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Crónicas do Professor Nuno Sotto Mayor Ferrão

Crónicas que tratam temas da cultura, da literatura, da política, da sociedade portuguesa e das realidades actuais do mundo em que vivemos. Em outros textos mais curtos farei considerações sobre temas de grande actualidade.

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A RESISTÊNCIA HUMANITÁRIA À PANDEMIA COVID-19 E O ISOLAMENTO SOCIAL PROFILÁTICO

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Esta doença infecciosa, conhecida por COVID-19, detectada primeiramente na China, continua a expandir-se para outros países, como em Itália onde apareceu no dia 31 de janeiro de 2020 ou nos Estados Unidos da América, que confirmaram o primeiro caso no dia 24 de fevereiro deste ano ou em muitos outros os países em que foi sendo diagnosticado, tornando-se uma pandemia reconhecida pela Organização Mundial de Saúde.

 

Em Portugal, o primeiro caso foi diagnosticado no dia 2 de março de 2020, encontrando-se ainda em crescimento a sua difusão, bem como no mundo com o surto pandémico a acelerar o seu ritmo de expansão estatística, de acordo com os dados da Organização Mundial de Saúde.

 

A resistência que houve em França e em outros países, durante a segunda guerra mundial, foi um dos fatores fundamentais para a vitória das forças aliadas sobre os nazis. A resiliência psicólogica e física irá ser fundamental para os portugueses, os europeus, os brasileiros e muitos outros povos do mundo nesta batalha contra esta pandenia do Coronavírus 2019 (COVID-19) e que, neste momento, tem o seu epicentro na Europa.

 

Chama-se a este fenómeno de resistência coletiva estabelecido em Portugal pelo Estado de Emergência isolamento social profilático, mas é preciso resiliência para não se cair no desânio ou na depressão perante notícias mais alarmantes. É um conjunto de três elementos que é fundamental para garantir a resistência/resiliência perante a evolução ciclópica desta pandemia em Portugal, na Europa e no mundo. Iremos, então, referir estes 3 elementos cruciais para a sanidade psíquica, física e sanitária dos milhões de cidadãos, que em Portugal, na Europa e no mundo se encontram em isolamento social nas suas habitações (#ficaemcasa).

 

Em primeiro lugar, apenas a unidade espiritual e as solidariedades coletivas em termos familiares, fraternais entre comunidades de amigos, patrióticas, lusófonas e europeias nos poderão garantir o ânimo para enfrentar este isolamento social imposto em muitos países do mundo e, em particular, na Europa.

 

A Inglaterra que resistia a tomar medidas tão drásticas, acabou de decretar este mesmo isolamento social profilático. Nesta era digital, apesar da sobrecarga das plataformas de comunicação, a internet e os “smartphones” tornaram estas atitudes mais fáceis de realizar. As solidariedades patenteiam-se nas compras que os vizinhos mais novos fazem aos vizinhos mais velhos e as palavras de conforto que trazemos uns aos outros através destes meios digitais.

 

Em segundo lugar, apenas com uma fé transcendental ou com uma forte convição espiritual, num retorno necessário às humanidades e às revistas culturais, aos livros e à “cultura online”, se conseguirá vencer este inimigo invisível, que anda por aí devido à globalização social que facilitou a inesperada circulação de pessoas numa escala planetária, com viajantes de todas as nações e de vários grupos sociais.

 

As humanidades, num indispensável retorno do mundo à metafísica, permitirão perceber que esta crise imeniente irá fazer tomar consciência às pessoas, aos governantes e às empresas sedentas do lucro fácil, especulativo, de que o abismo climático estará à nossa porta dentro de algumas décadas, neste século XXI.

 

O maravilhoso mundo novo, numa alusão a uma obra-prima de denúncia simbólica do escritor Aldous Huxley, que nos prometiam os positivistas e os neopositivistas do progresso constante, como foi o ingénuo caso de Francis Fukuyama, não passou de uma ilusão de ideólogos tecnocráticos.

 

Assim, unicamente com a complementaridade das visões tecnocráticas e das visões humanistas será possível construir um mundo melhor para as próximas gerações, pois, caso contrário, a Humanidade irá de colapso em colapso até ao seu próprio extermínio. É imperioso cuidar da “nossa casa comum”, como nos diz o Papa Francisco, com um espírito mais franciscano e mais afastado da teoria dos interesses.

 

Em terceiro lugar, emerge o papel da ciência médica e da indústria farmacêutica na busca de novos métodos de tratamento, de cura e de uma vacina para prevenir os novos surtos de COVID-19, que poderão aparecer ainda em final de 2020 ou início de 2021. É absolutamente vital a investigação laboratorial humanitária, da China, dos Estados Unidos e da Alemanha, em prol de tod@s os cidadãos do mundo, uma vez que poderá ser primordial para reduzir vítimas letais deste surto pandémico e minimizar grandes efeitos colaterais na economia.

 

Estão a revelar-se autênticos heróis os trabalhadores do Sistema Nacional de Saúde dos países europeus e do mundo, eventualmente, onde haja estruturas sanitárias semelhantes, pois o mundo foi apanhado desprevenido com este surto pandémico e apenas o esforço humanitário e o sacrifício suplementar da comunidade médica, de enfermeiros, de auxiliares de ação médica, de farmacêuticos e de fornecedores de bens essenciais tem conseguido responder com dificuldade ao crescimento exponencial de casos por todo o mundo, cifrando-se em mais de 350 mil de pessoas infectadas a nível global, embora a batalha esteja a ser muito dura, particularmente em Itália e em Espanha, nesta fase no fim do primeiro trimestre de 2020.

 

O problema continua a ser que a economia está baseada em pantanosos alicerces financeiros, que apenas desvirtua a economia real e a torna muito mais vulnerável aos golpes fraudulentos dos detentores de grandes fortunas e à fuga de capitais para maléficos paraíses fiscais, que garantirá mais desigualdades sociais no mundo, como o anunciam os relatórios PNUD da ONU.

 

Neste âmbito financeiro, foi positiva a decisão da Comissão Europeia, anunciada por Ursula Von Der Leyen, de que os países europeus da União Europeia passavam a usufruir de uma flexibilidade orçamental com a exclusão da regra de um máximo de défice orçamental de cada país de 3%, no decorrer desta conjuntura pandémica.

 

Em suma, nesta conjuntura de guerra contra esta pandemia, impõe-se uma resistência coletiva com um isolamento das famílias e das pessoas infetadas para se estancarem as correntes infecciosas, que circulam nas nossas sociedades neste mundo global. Unicamente mediante esta resistência coletiva, a que apelou Winston Churchil com o seu famoso discurso, do início da segunda guerra mundial, de “sangue, suor e lágrimas” face ao inimigo nazi, em 1940, será possível vencer este terrível inimigo invisível que é o Coronavírus 2019 (COVID-19). 

Nuno Sotto Mayor Ferrão

DO CENTENÁRIO DA REVOLUÇÃO RUSSA DE OUTUBRO DE 1917 À REVOLTA DA CATALUNHA DE 2017 (1917-2017)

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No século XXI ainda estamos em tempo de revoluções ou apenas são aceitáveis reformas políticas compagináveis com uma mentalidade de pragmatismo tecnocrático? A legitimidade constitucional espanhola autoriza a abafar a intrínseca vontade das populações catalãs? No centenário da Revolução Bolchevique (outubro de 1917- 2017), convém refletir no dinâmico processo emancipalista da nação Catalã.

