrupção financeira como Presidente do Peru. Este indulto desencadeou manifestações públicas de milhares de pessoas e mesmo confrontos físicos dos contestatários com a polícia.
Em suma, verificamos que sem o bom senso dos protagonistas políticos e económicos internacionais a paz e a justiça no mundo continuarão a ser miragens, apenas acessíveis aos discursos da ONU, das igrejas e dos filósofos. O Papa Francisco colocou, no centro da sua mensagem Natalícia neste dezembro de 2017, o sofrimento dos povos que estão sujeitos a crises, a guerras e a conflitos, e as crianças e os inocentes que arrastados por estes problemas se tornam, infelizmente, suas vítimas.
Contudo, o bom senso tem de emanar dos cidadãos para que possa chegar a contaminar positivamente a consciência errática dos líderes mundiais. E um exemplo disso foi o caso flagrante de mau senso, que colocou em causa a justiça social na cidade de Lisboa com uma loja da Padaria Portuguesa, da freguesia da Graça, a deitar no lixo um conjunto de bolos-reis, que podiam ser dados a pessoas mais carenciadas, o que justamente indignou a consciência de muitos concidadãos nas redes sociais.
Nuno Sotto Mayor Ferrão