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Crónicas do Professor Nuno Sotto Mayor Ferrão

Crónicas que tratam temas da cultura, da literatura, da política, da sociedade portuguesa e das realidades actuais do mundo em que vivemos. Em outros textos mais curtos farei considerações sobre temas de grande actualidade.

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O ESPÍRITO DO NATAL, SEU SIGNIFICADO NO PASSADO E NO PRESENTE, NA CONJUNTURA DE CRISE DA CIVILIZAÇÃO EUROPEIA

El Greco, Natividade

 

“(…) Tudo isto aconteceu para se cumprir o que o Senhor tinha dito pelo profeta: «Eis que a Virgem conceberá e dará à luz um filho; e hão de chamá-lo Emanuel, que quer dizer Deus connosco. Despertando do sono, José fez como lhe ordenou o anjo do Senhor, e recebeu sua esposa. E, sem que antes a tivessem conhecido, ela deu à luz um filho, ao qual ele pôs o nome de Jesus. (…)” Evangelho segundo São Mateus, 1, 22-25, in Bíblia Sagrada, Lisboa, Difusora Bíblica, 2002, p. 1566.

 

O Natal é a celebração do nascimento de Jesus Cristo, que se assume como um acontecimento religioso que expresso nas escrituras Sagradas do Novo Testamento tem influenciado a Ética e a Arte da Civilização Ocidental nos últimos séculos. No entanto, não nos podemos esquecer que a religião Cristã surgiu e desenvolveu-se no seio de um império materialista que estava a entrar em decadência - o império romano. Hoje, como ontem, e digo-o como eco-socialista-cristão, face à cultura materialista e tecnocrática dominante que desencadeou tendências individualistas e egoístas parece-me que a existência de místicas e de utopias é cada vez mais fundamental para que todos possamos ser concidadãos num mundo mais justo e mais humano. Esta foi a razão objetiva da conversão de São Paulo no primeiro século da nossa Era e do imperador Constantino no início do século IV.

 

Obviamente, para os cidadãos laicos, das sociedades europeias, Jesus Cristo pode não passar de um revolucionário que subverteu no longo prazo as estruturas religiosas e mentais do Império Romano. Contudo, para as pessoas de fé Jesus Cristo é visto como o filho de Deus que desceu à terra para pregar ideais Éticos que, defendidos e praticados, afastavam, paulatinamente, o Homem do Mal (do pecado) e garantiam a multidimensionalidade do Homem (corpo e espírito) nas sociedades onde vivessem cristãos. Acontece que, hoje em dia, com o capitalismo financeiro instalado no centro da Globalização, os cidadãos e os políticos tendem a olvidar os valores Éticos, porque as tendências para o hedonismo e o individualismo fazem desprezar os sentimentos da bondade, da solidariedade e da compaixão.

 

A Europa tem-se esquecido progressivamente da sua matriz cultural cristã, como se notou quando afastou do projeto de um Tratado Constitucional Europeu uma referência clara do Cristianismo como um dos pilares da Civilização Europeia, que se encontra, como todos sabemos, em decadência. A Doutrina Social da Igreja é respeitadora dos Direitos Humanos e Sociais dos indivíduos e, por isso, é profundamente lamentável que as correntes políticas moderadas e humanistas da democracia-cristã, da social-democracia e do socialismo cristão democrático estejam a perder terreno para a “teologia de mercado”, designada por neoliberalismo. O Natal surgiu como data comemorada no século IV d.C., após a conversão do Imperador Constantino, num ato de fé individual. Todavia, o Natal tornou-se no Império Romano, neste século, uma data celebrativa para converter os pagãos. Desde essa época, até hoje, o Cristianismo foi-se espraiando e moldando às diferentes conjunturas históricas pelos sete cantos da Europa e do mundo.

 

Em conclusão, o significado do Natal é aquele que já apresentámos, mas tornou-se, também, a festa das famílias cristãs que se reúnem para se recolherem no aconchego dos seus lares afetivos e para celebrarem a vinda de Deus feito Homem que desceu dos céus para nos dar a Boa Nova de uma vida que se deve nortear por uma conduta impoluta de Amor aos outros e por uma mensagem de Esperança em relação ao futuro.

 

Nuno Sotto Mayor Ferrão 

 

   

2º ANIVERSÁRIO DO BLOGUE “CRÓNICAS DO PROFESSOR NUNO SOTTO MAYOR FERRÃO”

 

O simpático Pato Donald, uma das figuras mágicas da “Walt Disney Company”, veio festejar connosco o 2º aniversário deste blogue. Quero agradecer a todos, leitores e amigos, o estímulo que me têm dado neste projecto, que sem vocês não teria sido possível erguer. Deixo, pois, o meu sentimento de profunda gratidão por todos, amigos, conhecidos e visitantes, de diferentes paragens geográficas, que me têm apoiado, de uma forma ou de outra, no desenvolvimento deste aliciante projecto. Sem o vosso interesse, caríssimos leitores, este blogue, de feição cívica e cultural, não teria sido possível medrar.

 

Não me quero repetir em relação à mensagem do ano transacto, mas não posso deixar de agradecer de forma especial aos amigos Professores Universitários José Medeiros Ferreira e Ana Paula Fitas e às Professoras Elsa Castro e Paula Magalhães que acreditaram neste projecto e me deram pistas práticas e técnicas que fizeram nascer e amadurecer este blogue. Quero agradecer, também, ao Professor Universitário Renato Epifânio que me integrou entre os colaboradores da revista cultural “Nova Águia” e do blogue do Movimento Internacional Lusófono (Milhafre), a que muito me honro de pertencer.

