Crónicas que tratam temas da cultura, da literatura, da política, da sociedade portuguesa e das realidades actuais do mundo em que vivemos. Em outros textos mais curtos farei considerações sobre temas de grande actualidade.
Crónicas que tratam temas da cultura, da literatura, da política, da sociedade portuguesa e das realidades actuais do mundo em que vivemos. Em outros textos mais curtos farei considerações sobre temas de grande actualidade.
As alterações climáticas caracaterizam-se pela mudança radical dos padrões metereológicos, num tempo longo. Ora, estas alterações têm-se verificado nas últimas décadas, designadamente com o aquecimento global do planeta. O clima define o padrão médio metereológico numa região, num período estenso.
Tomando como exemplo a cidade de Lisboa onde existia um clima temperado atlântico, será que, perante estas alterações, os climas identificados pelos geográfos ainda se mantêm válidos? Este fim da primavera e início de verão, em Portugal, tem sido atípico, pois verifica-se um tempo mais fresco do que é comum, tendo muitos dos portugueses, que usufruíram férias balneares em junho de 2019, sido prejudicados com as temperaturas mais baixas para esta época.
Com as atuais alterações climáticas estão a verificar-se, com mais frequência, fenómenos extremos em Portugal, no mundo lusófono e no planeta, designadamente com cheias terríveis, secas preocupantes, incêndios de grandes dimensões, quedas abruptas de granizo, manifestação de tornados e de furacões de efeitos catastróficos. Temos, ainda, bem presente os dramáticos ciclones de Moçambique, neste ano de 2019, em´particular o mais trágico intitulado “Idai”.
A caraterística básica das alterações climáticas traduz-se no aquecimento global do planeta, nas últimas décadas, manifestando-se vários efeitos indesejáveis como a subida do nível médio das águas do mar (recentemente o Secretário Geral das Nações Unidas apareceu simbolicamente, na capa da revista Time, com as pernas dentro de água); o aquecimento da atmosfera e dos oceanos; a diminuição das quantidades de neve, de gelo e reduções drásticas dos glaciares e a concentração de gases com efeito de estufa a aumentarem perigosamente na atmosfera.
Também, num recente relatório das Nações Unidas de Philip Alston apresentado ao Conselho dos Direitos Humanos, fala-se de um “apartheid climático”, pois com as alterações climáticas as populações mais pobres dos países ricos e as populações dos países mais pobres vão sofrer um impacto muito maior sobre as suas vidas em função destas alterações[1].
O efeito de estufa é imprescindível à sobrevivência da maioria das espécies pelo efeito amenizador das temperaturas, mas os gases em excesso produzidos pelo homem têm provocado um aumento inusitado dos gases da atmosfera, resultante da desmesurada utilização de combustíveis fósseis em veículos, nas fábricas e nas centrais elétricas.
Destes gases nocivos, destaca-se o incremento do dióxido de carbono, a par de outros gases e da grande desflorestação mundial, de que a Amazónia é um triste exemplo, pois com menos árvores no planeta a absorção de dióxido de carbono é bastante menor.
Desde meados do século XX com o incremento da industrialização e da vida urbana, o nosso ecossistema está a ficar mais desequilibrado, em função do aumento dos gases com efeito de estufa provenientes das atividades humanas. Esta problemática é de tal forma relevante que o Papa Francisco, em 2015, já dedicou uma encíclica ao tema ambiental, intitulada Laudato Si’[2].
Para estancar esta hemorragia vital do planeta, é fundamental reduzir as emissões de gases com efeito de estufa, tornando os automóveis menos poluentes, com a opção pelos carros elétricos, e as fábricas menos emissoras de fumos. Se a humanidade, com a ajuda de alguns líderes mundiais como António Guterres, tem alertado o mundo e não conseguir estancar esta hemorragia ambiental, poderão manifestar-se consequências catastróficas de elevado calibre para a vida humana, animal e vegetal do planeta. Infelizmente, alguns líderes como Donald Trump e Jair Bolsonaro estão a menorizar estas problemáticas das alterações climáticas.