 

Em 23 de outubro de 1917, houve uma revolução bolchevique com a polícia militar desta facção comandada por Trotsky a ocupar pontos estratégicos da cidade de Petrogrado (São Petersburgo), e a tomar de assalto o Palácio de Inverno, onde se reunia o governo provisório. No dia 26 de outubro, o poder governativo foi entregue ao Conselho dos Comissários do Povo, liderado por Lenine. A Rússia transformou-se numa República Soviética, com o poder entregue aos Sovietes.

 

O novo governo bolchevique, que substituiu o governo provisório, tomou como decisões importantes: a paz imediata com a Alemanha no contexto da 1ª guerra mundial; a abolição de todas as propriedades privadas sem quaisquer indemnizações e a requisição das colheitas agrícolas pelo Estado. Estas medidas inspiraram-se nas ideias marxistas, surgindo, deste modo, a doutrina do marxismo-leninismo com o objetivo de instaurar uma ditadura do proletariado.

 

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Lenine (Vladimir Ilitch Ulianov) partiu do exílio na Suiça para rumar de comboio, com a cumplicidade alemã, para a Rússia, no sentido de comandar a insurreição contra as autoridades do demoliberalismo. Este acontecimento fulcral da história universal do século XX foi imortalizado no filme Outubro de Sergei Eisenstein, e no livro do jornalista norte-americano John Reed intitulado Dez dias que abalaram o mundo.

 

A 23 de outubro, na Rússia e em congresso, os sovietes atribuíam o poder a um Conselho de Comissários do Povo comandado por Lenine. Sem dúvida que, sem a agitação do conspirador Lenine, a Revolução Russa teria sido diferente, pois foi dele que saíram as traves-mestras do regime soviético. Durante o século XX foi aceso e apaixonado o debate sobre o regime soviético, tendo a URSS partilhado com os EUA, no contexto da guerra fria, o estatuto de superpotência mundial.

 

Embora o autocrata regime soviético tenha sido caraterizado por uma polícia política e por uma censura impiedosa condicionadora da mentalidade dos cidadaos soviéticos, que levou a perseguições, a prisões arbitrárias, a impediosos aniquilamentos individuais e coletivos, manteve no mundo por longos anos a esperança na justiça social, a defesa do anticolonialismo e de um modelo sociopolítico alternativo – anticapitalista.

 

Para recordar esta revolução, que agora faz 100 anos (1917-2017), e apesar da destruição de muitos símbolos comunistas após 1991, encontra-se o corpo embalsamado de Lenine, desde 1930, num imponente mausoléu junto da muralha do Kremlin, na Praça Vermelha de Moscovo.

 

Face à presente ameaça da independência da Catalunha, o Governo de Madrid equacionou a possibilidade de suspender constitucionalmente o regime autonómico deste território. A integração histórica da Catalunha na Espanha resultou de um casamento entre Fernando de Aragão e Isabel de Castela, no século XVI, e não de uma autêntica vontade das populações da Catalunha. Daí que se tenha mantido até aos dias de hoje como uma das nações dentro do Estado Espanhol.

 

Várias vezes, ao longo da História, houve tentativas de separação da Catalunha do Estado Espanhol: em 1640, o que facilitou a restauração da independência portuguesa do domínio Filipino; em 1701-1711, durante a guerra da sucessão; em 1870, no período da primeira república espanhola e no decorrer da guerra civil, entre 1936 e 1939, que levou o regime franquista a degolar estas intenções emancipalistas da Catalunha.

 

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Não houve, para já, uma declaração unilateral de independência, por parte do governo autonómico catalão. As pressões para quebrar a eventual independência da Catalunha vieram de Madrid e do sistema financeiro, com vários bancos a deslocarem as suas sedes da Catalunha para o restante território espanhol. No contexto internacional da pretendida independência catalã encontram-se a desvinculação da Grã-Bretanha da União Europeia, designada Brexit, e a vontade da Escócia de se emancipar do Reino Unido.

 

A intenção da Catalunha, de se constituir em República, esbarra com as pressões de Espanha, com a neutralidade internacional e nas ambiguidades de querer manter o Euro como moeda e de não se saber quais irão ser as forças de segurança, de polícia e do exército, em situação de rutura institucional absoluta com o Estado Espanhol. Daí que o Governo Autonómico peça neste momento tempo para dialogar com Madrid.

 

Patenteiam-se duas questões, que nos parecem incontornáveis, ao estabelecermos alguma analogia entre a Revolução Russa e a revolta catalã: as revoluções ainda são possíveis num mundo pragmático e esquecido de utopias? Ou, pelo contrário, neste mundo pós-moderno, só são aceitáveis as reformas políticas dentro de uma lógica tecnocrática?

 

Embora a Constituição Espanhola de 1978 não preveja o direito das comunidades autonómicas à independência, no caso em análise, estamos perante nações histórica e linguisticamente assumidas. Será legítimo e democrático um Estado de direito fazer estas afirmações constitucionais, conhecendo estas premissas identitárias? Ou esta premissa constitucional evidenciará apenas a primazia dada ao imperialismo castelhano? Haverá, na verdade, uma nação espanhola? Claro que não. E, para entendermos isto, basta recorrrer à noção de nação e, dessa forma, esse pressuposto constitucional é claramente um falso argumento.

 

O referendo de 1 de outubro de 2017 mostrou uma vontade inequívoca dos cidadãos catalãos, que se deslocaram às urnas, de se emanciparem de Espanha. Madrid decidiu ilegalizar o referendo, no sentido de impedir a fragmentação do Estado Espanhol, uma vez que sabemos que a Espanha é formada por um conglomerado de nações.

 

Manifestou-se, em setembro e outubro de 2017, uma evidente tensão entre as autoridades catalãs e as autoridades do governo central, bem como entre populações pró e contra a independência da Catalunha, que se quer tornar uma república. O governo central ameaça, se houver declaração de independência, suspender a autonomia do governo catalão e, por consequência, ilegalizar o governo autonómico e as suas decisões.

 

A tensão permanece e irá, possivelmente, perdurar por várias semanas, meses ou anos entre os independentistas e o governo central de Madrid. Enquanto o governo autonómico pretende declarar a independência da Catalunha, Mariano Rajoy, chefe do Executivo Espanhol, ameaça suspender o regime autonómico da região.

 

Em suma, a independência da Catalunha configura um problema político, jurídico interno e externo, no âmbito da União Europeia. Veremos como se desenvolve este processo, que tem raízes históricas seculares. Todavia, a História Universal não terminou, como suspeitou Francis Fukuyama no fim do século XX, embora as revoluções sejam mais improváveis, mas não impossíveis, no quadro de Estados de direito democráticos em países desenvolvidos.

Nuno Sotto Mayor Ferrão

 

A TURQUIA DO PASSADO AO PRESENTE (1919-2016), A UNIÃO EUROPEIA E A PENA DE MORTE

 

Portugal, um dos países introdutores da abolição da pena de morte em 1867, como o reconheceu com júbilo o escritor Vítor Hugo, vê nestes dias a Turquia afastar-se dos parâmetros civilizacionais europeus. Apareceu a notícia do afastamento de 15 mil funcionários do Ministério da Educação, depois de milhares de militares e de magistrados terem recebido o mesmo tratamento.

 

A independência democrática dos poderes parece ser um pressuposto inexistente no regime político em formação na Turquia, sob a liderança do Presidente Erdogan.