 

O meu sentimento de gratidão estende-se a todos, os leitores e visitantes, que têm acompanhado este desafio, com interesse, e aos internautas que por cá têm passado. Devo reconhecer, com sinceridade, que tenho aprendido muito, também, com os blogues que tenho visitado, do ponto de vista dos seus conteúdos e padrões estéticos, pois incitam-me a tentar tornar este espaço cada vez mais acolhedor e enriquecedor dos leitores que o visitam.

 

A filosofia deste projecto consta, da linha editorial, da apresentação do blogue: “Crónicas que tratam temas da cultura, da literatura, da política, da sociedade portuguesa e das realidades actuais do mundo em que vivemos. Em outros textos, mais curtos, farei considerações sobre temas de grande actualidade”. Julgo ter cumprido estas metas definidas, mas estou aberto às críticas e aos comentários, que são muito úteis, para se proceder a uma avaliação construtiva, que se deve pautar por padrões Humanistas, e se aprofundar as questões lançadas através de debates abertos.

 

Juntei, em Fevereiro de 2010, um contador que me proporciona, a par dos comentários directos ou indirectos, algum “feedback” da aceitação que o blogue vai tendo no maravilhoso Mundo Novo da blogosfera. Já durante este ano, após ter frequentado uma formação em recursos digitais, introduzi uma estação de rádio (RFM), que oiço há vários anos, como som de fundo do blogue. Estou aberto a críticas e a todas sugestões construtivas que os leitores me queiram deixar, que são sempre bem-vindas.

 

Sei que, ainda, posso melhor mais a qualidade e a programação do blogue e, nomeadamente, desejo introduzir alguns “selos” identificativos, de forma que se alguém souber ajudar-me, com conselhos práticos, fico muito agradecido. Estou, também, com a dúvida de saber se devo, ou não, mudar o “cenário” deste blogue e fico a aguardar, as vossas opiniões, para poder decidir com base na vossa percepção. Na verdade, tem sido um enorme prazer escrever, seleccionando documentação relevante, sobre os diversos temas que vou abordando.

 

“Last, but not least”, reconheço o inestimável apoio que a minha “cara-metade”, os meus pais, os muitos amigos e alguns primos me têm dado no desenvolvimento deste entusiasmante projecto.

 

Caríssimos concidadãos, e visitantes de diversas partes do mundo, espero, assim, poder corresponder às vossas mais legítimas expectativas, mas em plena consciência o afirmo: este blogue é um espaço vosso, no sentido de que possamos construir, através da partilha de ideias, de experiências e de saberes, um mundo melhor e mais justo que se compagine com os ideais de uma cidadania que se quer global, interactiva, em prol da Defesa Universal dos Direitos Humanos. Lembro, a este propósito, que sustentei, no primeiro “post”, aqui publicado, que São Paulo de Tarso, em 2009 celebrado pela passagem do segundo milénio do seu nascimento, se afirmou como um dos primeiros indivíduos a defenderem “avant la lettre” a igualdade de todos os seres humanos.

 

A avaliação qualitativa que faço deste projecto tem sido, pessoalmente, muito gratificante, mas do ponto de vista quantitativo nota-se, também, uma evolução bastante positiva ao longo dos últimos meses com um crescente número de visitantes, não obstante haja algumas periódicas oscilações e seja, mesmo, de esperar uma quebra, nesta altura que, em Portugal, corresponde às férias do Verão. Felizmente, e com muito agrado, constato que o blogue tem registado muitas entradas de outros países, que gostaria de saudar de forma muito efusiva, porque este é um dos papéis mais importantes da Globalização: a união de povos e de pessoas de diferentes latitudes e longitudes através de uma sociedade da informação que contribua para a compreensão das complexas tendências do mundo contemporâneo.  

 

Convido-vos, como forma de festejar o 2º aniversário deste blogue, a assistir a um pequeno excerto de um desenho animado do aniversário do Pato Donald, que num gesto de incompreensão, não captou a generosidade dos seus sobrinhos, que simplesmente pretendiam oferecer-lhe um presente. Com este aspecto, talvez eu queira demonstrar a necessidade de valorizar mais a vertente sarcástica que alguns “posts” devem passar a conter. Vejamos se serei capaz de o fazer.

 

Deixo-vos, pois, dois vídeos para que possa celebrar convosco esta data simbólica deste espaço de liberdade e de reflexão, que espero possa continuar a merecer a vossa visita.

 

Nuno Sotto Mayor Ferrão

 

MANOEL DE OLIVEIRA: UM CINEASTA COM UMA VISÃO HUMANISTA UNIVERSAL

 

Manoel Cândido Pinto de Oliveira nasceu no Porto, a 11 de Dezembro de 1908, no seio de uma família da burguesia industrial nortenha que possuía fábricas em diversos sectores: têxtil, das lâmpadas eléctricas e da produção hidroeléctrica. É, na actualidade, o mais velho cineasta do mundo, tendo celebrado o seu centésimo segundo aniversário no final do ano que passou (2010). Aos 19 anos começou a trabalhar, auxiliando o pai, na indústria e na gestão agrícola de propriedades rurais. Ao mesmo tempo, cultivou uma vida boémia e de enriquecimento cultural frequentando tertúlias literárias. Nos primeiros anos de vida alcançou alguma notoriedade pública como um infatigável desportista, cultivando diversas modalidades como a ginástica, a natação, o remo, o atletismo e o automobilismo, tendo sido campeão de salto à vara e ganho uma corrida de automóveis.