Além das manifestações já antes assinaladas, serão consequências prováveis que alguns rios e lagos acabem por secar; que o número de secas aumente, prejudicando, mormente, a Europa Mediterrânica; que as reservas de água potável diminuam, prejudicando o consumo, a higiene e a produção agrícola; que muitas espécias animais e vegetais se extingam, lesando a harmonia dos ecossistemas.
Ao longo do século XX e nos anos iniciais do XXI, o ritmo das alterações climáticas cresceu fortemente. São cada vez mais frequentes as ondas de calor e os fenómenos de seca, que afectam, sobretudo, o sul de Portugal. A temperatura, no século passado no mundo, aumentou quase 1 grau celsius, enquanto que a previsão para este século é de um crescimento entre 2 e 4 a 6 graus celsius, tornando a vida, em muitos climas temperados ou quentes, menos aprazível ou, mesmo, quase insuportável.
Importa que os políticos possam agir e que os cidadãos actuem no seu quotidiano, optando por eliminar, progressivamente, o uso de combustíveis fósseis, por preferir energias renováveis e por procurar poupar energia e programar formas de garantir a eficiência energética. As manifestações juvenis de luta contra as alterações climáticas estão na ordem do dia, de forma que o Secretário Geral da ONU disse, em junho de 2019, que, face à falência das lideranças mundiais, os jovens vão passar a liderar os programas de combate às alterações climáticas.
O objetivo, nos acordos climáticos de Paris, é de limitar o aumento da temperatura do planeta em 2º celsius, mas para isso será necessário diminuir globalmente 45% das emissões de dióxido de carbono até 2030, o que não será fácil sem uma cidadania e uma governança globais.
Nuno Sotto Mayor Ferrão
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[1] Susana Peralta, “Apartheid climático: os pobres que paguem a crise (climática)”, Público, nº10658, 28 de junho de 2019, p.8.
“(…) O grande risco do mundo atual, com a sua múltipla e avassaladora oferta de consumo, é uma tristeza individualista que brota do coração comodista e mesquinho, da busca desordenada de prazeres superficiais, da consciência isolada. (…) Esta não é uma escolha duma vida digna e plena…(…)”
Papa Francisco, A Alegria do Evangelho – Exortação Apostólica ‘Evangelii Gaudium’, Prior Velho, Edições Paulinas, 2013, p. 5.
A intensidade da crise de valores perenes atravessa as sociedades contemporâneas no século XX e atinge o âmago neste início de milénio, tal como o expliquei num pequeno ensaio. Não nos podemos situar como indivíduos e sociedades se não tivermos uma forte identidade pessoal e colectiva e se não tivermos horizontes de esperança. Daí a urgência em não nos deixarmos atolar num pessimismo larvar e o papel fundamental que o Papa Francisco com a sua visceral coerência tem assumido no Ocidente ao ponto da revista Time o considerar a figura mundial do ano de 2013.
No mundo tecnológico, que amesquinha o sentimento e a dignidade dos homens muito bem retratado no filme Modern Times de Charles Chaplin, de 1936, importa ter a coragem de ir contra a corrente. Pairam no mundo contemporâneo falsos valores resultantes de mudanças aceleradas e impensadas, porque o ritmo frenético dos “burgos” não se compadece com o juízo de pensadores, de filósofos, que apontem estratégias coletivas.
Talvez isto explique, precisamente, a crise do Euro, encetada em 2010, que sofreu de uma sofreguidão na resposta rápida à Globalização em curso no fim do século XX através da montagem do sistema monetário europeu, quando sabemos do provérbio popular que “prudência e caldos de galinha nunca fizeram mal a ninguém”.
Um dos falsos valores que toca a nossa contemporaneidade é a efemeridade da vida quotidiana marcada pelo alucinante ritmo da inovação tecnológica, nesta ideia convirjo com o humanista Vitorino Magalhães Godinho.