 

O Ocidente está confrontado com um membro da NATO, que tem um papel relevante na dramática questão dos refugiados e na difícil problemática que confina com as suas fronteiras, mas que se aproxima dos paradigmas autoritários, não obstante desconhecermos se a democracia turca aguenta as divisões internas e as pressões externas, que a caraterizam, em particular, neste contexto atual. A entrada da Turquia na UE parece ficar adiada por uns bons anos, face ao quadro geopolítico presente, embora a própria UE precise de se repensar nos seus objetivos estratégicos.

 

Relembrando um pouco a história deste país, temos de compreender que a guerra de independência turca começou com a criação, em 1919, do movimento nacional turco, após a ocupação do território pelos Aliados no espaço do antigo Império Otomano.

 

A seguir à guerra com os Arménios, com os Gregos e com as tropas Aliadas ocupantes, foi assinado o armistício em 1922 e depois assinado, na Suiça, o Tratado de Lausana que reconheceu o poder dos nacionalistas liderados por Mustafa Kemal Ataturk e de outros jovens oficiais turcos e, concomitantemente, foram reconhecidas as fronteiras da Turquia. Houve, neste período, trocas populacionais angustiantes entre cristãos da Turquia e muçulmanos da Grécia. Na década de 20, a Turquia transformou-se num regime Republicano, com a expulsão da família real otomana e a abolição do califado.

 

Kemal Ataturk tornou-se o primeiro presidente da República Turca e fez reformas laicistas conhecidas por “kemalistas”. Sucedeu no país uma clara ocidentalização pois os códigos civil e penal inspiraram-se, respetivamente, no suiço e no italiano e a educação passou para as mãos do Estado.

 

A Turquia manteve uma posição de neutralidade na 2ª guerra mundial, mas juntou-se aos Aliados, no último ano do conflito, e tornou-se logo membro da ONU. No fim da década de 40, foi notória a influência dos EUA, no início da guerra fria, com um avultado apoio militar e económico, de forma a fazer face à expansão comunista mundial. Neste âmbito, a Turquia adere à aliança militar da NATO em 1952. Em 1974 invade Chipre e proclama a República Turca de Chipre do Norte.

 

Até 1945 a República Turca manteve-se sob o controlo de um só partido, mas a passagem para uma democracia pluralista foi bastante turbulenta na 2ª metade do século XX, com a irrupção de vários golpes de estado militares (1960, 1971, 1980 e 1997) e a emergência de governos autoritários.

 

O penúltimo golpe militar da Turquia de 1997, que afastou Erdogan de Perfeito de Istambul, visou assegurar o secularismo de Estado, de acordo com a tradição fundadora do regime Republicano, uma vez que emergiam partidos maioritários com tendências islâmicas.

 

A aproximação da Turquia da Europa iniciou-se com o seu primeiro pedido de adesão à CEE, em 1959, tendo-se tornado membro associado em 1963, mas só em 2005 começaram as negociações formais para a sua integração na UE. Em 2010, através de um referendo, decidiu-se aproximar os parâmetros constitucionais turcos dos modelos constitucionais ocidentais.

 

Com a tendência antilaicista a ganhar terreno e com o Presidente Recep Erdogan, desencadeou-se um novo golpe de estado militar, a 15 de julho de 2016. Pelo apoio popular, Erdogan fez fracassar, apesar de mais de duas centenas de mortos, o golpe de estado militar e logo iniciou um contragolpe com “a purga” de militares, de juízes, de professores, com uma declaração de estado de emergência e com a possibilidade equacionada de se reinstaurar a pena de morte.

 

Um dos problemas turcos mais permanentes deriva da minoria curda, que suscita um forte sentimento nacionalista, o qual tem potenciado muitos conflitos internos no país, em particular nos momentos em que as tendências secularistas ganham importância. Falta conhecer melhor o conjunto das motivações políticas que estiveram por detrás deste último golpe de estado de 15 de julho de 2016, uma vez que, tradicionalmente, os golpes militares estiveram associados ao “kemalismo”, ou seja, ao secularismo, apesar do politólogo Nuno Rogeiro negar esta hipótese.

 

A luta armada do PKK, da minoria curda marxista, tem levado a uma confllitualidade interna na Turquia, que tem suscitado atentados terroristas e uma actuação militar repressiva atentatória dos direitos humanos.

 

A localização geográfica da Turquia tem-lhe dado um papel geoestratégico decisivo nas relações internacionais, em particular na atualidade devido ao drama da migração de refugiados. O atual contragolpe do Presidente Erdogan contra os seus opositores, com a instauração de medidas excecionais de repressão de adversários, configura um retrocesso na República Constitucional Democrática e Secular que tem mantido relações estreitas com o Ocidente através da presença no Conselho da Europa, na NATO, na OCDE, na OSCE e no G20.

 

Todavia, as tendências políticas do Presidente Erdogan e os movimentos sociais que o apoiam afastam a Turquia, cada vez mais, da sua vontade de aderir à UE, dado que os países europeus criticam os mecanismos repressivos que voltam a reemergir.

 

Nuno Sotto Mayor Ferrão

 

 

O PATRIOTISMO NOS DIAS DE HOJE – SUA ATUALIDADE CONJUNTURAL

 

 

O patriotismo é, por definição, o sentimento de amor à pátria mediante a defesa do país, como Portugal na 1ª guerra mundial, ou o enaltecimento dos valores históricos, culturais, linguísticos e simbólicos de um povo.

 

Em Portugal, rapidamente se oscila quase de um complexo de inferioridade a um complexo de superioridade, daí que a ideia de decadência da nação tenha perpassado na mentalidade portuguesa quase todo o século XIX, ao ponto de aparecer um golpe de estado conhecido como Regeneração (1851).

 

Se nos devemos congratular com as vitórias e as conquistas desportistas (como foi o caso dos futebolistas no Euro 2016 ou os desportistas medalhados do atletismo), o importante é o que permanece no conjunto de virtudes de um povo. Portugal, historicamente e por influência da matriz católica, tem sido um país pacífico e bastante solidário com os outros povos em dificuldades.

 

Um dos motivos que mais nos deve orgulhar é a utopia da fraternidade universal sustentada pelo sapateiro Bandarra, pelo prosador Padre António Vieira e pelo poeta Fernando Pessoa, porque a construção de um império de matriz espiritual, que permita a sã convivência da multitude de povos e de civilizações, deve ser um sonho que nos deve fazer orgulhar, por sermos um povo com uma “costela” de poeta, como aliás bem se evidencia no fado que soubemos erguer a Património Comum da Humanidade.

 

O património histórico e linguístico português, consubstanciado no espaço lusófono, é o caminho para a concretização desta utopia, que tanta falta faz nos dias que correm.

 

Sem dúvida que o século XIX foi um século de grandes contradições em Portugal, com grandes actos patrióticos e desconfianças face ao valor da nação, como foram os casos de Antero de Quental, no seu texto sobre as causas da decadência dos povos peninsulares, ou o emblemático e amesquinhado Zé-Povinho de Rafael Bordalo Pinheiro. A sátira bordalista contribuiu para o reforço do complexo de inferioridade lusitano, mas o que parece certo é que desde Viriato os Lusitanos foram uns bravos valentões em resiliência perante o poderio militar romano.

 

Por todas estas razões (e mais algumas que tenhamos esquecido de elencar) há, neste momento coletivo de crise do paradigma globalizante, um retorno claro aos sentimentos patrióticos, desde que não se caia numa atitude xenófoba. As competições desportivas despertam os sentimentos patrióticos, em particular com comoções coletivas quando as populações ouvem e cantam os seus hinos nacionais ou observam a subida das suas bandeiras nas hastes dos recintos desportivos.