 

Foi um prolífero cineasta que se dedicou à criação de documentários etnográficos e de filmes poéticos que geraram celeuma pública e reconhecimento da crítica internacional. Estes filmes poéticos, de rara beleza, que constituem o cerne do seu estilo cinematográfico caracterizam-se pelos longos diálogos em prejuízo da acção dos personagens, mas são reveladores de cenários históricos ou sociais onde perpassam íntimas subjectividades. Com efeito, a mensagem poética dos seus filmes valorizadora dos diálogos teatrais, repare-se na cena aqui reproduzida do filme “Non ou a vã glória de mandar” (1990), em ritmo lento constituem ecos ressonantes que se instalam no Espírito do espectador mais atento.

 

Efectivamente, houve três factores biográficos que marcaram este seu cunho cinematográfico. Em primeiro lugar, os filmes que o pai o levou a ver de Charles Claplin e de Max Linder. Em segundo lugar, a sua convivência com escritores como José Régio e Agustina Bessa-Luís e a leitura das Cartas de São Paulo, talvez por ter passado por um colégio de Jesuítas na Galiza, que se repercutiu na sua mentalidade fortemente espiritual. Em terceiro lugar, a sua formação artística inicial, nos anos 20, onde frequentou uma escola de actores, fundada pelo cineasta italiano Rino Lupo na cidade do Porto, e a sua participação em 1933 no filme sonoro português intitulado “A Canção de Lisboa” do cineasta e arquitecto Cottinelli Telmo.

 

Afigura-se-nos que devido ao retrato antropológico, demasiado próximo das correntes do Neo-Realismo, imprimido à sociedade portuguesa no seu clássico filme Aniki-Bobó (1942) e nos seus documentários etnográficos, por exemplo no filme “Douro, Faina Fluvial” (1931), foi preterido pelo regime do Estado Novo que mediante o Fundo do Cinema não lhe reconheceu talento no quadro dos pressupostos ideológicos Salazaristas, dando antes preferência ao estilo da comédia popular que entretinha a população portuguesa. Em 1962 quando rodava o filme “O Acto da Primavera” foi detido pela PIDE, durante alguns dias, devido a alguns diálogos da película que geraram inquietação nos agentes do regime.

 

A sua carreira cinematográfica só ganhou um ritmo alucinante, em contraposição ao ritmo das suas películas, com a sua consagração internacional, a partir dos anos 60, com os reconhecimentos da crítica cinematográfica, francesa e italiana, e com o desabrochar do regime de liberdades instaurado com a Revolução do 25 de Abril de 1974 que lhe permitiu a liberdade criativa para produzir uma obra que é parte integrante do Património Cultural definidor da identidade portuguesa. Assim, durante o regime do Estado Novo realizou apenas três longas-metragens e com o regime democrático fez vinte e sete longas-metragens. O reconhecimento internacional adveio dos Prémios de alguns Festivais de Cinema que tem recebido e dos mediáticos actores estrangeiros que colaboraram em alguns dos seus filmes (Catherine Deneuve, Marcello Mastroianni, John Malkovich, Lima Duarte, etc).


É indeclinável que alguns actores portugueses amadureceram nos seus filmes (Luís Miguel Cintra, Leonor Silveira, Diogo Dória, Rogério Samora, etc.). Manoel de Oliveira acabou de realizar a sua última curta-metragem, no final de 2010, com uma homenagem à Cultura Portuguesa intitulada “Painéis de São Vicente de Fora, Visão Poética”. O seu reconhecido papel como criador cultural fê-lo liderar um grupo de personalidades ligadas à Cultura Portuguesa que receberam o Papa Bento XVI em Lisboa no Centro Cultural de Belém. Com estes gestos simbólicos, de plena lucidez, quis-nos transmitir a noção de que a sua obra está recheada de um Humanismo Universalista que pode e deve fazer irradiar o espírito lusófono de abertura ao mundo.

 

Nuno Sotto Mayor Ferrão

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

1º ANIVERSÁRIO DO BLOGUE "CRÓNICAS DO PROFESSOR NUNO SOTTO MAYOR FERRÃO"

  

No primeiro aniversário deste blogue, iniciado a 23 de Julho de 2009, quero partilhar convosco algumas ideias. É com gratidão, e imenso prazer, que tenho sentido um caloroso acolhimento por parte do público leitor. Agradeço, por isso, todo o apoio, atenção, estímulo e paciência que muitos amigos e leitores me têm dispensado. Com efeito, tem sido com muita satisfação que tenho escrito para este blogue que se tem desenvolvido em função de temas culturais, em textos longos de maior pesquisa ou em textos breves de maior vigor inspirativo, embora não tenha dado tanta relevância aos temas da actualidade como inicialmente tinha definido na filosofia deste projecto.

 

Tudo começou quando, no Verão de 2008, comecei a escrever uns textos manuscritos que depois enviei pela Internet a alguns amigos e a perceber, em seguida, existir alguma receptividade geral. No início de 2009 fiz circular uns textos sobre política educativa e política geral, que se podem ainda hoje encontrar na Internet, que tiveram uma empática recepção no contexto da crispação entre os docentes e a tutela. Houve, em particular, uma colega de Língua Portuguesa da Escola Secundária, onde anteriormente leccionei, que teceu considerações muito simpáticas sobre um dos meus textos e que o ajudou a divulgar. Fico-lhe, por isso, muito grato e este projecto é resultado deste e de outros importantes contributos que abaixo menciono.

 

Em Junho de 2009, após uma formação espiritual sobre o apóstolo São Paulo, a propósito da comemoração dos dois mil anos do seu nascimento, fui convidado a fazer uma pequena comunicação, a título de testemunho, na Igreja da minha paróquia que depois transformei num texto insuflado de inspiração, que se tornou o “post” inaugural do blogue intitulado “A Modernidade Cultural e Cívica do apóstolo São Paulo – o apóstolo dos gentios”, a seguir a ter participado num debate aberto numa conferência, sobre esta eminente figura histórica e religiosa, proferida pelo Professor Doutor Marcelo Rebelo de Sousa.