Como salienta, com grande propriedade, o professor Adriano Moreira as sociedades atuais colocaram o preço das coisas em lugar do seu valor, assim o valor do ter substituiu o valor do ser, ser bom, ser corajoso, ser bondoso, ser sábio foram relegados para segundo plano, pois dificilmente podem ser quantificáveis.
O relativismo prevalecente como vaga de fundo desde as provocações filosóficas de Friedrich Nietzsche tornou-se moda mental, ou seja, na ausência de valores universais o sentido Ético dilui-se em referenciais de múltiplos valores não devidamente fundamentados por uma argumentação filosófica.
O Papa Francisco reconhece que este desnorte metafísico tem levado as sociedades atuais a caírem num imparável consumismo e num hedonismo que não trazem felicidade ao coração dos nossos contemporâneos.
Existem alguns constrangimentos que necessitam de ser superados. É certo que é difícil compaginar a liberdade com o bem comum, mas não há alternativa na luta por um mundo melhor e mais justo.
Importa, também, que se ultrapassem os currículos educativos centrados numa educação parcelar medida pelo desenvolvimento cognitivo e pelas metas quantitativas, porque é necessário estimular o desenvolvimento do juízo moral das crianças e dos jovens e só o desenvolvimento de uma educação integral da pessoa humana poderá ser o paradigma humanitário que conjugue a liberdade com a responsabilidade social.
Em último lugar, a secundarização das Humanidades tem manietado as consciências a paradigmas mentais padronizados por métodos tecnocráticos que impedem a livre criatividade de pensamento.
Como nos lembrou D. Manuel Clemente, numa sessão da paróquia de Nossa Senhora do Amparo em Lisboa no dia 6 de fevereiro de 2014, fazendo eco dos apelos do Papa Francisco, um dos valores perenes que os cristãos não devem esquecer é a alegria do encontro com Cristo.
Fulcral como valor perene que atravessa a História dos últimos séculos é a dignidade atribuída à pessoa humana na sua singularidade, que perpassa filósofos como E. Kant a E. Mounier a várias organizações internacionais humanitárias.
A estratégia cristã do Papa Francisco a D. Manuel Clemente, cardeal-patriarca de Lisboa, é a da alegria do encontro com Jesus Cristo, que nos dá a certeza da Salvação e do mandamento novo de Amar o próximo. A simplicidade das atitudes do Papa Francisco marcada pelo despojamento de lautas solenidades e ostentações procura imitar o exemplo de Cristo, dando uma resposta concreta à crise de valores dos nossos dias.
Reconheceu D. Manuel Clemente, nessa sessão paroquial muito concorrida, que a teologia Católica do século XX e do presente século coloca a ênfase da alegria numa atitude de vivência comunitarista do Cristianismo e que o importante é redescobrir a validade dos documentos do Concílio Vaticano II, porque cinquenta anos depois os seus princípios carecem de ser aplicados pelas comunidades católicas em maior profundidade para se superar a crise de valores de que já falava, então, o Papa João XXIII.
Nesta exortação apostólica do Papa Francisco, que causou brado mediático com a afirmação verdadeira de que “esta economia mata”, na leitura de D. Manuel Clemente, mais importante, do que isso, é o empenho na missão sócio caritativa da Igreja Católica e da comunidade de leigos para que se rompam nas sociedades atuais os isolamentos derivados das mentalidades individualistas.
D. Manuel Clemente anunciou que colocando em prática a estratégia missionária apontada pelo Papa Francisco se irá preparar na diocese de Lisboa, com a colaboração das suas 280 paróquias, desde o presente ano até 2016 um Sínodo Diocesano que coincidirá com a data da celebração do tricentenário da atribuição do Patriarcado a Lisboa (1716-2016).
A preparação deste Sínodo terá por finalidade treinar competências missionárias de toda a comunidade católica (membros eclesiásticos e leigos) para romper com as tristezas e os isolamentos que grassam nas sociedades contemporâneas. Para isso, lembrou o cardeal-patriarca de Lisboa importa ter presente a máxima bíblica para se quebrar com a mentalidade materialista: “(…) Há mais felicidade no dar, do que no receber.(…)”