 

Há ainda um motivo acrescido para que, e na Europa em especial, venha à tona o sentimento patriótico, uma vez que a conjuntura histórica do início do século XXI acrescida das crises das dívidas soberanas da Grécia, da Irlanda e de Portugal e o ‘Brexit’ da Inglaterra têm criado desconfiança na moeda comum – Euro - e feito esboroar o espírito europeísta, com receios generalizados de novos referendos nacionais, por ausência de lideranças europeias carismáticas e de uma sólida estratégia comum.

 

Como a “virtude está no meio”, assim o diz o ditado popular, ressurgem “patriotismos regionalistas de espaços alargados”, de que é um excelente exemplo o espaço lusófono que une os povos falantes de língua portuguesa, que se sentem irmanados por um espírito e uma identidade históricas comuns.

 

Perante a crise do fenómeno globalizante no aspecto económico-financeiro de completa desregulação, configurando um verdadeiro caos ético mundial que afecta as outras esferas coletivas, faz todo o sentido este ressurgir dos fenómenos patrióticos com uma mentalidade aberta ao diálogo pacífico e cooperante nas Nações Unidas, numa necessária reformulação desta instituição supranacional, que tenha em conta as recomendações do Papa Francisco para a preservação desta nossa casa comum, que é a terra. Se estes patriotismos alargados fazem sentido, os patriotismos estritos como o Escocês ou o Catalão são fenómenos perigosos de desaglutinação da Humanidade.

 

Por fim, é sintomático que, neste contexto histórico, Marcelo Rebelo de Sousa, pessoa culta, sensível e humanista, tenha dado um exemplo singular de patriota, por formação e por convicção, desde o seu discurso inaugural de posse do cargo de Presidente da República Portuguesa, bastante mobilizador das forças unidas dos portugueses, até aos seus atos insólitos que muito o têm aproximado da população portuguesa.

 

O patriotismo é, pois, um sentimento que está na moda, mas que, na verdade, nunca deve estar afastado das nossas tendências, uma vez que parte da nossa genuína identidade coletiva como povo e como parcela da Humanidade.

 

Nuno Sotto Mayor Ferrão

 

 

 

 

 

 

 

DECLÍNIO CIVILIZACIONAL DO VELHO CONTINENTE (1914-2015) ?

 

A Europa tem sido denominada de velho continente, pois conseguiu afirmou-se como o berço humanista do mundo por ter feito despontar na sua Civilização a democracia liberal, um rico património ético e uma apurada sensibilidade defensora dos direitos humanos. Perguntamos se, realmente, a Europa se encontra num lento declínio civilizacional como o escreveu Osvald Spengler, no início do século XX, na obra O Declínio do Ocidente e como o pretende sustentar, também, o nosso insigne pensador Adriano Moreira.

 

Na altura, em que Spengler sustentou a sua tese decadentista a Europa, em 1918, acabara de sair de um conflito improcedente que gerou a luta de todos contra todos, designadamente fruto de uma louca ambição germânica. Arnold Toynbee, historiador britânico, vem nos anos subsequentes contrariar esta tese com uma inspiração mais espiritualista.

 

Iremos analisar o percurso histórico da Europa que nos permite perceber se esta intuição de Spengler será ainda verdadeira, ou não, nos nossos dias. Na realidade, as duas guerras mundiais que o velho continente desencadeou nos anos de 1914-1918 e de 1939-1945 por excessiva ambição germânica permitiu a ascensão dos EUA e da URSS como superpotências, ao mesmo tempo que deixou de rastos o velho continente, esfacelado em ruínas e com a sua economia nas ruas da amargura.

 

Destes tenebrosos escombros sombraíram homens de uma fibra invulgar que lutaram contra o monstro titânico chamado Adolfo Hitler ou afirmaram-se na hercúlea necessidade reconstrutora, designadamente Winston Churchill, Charles de Gaulle, Roberto Schuman e Jean Monnet.

 

Esta verdadeira loucura coletiva iniciada pela Tríplice Aliança e pelas potências do Eixo, com dois contumazes repetentes no erro, a Alemanha e a Itália, acabou por levar os europeus à perda dos seus impérios coloniais, fruto do esforço autonomista dos territórios dependentes e da consagrada ideologia do direito de autodeterminação dos povos, saída das Nações Unidas.

 

Perante esta depressão coletiva, a Europa gizou um projeto institucionalista, que começou na CECA e se transformou na CEE durante os anos 50, de relançamento material das suas condições de produção industrial, beneficiando dos trinta gloriosos anos de progresso económico (1945-1973), todavia com as crises dos anos 70 a par do emergir da potência nipónica fizeram claudicar os ânimos europeístas.

 

O fim da guerra fria fez pensar alguns ideólogos, no fim do século XX, que com a globalização, com as políticas neoliberais e com o reforço institucional da comunidade europeia transformada em União Europeia seria possível relançar o velho continente para novos horizontes.

 

Neste contexto histórico, aparece a teoria de Francis Fukuyama que ingenuamente pensou que o fim da História estaria a chegar com a expansão das democracias liberais no mundo, no entanto o caos aberto na política internacional com o desaparecimento da outra superpotência, a URSS, impediu que o paradigma ocidental se mundializasse e nem a teoria dos mercados livres pôde singrar, pois logo em 2008 surgiu uma violenta crise do Capitalismo Financeiro.

 

Entretanto, a Europa comunitária avançou para um sistema monetário comum, com a implementação do Euro, sem perceber que não estavam reunidas as condições de coesão económica e financeira nos países da zona Euro, o que levou, naturalmente, à crise das dívidas soberanas que principiou com o caso grego em 2010 e proliferou por outros países europeus designados PIGs.

 

Esta crise, do fim da primeira década do século XXI e início da segunda década, disseminou a vontade europeísta de construção de um projeto comum, que, aliás, começou logo em países integrados na zona Euro e em outros apostados nas suas moedas nacionais.

 

Contudo, houve uma tentativa de responder à crise da Zona Euro com políticas austeritárias, na senda do que vinha sendo desenhado pelas políticas neoliberais, só que estas políticas representavam uma perceção economicista do Homem, o que o deixou vulnerável a novos perigos como o reconhecem os vários relatórios do PNUD, pois tem sido descartado o desenvolvimento sustentável e a própria enciclíca do Papa Francisco Laudato Si vem sublinhar estes mesmos riscos com que a Humanidade, e não já só a Europa, se confronta.

 

Aliás, o escândalo recente das manipulações nas marcas automóveis europeias quanto às emissões poluentes demonstra a falta de valores das grandes empresas multinacionais.

 

Na Europa, até ao início do século XX, estavam as principais potências geo-estratégicas internacionais, mas encontra-se hoje em grande dificuldade, pois os seus grandes países perderam protagonismo mundial e emergem novas potências mundiais concorrentes como o Brasil, a Rússia, a Índia, a China e a África do Sul, designados BRICS.

 

De tal forma, esta transformação se reflectiu na diminuição do peso estratégico da Europa no mundo que os países mais ricos e industrializados do mundo no fim do século XX se reuniam no G7 com representatividade de 57% de países europeus, enquanto no início do século XXI o G20 já apresenta apenas uma representativa europeia de 30 %. Este aparente declínio civilizacional da Europa é fruto não de um atraso de desenvolvimento deste continente, mas, sobretudo, da crise demográfica que a faz mais diminuta populacionalmente no conjunto das nações.