 

Devo, também, uma palavra de grande reconhecimento ao meu amigo Professor Doutor José Medeiros Ferreira que me estimulou a continuar a desenvolver pesquisas históricas e a escrever novos textos. Foi, também, muito relevante o “post” que escreveu no seu antigo blogue “Bicho Carpinteiro” sobre o aparecimento destas “Crónicas”. Espero que passado um ano, este trabalho, não lhe tenha frustrado as expectativas.

 

As encorajadoras palavras recebidas de um dos nossos grandes Pensadores têm-me, também, dado bastante alento para continuar a escrever e a partilhar, neste blogue, textos de reflexão e de pesquisa.

 

Tenho desenvolvido ainda o gosto de viajar na blogosfera e de fazer comentários em blogues com os quais me identifico e em que encontro conteúdos de qualidade. Foi, por isso, extremamente importante o incentivo e a troca de ideias com autores de outros blogues, como sejam os casos: do Embaixador Francisco Seixas da Costa, da Professora Doutora Ana Paula Fitas, do Deputado e Advogado Osvaldo de Castro, dos Jornalistas João Rodrigues e Carlos Barbosa de Oliveira, etc. Quero também deixar uma palavra de agradecimento à amiga e escritora Gilda Nunes Barata que através das suas lisonjeiras palavras e pertinentes sugestões me deu ânimo, bem como o incentivo e o impulso que me foi dada pelo Doutor Renato Epifânio, Investigador na área da Cultura Contemporânea, com o qual partilho uma mesma convicção lusófona.

 

Devo ainda à gentileza de uma colega de trabalho o ensinamento para a incorporação de vídeos no blogue, que têm sido muito úteis para divulgar música clássica e introduzir excertos audiovisuais de valor histórico. “Last but not least”, não me esqueço do inestimável estímulo que a Rita (minha “cara-metade”), os meus pais, os muitos amigos e alguns primos me têm dado no desenvolvimento deste aliciante projecto.

 

De acordo com a estatística do “Sitemeter”,o blogue já conta com alguns poucos milhares de visitas, desde 12 de Fevereiro de 2010, altura em que introduzi este contador. Por mês, em média, tem registado, com algumas variações, mais de 1000 visitas mensais e nota-se já alguns leitores fiéis que o visitam regularmente, o que me deixa muito satisfeito. Em termos de interactividade, este blogue já recebeu várias dezenas de comentários que têm contribuído para transmitir uma palavra de estímulo ou para aprofundar o debate em torno dos temas tratados. Bem-haja a todos os que têm contribuído para o crescimento e amadurecimento sustentado deste blogue!

 

Para terminar direi que os meus propósitos iniciais poderão ter ficado aquém, na medida em que as questões políticas directas e os textos de grande actualidade foram em pequeno número. Espero, em todo o caso, que vocês, caríssimos leitores, sejam benévolos, continuem interessados e possam deixar sugestões para que possamos tornar este projecto cada vez mais apelativo e interactivo!

 

Cordiais saudações a todos, caríssimos leitores e amigos, Nuno Sotto Mayor Ferrão 

AS IMPLICAÇÕES DA AUSÊNCIA DE DEUS NAS SOCIEDADES CONTEMPORÂNEAS - BREVE ENSAIO DE FILOSOFIA DA HISTÓRIA

As implicações da ausência de Deus nas sociedades contemporâneas - breve ensaio de Filosofia da História

 

            Li no ano passado (escrevo em Outubro de 2009) um ensaio teológico, deveras inspirador, intitulado O Cubo e a Catedral[1] que sustenta a tese sociológica de que o Humanismo Cristão é um movimento social e intelectual essencial, sobre o qual a Europa se deve firmar, no sentido de garantir a defesa dos valores espirituais de uma democracia, autêntica, que não seja simplesmente produto das burocráticas orientações administrativas de políticos tecnocratas. Daí que, na lúcida perspectiva de George Weigel, autor do ensaio, seja legítima a conclusão de que as sociedades, sem inspiração divina[2] ou, por outras palavras, que não atribuem importância à realidade transcendental vivem, como diria o nosso consagrado poeta, “numa apagada e vil tristeza”[3].

 

            Esta obra, do teólogo católico George Weigel, foi suscitada pela questão que esteve em debate, quando se estava a tratar da elaboração de um projecto de Constituição Europeia, ao surgir a polémica entre fazer consagrar, ou não, o Cristianismo como um dos valores europeus a nele inscrever.

 

É certo que esta questão polémica, entre europeus laicistas e crentes, alimentou boa parte do debate público aquando da redacção, do documento, chefiada por Valéry Giscard d’ Estaing, como Presidente da Convenção Europeia, nos anos de 2002 e 2003. No entanto, terá prevalecido a posição dos laicistas ou, eventualmente, a questão da hipotética integração da Turquia, que com o peso da religião Islâmica, terá feito prudentemente pender a decisão para a não alusão à importância do Cristianismo na Europa.  

 

            Com efeito, é esta ausência de Deus na vida de muitos homens contemporâneos que os coloca numa situação de vazio ontológico e de uma angustiante solidão espiritual, o que tem feito crescer as tendências de suicídio e as ondas de violência e de agressividade, de jovens e de adultos, nestas sociedades pseudodesenvolvidas.

