O SENTIDO MELÓDICO DO COMPOSITOR JOLY BRAGA SANTOS (1924-1988) NA ENCRUZILHADA ENTRE A TRADIÇÃO E A MODERNIDADE CULTURAL
Joly Braga Santos Luís de Freitas Branco
Joly Braga Santos, nascido em Lisboa em 1924, foi um compositor de talento, um maestro, um professor e um crítico musical português de grande destaque. Foi discípulo do grande compositor Luís de Freitas Branco, após ter sido seu aluno de violino e de composição no Conservatório de Lisboa. O músico Pedro de Freitas Branco foi um dos divulgadores internacionais da sua obra. Como compreenderemos, nesta abordagem de análise, o mérito da sua obra reside em ter conseguido compaginar, como poucos cultores do espírito, a tradição e a modernidade, alavancando-o para uma celebridade intemporal.
Na primeira fase da sua carreira musical (1942-1959) inspirou-se na tradição folclórica portuguesa, tendo, também, sido moldado pela matriz compositiva clássica, de Ludwig Van Beethoven, na senda do seu Mestre. Neste período, criou as suas primeiras 4 sinfonias e compôs música para textos de poetas portugueses (Antero de Quental, Fernando Pessoa e Luís Vaz de Camões).
Nesta medida, Joly Braga Santos conseguiu ultrapassar a estratégia cultural modernista radical sustentada por José de Almada-Negreiros, no início do século XX, que disse “É preciso substituir na admiração e no exemplo os velhos nomes de Camões, de Vítor Hugo, e de Dante pelos Génios de Invenção: Edison, Marinietti, Pasteur, Elchriet, Marconi, Picasso, e o padre português, Gomes de Himalaia“ (José de Almada-Negreiros, Ultimatum Futurista às Gerações Portuguesas do Século XX, Lisboa, Edições Ática, 2000, p. 13), ao encontrar ao longo da sua carreira um ponto de equilíbrio entre essas tendências estéticas ambivalentes.
Na segunda fase da sua produção musical (1961-1988), resultado da experiência e amadurecimento como bolseiro, de composição e de direção de orquestra, em Itália e, mais tarde, na sua labuta de diretor de orquestra em Portugal, encetou um estilo de criação modernista sem renegar as suas aprendizagens anteriores. Assim, em 1965 compôs a sua obra-prima a 5ª Sinfonia, já numa estética modernista permeada pela matriz desconstrutivista das vanguardas artísticas, sem abafar o sentido melódico que o caracterizou.
O auge da sua carreira musical foi obtido com a composição da ópera Trilogia das Barcas, baseado numa peça teatral de Gil Vicente, que o consagrou como um dos expoentes da composição lírica portuguesa. Este percurso de conciliação de valores estéticos ambivalentes valeu-lhe o reconhecimento público, com a UNESCO a classificá-lo como um dos 10 melhores compositores de música contemporânea e com a atribuição do galardão honorífico da Ordem de Sant’iago da Espada pelo Presidente da República Portuguesa, António Ramalho Eanes, em 1977.
Em conclusão, o seu exemplo de ecletismo cultural deve servir-nos de lição para superarmos a dicotomia entre o Humanismo Clássico e a Tecnocracia imbuída de um radicalismo exacerbado.
Nuno Sotto Mayor Ferrão