 

Esta debilidade do velho continente não é, portanto, nenhuma novidade, só que algumas ilusões políticas tornaram esta realidade menos notória para a opinião pública europeia. A ausência de uma política concertada e avisada perante a crise humanitária de refugiados, que nestes últimos meses (julho, agosto e setembro de 2015) tem acorrido à Europa fruto das guerras em países como a Síria, o Iraque e o Afeganistão, mostra à saciedade a falta de uma consciência ética europeia que permitisse uma forte política comum de resposta a esta candente problemática migratória.

 

A Europa tem estado a olhar para os seus próprios problemas, para o seu umbigo, nomedamente com a questão chamada “Grexit” e só quando o problema transbordou as suas fronteiras e milhares de pessoas faleceram na travessia do Mar Mediterrâneo acabou por acordar para esta problemática de crise humanitária dos refugiados e a migração em massa para o velho continente.

 

A decadência da Europa explica-se, na atualidade, concomitantemente pela ausência de elites que saibam liderar os seus povos com carisma e determinação, apesar das agruras do momento como o fez Winston Churchill em 1940, e também pelo facto do velho continente em várias décadas ter vivido de uma mentalidade excessivamente pragmática de resposta às questões imediatas, sem pensar em definir um conceito estratégico comum com horizontes mais vastos que tivessem em conta a riqueza do património ético e histórico da Civilização Europeia.

 

Este relativismo escorado nas diferentes identidades nacionais, sem perceber que o que nos une é mais forte do aquilo que nos separa, acabou por deixar a União Europeia sem norte e por guiar-se pela principal potência industrial, a Alemanha, que carece da sensibilidade humanista de outros povos europeus.

 

Foi pena que aquando da discussão de uma Constituição Europeia, necessária para responder ao quadro da globalização desregulada, não se tenha definido como base da matriz identitária europeia o cristianismo. Aliás, é um argentino que com o seu atual carisma está a conseguir mobilizar o mundo para a necessidade de definir um paradigma comum para a unidade e a sustentabilidade da própria Humanidade, refiro-me ao Papa Francisco.

 

Em suma, só seguindo o exemplo inspirador do Papa Francisco, com as suas atitudes de simplicidade e de espontaneidade, a Europa poderá ter lideranças confiáveis que mobilizem as suas populações para uma unidade fraterna em torno de um projeto comum moldado numa estratégia que respeite as diferentes identidades nacionais, mas que una os europeus nos seus valores comuns e em prioridades bem definidas. Caso contrário, a Europa entrará verdadeiramente num inevitável declínio fruto de divisionismos políticos de que a Escócia, a Catalunha e a intolerante Hungria bem exemplificam.

 

Nuno Sotto Mayor Ferrão

 

 

OS ATUAIS IMPASSES DA UNIÃO EUROPEIA E O PRÉMIO NOBEL DA PAZ DE 2012 – TRILHOS DO PASSADO, DO PRESENTE E DO FUTURO EUROPEU

 

 

A crise da Zona Euro (2010-2012), com o emergir do problema financeiro na Grécia, gerou tensões nacionalistas, no seio da União Europeia, que são lamentáveis para o projeto institucional Europeu. Todos os países Europeus mais aflitos, neste tempo de aperto financeiro, começaram a invocar o facto de serem melhores que algum dos seus parceiros comunitários, o que tem desencadeado uma crescente mentalidade eurocética.


Habituamo-nos a ouvir, num tom de competição autoritária, de insensata sensibilidade tecnocrática, imposta pelo ultraliberalismo dos mercados financeiros, os países do Norte da Europa a queixarem-se dos povos da Latinidade de serem excessivamente ociosos. Ora, estas tensões nacionalistas, em vez de serem parte da solução, são verdadeiramente parte do problema por levarem a um enfraquecimento do espírito comunitário com uma União Europeia centrífuga, sendo este o autêntico “busílis” da problemática.

 

No início do século XX os antagonismos nacionalistas, herdados desde o fim do século XIX, levaram a Europa a mergulhar na 1ª Guerra Mundial (1914-1918) que prejudicaram de forma colossal o desenvolvimento económico do “Velho Continente”. Com o recrudescimento da crise económica dos anos 30, na Europa, os antagonismos nacionalistas internos aumentaram, novamente, e desembocaram no despoletar da 2ª Guerra Mundial (1939-1945). No entanto, o sonho Utópico de políticos Europeus sonhadores (Robert Schuman e Jean Monnet) tornou possível transformar o “Velho Continente” mais defendido de conflitualidades bélicas, não obstante tenha havido exceções, talvez residuais, como foi o caso do desmembramento da Ex-Jugoslávia que gerou feridas dramáticas no seio do continente Europeu no fim do século XX.

 

A 12 de outubro de 2012 o Comité Nobel da Academia Sueca, numa louvável manobra política de alento moral ao projeto institucional Europeu, que está moribundo pela mentalidade pessimista dos Europeus, em resultado dos impasses nacionalistas, atribuiu o Prémio Nobel da Paz à União Europeia. Na realidade, o fundamento apresentado para a atribuição deste Prémio é o facto da União Europeia e das suas antecessoras (CECA, CEE e CE) terem sido a salvaguarda, durante décadas da “paz, da reconciliação, da democracia e dos Direitos Humanos” no espaço Europeu nas afirmações públicas do Porta-voz do Comité Nobel. 

 

O evidente desacordo sobre os fundos do orçamento plurianual Europeu para 2014-2020 decorrente do euroceticismo dos países do Norte da Europa (principalmente, Inglaterra, Suécia e Holanda) com a promessa de cortes profundos no orçamento comunitário está na origem da crescente perda da credibilidade da União Europeia, não obstante o galardão recebido da prestigiada Academia Sueca. As divergências nacionalistas na União Europeia a 27 patenteiam a falta de solidariedade comunitária para enfrentar a conjuntura de crise financeira da Zona Euro, situada no contexto internacional de abrandamento do crescimento económico mundial, deste momento em que vivemos.


Importa ter em atenção que só outro paradigma de desenvolvimento, como estratégia coletiva da União Europeia e do mundo Globalizado, com reforço das instituições supranacionais permitirá enfrentar os ingentes desafios que a Humanidade tem pela frente. Por outras palavras, convém ter consciência que a Globalização Capitalista Ultraliberal pariu uma monstruosa crise multipolar sem mecanismos e instituições supranacionais reguladores.

 

Assim, os impasses da União Europeia resultam da falta de uma tática conjuntural para debelar a crise da Zona Euro e de uma ausência de estratégia Federalista que salvaguarde o Bem Coletivo do Modelo Social Europeu, em face da falta de carisma europeísta dos seus atuais líderes. Este pessimismo larvar, a par da estratégia da austeridade cega, ajuda a explicar os enormes “cortes” nos fundos estruturais do orçamento comunitário que se traduziu no desacordo dos Chefes de Governo nesta Cimeira Europeia, terminada a 23 de novembro de 2012, que irão implicar uma redução substancial nos fundos estruturais de apoio ao desenvolvimento das regiões mais desfavorecidas da Europa (Portugal, Grécia e Países da Europa de Leste).

 

Em suma, estes impasses da União Europeia gerados pelos atuais egoísmos nacionalistas só poderão ser superados, com uma forte consciência histórica, se for reposta uma ambição coletiva e comunitária de cumprir ideais Utópicos para que a Esperança seja possível de retornar à mentalidade dos Europeus, porque o excessivo pragmatismo contabilístico da tecnocracia neoliberal tem deixado a Europa sufocada socialmente debaixo de uma ideologia prevalecente de cada indivíduo ou cada nação por si se deve salvar, esquecendo os princípios da solidariedade e da justiça social.