 

A solução, para inverter este indesejável rumo da História Contemporânea, passa por uma evangelização globalizante do mundo que divulgue, através da percepção intuitiva de leigos e de sacerdotes, a imagem de Deus-Pai, Misericordioso, que nos enviou o seu Filho, Jesus Cristo, para salvar os Homens das tentações de “Satanás” (encarnação simbólica, na religião e na cultura literária e artística, do Pecado e do Mal), pois este Deus, Misericordioso do Cristianismo, zela pelo Bem da Humanidade e instiga os indivíduos a louváveis condutas morais. 

 

            Na realidade, constata-se que decorre da ausência de uma convicção cristã profunda, do inerente afastamento da Doutrina Social da Igreja e do dever de amor ao próximo, o repudiável fenómeno, carregado de mentalidade individualista, da decadência do juízo moral dos indivíduos nas sociedades da Civilização Ocidental.

 

Só uma autêntica consciência cristã, ou outra consciência espiritual fundada num Ser Transcendente e Bom, que ajude a apurar o processo de ajuizamento de boas e de más acções poderá compelir o Homem Contemporâneo a desenvolver a percepção do Bem e do Mal. Caso contrário, o Homem continuará imerso na profusão corruptiva que contamina a alma das sociedades em que vivemos[4].

 

            Não admira, assim, que nas nossas sociedades contemporâneas ocidentais, reforçadas, agora, pela lógica impessoal da Globalização, naufragadas nos processos secularizadores das sociedades e dos Estados e perdidas no turbilhão tecnocrático das políticas sem causas ideológicas (causadoras da indolência ideológica das classes médias), os cidadãos tenham amolecido as suas capacidades de ajuizamento moral das situações quotidianas.

 

            Esta desorientação moral das sociedades ocidentais teve a sua raiz histórica mais profunda nas perversões introduzidas pelo pensamento filosófico de Friedrich Nietzche[5] em torno dos fracturantes temas do Anticristo, do niilismo moral e da vontade férrea do super-homem que desbravaram caminho para as várias tendências egoístas de um individualismo atroz que pauta as sociedades do nosso mundo Globalizado. Este desvirtuamento da mentalidade social da Civilização Ocidental levou, por exemplo, o reputadíssimo escritor Fiódor Dostoiévsky a pôr na boca de uma das suas personagens a seguinte frase, aberrante do ponto de vista ético: “(…) Se Deus está morto, então tudo é permitido. (…)”.

 

            Foi nesta conjuntura do final do século XIX que se puderam desenvolver os fenómenos históricos do relativismo moral na Alemanha[6], do aguerrido anticlericalismo nos países da Latinidade Católica[7], do crescente distanciamento dos intelectuais em relação a Deus e da afirmação do mais forte que deram azo às aberrações totalitárias do século XX e a novas manifestações atentatórias dos mais elementares Direitos Humanos[8].

 

            Com efeito, foi a nefasta influência deste ambiente dominado por um laicismo larvar que contaminou algumas gerações portuguesas da segunda metade do século XX, talvez, em parte, induzidas pela força carismática dos líderes oposicionistas ao regime do Estado Novo e, em parte, por alguma descrença religiosa de ordem metafísica ou social, que fez com que as gerações mais novas, nascidas ou crescidas após a revolução do 25 de Abril de 1974, não tenham na generalidade aprofundado a fé e se auto designem como “católicos não praticantes”. Talvez, esteja aqui uma problemática para um estudo sério no âmbito da sociologia da religião.

 

            Foi, neste ambiente histórico-social, que cresci como adolescente e só, na idade adulta, com uma percepção mais profunda e autónoma da vida, me converti à prática de alguns rituais católicos e, em especial, aderi à convicção cristã, à fé, na existência de uma Força Transcendente, Benevolente e Misericordiosa.

 

Só, a partir dessa fase de maturação espiritual, consegui responder de forma cabal e integradora à interrogação filosófica sobre o verdadeiro sentido da vida. Ao ponto, desta modificação da minha mundividência me levar a afirmar hoje em dia que me sinto um “eco-socialista-cristão”[9]. Até esse momento, tinha andado equivocado com a resposta hedonista que as sociedades pós-modernas apresentam aos incautos cidadãos.  

 

Em suma, a percepção errónea do Homem Contemporâneo levou-o a um esvaziamento interior e à recusa de todas as concepções Hegelianas[10]. Nesta medida, a sensação de vazio, do Homem das sociedades pós-industriais, conduzem-no a uma fuga para a frente, em direcção a uma vida frenética, de um constante dinamismo valorizador da matéria, em detrimento da valorização das actividades de âmbito espiritual. Esta funesta tendência tem desembocado na acelerada secularização de algumas sociedades do mundo Ocidental[11], na perda de nobres valores espirituais[12] e no afastamento progressivo do Homem em relação a Deus. 

 

Na verdade, todos estes fluxos filosóficos e históricos, já enunciados, têm separado o Homem Contemporâneo da oração e da meditação introspectiva. Com efeito, a compreensão destes errados trilhos, do actual paradigma das nossas sociedades, só foi possível aferir, com maior rigor, a partir dos pressupostos psicológicos que Daniel Goleman e António Damásio nos apresentaram, na transição do século XX para o XXI, com a lúcida noção de que o Homem integral carecia de uma inteligência emocional[13].

 

Em síntese, esta inteligência emocional só é passível de se manifestar quando o Homem moderno souber compaginar o saber científico com a intuição religiosa proveniente da fé. São Paulo ensina-nos, com a sua vasta sapiência, a conseguir unir a multiplicidade das dimensões humanas. Urge, pois, que o Homem pseudodesenvolvido arrepie caminho para que se possa sentir um Ser completo e tranquilo[14].

 

Nuno Sotto Mayor Ferrão



[1] George Weigel, O Cubo e a Catedral – A Europa e a América e a política sem Deus, Lisboa, Aletheia Editores, 2006.