Este rumo da União Europeia que revela falta de uma estratégia política e de lideranças fortes, advém do bloqueamento das necessárias convicções utópicas por meio da ideologia neoliberal, que se devem conseguir compaginar com um pragmatismo moderado. Deste modo, estas dissidências nacionalistas Europeias tornarão, neste mundo Globalizado, cada vez mais difícil a concretização da Paz Perpétua de que nos falava I. Kant.

 

Nuno Sotto Mayor Ferrão 

 

 

 

 

 

  

O NOSSO MUNDO – A LÍBIA, OS PAÍSES ÁRABES E A UNIÃO EUROPEIA – E AS LIBERDADES AMEAÇADAS – CONQUISTAS E CONSTRANGIMENTOS EM 2010 E 2011

 

“(…) A liberdade está ameaçada, e a educação para a liberdade é urgentemente necessária. (…)”

in Aldous Huxley, Regresso ao Admirável Mundo Novo, Lisboa, Livros do Brasil, s.d., p. 227

 

O nosso mundo parecendo progredir, nos últimos anos à custa de uma prometida Globalização, tem caído numa teia de crises que geram nas mentalidades das pessoas um sentimento de profunda incerteza. Na verdade, as revoluções da “Primavera  Árabe”, agora no fim da sangrenta guerra civil na Líbia, tem-se traduzido numa luta contra regimes políticos opressivos no Norte de África e no Médio Oriente. No entanto, das revoluções desconstrutivistas aos sonhados regimes democráticos plenos vai uma distância abissal de um longo caminho que urge trilhar.

 

Assim, os povos do mundo parecem clamar por Estados de Direito, que salvaguardem a justiça social e o civismo, parecendo, na aparência, dar razão à consabida tese de Francis Fukuyama[1] de fim da História. No entanto, esta perspectiva é uma pura ilusão dos ingénuos, pois as conquistas democráticas da “Primavera Árabe” ainda são muito prematuras e o sistema internacional tem esvaziado, sob pressão de uma Globalização Financeira, os regimes democráticos. É certo que um vento de Esperança surgiu nos EUA com a eleição do Presidente Barack Obama em 2009.

 

Na União Europeia, devido à falta de vontade política, os regimes democráticos têm entrado, como sustenta Boaventura Sousa Santos[2], num ritmo de baixa intensidade, reduzindo as formas de participação dos cidadãos através de liberdades sitiadas e de direitos sociais a minguar. Estes constrangimentos Europeus decorrem da ditadura dos mercados financeiros, aceites pela mulher mais poderosa do planeta[3] (chanceler alemã Ângela Merkel) e pelo presidente francês Nicolas Sarkozy, que se recusam a gizar uma estratégia comunitária ousada que sirva de alternativa. De facto, este é um tempo em que domina no Velho Continente o pensamento único[4], neoliberal, que adormece e torna apática a consciência cívica dos povos Europeus.

 

Neste tom de resignação ideológica Ângelo Correia, figura bem conhecida da vida política portuguesa, disse, no Jornal da Noite da RTP-N de 28 de Julho de 2011, que o mundo tem de aceitar e consciencializar-se da inevitabilidade do pensamento único. Aliás, Henrique Medina Carreira[5] e Manuela Ferreira Leite[6] já advogaram implicitamente, ou mesmo explicitamente, que o controlo das contas públicas, em anos anteriores, só se seria possível com um regime autoritário.

 

Em conclusão, no nosso mundo as liberdades estão longe de progredir, embora as promessas de um Admirável Mundo Novo[7] façam sorrir povos oprimidos, como a Líbia a libertar-se do regime do coronel Kadafi, porque o sistema da Globalização Financeira quer impor ao mundo uma única filosofia de vida, consumista, que aproxima a Humanidade do abismo ecológico e social. Com efeito, só esta consciência das liberdades ameaçadas poderá despertar a opinião pública mundial para a iminente tragédia decorrente da apatia cívica e da falta de sentido crítico face à Globalização Financeira em que as elites têm querido adormecer as populações.

 

Nuno Sotto Mayor Ferrão

 


[1] Francis Fukuyama, “A Revolução Liberal Mundial”, in O Fim da História e o Último Homem, Lisboa, Editora Gradiva, 1992, pp. 59-70.

[2] Boaventura Sousa Santos, Portugal – Ensaio contra a autoflagelação, Coimbra, Almedina Editora, 2011, pp. 131-132.

[3] De acordo com informação divulgada em Agosto de 2011 pela revista “Forbes”.

[4] Há autores inspirados que já falam nesta presente conjuntura como a manifestação de um Despotismo Esclarecido dos dissimulados defensores da ideologia neoliberal.

[5] Henrique de Medina Carreira, “O fim da ilusão”, in O fim da ilusão, Alfragide, Editora Objectiva, 2011, pp. 93-97.

[6] Ficou conhecida nos anais da História Política Portuguesa a frase de Manuela Ferreira Leite de que para endireitar as Finanças Públicas Portuguesas era necessário um interregno da democracia por uns meses.

[7] Aldous Huxley foi um escritor inglês de renome internacional que publicou um romance satírico com o título de Admirável Mundo Novo que anunciava as ameaças que o futuro parecia trazer à liberdade. É muito interessante o ensaio que passados quase trinta anos este autor escreveu sobre o mundo contemporâneo ( Aldous Huxley, Regresso ao Admirável Mundo Novo, Lisboa, Livros do Brasil, s. d.).

 

MÁRIO SOARES E TERESA DE SOUSA LANÇAM O LIVRO “PORTUGAL TEM SAÍDA” (LISBOA, EDITORA OBJECTIVA, 2011) – BREVE RECENSÃO CRÍTICA

 

 

No dia 4 de Julho de 2011 ao fim da tarde no edifício do Corte Inglês, de Lisboa, foi lançado o livro “Portugal tem saída” (Lisboa, Editora Objectiva, 2011) de Mário Soares e Teresa de Sousa. Este livro surgiu de uma reflexão política resultante de uma longa conversa, prolongada por várias semanas, entre os dois autores, Mário Soares como pensador e Teresa de Sousa como jornalista que o entrevistou, a propósito da crise financeira portuguesa. O livro foi apresentado pelo Advogado Vasco Vieira de Almeida que fez uma dissertação histórico-política, que recuou até à Europa do século XIX.

 

Mário Alberto Nobre Lopes Soares (nascido em 1924), de quem tive o privilégio de ter um livro assinado, é como me dizia um amigo “uma lenda viva”. Já antes da mega Crise do Capitalismo de 2008 denunciava os mecanismos financeiros dos mercados internacionais que funcionavam como “casinos”. Pela sua sólida formação Humanista, apoiou estas reflexões nos conhecimentos históricos que considera fundamentais para gerar estratégias sustentadas para o presente e o futuro do país e do mundo. Foi, pois, bem feliz esta iniciativa editoral da Objectiva.

 

Começa por afirmar que Portugal, que está no centro do turbilhão do movimento especulativo internacional, evoluiu muito entre 1984 e 2011 devido à integração Europeia (1985/86) e à formação da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (1996). Todavia, alerta para o facto da integração Europeia ter sido encarada pelo senso comum como a chegada ao “Paraíso”, o que levou muitos cidadãos a não terem consciência das suas responsabilidades e dos seus deveres e do Estado perante os seus credores. Num balanço de Filosofia da História assegura-nos que as duas últimas décadas na Europa levaram ao colapso do Comunismo e à afirmação, concomitante, do Neoliberalismo, sendo que no presente se constata o esgotamento deste modelo político, plasmado nesta nova ideologia, porque os políticos Europeus não compreenderam o seu falhanço e a necessidade de criar outro paradigma alternativo com a força das suas inteligências.

 

Do seu avisado ponto de vista, o novo paradigma implica um Capitalismo Global, regulado pela Ética, que ponha cobro à impunidade dos paraísos fiscais e das agências de “rating” que apenas favorecem os jogos especulativos e as ganâncias egoístas. Nesta conjuntura do défice público português emergem dois factores nacionais potenciadores deste problema: a especulação importada do mundo Globalizado e os gastos excessivos públicos e privados[1].  Nesta encruzilhada da crise, a Europa poderá seguir as receitas neoliberais que vão agravar a recessão ou optar por mudar o paradigma político de desenvolvimento.

 

Mário Soares considera que a melhor saída desta crise pantanosa[2] é o caminho federalista, à revelia do pensamento da Chanceler Ângela Merkl, escorado num novo modelo ideológico mais solidário. Na sua opinião, optimista, só uma Europa unida e socialmente coesa permitirá ao Velho Continente readquirir o seu prestígio internacional, caso contrário a decadência e a desagregação institucional serão inevitáveis. A seu ver, as actuais políticas de austeridade, da maioria dos Governos de Direita da Europa, irão gerar recessão económica, descontentamento popular e incapacidade de resolver os problemas estruturais das suas sociedades. Com efeito, a União Europeia continua sem dar resposta à crise do Euro e só reage aos ataques especulativos dos mercados aos países em risco de bancarrota (Grécia, Irlanda, Portugal, Espanha, Bélgica, etc.). Foi um exemplo a reacção, em uníssono, face à quebra de Portugal no “rating” da Moody’s que causou uma enorme polémica e consternação pública nacional e nas instâncias Europeias.

 

Desde os anos 90 que o socialismo de terceira via tentou adaptar o socialismo democrático à Globalização. No entanto, a crise financeira e o quase desaparecimento de Governos Socialistas Europeus no activo provam a necessidade da reflexão da Esquerda democrática encontrar uma nova estratégia, uma vez que a presente crise pode desembocar em movimentos de agitação social. A refundação do socialismo democrático/da social-democracia é fundamental para se garantir à Europa, e ao mundo, um desenvolvimento sustentável que garanta o progresso económico, social e político, o que não tem acontecido na Era da Globalização Neoliberal (1990-2011).

 

Neste livro, Mário Soares tece algumas considerações sobre o debate eleitoral em volta das eleições legislativas de 5 de Junho, no entanto o mais interessante é análise estrutural que faz à crise do Euro e das dívidas soberanas. Mostrou uma grande lucidez ao antever inúmeros problemas que estiveram por detrás da crise financeira de 2008 e da crise das dívidas soberanas Europeias de 2010-2011. Na sua visão, esclarecida e sensível às problemáticas sociais, indica a necessidade, dos países em risco de queda na bancarrota, se indignarem com as políticas tendencialmente centralistas (de germanização) que a União Europeia, a reboque da Alemanha, está a dar sinais de querer seguir. Nestas suas reflexões indica, como desejável receita económica, que a Esquerda deve associar as políticas de austeridade, face ao despesismo, com a promoção de crescimentos económicos nos países Europeus.   

 

Só a 8 de Julho de 2011 o Presidente da República Portuguesa, Aníbal Cavaco Silva, aderiu à tese de que a Europa não deve estar subjugada à arbitrariedade dos mercados especulativos, reagindo à notação financeira atribuída, na primeira semana deste mês, pela agência de rating Moody’s à dívida portuguesa. Neste opúsculo, Mário Soares sustenta, com bastante clarividência, que as correntes políticas Socialistas têm de exigir que a União Europeia se consubstancie numa unidade institucional, verdadeiramente social e política, que não permita que os negócios contaminem a vida pública, a qual deve ser exercida tendo por base princípios Éticos[3].  

 

O autor deixa-nos uma palavra de esperança face à crise que Portugal e a Europa atravessam, porque, com bom senso e sensibilidade, diz-nos que por maior que seja a crise de um país ou de uma região, em situação de pré-bancarrota, é necessário agir com sensatez e confiança e não com dramatismos. Infere que, se a União Europeia entrar em colapso, todos os países Europeus sairão a perder perante as dinâmicas das novas potências emergentes, mas que a nação “Lusíada”, já com nove séculos de existência, encontrará outras alternativas de sobrevivência que lhe permitirão encontrar saídas para esse drama eventual e indesejável.

 

A nova Era, que vivemos, entre 1989 e 2011 tem desmentido a tese de Francis Fukuyama de “fim da História”, porque esta conjuntura tecnocrática não deu azo à generalização de regimes democráticos sólidos a nível mundial e os desafios Globais são inumeráveis. Se, por um lado, as Revoluções democráticas do Norte de África, de 2011, têm sido uma resposta justa no mundo Muçulmano aos fenómenos do fundamentalismo, por outro lado, os arremedos nacionalistas, que se anunciam no horizonte, são uma resposta  indesejável à crise financeira internacional, porque as velhas potências estão a ver os seus poderes crescentemente diluídos.   

 

Em conclusão, Mário Soares, como pensador da nossa Contemporaneidade política, lembra-nos a necessidade da Ética, voltar a ser rainha em detrimento do dinheiro alçado à realeza mediante a imposta “teologia do mercado”, dever dirigir a investigação científica, a vida económica e a labuta política para que possamos escapar à anarquia da selva egoísta do “Capitalismo de casino” que está instalado no centro da Globalização[4].

 

Nuno Sotto Mayor Ferrão



[1] Mário Soares e Teresa de Sousa, Portugal tem saída, Lisboa, Editora Objectiva, 2011, p. 17.

[2] A expressão de “pântano” faz-nos recordar o termo de António Guterres quando se demitiu, em Dezembro de 2001, ao constatar a vulnerabilidade das soluções neoliberais.

[3] Pelo mesmo diapasão crítico afina Joana Amaral Dias em vários textos do seu livro de crónicas: Cf. Joana Amaral Dias, “A miséria da ganância”, in Portugal a arder, Lisboa, Editora Objectiva, 2011, pp. 202-204.

[4] A nível interno, o autor diz-nos que a derrota do Partido Socialista, em 5 de Junho de 2011, resultou do fanatismo partidário da extrema-esquerda, esquecendo-se que a falta de um novo paradigma de socialismo democrático na Europa não ajudou a mobilizar a sociedade portuguesa.

 

 

BREVE REFLEXÃO SOBRE EDUCAÇÃO, POLÍTICA E FUTEBOL, NUM MUNDO EM VERTIGINOSA MUDANÇA, NO INÍCIO DO SÉCULO XXI

 

As áreas da educação, da política e do futebol confrontam-se, sempre, com a análise dos processos e dos resultados da parte de leigos e de especialistas. Muitas vezes acontece que os analistas e os decisores tomam partido por uma perspectiva de análise que valoriza os resultados em detrimento dos processos devido à predominância da mentalidade pragmática[1]. Segundo este pensamento, o critério da verdade é a utilidade prática das técnicas educativas, das medidas políticas ou das tácticas de jogo.