[2] As sociedades devem ter “inspiração divina”, mas não devem ser sectaristas e intolerantes como nos ensinou Voltaire, pois as crenças religiosas não podem ser impostas, porque acreditamos que a dignidade humana exige uma liberdade com sentido de responsabilidade.

[3] Luís Vaz de Camões, Os Lusíadas, Cap. X, 145.

[4] Sobre este tema convém atentar nas sábias palavras de Sua Santidade Bento XVI na sua, mais recente e notável, encíclica: Bento XVI, Caridade na Verdade, Prior Velho, Edições Paulinas, 2009, pp. 20,21,111,112 e 113.

[5] As obras em que Friedrich Nietzsche mais desenvolveu estas suas ideias foram: Assim falava Zaratrusta, 1883-1885; Para além do Bem e do Mal, 1886; e O Anticristo (1888).

[6] Esta génese histórica está bem estudada e constitui, uma obra clássica, o estudo de Hannah Arendt, The Origins of Totalitarism, Nova Iorque, Harcourt Brace and World, 1973.

[7] Em Portugal, esta tendência afirmou-se com uma veemência feroz entre os ideólogos do Partido Republicano Português.

[8] O Holocausto Nazi foi o expoente máximo do niilismo ético que as gerações mais novas não devem esquecer como, pelo contrário, devem repudiar de forma inequívoca.

[9] Terei o maior prazer em ajudar a fundamentar, em futura crónica, axiologicamente a simbiose que une e não separa, a meu ver, estes dois ideais. Esta reflexão será uma tentativa de resposta a uma pertinente questão que fico a dever à argúcia do Senhor Professor Doutor Marcelo Rebelo de Sousa que a colocou num debate que se seguiu a uma sua Conferência sobre São Paulo.

[10] George Wilhelm Friedrich Hegel (1770-1831) foi um dos pais fundadores da teoria do Espírito, mas ao seu idealismo respondeu Karl Marx (1819-1883) com as suas premissas materialistas da natureza da História da Humanidade em obras como Crítica da Filosofia do Direito de Hegel, A Ideologia Alemã e O Capital.

[11] Aliás, este actual despojamento espiritual do Homem Ocidental, de europeus e de norte-americanos, tem feito penetrar, na nossa Civilização, algumas tendências mentais da espiritualidade oriental manifestas na alimentação, na arquitectura, nas massagens, ditas vulgarmente como “zen”,etc.

[12] É esta tendência do niilismo e do relativismo que levou a que desde o início do século XX se tenha instalado uma crise de valores que varreu a Europa e os Estados Unidos da América. Foi nesse quadro histórico que, em Paris, o intelectual Paul Valéry já, nessa altura, alertou os seus concidadãos para a crise de valores que estava a abalar a Europa.

[13] Este balanço de Filosofia da História da Civilização Ocidental, na senda epistemológica do caminho que Raimond Aron nos apontou, pode ser aprofundado em outra crónica que escrevi neste blogue com o título “Agonia – o estado da nação ou o estado do mundo ?”.

[14] A inquietude é um dos traços mais marcantes do Homem Contemporâneo, neste turbilhão alucinado de incertezas decorrentes da Globalização defensora da teologia do mercado, portanto importa virar esta página da História da Humanidade rumo a uma Globalização Humanista que volte a requalificar os valores espirituais no sentido de concretizar um paradigma de desenvolvimento humano mais equilibrado. Vide Bento XVI, Caridade na Verdade, Prior Velho, Edições Paulinas, 2009, pp. 121-124.

A MODERNIDADE CULTURAL E CÍVICA DE SÃO PAULO - O APÓSTOLO DOS GENTIOS

Crónicas do Professor Ferrão (12)

"A modernidade cultural e cívica de São Paulo - o apóstolo dos gentios"

Lisboa, 16 de Julho de 2009

 

         Terminou a 29 de Junho de 2009 o ano Paulino comemorativo dos dois mil anos do nascimento do apóstolo de Jesus Cristo – Paulo de Tarso da Cilícia, na actual Turquia. Este texto resultou de algumas reflexões que fui fazendo no grupo Paulino a que pertenci na Igreja de Nossa Senhora do Amparo, na paróquia de Benfica, em torno da Antologia de D. Anacleto Oliveira, bispo auxiliar de Lisboa ( Um ano a caminhar com São Paulo, Coimbra, Coimbra Editora, 2008) e das esclarecidas conferências que tive o privilégio de assistir ( deste autor, do teólogo Juan Ambrósio e do Professor Doutor Marcelo Rebelo de Sousa).  Sem estes contributos intelectuais, sem o debate no grupo Paulino e sem este dom de prosador estas reflexões, seguramente, não poderiam ser partilhadas convosco.
 
            O legado cultural da vida de São Paulo e das suas Cartas apostólicas é de uma notável modernidade como terei oportunidade de demonstrar, como aliás já o fiz publicamente numa pequena intervenção num sarau cultural no salão paroquial da supracitada igreja[1]. No entanto, não irei traçar nenhuma resenha biográfica, mas apenas chamar a atenção para alguns aspectos invulgares da sua vida e obra para a época e, sobretudo, para a actualidade.
 
            Na minha perspectiva, São Paulo foi um precursor na defesa dos Direitos Humanos no contexto histórico do império romano, como já o sustentei algumas vezes, porque universalizou a religião cristã ao evangelizar os gentios, pois transmitiu-lhes a “Boa Nova” da Salvação por Jesus Cristo. O apóstolo Paulo foi, deste modo, responsável pela irradiação geográfica do Cristianismo no mundo Mediterrânico nas pregações feitas durante as suas longas viagens e nas Cartas que enviou às suas comunidades.
 