 

Num mundo crescentemente tecnocrático, com parâmetros econométricos que submergem os outros critérios de avaliação, não admira a importância excessiva que é dada aos resultados educativos, políticos e futebolísticos. Nas leituras apressadas, desta Era da Globalização, sempre que os resultados são frustrantes abrem-se crises. No entanto, como é sabido, a verdadeira crise actual reside no esquecimento de valores morais que devem reger as condutas humanas.

 

Na verdade, tem de se encontrar um meio-termo, dificilmente quantificável, de análise que pondere os processos e os resultados, pois irei dar dois exemplos relativos à desvalorização deste princípio basilar. Nem sempre é fácil atingir em educação este meio-termo, daí que o Professor Nuno Crato[2] tenha andado a criticar, aquilo que o Professor Marçal Grilo chamou de “eduquês”, as modernas pedagogias românticas de darem demasiado destaque aos processos educativos construtivos baseados nos sujeitos das aprendizagens. Com efeito, só através de uma dose de Humanismo e de Pragmatismo se pode alcançar este meio-termo nas práticas pedagógicas, porque nos devemos recordar que a pedagogia exige arte, ciência e técnica. Se centramos a pedagogia na ciência visamos, mormente, os resultados de aprendizagem, mas se centramos a pedagogia na arte visamos, sobretudo, os processos de aprendizagem. De forma que, o grande desafio que se abre à Educação Internacional, à revelia desta Era Tecnocrática, é a de conseguir um equilíbrio entre os processos e os resultados educativos.

 

A hegemonia da corrente pragmática nesta era da Globalização tem favorecido o ataque especulativo aos países criativos de matriz Latina, ou de influência católica, em 2010-2011 (Grécia, Irlanda, Portugal, Espanha, Itália e Bélgica). De facto, mais uma vez, é a pressão dos resultados e a depreciação da capacidade criativa destes povos e da sua rica herança cultural que está em questão.  Ora o destino da moeda única Europeia (o Euro), e da própria União Europeia, não pode depender da adopção de um padrão cultural comum que garanta a concretização de resultados financeiros, porque a riqueza da Europa é, precisamente, a sua diversidade de costumes, de tradições e de culturas. Este é, pois, o desafio incontornável que se abre à Europa neste momento de crise financeira.

 

Um bom exemplo desta dicotomia ideológica foi o Campeonato da Europa 2004, realizado em Portugal, em que a selecção portuguesa dirigida por um brasileiro, Luiz Felipe Scolari, foi vencida na Final pela selecção grega dirigida por um alemão, Otto Rehhagel, que conquistou o título de selecção campeã Europeia de Futebol nesse ano. Enfrentaram-se dois estilos de futebol: o grego, germanizado, que adoptou um estilo pragmático à procura de resultados e o português que adoptou um estilo artístico, baseado na “posse de bola”, que buscou os processos que encantaram milhões de espectadores em todo o mundo, mas que claudicou frente ao Hércules grego possuidor de um estilo de jogo “sem arte, mas com engenho”.  

 

O Futebol Clube de Barcelona, na Europa em 2010-2011, é o modelo de futebol síntese que conseguiu conciliar os resultados desportivos com os processos futebolísticos, que deram um grandioso espectáculo ao mundo, comandados pelo catalão Josep Guardiola i Sala. Este edificante exemplo deve servir de inspiração, na Educação e na Política, para que se pense, concomitantemente, nos processos e nos resultados, no sentido de se superarem estes estrangulamentos da crise destes sectores da vida colectiva global, que mais não são do que um reflexo da crise de valores que atravessa a História da Humanidade no início do século XXI. Em suma, o Futebol Clube de Barcelona por se ter alavancado nos três pilares interdependentes (a arte, a ciência e a técnica) proporcionou ao mundo um futebol magistral que obteve resultados estratosféricos com processos artísticos moldados na consabida criatividade catalã.

 

Nuno Sotto Mayor Ferrão



[1] O pragmatismo como corrente filosófica nasceu nos EUA com o pensamento do filósofo William James (1842-1910).

[2] Nuno Crato, “Eduquês” em discurso directo, Lisboa, Gradiva Editora, 2006.

 

 

 


FÓRUM ECONÓMICO MUNDIAL (2011) EM DAVOS E OS PARADOXOS DA PRESENTE GLOBALIZAÇÃO

 

 

O Fórum Económico Mundial que se realiza em Davos, na Suíça, de 26 a 30 de Janeiro tem revelado a confiança dos participantes no crescimento económico dos países emergentes. Não obstante, debatem-se, também, os múltiplos constrangimentos mundiais, desta nova configuração geoeconómica internacional, em particular: o abrandamento do progresso económico Europeu e a crise da dívida soberana da zona Euro, a tendência perigosa do aumento dos preços dos bens alimentares geradores de crispações sociais como tem sido visível na Grécia e em alguns países do Norte de África.

 

Esta nova estrutura económica mundial procedente da Globalização e das políticas de desregulamentação dos mercados financeiros originaram a grande crise financeira de 2008 e tem gerado um fenómeno paradoxal: uma diminuição das disparidades económicas entre países de grande dimensão territorial, por acção da revolução tecnológica e da capacidade demográfica, e um aumento das desigualdades sociais internas com o crescente fosso entre ricos e pobres e a gritante diminuição do grupo dos “remediados” na maioria dos países desenvolvidos.

 

Em 1970 iniciou-se o primeiro Fórum Económico Mundial criado pelo Professor Klaus Schwab. O novo panorama mundial em termos de geoestratégia económica é dominado pela transferência dos poderes económicos mundiais do Hemisfério Ocidental para o Oriental (China, Índia, Paquistão, Tailândia, etc) e do Hemisfério Norte para o Sul (Brasil, México, Chile, etc). As diversas sessões deste Fórum que reúne 2500 pessoas (gestores, políticos, empresários, banqueiros, etc) abordam temas quentes da nova Era Internacional e assistimos aos discursos dos mais importantes líderes Europeus (David Cameron, Nicolas Sarkozy, Ângela Merkel, Jean Claude-Trichet, etc) e de muitos líderes dos países emergentes. Para inculcar, na opinião pública mundial, a ideia do universalismo deste Fórum estarão presentes líderes religiosos, culturais e membros de Organizações Não Governamentais.

 

Na verdade, o declínio Civilizacional Europeu resultou dos nacionalismos exacerbados que se traduziram nas duas Guerras Mundiais do século XX e do actual insucesso de uma Europa coesa, incapaz de recompor os sistemas de Segurança Social e que investiu numa estratégia precipitada de desmesurado alargamento geográfico dos confins do espaço da União Europeia. O Fórum Económico Mundial está a reflectir sobre a necessidade de estabelecer novas regras perante um espaço económico internacional mais vasto e mais inseguro pela sua crescente complexidade e pela retumbante crise financeira de 2008.

 

Esta nova dinâmica económica, de esteios éticos titubeantes, tem potenciado crescentes desigualdades sociais, dentro dos países desenvolvidos entre ricos e “remediados” (classe média) e entre países ricos e países pobres como tem sido denunciado pelos relatórios das Nações Unidas, constituindo um paradoxo iniludível da presente Globalização. Não espanta que esta dicotomia mundial entre o aparente progresso económico e o significativo retrocesso social tenha reforçado o movimento de Alter-Globalização e a crescente importância do Fórum Social Mundial que tem sido especialmente apreciado pelas populações das potências emergentes como o Brasil ou a Índia.

 

Nuno Sotto Mayor Ferrão

 

 

 

 

 

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