Efectivamente, esta vertente de defesa dos Direitos Humanos emerge em São Paulo do sentido da igualdade que atribui a todos os Homens mediante o tratamento fraternal de “irmão” que concede a todos os crentes, independentemente do estatuto social de cada um. Assim, no seu modo de ver o importante, não era se alguém tinha o estatuto de centurião ou de escravo, era que esse indivíduo era filho de Deus e, portanto, tinha igual dignidade humana o escravo e o cidadão, o pobre e o rico, devendo todos ser afectuosamente tratados como “irmãos”. Reparemos na Carta de São Paulo a Filémon quando o interpela dizendo: “(…) para que o recebas (…) não já como escravo, mas muito mais do que um escravo: como irmão amado (…)” ( Flm, 15-16 ).
 
Em segundo lugar, a modernidade da mensagem religiosa de São Paulo advém da forte inteligência emocional que manifestou nas suas Cartas às comunidades cristãs, pois estas foram fruto do seu dom de formular uma síntese perfeita entre a fé e a razão. Na realidade, a base da sua convicção foi a fé como sentimento religioso primordial quando afirma na Carta aos Gálatas: “(…) já não sou eu que vivo, mas é Cristo que vive em mim (…)” ( Gl, 2-20). No entanto, a esta base emocional juntou o raciocínio ético que desenvolveu através da pedagogia da palavra para explicar a bondade da mensagem cristã ao desabafar na sua primeira Carta aos coríntios com a coloquial expressão: “(...) ai de mim, se eu não evangelizar!” (…)” (1ª Cor. 9,16).
 
Por consequência, esta inteligência emocional manifestou-se na conduta religiosa de São Paulo ao unir de forma coerente a sua capacidade de acção com a sua força espiritual conseguindo, pois, conciliar a oração com as suas extenuantes viagens apostólicas de pregação religiosa da Boa Nova aos povos pagãos.
 
Importa, agora, examinar duas sugestivas visões da transfiguração de São Paulo de perseguidor de cristãos em obstinado conversor cristão de almas pagãs. Na realidade, há duas interessantes e antagónicas interpretações da sua conversão a caminho de Damasco que merecem ser conhecidas. Enquanto uma corresponde à versão do crente, a outra corresponde à versão laica do ateu. A primeira interpretação, recente, é a do teólogo Juan Ambrósio, da Universidade Católica de Lisboa, que lê a conversão de São Paulo, pelo encontro místico com Cristo Ressuscitado, como um processo lento e comunitário, ou seja, a vivência inicial de São Paulo nas comunidades cristãs, a seguir a esse encontro genésico, constituiu na sua opinião um meio de aprofundamento do conhecimento de Cristo[2].
 
A segunda versão deste acontecimento da vida de São Paulo, que quero referir, é-lhe historicamente anterior (1934) e corresponde à versão laica de um escritor português do Saudosismo ( Teixeira de Pascoais, São Paulo, Lisboa, Editora Assírio e Alvim, 2002 ), contaminado pelo ambiente anticlerical da época, que encara São Paulo como um poeta que se converteu à fé no “Ressuscitado” por um forte sentimento de remorso pela morte de Santo Estêvão, isto é, a aparição de Cristo Ressuscitado dever-se-ia à sua má consciência por este martírio[3]. 
 
São Paulo pela sua vasta cultura, formado na escola judaica de Gamaliel, acabou por ter um papel fundamental na História do Cristianismo ao abrir intelectualmente esta religião, através das suas Cartas, aos valores morais e espirituais que lhe estão subjacentes. Protagonizou, assim, a nobre missão pedagógica de transmitir os valores éticos e as virtudes cristãs que deveriam pautar a conduta dos fiéis do seu tempo e das gerações vindouras.
 
Desta maneira, revelou aos seus contemporâneos, no contexto do desvirtuamento moral do império romano em que a corrupção se generalizara, o inestimável valor das virtudes teologais ( fé, esperança e caridade ) que deviam ancorar a vida dos cristãos em meio social tão adverso. Não me espanta, pois, que tenha exortado a comunidade cristã da cidade de Colossos com as seguintes palavras de revelação ética contra comportamentos egoístas: “(…) Como eleitos de Deus, santos e amados revesti-vos, pois de entranhas de misericórdia, de bondade, de humildade, de mansidão, de longanimidade, suportando-vos uns aos outros (…) se alguém tiver razão de queixa contra outro (…)” ( Cl, 3, 12-13 ).
 
Na verdade, outro indício precursor, e mesmo progressista, da acção apostólica de São Paulo na vida da nascente Igreja foi a activa participação que atribuiu às mulheres na vivência organizacional das primeiras comunidades cristãs, sendo exemplo disso a liderança que delegou em Lídia na Igreja da cidade de Filipos. Deste modo, revelou uma sensibilidade “feminista” ao confiar a algumas mulheres cargos eclesiásticos, o que era pouco comum entre as instituições religiosas da época. Esta sua preocupação em melhorar a situação da mulher nas sociedades do império romano patenteia, novamente, a sua disposição para a defesa do Direito de igualdade entre todos os crentes como uma das premissas do ideal cristão, designadamente de paridade entre homem e mulher.
 
Comprova-se, portanto, a sua luta por este Direito Humano quando anuncia o universalismo da religião cristã, que o levou a evangelizar os gentios, ao proclamar na Carta aos Gálatas essa igualdade entre todos os cristãos: “(…) Não há judeu nem grego, não há escravo nem livre, não há masculino e feminino, porque todos sois um em Cristo (…)” ( Gl 3, 28).
 
Em suma, São Paulo é um exemplo de vivificante actualidade, pelo seu optimismo cristão, que nos pode ajudar a enfrentar espiritualmente esta crise multipolar ( energética, climática, económica, social, política, moral, etc. ) deste complexo mundo Globalizado em que vivemos. Com efeito, o legado cultural da esperança cristã, que este apóstolo nos ensinou nas suas epístolas, é em tempos de crise e de grandes incertezas uma resposta psicologicamente positiva às angústias e ansiedades actuais e uma solução filosófica para a crise de valores das sociedades contemporâneas e para o inerente relativismo da mentalidade dominante nos países mais desenvolvidos. Daí, advém, a importância de sermos tocados pela mensagem Paulista de confiança no que o futuro nos reserva mediante a nossa fé cristã.
 
Compreendemos, assim, as palavras que São Paulo dirigiu em carta à comunidade cristã de Filipos ao persuadir os crentes pela veemência do seu poder carismático com as seguintes expressões, que devem ter comovido os corações dos fiéis: “(…) Alegrai-vos sempre no Senhor (…) O que de vós é bondoso seja conhecido de todos os homens (…) Por nada vos deixeis inquietar. (…)” ( Fl. 4, 4-6 ).
 
Por conseguinte, o exemplo de São Paulo de inquebrantável confiança no Deus do Amor e em Jesus Cristo seu Filho, que veio salvar a Humanidade, é-nos dado pelo seu esforço de missionação no nordeste do mundo Mediterrânico, não obstante todo o sofrimento que lhe terá causado uma doença crónica[4]. Esta lição de fé deste apóstolo faz-nos recordar o singular exemplo paralelo, de crença religiosa apesar de todo o sofrimento físico e de ânimo evangelizador pelas “sete partidas do mundo”, da acção pontifícia de João Paulo II[5]. Na realidade, a semelhança entre estas duas vidas paralelas, já que este papa muito viajou apesar das suas enfermidades e em especial da doença de Parkinson, levam-nos a conjecturar a hipótese deste papa se ter inspirado substancialmente no edificante exemplo de São Paulo.
 
Por último, a moralizante acção e doutrinação de São Paulo no contexto de podridão ética do império romano constitui um exemplo a seguir perante o desnorte de valores que submerge a vida política actual, influenciada pelo fenómeno da Globalização e pela ideologia neoliberal que sacralizou a “teologia de mercado”. Foi, aliás, este dantesco cenário internacional que mergulhou o mundo naquilo que, alguns autores, chamam de “capitalismo de casino” e que favoreceu escandalosas fraudes financeiras em várias regiões do mundo.
 
Deste modo, para se sair deste caos social que assola o planeta, nos nossos dias, é necessário interligar sem dogmatismos fundamentalistas a política e a religião, como o pretende fazer Tony Blair, ex-primeiro ministro inglês, nas suas académicas prelecções de “Globalização e Fé” numa prestigiada Faculdade dos Estados Unidos da América ou os teólogos da libertação como o professor universitário Leonardo Buff, por entenderem que o agravamento das injustiças e das desigualdades sociais decorrem das bases ideológicas deste tóxico sistema internacional.
 
Em conclusão, não restam dúvidas que a alavanca para garantir o bem-estar material e espiritual nas populações deste mundo globalizado passa pela reintrodução do legado ético na vida política internacional e nacional, o que poderá ser a solução para a desejada reaproximação entre cidadãos e governantes[6]. Contudo, afigura-se-nos fundamental que se quebrem alguns pressupostos identitários do mundo em que vivemos, nomeadamente é indispensável que os poderes políticos não estejam manietados pela força das grandes autoridades económicas e financeiras, mas ao invés que sejam guiados pelo senso ético. 
 
Ao fim e ao cabo, o revolucionário exemplo de São Paulo no quadro histórico de um império materialista assume uma modernidade cultural e cívica no tempo presente absolutamente entusiasmante.
 
Nuno Sotto-Mayor Ferrão

 


[1] Comunicação que fiz, em representação de um grupo Paulino de reflexão a 25 de Junho de 2009, num sarau cultural, no salão paroquial de Nossa Senhora do Amparo em Benfica, dinamizado pelo pároco José Traquina.
[2] De acordo com Conferência proferida pelo teólogo Juan Ambrósio no Anfiteatro da Escola Secundária Padre Alberto Neto, em Queluz, a 16 de Abril de 2009.
[3] “(…) Quem lhe apareceu, na estrada de Damasco, foi o seu remorso personificado em Jesus Cristo, o deus da sua vítima. (…) O Deus de Estêvão ficou a ser o Deus de Paulo. (…)” in Teixeira de Pascoais, São Paulo, Lisboa, Editora Assírio e Alvim, 2002, p. 31.
[4] Há autores que sustentam tratar-se epilepsia essa doença crónica de São Paulo, no entanto D. Anacleto Oliveira optou por referi-la como uma doença crónica. Vide D. Anacleto Oliveira, Um ano a caminhar com são Paulo, Coimbra, Gráfica de Coimbra 2, 2008, p. 44.
[5] Sobre este papel histórico do papa João Paulo II vale a pena ler o seguinte artigo: Jorge Borges de Macedo, “O sentido e o fim do último quartel do século XX. Experiência e Crise (1974-1995)” in História Universal, vol. II, Lisboa, Selecções do Reader’s Digest, s.d., pp. 550-561.
[6] Sobre esta permanente questão da distância entre cidadãos e governantes vale a pena ler o magnífico romance do nosso escritor laureado com o Prémio Nobel da Literatura: José Saramago, Ensaio sobre a lucidez, Lisboa, Editorial Caminho, 2004.

 

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